Para quem atua na prática do direito, mais precisamente nos processos judiciais, o requerimento, na Petição Inicial, de tutelas de urgência vem sendo praxe levada a cabo pelas partes, mesmo não estando presente os seus requisitos autorizadores previstos no Código de Processo Civil.
A antecipação do bem da vida requerido de forma célere ou o resguardo do direito para a eficácia da futura decisão de mérito é um meio que a parte possui para garantir o direito à duração razoável do processo e, principalmente, ao acesso eficaz da tutela jurisdicional. Porém, tal requerimento deve ser visto com cautela. Eis o dever de informação do advogado da parte.
Isso porque a concessão de uma tutela de urgência criará uma obrigação (de fazer, de não fazer, de dar, etc.) para a parte contrária, podendo causar-lhe prejuízos.
Convém lembrar que a tutela de urgência é deferida em cognição sumária e rarefeita, sujeita à temporariedade e precariedade. O bem da vida obtido liminarmente pela parte requerente poderá, em decisão futura, retornar ao status quo ante, assumindo a parte beneficiária todas as consequências da revogação do decisum.
Aplica-se, assim, a regra insculpida no art. 811 do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 811. Sem prejuízo do disposto no art. 16, o requerente do procedimento cautelar responde ao requerido pelo prejuízo que Ihe causar a execução da medida:
I - se a sentença no processo principal Ihe for desfavorável;
II - se, obtida liminarmente a medida no caso do art. 804 deste Código, não promover a citação do requerido dentro em 5 (cinco) dias;
III - se ocorrer a cessação da eficácia da medida, em qualquer dos casos previstos no art. 808, deste Código;
IV - se o juiz acolher, no procedimento cautelar, a alegação de decadência ou de prescrição do direito do autor (art. 810).
No campo da jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu a respeito:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL LOCALIZADO EM SHOPPING CENTER. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELOS DANOS CAUSADOS PELA EXECUÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. ARTS. 273, § 3º, ART. 475-O, INCISOS I E II, E ART. 811, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. INDAGAÇÃO ACERCA DA MÁ-FÉ DO AUTOR OU DA COMPLEXIDADE DA CAUSA. IRRELEVÂNCIA. RESPONSABILIDADE QUE INDEPENDE DE PEDIDO, AÇÃO AUTÔNOMA OU RECONVENÇÃO.
[...]
2.2. A obrigação de indenizar o dano causado ao adversário, pela execução de tutela antecipada posteriormente revogada, é consequência natural da improcedência do pedido, decorrência ex lege da sentença e da inexistência do direito anteriormente acautelado, responsabilidade que independe de reconhecimento judicial prévio, ou de pedido do lesado na própria ação ou em ação autônoma ou, ainda, de reconvenção, bastando a liquidação dos danos nos próprios autos, conforme comando legal previsto nos arts. 475-O, inciso II, c/c art. 273, § 3º, do CPC. Precedentes.
[...]
3. Recurso especial do Condomínio do Shopping Conjunto Nacional não provido e recurso de Mozariém Gomes do Nascimento provido. (REsp 1191262/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/09/2012, DJe 16/10/2012)
Na seara do Direito Previdenciário, uma questão que trata bem o tema é a concessão de aposentadoria através de tutela antecipada. Segundo a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que engloba a 1ª e a 2ª Turmas, caso a mencionada decisão interlocutória seja revogada pela sentença, o segurado deverá devolver o valor do benefício previdenciário. Daí se pergunta: e se o segurado já tiver despendido todos esses valores recebidos para a satisfação de suas necessidades?
Como esses valores vieram dos cofres públicos e, em razão disso, a decisão de antecipação de tutela trouxe prejuízos à Administração Pública, a consequência é a responsabilização do segurado pelos prejuízos, podendo a Fazenda Pública executar os bens do mesmo, excetuados aqueles absolutamente impenhoráveis.
Infelizmente, ao receber o benefício previdenciário em sede de tutela antecipada, o segurado não é informado, por seus representantes legais, de uma possível reforma da decisão, o que poderá levar à devolução dos valores recebidos. Isso poderá chegar ao conhecimento do interessado com surpresa, podendo uma eventual execução de danos levá-lo a um verdadeiro estado de insolvência, pois, como dito, o segurado não detinha informações acerca das consequências da reforma da medida liminar.
Noutro norte, como a revogação da medida liminar pode trazer consequências ao requerente, o seu advogado deve informá-lo a respeito, afinal, este é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa (Art. 32 da Lei nº 8.906/1994).
Demais disso, como se trata de uma verdadeira prestação de serviços, a informação processual e suas consequências é da própria natureza da atividade advocatícia, devendo o profissional responder por eventuais danos decorrentes da má prestação de seus serviços. Este, aliás, é o papel do profissional para fazer valer a sua indispensabilidade à administração da justiça (Art. 133, CF).
Voltando ao tema do Direito Processual Previdenciário, a grande maioria dos segurados é formada por pessoas humildes, carecedoras de conhecimentos obrigacionais e, logicamente, jurídico-processuais. Assim, exigir dessas pessoas o conhecimento de que uma eventual reforma da decisão liminar pode lhe trazer consequências reparatórias é, no mínimo, irrazoável. Sobre a responsabilidade do advogado, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO COM AGRAVO REGIMENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CONDUTA OMISSIVA E CULPOSA DO ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. DECISÃO MANTIDA.
1. Responsabilidade civil do advogado, diante de conduta omissiva e culposa, pela impetração de mandado de segurança fora do prazo e sem instrui-lo com os documentos necessários, frustrando a possibilidade da cliente, aprovada em concurso público, de ser nomeada ao cargo pretendido. Aplicação da teoria da "perda de uma chance".
2. Valor da indenização por danos morais decorrentes da perda de uma chance que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista os objetivos da reparação civil. Inviável o reexame em recurso especial.
3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento.
Ante o exposto, é razoável defende a existência de obrigação de o advogado informar ao seu cliente das consequências de qualquer ato processual, mormente aqueles que podem trazer prejuízos à parte contrária, a exemplo de execução provisória de sentença e, o que foi tratado no presente trabalho, da revogação de tutela de urgência. Aliás, pode-se realçar dita obrigação trazendo à tona a teoria da boa-fé contratual objetiva.
FONTES DE PESQUISA:
- www.stj.jus.br
- Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1884.
- Código de Processo Civil.
- Constituição Federal de 1988.
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