RESUMO: Tendência que vem ganhando cada vez mais força, o papel ativo do juiz no decorrer do processo merece destaque na celeridade e busca de justiça social. O magistrado abandonou, há muito, a postura de mero proclamador da literalidade da lei, passando a agir como verdadeiro intérprete do ordenamento jurídico. Dessa forma, o juiz deixa de ser mero expectador do desenvolvimento processual e passa a exercer papel ativo da construção da decisão, realizando de modo eficaz, eficiente e útil a vontade da constituição, priorizando, dessa forma sua força normativa.
Palavras chave: publicista, magistrado, pró-atividade, eficácia.
1- Introdução
A corrente publicista do processo vem ganhando, a cada dia que passa, mais adeptos, seja na doutrina, em que parece haver grande prestígio aos mecanismos que aumentam os poderes jurisdicionais, seja na jurisprudência, que vem chancelando e consolidando o poder do juiz para limitar o exercício do poder de ação do cidadão.
Antes, a trilogia processual- ação, processo e jurisdição- era tratada com o mesmo grau de importância e a doutrina via em cada um desses conceitos sua autonomia e sua igual força de participação para o Direito Processual. De fato, se formos levar em conta a estrutura pela qual o devido processo legal se materializa, garantindo o direito através de um procedimento em que sejam garantidos os direitos fundamentais, todos os três elementos acima são necessários para um desenvolver processual.
Todavia, após, principalmente, a Onda renovatória Processual trazida por Mauro Cappelletti, em que amplia demasiadamente o acesso do cidadão à prestação jurisdicional, nota-se que, para parte da doutrina, a jurisdição é que passa a medir os limites do direito de ação. Seria, assim, em princípio, possível de levar a análise do juiz toda e qualquer pretensão, cabendo ao magistrado atuante na demanda exercer sua função e poder e aplicar os limites que considerar necessários ao caso.
Esta nova forma de encarar a tutela dos direitos foi retratada nas legislações influenciadas pelo socialismo e fascismo, que traziam a noção de que o aumento dos poderes do Estado representava um avanço social, o que explicava e legitimava a ampliação dos poderes do magistrado, visando conferir mais qualidade e justiça na forma da tutela jurisdicional, significando que o processo, neste contexto, foi alçado ao patamar de interesse público. (GRECO, Leonardo. “Publicismo e privatismo no processo civil”. Revista de Processo. n. 164. out./2008. p. 31)
2- Desenvolvimento
Enxergar o processo como instrumento de interesse público é o primeiro passo para que os publicistas possam firmar a ideia de que a jurisdição para a ser mais importante do que a ação, no momento em que é através do exercício da “atuação estatal visando a aplicação do direito objetivo ao caso concreto, resolvendo com definitividade uma situação de crise jurídicae gerando com tal solução a pacificação social” (Neves, Daniel Amorim Assunção. Manual de Direito Processual Civil- 2 ed- Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: MÉTODO, 2010, pag. 03) é que se diz que determinada demanda tem ou não condições de ser analisada e, assim, ser proferida uma decisão de mérito.
Nesse contexto, o juiz passa a ser o sujeito responsável pela condução processual, adotando um perfil pró-ativo na coleta de provas, visando chegar o mais próximo possível da verdade material, podendo, ainda, distribuir de modo dinâmico o ônus da prova, desde que, por óbvio oportunize o contraditório e não venha a ferir o direito de defesa das partes. O juiz, ainda, nessa postura ativa, conferida na análise publicista do processo, poderá deferir medidas satisfativas de ofício, visando, sempre atingir o interesse coletivo tutelado pelo processo. Nota-se, assim, que a corrente publicista coloca os poderes jurisdicionais como elemento necessário e suficiente para garantir o devido processo legal. O juiz passa a ser visto muito além do que o responsável por um julgamento do feito: passa a ser um curador da lei e dos atos processuais.
É necessário dizer, contudo, que há doutrinadores que criticam tal postura, afirmando que tal movimento daria origem a posturas extremamente autoritárias por parte do Poder Judiciário, que passaria a ser, dessa forma, o responsável por dizer e estabelecer os limites da jurisdição. Os que defendem essa corrente, aduzem que tal atividade é de responsabilidade do Poder Legislativo, vez que se trata de um poder que possui membros eleitos e que agem segundo a lógica da macro justiça, ao contrário do Poder Judiciário que, em regra, analisa cada caso concreto e resolve a lide nos limites do que lhe foi mostrado. Haveria, por conclusão, uma grave lesão ao princípio da separação de poderes, cláusula pétrea positivada na Carta Maior, em seu artigo 60, §4º. Trata-se, como é cediço, do núcleo duro da constituição, que não pode ser modificado nem por emenda constitucional, dada a importância conferida pelo Poder Constituinte Originário ao seu conteúdo axiológico. Esse modelo de processo é denominado de garantista. (AROCA, Juan Montero. Proceso y Garan"a. El proceso como garan"a de libertad y de responsabilidad. Valencia: Tirant lo blanch. 2006, p. 24.)
Nota-se, todavia, a despeito do peso da argumentação dos defensores do processo garantista, que o Direito no Brasil parece ir à contramão desses pilares, vez que através das reformas processuais constantes no Código de Processo Civil, os poderes conferidos aos magistrados são cada vez maiores, através de, como já se disse, possibilidade de concessão de medidas protetivas de ofício e adoção de inúmeros conceitos chamados de cláusulas abertas, que permitem um juízo de discricionariedade maior por parte do magistrado no caso concreto. É, repita-se, o Poder Judiciário ocupando um papel de destaque na estrutura processual.
Essas medidas são fundamentais, na medida em que visam, através do processo, atingir dois importantes princípios processuais, quais sejam, a celeridade e a harmonia dos julgados. Percebe-se, assim, que há uma tendência no ordenamento brasileiro em ampliar os poderes dos órgãos jurisdicionais na condução do procedimento em contraditório, sendo a possibilidade de redução de conflitos individuais em massa um grande exemplo, ainda mais com a criação do instituto da repercussão geral no recurso extraordinário, súmula vinculante, demandas repetitivas e o tão polêmico artigo 285-A, do Código de Processo Civil, que permite o julgamento de improcedência prima facie.
3- Conclusão
Demandas semelhantes, com a mesma causa de pedir, podem ser extintas por falta de condição da ação por um magistrado e serem julgadas procedentes por outros. E, no contexto do presente trabalho, a jurisdição sendo colocada como limite do direito de ação, sendo aquela, para os publicistas, mais importante do que esta. Na análise sobre a possibilidade do casamento homossexual, por exemplo, o próprio STJ, em precedente, decidiu por sua possibilidade, mas, conforme avaliaram os próprios Ministros atuantes na causa, por não se tratar de decisão com efeito vinculante, os demais magistrados poderão decidir de forma diversa (http://jornaloexpresso.wordpress.com/2011/10/25/stj-firma-jurisprudencia-para-casamentos-homossexuais/). É certo, assim, que as lides que versam sobre direitos individuais são as responsáveis por assoberbar os órgãos do Poder Judiciário com processos, muitas vezes, idênticos. Assim, com julgamentos pulverizados e levados a análise de magistrados diversos, levam inevitavelmente, a decisões contrárias e que geram insatisfação e insegurança do jurisdicionado. Nesse contexto, vale dizer, que o direito brasileiro inovou ao criar a possibilidade de coletivizar as demandas individuais que apresentem a mesma origem e se mostrem semelhantes, como se pode notar através da Lei número 8078/90.
Por fim, conclui-se, então, que a visão publicista do processo confere, a meu ver, maior celeridade e segurança, ao contrário do que alegam os defensores da corrente privatista e garantista. Conferir a jurisdição o direito de ditar os limites da ação, ainda mais em se tratando de ações coletivas, é a forma mais eficiente de se alcançar decisões harmônicas e um julgamento justo.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Política. Trad.: Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2002.
AROCA, Juan Montero. Proceso y Garan"a. El proceso como garan"a de libertad y de responsabilidad. Valencia: Tirant lo blanch. 2006.
BURNIER Jr., João Penido. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Campinas: Copola, 2000.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 1. Salvador: Juspodvm, 2007.
GRECO, Leonardo. “Publicismo e privatismo no processo civil”. Revista de Processo. n. 164. out./2008.
HOBBES, Thomas. Leviatã. Trad.: Rosina D'Angina. São Paulo: Martin Claret, 2010.
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MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
Procuradora Federal, Graduada em Direito na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais- PUC-MG, e pós graduada em Direito Público pela Universidade de Brasília- UnB.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Mariana Savaget. A concepção publicista do processo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jul 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40251/a-concepcao-publicista-do-processo. Acesso em: 22 nov 2024.
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