RESUMO: O presente trabalho procura apontar as justificativas que impedem a existência da intervenção de terceiros nos Juizados Especiais
PALAVRAS CHAVES: Intervenção de terceiros. Juizados especiais. Litisconsórcio.
INTRODUÇÃO
A simplicidade da causa e a celeridade do rito são pilares dos juizados especiais e por esse motivo as Leis 10.259/01 e 9.099/95 impedem intervenção de terceiros após a propositura da lide, exceto em casos de posterior identificação de litisconsórcio passivo necessário:
Lei 10.259/01
Art. 1º São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.
Lei 9.099/95
Art. 10. Não se admitirá, no processo, qualquer forma de intervenção de terceiro nem de assistência. Admitir-se-á o litisconsórcio.
A impossibilidade da intervenção de terceiros nos Juizados Especiais
Diante das leis citadas não restam dúvidas quanto à impossibilidade de intervenção de terceiros e assistência no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, porém várias foram as alegações em sentido contrário, inclusive invocando justamente a necessidade de solução definitiva do conflito de forma a evitar demandas futuras, obrigando as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais a analisarem a matéria:
Processo 2005.36.00.902262-0
Apesar de ser autorizado o litisconsórcio nos Juizados Especiais Federais, por aplicação do art. 10 da Lei 9.099/95 c/c art. 1º da Lei 10.259/2001, há que se observar as peculiaridades previstas nesta Lei.
Prevê, a propósito, o art. 6º da Lei 10.259:
Art. 6º - Podem ser partes no Juizado Especial Federal Cível: I - omissis.
II - como rés, a União, autarquias, fundações e empresas públicas federais. O dispositivo supra transcrito é claro ao prever, de forma taxativa, os entes autorizados a ocupar o pólo passivo nos Juizados Especiais Federais.
Veja-se, a respeito, a seguinte lição (Sinopses Jurídicas - Juizados Especiais Cíveis e Criminais Federais e Estaduais, Marisa Ferreira dos Santos e Ricardo Cunha Chimenti, 3ª ed., p. 64): Quanto aos Juizados Federais, podem ser réus a União, autarquias, fundações e empresas públicas federais. Também aqui a enumeração legal é taxativa. Dessa forma, fica afastada a possibilidade de qualquer outro tipo de pessoa física ou jurídica ser demandada nos Juizados Especiais Federais.
Os princípios da simplicidade e da celeridade próprios dos juizados levam à conclusão de que o litisconsórcio somente pode ser admitido entre aquelas pessoas autorizadas a figurarem no pólo passivo das lides de sua competência.
A intervenção de terceiros, de uma maneira geral, à exceção do litisconsórcio, está proibida nos Juizados (art. 10 da Lei 9.099/95).
A restrição procede e vem ao encontro dos princípios do Juizado. O objetivo não é outro que evitar a proliferação de pretensões dentro de um mesmo processo, com o aumento da complexidade da lide e a morosidade do processo, exatamente o que o Juizado pretende evitar.
Assim, é de admitir-se o litisconsórcio somente dentre aqueles entes públicos definidos taxativamente em lei.
Dito isso, impõe-se o reconhecimento da incompetência deste Juízo, ademais cuidando-se de litisconsórcio passivo necessário. Como trata-se de processo virtual, impõe-se a extinção do feito sem julgamento do mérito, a exemplo do que ocorre quando reconhecida a incompetência territorial (art. 51, III, da Lei 9.099/95), devendo a parte autora propor novamente a ação junto à Justiça Federal não especializada.
Diante do exposto, VOTO pelo CONHECIMENTO do recurso e seu PROVIMENTO, para o fim de, reconhecendo a incompetência do JEF, julgar extinto o processo, sem exame do mérito. Sem custas processuais e sem honorários advocatícios, na forma do art. 55, da Lei nº 9.099/95.
Decide a Turma Recursal do Juizado Especial Federal de Mato Grosso, por maioria, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Exmº. Senhor Juiz Relator. (grifos nossos)
Processo 2004.33.00.719871-9
PREVIDENCIÁRIO. RECEBIMENTO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO QUE ERA SERVIDOR DA AERONÁUTICA. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO QUE DETERMINOU A CITAÇÃO DOS DEMAIS PENSIONISTAS. LITISCONSÓRCIO CABÍVEL NOS JUIZADOS ESPECIAIS.
1. Conquanto inadmissível a intervenção de terceiros nos juizados especiais, o litisconsórcio é expressamente admitido em lei.
2. Devem ser chamados como litisconsortes necessários, no caso, os demais pensionistas, já que a questão versa sobre interesse direto seu.
3. Não houve coação indevida.
4. Mandado de segurança desprovido. (grifos nossos)
A doutrina também analisa a questão:
Aplica-se de maneira cabal aos Juizados Especiais Federais a regra contida no art. 10 da lei 9.099/95, in verbis: Não se admitirá, no processo, qualquer forma de intervenção de terceiro nem de assistência. Admitir-se-á o litisconsórcio. Trata-se, portanto, de norma cogente, que rechaça, de plano, a possibilidade de qualquer tipo de intervenção de terceiros (oposição, nomeação à autoria, chamamento ao processo e denunciação á lide - cf. Arts. 56/80 do CPC) e forma de assistência, admitindo, contudo, o litisconsórcio.
Assim, como já ocorria na Lei 7.244/84 (art. 10), os institutos da intervenção de terceiro não são admitidos neste tipo especial de jurisdição porque representam maior complexidade para a causa e também acréscimo no número de participantes do processo, fazendo com que se torne mais lento. Por conseguinte, impossível juridicamente também se torna – e com maior razão – a litisdenunciação sucessiva.
A assistência (art. 50 e ss. do CPC) também não é admitida, pelos mesmos motivos, mas o litisconsórcio (necessário ou facultativo) o é. Mas como enquadrar a figura híbrida da assistência litisconsorcial? (...)
Nesse caso, havendo uma relação jurídica identificada à do que deverá ser assistido, entre o que figurará como assistente litisconsorcial e o adversário destes, e havendo, ainda, a sentença a ser proferida que influir nessa relação – reclamado, portanto, julgamento uniforme para ambas as situações -, a citação do litisconsorte, a requerimento do autor, será suficiente para contornar o problema eventualmente surgido.[1]
Parece claro, portanto, que nem a legislação, nem a jurisprudência e nem a doutrina admitem a aplicação do instituto da intervenção de terceiros no âmbito dos juizados especiais cíveis, pelo que foi editado o Enunciado 15 pelo Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais - FONAJEF:
Nos Juizados Especiais Federais, não é cabível a intervenção de terceiros ou a assistência.
Esse entendimento impede, inclusive, a possibilidade de interposição de recurso por um terceiro prejudicado nos juizados especiais.
A doutrina analisa a questão:
Diferentemente do que ocorre com o sumário, o procedimento dos Juizados Especiais Cíveis veda qualquer espécie de intervenção de terceiros, até mesmo a assistência (art. 10, LF 9.099/95). Trata-se de dispositivo peremptório que proíbe, a fortiori, a interposição de recurso pelo terceiro.
Permitindo o legislador, no particular, o litisconsórcio (art. 10, fine, LF 9.099/95), sem distingui-lo entre inicial e ulterior, seria possível o recurso de terceiro diretamente prejudicado, o qual, como será visto, ingressa no feito como assistente litisconsorcial (litisconsorte unitário facultativo ulterior)? Entendemos que, ainda assim, não será permitido, porquanto parte inicial do mesmo artigo faz expressa referência à proibição da assistência, sem distinção, o que inclui, por suposto, a litisconsorcial. Quis-se impedir qualquer alteração subjetiva superveniente da relação jurídica processual.
Em segundo lugar, poderia o litisconsorte necessário não-citado ingressar com recurso de terceiro? Aqui, é conveniente que se permita esta intervenção. Isto porque, sem a participação do litisconsorte não-citado, o processo é coisa sem valia (art. 47 do CPC). É desejável que se possa regularizar o feito, o mais rapidamente possível, sem que se espere um futuro e inevitável questionamento da decisão. A regra expressa que proíbe a intervenção de terceiro em sede de Juizado Especiais reclama o devido temperamento.[2]
E os litisconsórcios? Pode haver litisconsórcio nos juizados ou também conflitaria com os princípios da celeridade e da baixa complexidade das causas? Poderia haver litisconsórcio ulterior, mesmo não sendo possível a intervenção de terceiros?
Litisconsórcio é a reunião de duas ou mais pessoas assumindo posições de autores ou réus em uma mesma demanda judicial e é admitido nos juizados especiais, o que induz a concluir que o legislador entendeu que o fato de haver mais de um litigante, seja como autor, seja como réu, não gera a complexidade à ação judicial proposta.
É certo que em um processo judicial as partes são, em geral, definidas quando da triangulação da relação jurídica processual, podendo haver alterações ulteriores.
Existem diversas classificações no estudo do instituto do litisconsórcio:
Litisconsórcio inicial é aquele que se forma contemporaneamente à formação do processo (art. 263 do CPC), quer porque mais de uma pessoa postulou, quer porque em face de mais de uma pessoa foi oferecida a demanda.
Litisconsórcio ulterior é aquele que surge após o processo ter-se formado. Tem de ser encarado como exceção, pois não deixa de ser evento que tumultua a marcha processual.
De três maneiras pode surgir o litisconsórcio ulterior: a) em razão de uma intervenção de terceiro (chamamento ao processo e denunciação da lide, por exemplo); b) pela sucessão processual (o ingresso dos herdeiros no lugar da parte falecida, art. 43 do CPC); c) pela conexão (arts. 103 e 105 do CPC), se impuser a reunião das causas para processamento simultâneo, o que pode dar ensejo à formação de um litisconsórcio ulterior.[3]
Conforme explicitado pela doutrina supra, há três possibilidades de ocorrer um litisconsórcio ulterior em uma demanda: em virtude da sucessão, da conexão ou pela incidência de uma das modalidades do instituto da intervenção de terceiros.
Urge a necessidade de analisar outra classificação de litisconsórcio que pode interferir na presente análise: o necessário e o facultativo.
O litisconsórcio facultativo ocorre por conveniência das partes, o que, a princípio, no âmbito dos Juizados somente ocorrerá por conveniência do autor.
Sobre o litisconsórcio necessário buscaremos auxílio na doutrina:
Já o litisconsórcio necessário está ligado mais diretamente à indispensabilidade da integração do pólo passivo por todas as pessoas co-legitimadas, seja por conta da própria natureza desta relação jurídica, seja por imperativo legal. A necessariedade atua, por isso, na formação do litisconsórcio e nisso, repise-se, difere da unitariedade, vez que esta pressupõe um litisconsórcio já formado. O litisconsórcio necessário revela os casos de legitimação ad causam conjunta ou complexa.
É o art. 47 da CPC que trata mais especificamente das hipóteses em que o litisconsórcio será, ou não, necessário. Por duas razões, diz o dispositivo aludido, ter-se-á o litisconsórcio necessário: a) quando o exigir a própria natureza da relação jurídica deduzida em juízo ou b) quando o exigir a lei, independentemente da natureza da relação jurídica deduzida em juízo.[4]
O litisconsórcio necessário, portanto, pode ser considerado um caso especial nos juizados especiais, quando, independentemente da vontade do autor, um terceiro que originalmente podia não integrar a lide, venha a ser chamado a participar do processo.
Este é o entendimento do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais – FONAJEF, que, por meio do Enunciado 21, admite inclusive a participação no pólo passivo de pessoas físicas e jurídicas de direito privado no âmbito dos Juizados Especiais Federais.
As pessoas físicas, jurídicas, de direito privado ou de direito público estadual ou municipal podem figurar no pólo passivo, no caso de litisconsórcio necessário.
No caso da assistência litisconsorcial, que, apesar da jurisprudência não se manifestar expressamente, a doutrina sugere que se peça ao autor para formular pedido de citação do terceiro.
Perceba-se que neste caso o autor teria a liberalidade de acatar ou não a sugestão do réu, até porque ele não pode ser obrigado a demandar contra quem não possui relação jurídica direta com ele.
A intervenção anômala instituída pela Lei 9.469/97 também não pode ser aplicada não só porque possui natureza jurídica de intervenção de terceiro, mas principalmente porque se o legislador quisesse permitir a sua aplicabilidade no âmbito dos juizados especiais cíveis federais o teria feito de maneira expressa.
Isto porque, se os institutos da intervenção de terceiro não são admitidos neste tipo especial de jurisdição porque representam maior complexidade para a causa e também acréscimo no número de participantes do processo, fazendo com que se torne mais lento, caberia ao legislador, caso entendesse que a intervenção anômala (que já existia quando da edição da Lei 10.259/01) pudesse ser aplicada nos juizados federais, teria, expressamente, admitido a sua aplicação, ainda que vedando as demais modalidades de intervenção.
CONCLUSÃO
Assim, temos que somente é possível o ingresso ulterior de um terceiro na lide, no âmbito dos juizados especiais e independentemente da vontade do autor, quando estiver evidente tratar-se de litisconsórcio passivo necessário.
Referências:
Tourinho Neto, Fernando da Costa; Figueira Júnior, Joel Dias. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais – Comentários à Lei 10.259, de 10.07.2001. 7ª ed., RT, 2011
Didier Jr, Fredie. Recurso de Terceiro – Juízo de Admissibilidade. 2ª ed., RT, 2005
Didier Jr, Fredie. Direito Processual Civil - Tutela Jurisdicional Individual e Coletiva. 5ª ed., Juspodivum, 2005
[1] Tourinho Neto, Fernando da Costa; Figueira Júnior, Joel Dias. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais – Comentários à Lei 10.259, de 10.07.2001. 7ª ed., RT, 2011, p. 194/195
[2] Didier Jr, Fredie. Recurso de Terceiro – Juízo de Admissibilidade. 2ª ed., RT, 2005, p. 70/71
[3] Didier Jr, Fredie. Direito Processual Civil - Tutela Jurisdicional Individual e Coletiva. 5ª ed., Juspodivum, 2005, p. 251/252
[4] Didier Jr, Fredie. Direito Processual Civil - Tutela Jurisdicional Individual e Coletiva. 5ª ed., Juspodivum, 2005, p. 253
Procurador Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SAMPAIO, Ricardo Ramos. A Impossibilidade da Intervenção de Terceiros nos Juizados Especiais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 jun 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39984/a-impossibilidade-da-intervencao-de-terceiros-nos-juizados-especiais. Acesso em: 22 nov 2024.
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