Dado que a oposição de interesses integra a própria essência do processo, tem-se por exigência a possibilidade de as partes se manifestarem sobre todos os atos em que se encontrem envolvidas. Tal imposição decorre da finalidade do processo, que consiste na emissão de um juízo de valor decorrente da ponderação entre os argumentos trazidos pelas partes e os anseios da justiça.
Pelo princípio do contraditório tem-se a proteção ao direito de defesa, de natureza constitucional, conforme consagrado no artigo 5º, inciso LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes”. Além de previsto na Constituição, tal princípio também pode ser extraído, enquanto garantia de citação e participação no processo, do postulado do pleno acesso ao Judiciário, insculpido no inciso XXXV do mesmo artigo 5º.
A ampla defesa, por sua vez, constitui garantia constitucional resultante da assertiva de que o processo é a institucionalização do jogo da argumentação, estando intrinsecamente relacionada ao princípio do contraditório. Assegura ao réu condições para que traga ao processo todos os elementos necessários ao esclarecimento da verdade, facultando-lhe ainda o direito de omitir-se ou calar-se. Alexandre de Moraes (2013, p. 110) afirma que “o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo”.
No ponto, é válido também destacar a Súmula Vinculante nº 14, editada pelo Supremo Tribunal Federal em favor da efetividade da ampla defesa, conforme redação a seguir transcrita:
É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
O atendimento do pedido do autor importa a interferência na esfera jurídica do réu, cuja liberdade sofre uma limitação. Esse fenômeno é denominado “bilateralidade da ação”, que, por sua vez, gera a “bilateralidade do processo”.
Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco (2014, p. 55) explicam que “o autor (demandante) instaura a relação processual, invocando a tutela jurisdicional, mas a relação processual só se completa e põe-se em condições de preparar o provimento judicial com o chamamento do réu a juízo”. Isso se dá por meio da citação, visto que o réu também possui, em face do ordenamento jurídico, uma pretensão, que assume posição antitética à do autor.
Com efeito, situado entre as partes, mas equidistante delas, o juiz tem o dever de imparcialidade, obrigando-se a ouvir ou, pelo menos, citar a parte que se encontra no polo demandado, para cada decisão a ser proferida. A soma da parcialidade das partes, num processo dialético, é que conduz o juiz à síntese; por tal razão, as partes assumem, em relação a ele, o papel de “colaboradores necessários”, pois, apesar de agirem conforme seus próprios interesses, a ação combinada delas é que auxilia na eliminação do conflito que as envolve (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, 2014, p. 55).
Assim, é imprescindível que se oportunize ao réu, no processo, o direito de defesa, que abrange a faculdade de se manifestar e ser ouvido. Proporcionada essa oportunidade, satisfeito está o princípio, ainda que permaneçam inativas as partes, pois oferecida está a possibilidade de um processo dialogado.
Para autores como Willis Santiago Guerra Filho (1997, p. 171), no entanto, tal entendimento não se coaduna com a visão mais moderna sobre o princípio do contraditório, que indica a necessidade de efetiva participação no processo, e não de mera faculdade concedida aos litigantes. De acordo com essa concepção, o princípio somente estaria atendido mediante a atuação concreta das partes.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 5 que representa posição no sentido de que o conteúdo da ampla defesa e do contraditório é formal, e não substancial (“A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”).
Quando o processo envolve privação de liberdade, todavia, a Corte Suprema entende que, mesmo coma defesa, poder-se-á anular o processo se evidenciado prejuízo ao réu. É o que preceitua a Súmula 523:
No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.
No entender de Domingos Sávio Dresch da Silveira (1997, pp. 62-63), “o contraditório foi elevado à condição de fundamento constitucional de todo e qualquer procedimento, judicial ou administrativo, sendo indevida qualquer restrição”. Segundo esse autor, o fim último do contraditório é assegurar o democrático jogo de inteligências, garantindo simetria (igualdade de armas), possibilidade de intervenção e controle do arbítrio judicial. O juiz não pode, assim, ser mero espectador do processo, mas sim agente condutor, devendo intervir para assegurar a participação de ambas as partes.
Discorrendo sobre os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, Roberto Rosas sintetiza a fórmula nos seguintes termos:
É uma garantia político-constitucional do indivíduo. É um meio técnico de que a lei se vale para a condução do processo e garantir os fins da justiça. As partes interessadas é que devem fornecer a matéria de fato válida, a definir a instrução. (1997, p. 48)
O fundamento lógico dos princípios do contraditório e da ampla defesa consiste, então, na ciência bilateral dos atos do processo, com a possibilidade de contrariá-los, e tem por fundamento constitucional a garantia do devido processo legal e do acesso à justiça. Somente com a ciência dos atos praticados pelo juiz e pelo adversário há condições de se efetivar o contraditório e a ampla defesa, evitando-se surpresas no decorrer do processo.
rEFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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