RESUMO: O presente artigo tem por análise a amplitude das relações domésticas para a aplicação da Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha), observando a contextualização da mulher, no âmbito mundial e nacional, em períodos de grande relevância para a abordagem do assunto, como a Revolução Russa e a convocação da Assembleia Constituinte no governo de Getúlio Vargas. O machismo é o grande fator para a ocorrência de tais violências, e era perceptível em nosso ordenamento jurídico as lastimáveis situações das mulheres até a promulgação da Constituição de 1988. Para um entendimento mais conciso e claro sobre o tema, deve-se observar os conceitos de gênero e sexo, pois denotam a real situação das vítimas de violência doméstica e familiar. Conhecendo tais conceitos, além de outros citados nesse artigo, se compreende que o uso isolado da referida lei é insuficiente para o combate a esse problema histórico, social e cultural, pois tal uso deve ser em conjunto com políticas públicas voltadas, diretamente ou indiretamente, para a erradicação dessas violências contra a mulher.
Palavras-Chave: Violência Doméstica. Contextualização. Ordenamento Jurídico. Conceitos. Políticas Públicas.
1 –Contextualização Histórica da mulher
1.1 – No mundo
Desde os primórdios do planeta Terra até o período atual, a mulher é tratada em uma relação submissa ao homem e com um papel sempre doméstico e familiar. Entretanto não é isso o que demonstrou os estudos de arqueólogos, paleontólogos, historiadores, a respeito das mulheres pré-históricas depois da descoberta de dois fósseis, Lucy (fóssil AustralopItecusAfarensis descoberto em 1974 na Etiópia, com aproximadamente 3,5 milhões de anos)[1] e Luzia (fóssil descoberto nos anos 70 na região metropolitana de Belo Horizonte, com cerca de 11.400 a 16.400 anos)[2], de grande relevância para os estudos referentes ao papel do gênero na sociedade. Até estas descobertas, a função da mulher era limitada em decorrência de errôneas reproduções dominadas pelos valores patriarcais que abrangiam os estudos sobre a pré-história. Ela era tratada sempre com um valor matriarcal, cuidando do lar, educando, ou responsabilizando-se pela manutenção da família e da casa. Contudo, as pesquisas evidenciaram que havia um papel ativo delas no processamento da caça, no corte das carnes, no transporte de animais abatidos para fins alimentares, na realização de pinturas, na confecção de artesanato e arma, assim como também na coleta de folhagens, frutos e raízes de suma relevância para o sustento de todo o grupo no qual pertencia.
Ao longo de toda sua história, as mulheres têm lutado para conquistar seu espaço e todos os direitos e garantias inerentes à pessoa humana. São inúmeras situações em que elas demonstraram sua indignação com a posição imposta a elaspela sociedade e seus valores moralizantes, ou seja, valores que preferiam transbordar machismo em suas essênciase subjugá-las, do quê entender suas reivindicações. Várias revoluções transformaram as concepções acerca da mulher no decorrer da história,colocando-as, hoje, em posições de demasiada notoriedade em algumas sociedades. Uma dessas revoluções foi a Russa, no qual, juntamente com seus frutos, modelou todo o cenário político e os eventos que marcaram o século XX. Iniciando seus trabalhos acerca dessa revolução, Wendy Goldmandiz:
Ativistas e revolucionários de todo o mundo se basearam no legado da Revolução, inspirados pelos sonhos revolucionários. Gerações sucessivas, fascinadas pela Revolução, participaram das grandes lutas dos trabalhadores industriais e das rebeliões camponesas dos anos 1930, da resistência antifascista da Segunda Guerra Mundial, de movimentos anticolonialistas e anti-imperialistas, do grande Ascenso estudantil dos anos 1960 e 1970, e dos mais recentes protestos do novo milênio[3].
Culminando em 1917, a Revolução Russa foi um conjunto reiterado de momentos políticos na Rússia, que, depois da eliminação da autocracia e do Governo Provisório (Duma), teve o partido Bolchevique como controlador do poder soviético. A estratégia bolchevique de libertação da humanidade através de uma revolução operária incluía a luta contra a opressão às mulheres e a outros setores da sociedade[4]. A teoria da revolução utilizada pelos bolcheviques teve como imenso contribuinte Leon Trotski, no qual mencionava que:
A Revolução de Outubro inscreveu em sua bandeira a emancipação da mulher e produziu a legislação mais progressista na história sobre o matrimônio e a família. Isso não quer dizer, no entanto, que imediatamente a mulher soviética conquistou uma “vida feliz”. A verdadeira emancipação da mulher é inconcebível sem um aumento geral da economia e da cultura, sem a destruição da unidade econômica familiar pequeno-burguesa, sem a introdução da elaboração socializada dos alimentos e sem educação[5].
1.2 – No Brasil
A mulher brasileira tem conseguido um papel de destaque dentro das lutas sociais, buscandomelhoria para si própria e toda a sociedade. Desde o período colonial[6], já resultado de toda influência machista europeia, a mulher tinha como papel principal o autossacrifício, a total submissão sexual e material em relação aos homens. Mas não era só uma questão de gênero, e sim uma questão econômica também, pois a mulher burguesa opunha-se à promiscuidade e à lascívia da mulher subalterna. Desde seu nascimento a mulher já se submetia à inferioridade, sendo obrigada a sempre cuidar e zelar pelos afazeres domésticos para melhor agrado de seu pai ou marido. Quando chegava a idade para casar (fase estipulada pelo próprio pai), a mulher não tinha autonomia alguma para escolher seu marido, porque seu pai escolheria mediante a própria vontade dele. Era uma típica transação comercial, onde famílias casavam filhas e filhos a fim de criar ou modificar relações comerciais. E para isso a mulher não precisava ter notório conhecimento sobre nada, pois quanto mais desprovida de intelectualidade melhor era para o marido, que a manteria sempre em seu domínio.
A luta das mulheres continuou, e em 1933 elas tiveram uma grande vitória para toda sociedade feminina, o direito ao voto. A principal reivindicação dos(as) paulistas era a imediata convocação de uma Assembleia Constituinte. Em setenta dias de luta, as forças legalistas sufocaram a revolta. Mesmo derrotados no campo de batalha, os paulistas conseguiram realizar parte de seus objetivos, pois Getúlio Vargas convocou eleições para a Assembleia Constituinte. Ao convocar a Constituinte, Vargas promulgou uma lei eleitoral que estendeu o direito a voto às mulheres, sendo a primeira vez que acontecia no Brasil[7]. Entretanto, só em 1946 foi previsto constitucionalmente o voto sem distinção de sexo[8]. Com tudo o que já ocorreu em benefício às mulheres por meio de suas lutas, ainda sãoperceptíveis comportamentos masculinos de forma paternalista, preconceituosa e discriminatória com as mulheres.
2 – Ordenamento jurídico brasileiro em desfavor das lutas feministas
O Código Penal Filipino[9] (1732-1831), em sua vigência, tipificava o adultério como crime em que o sujeito ativo era somente a mulher, punindo-a com pena de morte. O Código Criminal do Império[10] (1830), art. 250, tipificava a conduta criminosa do adultério, e o sujeito ativo era exclusivamente as mulheres, punindo-as com pena de trabalhos forçosos de 1 a 3 anos. O Código Penal dos Estados Unidos do Brasil[11] (1890), em seu art. 279, tipificava que só a mulher casada era sujeito ativo do crime de adultério, e o co-réu adúltero só se enquadraria na conduta criminosa se fosse preso em flagrante ou se houvesse a apreensão de documentos amorosos subscrito por ele. O Código Civil de 1916[12], em seu art. 6º, inciso II, previa que a mulher casada era semi-incapaz, pois dependia de autorização do cônjuge para o exercício dos atos da vida civil. Só a solteira e maior de 21 anos era plenamente capaz.
3 – Ordenamento jurídico brasileiro a favor das lutas feministas
A Lei n. 4.126/1962[13], denominada Estatuto da Mulher Casada, colocou a mulher casa como plenamente capaz para seus atos civis, não mais precisando das autorizações do marido para, por exemplo, trabalhar. Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil[14], mudanças no cenário da sociedade foram inevitáveis. A nova Constituição transformou os conceitos acerca do princípio da igualdade e do princípio da dignidade da pessoa humana, assim como solidificou o papel da mulher como cidadã, reconhecendo ainda a família monoparental e a união estável. Destarte, também ocorreram várias outras transformações, como na Lei de Crimes Hediondos, no Código de Processo Penal, no Código Civil, na Criminalização do Assédio Sexual, na Notificação Compulsória de Violência contra a mulher e no Direito aos Alimentos da Gestante (alimentos gravídicos).
4 – Unidade doméstica e a convivência familiar decorrente da tutela ou curatela
A Lei Maria da Penha, sancionada em 07 de Agosto de 2006, foi uma importante conquista da luta feminina em prol dos direitos e garantias inerentes à pessoa humana, com base no amparo constitucional de que todos são iguais, obtendo homens e mulheres direitos e obrigações equiparados. Em seu artigo 1º, a lei diz:
Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar[15].
Em seus artigos 5º e 7º a lei define e identifica, respectivamente, a violência doméstica e suas formas, e para chegar a um conceito legal é necessário interpretá-los conjuntamente. Limitar-se somente ao artigo 5º é vazio e insuficiente, pois são vagas as expressões: “qualquer ação ou omissão baseada no gênero”; “âmbito de unidade doméstica”; “âmbito da família” e “relação íntima de afeto”. Por outro lado, também é ineficaz analisar somente o artigo 7º para definir o conceito legal de violência doméstica contra a mulher. Interpretando-os simultaneamente defini-se o conceito legal. Destarte, a violência doméstica é qualquer das ações elencadas no artigo 7º (violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) praticada contra a mulher em razão de natureza familiar ou afetiva[16]. O legislador foi incisivo em delimitar o campo de abrangência da unidade doméstica, compreendida no artigo 5º, inciso I, no qual diz: ”no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convivência permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas”.
Nesse contexto, é de suma relevância salientar que a conduta praticada na unidade doméstica contra uma vítima foi realizada em razão dessa unidade, como por exemplo, a empregada doméstica. A “diarista”, que não tem uma rotina semanal regular no âmbito doméstico, não é protegida pela lei em função de sua irregularidade no ambiente de trabalho. No caso de quem trabalha todos os dias e não mora no local de trabalho, deve-se observar se ela é considerada por todos e por ela própria membro da família. Já em relação às pessoas que trabalham, moram, convivem e são consideradas como membros no mesmo ambiente familiar, não há o que se discutir sobre a aplicabilidade da Lei Maria da Penha[17].
Outro aspecto peculiar da interpretação da violência doméstica é a unidade familiar decorrente da convivência da tutela ou curatela. De acordo com César Fiuza, tutela e curatela conceituam-se como:
A tutela consiste no encargo cometido a certa pessoa, a fim de que gerencie a vida pessoal e patrimonial de menor incapaz, sobre o qual não se exerça poder familiar. A curatela propriamente dita é o encargo conferido a alguém para gerenciar a vida e o patrimônio dos maiores incapazes[18].
Mesmo que não exista a relação de parentesco entre o tutor ou curador em relação à tutelada ou curatelada, pode-se observar um espaço de convivência entre eles. E se há uma convivência entre eles, embasada em uma verticalização de poder da relação, pode-se visualizar a aplicação da Lei Maria da Penha com fundamento na violência doméstica.
Nos casos em que a vítima de violência doméstica seja portadora de alguma deficiência, há uma circunstância agravante introduzida no artigo 120 do Código Penal Brasileiro pelo artigo 44 da Lei 11.340/2006, no qual a pena será aumentada de um terço. A mulher agredida no âmbito da unidade doméstica deve fazer parte dessa relação doméstica. Não seria lógico que qualquer mulher, bastando estar na casa de alguém, onde há relação doméstica entre terceiros, se agredida fosse, gerasse a aplicação da agravante introduzida pela Lei Maria da Penha[19].
5 – Aplicação de medidas protetivas da Lei Maria da Penha sem a necessidade de inquérito policial, processo penal ou civil em curso
A interpretação da violência doméstica contra a mulher tem ultrapassado barreiras no ordenamento jurídico brasileiro. Em 11 de fevereiro do corrente ano, o Superior Tribunal de Justiça negou provimento a um recurso especial interposto pela parte ré, mantendo os benefícios das medidas protetivas da Lei Maria da Penha. Uma senhora ajuizou uma “ação protetiva dos direitos da mulher, com pedido de aplicação da medida cautelar”, contra um de seus filhos. A lide começou em 2008, quando ela e seu falecido marido realizaram doações aos seus filhos. Após essas doações, um de seus filhos iniciou tratamentos violentos para com ela e seu marido, utilizando xingamentos, ofensas e ameaças. O juiz de primeira instância extinguiu o processo sem resolução do mérito, por não haver ação penal em curso. Contudo, o Tribunal de Justiça de Goiás reformou a sentença, aplicando as medidas protetivas por entender que têm caráter civil. A parte ré, utilizando seu direito de recurso, recorreu ao S.T.J. contra a decisão. Entretanto o S.T.J. negou provimento, acordando o seguinte:
1. As medidas protetivas previstas na Lei 11.340/2006, observados os requisitos específicos para a concessão de cada uma, podem ser pleiteadas de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher, independentemente da existência, presente ou parcial, de processo-crime ou ação principal contra o agressor.
2. Nessa hipótese, as medidas de urgência pleiteadas terão natureza de cautelar cível satisfativa, não se exigindo instrumentalidade a outro processo civil ou criminal, haja vista que não se busca necessariamente garantir a eficácia básica da tutela principal. “o fim das medidas protetivas é proteger direitos fundamentais, evitando a continuidade da violência e das situações que a favorecem. Não são, necessariamente, preparatórias de qualquer ação judicial. Não visam processos, mas pessoas”. (DIAS. Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012).
3. Recurso especial não provido[20].
Seguindo o voto do Relator a 4ª Turma foi unanime e mantiveram as medidas protetivas da Lei Maria da Penha à recorrida.
6 – Políticas Públicas como forma de erradicação da violência contra a mulher
Políticas públicas são conjuntos de programas, ações ou atividades desenvolvidas pelo Estado, diretamente ou indiretamente, com a participação de entes públicos ou privados, que visam assegurar determinados direitos de cidadania, de forma difusa ou para determinado seguimento social, cultual, étnico ou econômico. No âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, é relevante arguir que essas políticas devem abranger como base conceitual a questão do gênero, cuja noção afasta-se do conjunto dos marcos biológicos e se aproxima do conjunto de comportamentos e valores adquiridos durante o processo de socialização, modelados por certas expectativas e representações vigentes, segundo as quais, dadas qualidades, particularidades, comportamentos, necessidades e papéis são introjetados como “naturais”desejáveis às mulheres e outros aos homens[21]. Essas políticas têm o papel de desconstruir e reeducar certos paradigmas culturais estabelecidos pela sociedade, paradigmas estes que ultrapassam as barreiras econômicas, sociais e culturais, e acentuam a incidência da violência contra a mulher, como por exemplo: “a violência doméstica somente acontece com as famílias de baixa renda e pouca instrução”; “é fácil identificar o tipo de mulher que apanha”; “os agressores não sabem controlar suas emoções e são reféns de seus instintos”; “se a situação fosse realmente tão grave, as mulheres abandonariam imediatamente seus agressores”.
De acordo com a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR)[22], com base em dados realizados de janeiro a junho de 2014, 77% das mulheres em situação de violência doméstica sofrem agressões semanal ou diariamente. Foram realizados, nesse período, 265.351 atendimentos, no qual 11% desses registros eram sobre denúncias de violência (30.625 casos). Em 94% dos casos, o agressor era o parceiro, ex ou um familiar da vítima. Os dados mostraram que essas violências também atingiam os filhos, sendo eles espectadores ou vítimas das agressões (64,50% e 17,73%, respectivamente). Entre os tipos de violência informados pelo Ligue 180, os mais recorrentes foram a violência física (15.541 casos), a violência psicológica (9.849 casos), a violência moral (3.055 casos), a violência sexual (886 casos) e a violência patrimonial (634 casos). Esses dados mostram que, mesmo sendo um crime e uma grave violação aos direitos humanos, ainda continua reiterada a sua prática dentro do território nacional.
Há várias Políticas Públicas no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher implantadas na sociedade brasileira, como o “Programa Mulher: Viver sem fronteiras”, o “Plano Nacional de Políticas para as Mulheres 2013-2015”, a “Política Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres”, a “Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher”, o “Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres”, dentre outras. Há também outras políticas públicas que não atuam diretamente no âmbito da violência doméstica, mas também influenciam na sua erradicação, como o programa Bolsa Família. Em uma pesquisa de cinco anos, entre 2006 e 2011, a socióloga Walquiria Leão Rego e o filósofo italiano Alessandro Pinzani[23] realizaram entrevistas com os beneficiários do bolsa família e percorreram lugares como o Vale do Jequitinhonha (MG), o sertão alagoano, o interior do Maranhão, Piauí e Recife. A socióloga mostra que o machismo é muito forte no chamado Brasil profundo, no qual os padrões familiares são muito rígidos. Mostra também ser comum ouvir que a mulher saiu da escola porque o pai disse que ela não precisava aprender, e que o casamento acontece precocemente. Entretanto, com o advento do dinheiro, percebeu-se entre as mulheres um contentamento pela regularidade, estabilidade, pelo fato de poderem planejar melhor minimamente a vida. Em relação aos sistemas conjugais, a pesquisa mostrou que as mulheres se tornaram mais autônomas. Se antes nunca tiveram o poder do dinheiro em suas mãos, com o programa passaram a ser titulares do cartão. Entretanto ainda é uma situação muito complicada, pois o vínculo conjugal é difícil de romper no interior do Brasil. Lá as famílias são ampliadas com a sogra, mãe, cunhado, normalmente morando próximos uns aos outros, dificultando ainda mais o rompimento. Não obstante, a socióloga afirma que aconteceram casos de rompimento, de separações por diversos motivos, concretizando a independência que a renda fornecida trouxe para elas.
CONCLUSÃO
A lei de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, n. 11.340/06, criou mecanismos para coibir e prevenir a violência contra a mulher. Contudo, não se pode analisar a lei de forma isolada para a efetiva coibição e prevenção, tem-se que averiguar todo um contexto histórico e cultural da sociedade, tem-se que perceber que tal violência não é uma questão unicamente de sexo, mas de gênero também. E, principalmente, tem-se que efetivar a utilização de políticas públicas voltadas para a desconstrução e reeducação da sociedade em relação a tal violência. São essas políticas que darão a genuína concretização para a erradicação do problema analisado que assola a sociedade dentre épocas e épocas.
As diretrizes dessas políticas públicas devem estar voltadas para: a aceleração do movimento de sensibilização da opinião pública quanto à violência contra as mulheres, por campanhas publicitárias veiculadas pelos meios de comunicações mais acessíveis à grande massa. Isso representa uma maneira de demonstrar o compromisso e o comprometimento público do Estado como problema, além de fazer da mídia uma parceira atuante na mudança de mentalidade, na divulgação de informações e na consolidação de novos modelos de relação entre os gêneros; a perspectiva de políticas públicas de gênero, abrangendo como parte de seus pressupostos o combate aos tradicionais estereótipos do masculino e feminino ainda disseminados pelo sistema escolar, entre eles o sexismo, o racismo, a homofobia e outros; a programas centrados nas mulheres, enquanto seres autônomos e não considerados anexos à entidade “família”, com o intuito de estimular e garantir sua emancipação e recuperação da auto-estima; a identificação de traços que marcam a vida do homem e da mulher na vida familiar e no trabalho, levando em conta a alteração dessa dinâmica no momento de inserção da mulher no mercado de trabalho, assim como a alteração das divisões sexual e social do trabalho doméstico e fora de casa; a definição das características socioeconômicas e culturais que interferem na prática da violência contra as mulheres e nas relações violentas entre os próprios homens; o reconhecimento explícito da alta magnitude da violência de gênero, da violência como violação de direitos humanos e problema de saúde pública, evidenciando-se a necessidade urgente de elaboração e efetivação de políticas e de programas de intervenção; a ideia de atendimento psicológico às agredidas e extensivo aos agressores, reconhecendo a premência da instauração de novos valores, novas representações e novos investimentos subjetivos, a serem feitos tanto pelas mulheres quanto pelos homens, com vistas à superação do padrão violento introjetado; a identificação das várias resistências institucionais e de suas/seus agentes à incorporação dessas políticas na prioridade das agendas públicas; o lançamento de uma campanha de capacitação de lideranças femininas e de um programa de sensibilização da população para a questão da violência doméstica e de gênero, facilitando o acesso aos canais de atendimentos institucionais. Para realizar essa sensibilização, é fundamental reconhecer a violência contra as mulheres como um fato social abrangente, isto é, que diz respeito a todas as mulheres em todos os meios sociais e culturais, transpõe raças e faixas etárias, tem múltiplos autores,entre eles alguns cujas expressões podem ser dissimuladas em meros galanteios e assédios; e o aprendizado baseado em experiências dos movimentos feministas em outros países e continentes, como aquelas já sistematizadas e divulgadas na Europa, nos Estados Unidos e no Canadá.
REFERÊNCIAS
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[2]Luzia – Crânio de Mulher com mais de 11 mil anos. Jornal Diferente, 29 de setembro de 2011. Disponível em: <http://www.jornaldiferente.com.br/index.php/arte-e-cultura/1738-luzia-cranio-de-mulher-com-mais-de-11-mil-anos> Acesso em: 15 de set. de 2014.
[3] GOLDMAN, Wendy. Mulher, Estado e Revolução. p. 09. São Paulo: Boitempo Editorial; Iskra Edições, 2014.
[4] GOLDMAN, Wendy. Mulher, Estado e Revolução. p. 13. São Paulo: Boitempo Editorial; Iskra Edições, 2014.
[5] TROTSKI, Leon. “Twenty Years of Stalinista Degeneration”, em Fourth International, v. 6, n. 3, mar. 1945. PublicadooriginalmenteemThe Bulletion of the Russian Opposition, n. 66-7, maio-jun. 1938. Disponível em: <http://www.marxists.org/archive/trotsky/1938/xx/stalinism.htm> Acesso em: 16 de set. 2014.
[6] PORTELA, Wagner e Aguiar. A Mulher na Sociedade Brasileira. Vermelho, 14 de março de 2007. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/ap/noticia/14032-55> Acesso em: 15 de set. de 2014.
[7]DE A. ARRUDA, José Jobson. PILETTI, Nelson. Toda a História: História Geral e História do Brasil. Editora Ática. 12ª edição. São Paulo, 2004.
[8]BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946, art. 131. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao46.htm> Acesso em: 16 de set. 2014
[9] COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006.p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[10]COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006. p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[11]COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006. p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[12]COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006. p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[13] COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006. p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[14] COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Violência Doméstica e Família Contra a Mulher Lei 11.340/2006. p. 02. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj036248.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[15] BRASIL. Lei nº 11.340/2006. Lei Maria da Penha. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm> Acesso em: 16 de set. 2014.
[16] DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Editora Revista dos Tribunais. São Paulo, 2007. p. 40.
[17] DE JESUS, Damásio. SANTOS, Hermelino de Oliveira. A empregada doméstica e a Lei “Maria da Penha”. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/13261-13262-1-PB.pdf> Acesso em: 16 de set. 2014.
[18] FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 14ª edição, atualizada e ampliada. Ps. 1012 e 1016. Editora Del Rey. Belo Horizonte, 2010.
[19] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 864. Editora Forense. São Paulo, 2006.
[20] BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.419.421 – GO. Recurso Especial. Direito Processual Civil. Violência Doméstica Contra a Mulher. Medidas Protetivas da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Incidência no Âmbito Cível. Natureza Jurídica. Desnecessidade de Inquérito Policial, Processo Penal ouCivil em Curso. Recorrente: C. A. S. Recorrido: Y. S. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão, DF, 11 de Fevereiro de 2014. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=33935663&sReg=201303555820&sData=20140407&sTipo=5&formato=PDF> Acesso em: 16 de set. 2014.
[21] BANDEIRA, Lourdes. DE ALMEIDA, Tânia Mara C. DE MENEZES, Andrea Mesquita. Orgs. Violência Contra as Mulheres: a Experiência de Capacitação das DEAMs da Região Centro-Oeste. AGENDE, 2004. pg. 157
[22] Dados Nacionais Sobre Violência Contra as Mulheres. Compromisso e Atitude: Lei Maria da Penha. Disponível em: <http://www.compromissoeatitude.org.br/sobre/dados-nacionais-sobre-violencia-contra-a-mulher/> Acesso em: 26 de set. 2014.
[23] DE LUCENA, Eleonora. Bolsa Família Enfraquece o Coronelismo e Rompe com Cultura da Resignação. Folha de São Paulo, 11 de junho de 2013. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/06/1293113-bolsa-familia-enfraquece-o-coronelismo-e-rompe-cultura-da-resignacao-diz-sociologa.shtml> Acesso em: 26 de set. 2014.
Acadêmico de Direito no Centro Universitário do Distrito Federal - UDF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: XAVIER, Paulo Silva. Mulher não gosta de apanhar: Violência doméstica oriunda de um problema histórico, social e cultural Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 nov 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41657/mulher-nao-gosta-de-apanhar-violencia-domestica-oriunda-de-um-problema-historico-social-e-cultural. Acesso em: 22 nov 2024.
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