O benefício assistencial, na forma do artigo 203, V, da Constituição da República, é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Inicialmente, deve-se mencionar que, para fins de recebimento do benefício assistencial, a Constituição da República não exigiu ao portador de deficiência uma idade mínima.
A Lei 8.742/93, visando regulamentar o benefício de que trata o artigo 203, V, CR/88, estabeleceu, em um primeiro momento, que deficiente seria a pessoa incapaz para o trabalho e para a vida independente.
Contudo, em relação ao menor de 16 anos, cujo trabalho, por força da própria Constituição da República (artigo 7º, XXXIII, da CR/88), é vedado, tal conceito de deficiência é insuficiente.
Isso porque, ao vedar expressamente o trabalho infantil aos menores de 16 (dezesseis) anos, a Constituição da República tornou-os presumidamente incapazes para o trabalho.
Nesse contexto é que se desenvolveram questionamentos acerca da aplicabilidade da norma prevista no art. 203, V da CR/88 aos menores deficientes cuja família esteja em situação de miserabilidade. Afinal de contas, à luz da CR/88, toda criança, com ou sem deficiência, não pode ser considerada totalmente capaz para a vida independente e nem para o trabalho.
Por outro lado, não se pode pensar que o legislador não previu tal benefício para as crianças pelo simples fato delas não poderem trabalhar. Ainda mais se considerarmos que a criança portadora de deficiência necessita de cuidados intensivos para um desenvolvimento sadio, os quais geralmente são dispensados por um ente do grupo familiar, que se furta de trabalhar, parcial ou totalmente, para poder, com isso, auxiliar essa criança portadora de necessidades especiais.
Por consequência, a abdicação ao trabalho remunerado por qualquer membro do núcleo familiar da criança deficiente poderá agravar as dificuldades financeiras da família carente, prejudicando ainda mais a qualidade de vida da criança que exige cuidados especiais.
Desta forma, conclui-se que o benefício assistencial também será devido às crianças portadoras de deficiência (se preenchido obrigatoriamente o requisito da miserabilidade), as quais exigem maior cuidado, gastos e dedicação por parte de sua família.
Ressalte-se, ainda, que o conceito de incapacidade trazido pela Lei 12.470/2011 deixou ainda mais evidente o direito das crianças portadoras de deficiência ao benefício assistencial.
Isso porque, com a edição da citada lei, pessoa com deficiência deixou de ser aquela incapacitada tão somente para o trabalho e passou a ser aquela que tem impedimentos, seja de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade.
Como visto, a Lei 12.470/2011 não restringe o conceito de deficiência à impossibilidade de exercício de atividade laborativa. Pessoa portadora de deficiência passa a ser aquela que tem impedimentos que obstruem sua participação plena e efetiva na sociedade, em todos os seus aspectos, incluindo, quando se tratar de maior de 16 (dezesseis) anos, o exercício de atividade profissional.
Assim, no caso de requerimento do BPC – Benefício de Prestação Continuada por crianças e adolescentes sem idade para o trabalho, ou seja, por menores de 16 (dezesseis) anos, deve-se comprovar que a deficiência implique na limitação ao desempenho de atividades ou restrição na participação social, compatíveis com a idade, ou mesmo impacto na economia do grupo familiar do menor.
Esse é o entendimento da Turma Nacional de Uniformização. Vejamos:
LOAS. CRIANÇA. SÚMULA 29 DA TNU. AMPLITUDE DO CONCEITO DE INCAPACIDADEPARA VIDA INDEPENDENTE. APLICAÇÃO DAS CONDICIONANTES CONSTANTES DO VOTOPROFERIDO NO PROCESSO Nº 2007.83.03.50.1412-5. QUESTÃO DE ORDEM Nº 20 DATNU. PRECEDENTES DA TNU. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTEPROVIDO.291. "Ao menor de dezesseis anos, ao qual o trabalho é proibido pela Constituição, salvo o que se veja na condição de aprendiz a partir dos quatorze anos, bastam a confirmação da sua deficiência, que implique limitação ao desempenho de atividades ou restrição na participação social, compatíveis com sua idade, ou impacto na economia do grupo familiar do menor, seja por exigir a dedicação de um dos membros do grupo para seus cuidados, prejudicando a capacidade daquele familiar de gerar renda, seja por terem que dispor de recursos maiores que os normais para sua idade, em razão de remédios ou tratamentos; confirmando- se ainda a miserabilidade de sua família, para que faça jus à percepção do benefício assistencial previsto no art. 203, inc. V, da Constituição e no art. 20 da Lei nº 8.742/93" (TNU,PEDILEF 200783035014125, Rel. Juiz Federal Manoel Rolim Campbell Penna, DOU11-3-2011).203VConstituição208.7422. "Acórdão recorrido, reformando a sentença, não concedeu Benefício Assistencial a menor, seja por entender que não há falar em incapacidade de menor de 16 (catorze) anos, em face de expressa vedação constitucional (art. 7º, XXXIII, da CF), seja pelo fato de laudo pericial atestar a sua capacidade para os atos do di a adia. 2. Esta Turma Nacional tem firme orientação, assentada na sua Súmula 29, no sentido de que a interpretação do art. 20, § 2º, da Lei 8.742/03 deve ser mais ampla,a partir da premissa que a capacidade para a vida independente engloba a impossibilidade de prover o seu sustento como a prática das atividades mais elementares da pessoa.7ºXXXIIICF3. Resta assente que este conceito de capacidade para a vida independente não está adstrito apenas às atividades do dia a dia,vez que não se exige que o (a) interessado (a) esteja em estado vegetativo para obter o Benefício Assistencial. Dele resulta uma exigência de se fazer uma análise mais ampla das suas condições pessoais, familiares, profissionais e culturais do meio em que vive para melhor avaliar a existência ou não dessa capacidade.4. Nessa análise ampliada é de se verificar se a deficiência de menor de 16 (dezesseis) anos poderá impactar de tal modo a sua vida e,bem como de sua família, a reduzir as suas possibilidades e oportunidades, nomeio em que vive. Precedentes nesta TNU: 2007.83.03.50.1412-5; 200580135061286e 200682025020500". (PEDILEF 200932007033423, Relator JUIZ FEDERAL PAULORICARDO ARENA FILHO, Data da Decisao 05/05/2011, Fonte/Data da Publicação DOU 30/08/2011). 3. Pedido de Uniformização conhecido e parcialmente provido, para determinar à Turma Recursal de origem para, com base na premissa jurídica firmada, fazer a devida adequação, proferindo nova decisão. Aplicação da Questão de Ordem nº 20 desta Turma Nacional. (BRASIL, 2012).
Frisa-se, por fim, que o Instituto Nacional do Seguro Social já vem adotando a linha de raciocínio acima exposta, como se observa desde a Orientação Interna INSS/DIRBEN n 61, de 16 de janeiro de 2002, cujo artigo 9 prevê que, em caso de benefício requerido para criança ou adolescente de até 16 (dezesseis) anos, de família que não tenha renda suficiente para prover à sua subsistência, a equipe médica deverá apenas verificar se a deficiência se encaixa nas definições legais já existentes, pois a incapacidade para o trabalho e para a vida independente, em face da tenra idade, já é presumida.
Referências
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PROCURADOR FEDERAL lotado na Procuradoria Federal em Minas Gerais, Especialista em Direito Público pela PUC/MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: XAVIER, Bruno Di Fini. O benefício assistencial da Lei 8.742/93 para as crianças portadoras de deficiência Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41590/o-beneficio-assistencial-da-lei-8-742-93-para-as-criancas-portadoras-de-deficiencia. Acesso em: 22 nov 2024.
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