I – Intróito
Trata, o presente artigo, acerca da possibilidade de reconhecimento da prescrição do crédito tributário arguida em sede de exceção de pré-executividade, e, por conseguinte, a extinção, pelo magistrado, do crédito com base no art. 156, inciso V, do Código Tributário Nacional, assim como a execução com fulcro nos arts. 269, inciso IV cumulado com o 795, ambos do Código de Processo Civil.
II – A execução fiscal e a arguição da prescrição do crédito tributário
A execução fiscal é o instrumento de que dispõem as Fazendas Públicas para a cobrança de seus créditos provenientes da Dívida Ativa, em decorrência da inadimplência do contribuinte no pagamento de crédito tributário. Em linha de princípio, toda e qualquer matéria relacionada ao direito de defesa do contribuinte somente é argüível após estar garantida a execução, e no âmbito de embargos, o que, à evidência, deixa o contribuinte em situação de desvantagem com relação à Fazenda Pública, verifica-se que isto se constitui, indubitavelmente, numa prerrogativa estabelecida em favor do credor que, em tese, tem um crédito, vencido e não pago, cujo valor o devedor resiste em pagar.
Releva, pois, frente a esse quadro, notar que a doutrina[1] e a jurisprudência não estão insensíveis a tal realidade, acatando, em determinadas situações, o que se chama de "exceção de pré-executividade", consistente na faculdade atribuída ao executado de submeter ao conhecimento do juiz da execução, independentemente de penhora ou de embargos, determinadas matérias próprias da ação de embargos do devedor.
A exceção de pré-executividade apenas pode ser utilizada para alegação de matérias de ordem pública e de vícios objetivos do título, referentes à certeza, liquidez e exigibilidade, desde que comprovadas de plano, vedada, em consequência, a dilação probatória.
Tem-se, assim, a possibilidade de o devedor alegar, nos autos da execução fiscal, dentre outras: a prescrição da ação; a decadência do direito do exeqüente e as nulidades formais evidentes dos títulos embasadores da execução.
Ademais, nas hipóteses em que há necessidade de dilação probatória, como na realização de audiências e de perícias, somente depois de garantido o juízo pela penhora, o devedor terá condições de solicitá-las por intermédio dos embargos.
Portanto, de regra, ao devedor compete a propositura dos embargos após a formalização da penhora, a fim de exercer sua ampla defesa, e, excepcionalmente, em situações específicas cujo reconhecimento seria possível desde logo por ser visível e devidamente fundamentado - como a prescrição, que, em obediência à celeridade processual e ao direito do devedor, prescinde-se daquela ação, bastando ser alegada nos próprios autos da ação executiva, podendo, assim, ser levantada em sede de exceção de pré-executividade, não estando sujeita à dilação probatória por se tratar de questão de baixa complexidade, além de imputar ao executado encargo demasiadamente pesado, ferindo de morte o princípio insculpido no art. 620 do Código de Processo Civil.
Nesse sentido, os tribunais pátrios há algum tempo já vêm se manifestando, inclusive o Colendo Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL - MATÉRIA DE DEFESA: PRÉ-EXECUTIVIDADE - OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - CITAÇÃO - INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL - PRECEDENTES DESTA CORTE - INTIMAÇÃO PESSOAL - AUSÊNCIA - FUNDAMENTO SUFICIENTE INATACADO - SÚMULA 283/STF - 1. Somente a citação regular interrompe a prescrição (ERESP 85.144/RJ). 2. Doutrinariamente, entende-se que só por embargos é possível defender-se o executado, admitindo-se, entretanto, a exceção de pré-executividade, como defesa excepcional, que não tem o condão de substituir os embargos, ação própria para o executado formular sua impugnação. 3. Consiste a pré-executividade na possibilidade de, sem embargos ou penhora, argüir-se na execução, por mera petição, as matérias de ordem pública ou as nulidades absolutas, inclusive quanto à prescrição. Precedente da Corte Especial. 4. Recurso que não ataca um dos fundamentos do decisum, suficiente, de per si, para a sua manutenção, devendo-se aplicar à espécie o teor da Súmula 283/STF. 5. Recurso Especial improvido.” (STJ - RESP 200500594352 - (741341 SP) - 2ª T. - Relª Minª Eliana Calmon - DJU 15.08.2005 - p. 00293)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. PRESCRIÇÃO. REDIRECIONAMENTO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. 1. A antecipação dos efeitos da tutela recursal pretendida exige que seja demonstrado, por meio de prova inequívoca e verossimilhança da alegação, fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou que haja abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu, sem que se configure perigo de irreversibilidade do provimento antecipado, conforme inciso III do art. 527 c/c art. 273 do CPC. 2. A exceção de pré-executividade, meio de defesa criado pela doutrina e aceito pela jurisprudência, deve limitar-se à discussão da nulidade formal do título, baseada em alegação passível de apreciação mesmo de ofício e desde que ausente a necessidade de instrução probatória. Por se tratar de meio excepcionalíssimo de defesa, a exceção de pré-executividade é restrita apenas aos casos de nulidade absoluta, que são aqueles que podem ser reconhecidos de ofício e não ensejam a produção de outras provas. 3. Nesse sentido, desde que atendidos os pressupostos mencionados, na linha de firme jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça e deste Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a alegação de prescrição é passível de ser apreciada em referida via incidental. Precedentes: STJ, Segunda Turma, REsp 104.845-6/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, j. 19.06.2008, DJe 05.08.2008; TRF 3ª Região, Terceira Turma, AG 335.289/SP, Rel. Desembargadora Federal Cecilia Marcondes, j. 27.11.2008, DJF3 09.12.2008. 4. Disciplina o art. 174 do CTN, que a ação para a cobrança dos créditos tributários prescreve em cinco anos, a contar da data de sua constituição definitiva. Nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, tendo o contribuinte declarado o débito por intermédio de DCTF, considera-se esse constituído no momento da entrega da declaração, devendo ser contada a prescrição a partir daquela data, ou, na falta de comprovação documental de tal fato, a partir da data do vencimento dos débitos, conforme entendimento adotado por esta Turma de Julgamento. Nesse sentido destaco julgado do Superior Tribunal de Justiça: STJ, 1ª Turma, AGA 938979/SC, Relator Ministro José Delgado, Julgado em 12/02/2008. 5. Em análise da CDA n. 80.6.06.056545-46, seus créditos foram constituídos por lançamento de ofício, operado em 07/12/2005, por edital, em que se tem um prazo de quinze dias, e em 22/01/2006 (ou dia útil subseqüente), trinta dias depois do decurso do prazo de edital, foram efetivamente constituídos. Isso porque, no que se refere ao crédito inscrito em referida CDA, há a particularidade de revisão por lançamento de ofício, já que foi lavrado auto de infração antes de decorridos 05 (cinco) anos a contar do vencimento, razão pela qual não há que se falar em decadência do direito da Fazenda Nacional. 6. Quanto ao março interruptivo do prazo prescricional, cumpre ressaltar que a Terceira Turma deste Egrégio Tribunal tem entendido que, tratando-se de execução ajuizada após o início da vigência da LC n. 118/05 (09/06/2005), como no presente caso, não incide o disposto na Súmula n. 106 do Egrégio STJ, considerando-se, pois, o despacho que ordena a citação do devedor para interrupção do prazo prescricional. 7. No caso concreto, o despacho ordenando a citação foi dado em 21/05/2007 (fls. 56). Observa-se, pois, que a CDA n. 80.6.06.056545-46 não se encontra fulminada pela prescrição, visto que não decorreu o prazo quinqüenal entre a constituição definitiva do crédito tributário e o despacho citatório ordenado pelo juiz. 8. Quanto ao mais, vislumbro que, em relação à ilegitimidade passiva, tem-se que, tenho admitido o redirecionamento da execução fiscal nos casos em que, comprovada a impossibilidade de garantia da causa pelos meios ordinários, apresentem-se indícios da dissolução irregular da sociedade executada ou das práticas descritas no artigo 135, III, do CTN. Entendo configurada a situação de dissolução irregular da empresa, com assenhoramento de capital por parte do sócio que exercia a gerência desta na época do suposto desfazimento, nos casos em que a empresa não se encontra mais no local de sua sede ou deixa de prestar regularmente informações à Secretaria da Receita Federal. Nesse sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça: REsp 200901125948, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJE 28.06.2010; EEARES 200802082776, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJE 07.06.2010. 9. No caso concreto, não se configurou a dissolução regular da empresa executada, uma vez que não consta na Ficha da Junta Comercial a ocorrência de distrato. Ademais, a documentação apontada pelo agravante, como prova da dissolução configura-se como mera deliberação a seu respeito. 10. Na tentativa de cumprimento do mandado de penhora, o Oficial de Justiça lavrou certidão (fls. 76) no sentido de que procedeu à citação da empresa executada por meio de seu representante legal, ora agravante, que declarou que a empresa encontrava-se desativada de fato e sem bens, o que permite considerar a ocorrência de dissolução irregular. Conforme o referido documento, José Theóphilo Ramos Junior ocupava cargo de gerente delegado, assinando pela empresa executada, à época em que foi constatada sua dissolução irregular, fato que possibilita o redirecionamento da execução contra ele. 11. Agravo de instrumento improvido. (TRF-3 - AI: 12738 SP 0012738-44.2013.4.03.0000, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MARCONDES, Data de Julgamento: 05/12/2013, TERCEIRA TURMA)
AGRAVO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ESTANDO A ARGÜIÇÃO DE PRESCRIÇÃO PRONTA A SER APRECIADA NO PRESENTE FEITO, POSSÍVEL A ANÁLISE DESTE INSTITUTO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO OCORRÊNCIA EM RELAÇÃO AOS SÓCIOS-GERENTES. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. O termo inicial do prazo prescricional em relação aos sócios-gerentes é o do conhecimento da dissolução irregular da sociedade. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SUBSIDIÁRIA DO SÓCIO. Discussão de questões relativas à ilegitimidade de parte. Matéria não evidenciada de plano, a depender de dilação probatória, o...(TJ-RS - AGV: 70041671553 RS , Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Data de Julgamento: 25/05/2011, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 14/06/2011)
Quanto à argüição de prescrição, sabe-se que o prazo prescricional inicia-se com a constituição definitiva do crédito, isto é, da data em que não mais admita a Fazenda Pública discutir a seu respeito em procedimento administrativo. Se não se efetuar a cobrança no prazo de cinco anos, não poderá mais fazê-lo.
Nesse sentido, cumpre destacar que, o doutrinador Hugo de Brito Machado[2], em sua obra Curso de Direito Tributário, trata a prescrição como uma causa extintiva do crédito e não apenas da ação para a sua cobrança:
“A prescrição não atinge apenas a ação para cobrança do crédito tributário, mas o próprio crédito, vale dizer, a relação material tributária.”
Como o próprio doutrinador supra aludido explica, se a prescrição atingisse apenas a ação para cobrança do crédito tributário, a Fazenda Pública, após 05 (cinco) anos, mesmo sem poder cobrar o crédito, poderia se recusar a fornecer Certidões Negativas de Débitos aos sujeitos passivos.
Ainda no tocante à prescrição, o Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de que, transcorrido determinado lapso temporal sem a promoção da devida execução fiscal pela parte interessada, deve-se reconhecer a prescrição, com o escopo de se efetivar o princípio da segurança jurídica, afastando, assim, a possibilidade, mesmo que remota, de uma prescrição ad eternum:
“Após o decurso de determinado tempo, sem promoção da parte interessada na interposição de execução fiscal, deve-se estabilizar o suposto conflito, pela via da prescrição, impondo segurança jurídica aos litigantes, uma vez que afronta os princípios informadores do sistema tributário a prescrição indefinida.
Paralisado o processo por mais de 5 (cinco) anos impõe-se o reconhecimento da prescrição
In casu, decorreu mais de cinco anos entre a notificação do lançamento do crédito tributário (27.09.1996) e a propositura da ação de execução fiscal (26.11.2001), razão pela qual mister reconhecer a ocorrência da prescrição”. (STJ - AgRg no REsp 921399/PE AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 2007/0020580-9 – Relator(a): Ministro LUIZ FUX (1122) - Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA - Data do Julgamento: 04/10/2007 - Data da Publicação/Fonte - DJ 29.10.2007 p. 191). (g.n.)
Mister se faz salientar que, o art. 2º, §3º, da Lei de Execução Fiscal, deve ser interpretado em harmonia com o disposto no art. 174 do Código Tributário Nacional, que deve prevalecer em caso de colidência entre as referidas leis. Isto porque, é princípio de Direito Público que a prescrição e a decadência tributárias são matérias reservadas à lei complementar, segundo prescreve o art. 146, inciso III, alínea "b", da Constituição Federal. Nesse diapasão, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça consagrou o seguinte entendimento:
“ ... o art. 2º, § 3º, da Lei 6.830/80 aplica-se tão-somente às dívidas de natureza não-tributárias, pois a prescrição das dívidas tributárias é matéria reservada à lei complementar e está prevista no art. 174 do CTN. Precedentes: AgRg no Ag 856275/MG DJ 18.06.2007; REsp 708227/PR DJ 19.12.2005;REsp 679791/RS DJ 09.10.2006.”
III – Considerações finais
Destarte, releva notar que a doutrina e jurisprudência pátria, inclusive o Colendo Superior Tribunal de Justiça ao enfrentarem o tema, são firmes em se posicionarem no sentido do cabimento de arguição da prescrição do crédito tributário em sede de exceção de pré-executividades, desde que seja desnecessária a produção de outras provas além das constantes nos autos.
IV – Referências bibliográficas
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 25ª Ed. Malheiros: São Paulo. 2004.
MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, Ed. Atlas, 2005.
NERY, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante, 7ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, 2003.
[1] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, Ed. Atlas, 2005, p. 576; NERY, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante, 7ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 1.050, comentários ao art. 736.
[2]In Curso de Direito Tributário. 25ª edição. São Paulo: Malheiros, São Paulo, 2004, página 218.
Procuradora Federal em exercício na Procuradoria Federal junto à Fundação Universidade Federal do Tocantins - UFT.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Patricia Bezerra de Medeiros. Da arguição da prescrição de crédito tributário em sede de exceção de pré-executividade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 jan 2014, 06:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38111/da-arguicao-da-prescricao-de-credito-tributario-em-sede-de-excecao-de-pre-executividade. Acesso em: 22 nov 2024.
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