Antesdo advento da Lei n° 11.382/2006 os embargos à execução eram a única forma de oposição de defesa perante uma ação de execução, com a condição sinequa non da garantia do juízo.
Com o advento da Lei nº 11.382/06, ante as modificações ocorridas no processo executivo, em especial no art. 736 do CPC, foi permitido ao executado exercer o seu direito de defesa através dos embargos do devedor, independentemente de penhora, depósito ou caução.
Através da referida modificação, atendeu o legislador aos anseios dos processualistas e operadores do direito, pois se estendeu o direito de defesa ao executado, independentemente do seguro judicial dos valores discutidos. Vale dizer que a garantia do juízo não é mais condição para o conhecimento dos embargos.
Assim, pela atual sistemática, a penhora somente ocorrerá caso o devedor citado, não efetue o pagamento integral do débito no prazo de 03 (três) dias, nos termos do art. 652 do Estatuto Processual Civil:
Art. 652. O executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida.
§ 1º Não efetuado o pagamento, munido da segunda via do mandado, o oficial de justiça procederá de imediato à penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se o respectivo auto e de tais atos intimando, na mesma oportunidade, o executado.” (grifo do autor)
Diante da nova redação do artigo 736 do CPC, que permite ao executado opor os embargos "independentemente de penhora, depósito ou caução", podendo, nos embargos, alegar, além de outras, "qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento" (inciso V do artigo 745/CPC), surgiu a seguinte pergunta: O instituto da objeção de pré-executividade sobreviveu à nova sistemática inaugurada pela Lei n° 11.382/2006?
Surgiram na doutrina, opiniões divergentes acerca da utilidade e/ou viabilidade da objeção de pré-executividade.
Alguns doutrinadores alegam que a objeção de pré-executividade tenderia a desaparecer, argumentando para tanto, que ela não possui mais nenhuma utilidade prática, uma vez que para o ajuizamento dos embargos à execução não mais se faz necessário garantir o juízo.
Os adeptos de tal posição defendem suas teses na exposição de motivos n° 0120-MJ, do antigo Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos que sustentou o projeto do qual originou a Lei nº 11.382/2006, a qual dispõe que:
d) nas execuções por título extrajudicial a defesa do executado - que não mais dependerá da 'segurança do juízo', far-se-á através de embargos, de regra sem efeito suspensivo (a serem opostos nos quinze dias subseqüentes à citação), seguindo-se instrução probatória e sentença; com tal sistema, desaparecerá qualquer motivo para a interposição da assim chamada (mui impropriamente) ‘exceção de pré-executividade’, de criação pretoriana e que tantos embaraços e demoras atualmente causa ao andamento das execuções;[1]
No entender de Luiz Fux:
(...) veda-se ao executado a apresentação de peças informais nos autos da execução para provocação acerca desses temas, anteriormente enquadráveis na denominada exceção de pré-executividade. Interpretação diversa é notoriamente contra a mens legis. Destarte, muito embora a exposição de motivos apresente uma justificação para a dispensa da garantia do juízo, a realidade é que essa exoneração de segurança judicial atende ao postulado do acesso à justiça, não só em relação aos que pretendiam se opor ao crédito exeqüendo e não ostentavam condições para caucionar, como também para aquelas hipóteses em que a fragilidade do crédito exeqüendo tornava injusto que o devedor comprometesse o seu patrimônio para livrar-se de um crédito evidentemente ilegítimo”.[2]
Outros processualistas, a exemplo de Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina, também se posicionam no mesmo sentido, no qual ante a inovação da possibilidade dos embargos independentemente de penhora, se não a completa extinção da objeção de pré-executividade ao menos que o instituto ficou bastante reduzido.
No entanto, grande parte da doutrina é favorável à permanência da objeção de pré-executividade.
Para o ilustre doutrinador Araken de Assis, mesmo após as reformas do CPC, a objeção de pré-executividade continua sendo útil para o sistema processual civil brasileiro, veja o que leciona acerca do assunto:
Nada mudou com a Lei n. 11.382/2006. É verdade que desapareceu a necessidade da “garantia do juízo”. O art. 736, caput, reza que os embargos prescindem de “penhora, depósito ou caução”. E o prazo para embargar, que é de quinze dias, flui da juntada aos autos do mandado de citação (art. 738, caput). Sucede que a concessão de efeito suspensivo aos embargos, opeiudicis, explicitamente “não impedirá a efetivação dos atos de penhora e de avaliação de bens” (art. 739-A, § 6°). Ora, subsiste o interesse (e a necessidade) de o executado, se for o caso, impedir a realização da penhora, por força das relevantes circunstâncias anteriormente expostas. Salvo engano, outra vez o legislador acentuou o campo de atuação da exceção de pré-executividade, antes de restringi-lo ou eliminá-lo.
Convém insistir nesse ponto. A exceção de pré-executividade não pode ser encarada como expediente pernicioso ou maligno. Ao contrário, presta-se admiravelmente para impedir o prosseguimento de execuções inúteis, beneficiando o conjunto da atividade jurisdicional, ou evitar dano injusto ao executado. O mau uso do remédio logra a sanção prevista no art. 656, § 1°, parte final (“... bem como abster-se de qualquer atitude que dificulte ou embarace a realização da penhora...”), bem como a do art. 14, V e parágrafo único. Fora daí, alegar para o juiz que a pretensão a executar se encontra prescrita, ou que o exeqüente desatendeu o art. 618, I, olvidando a juntada do titulo executivo certo, liquido e exigível (art. 586), só pode ser considerada contribuição ao bom desempenho dos misteres judiciais.[3]
No mesmo sentido o professor Humberto Theodoro Junior:
Em conclusão, pode-se afirmar que:
a) Nem no procedimento incidental do cumprimento da sentença, nem na ação autônoma de execução, restou inviabilizado o recurso à execução (ou objeção) de pré-executividade (ou de não executividade)
b) Dentro dos pressupostos e requisitos da construção doutrinária e jurisprudencial anteriores à reforma da execução forçada, continua cabível a impugnação por simples petição a qualquer tempo, para impedir a penhora ou para fazer cessar a execução a que faltem pressupostos processuais ou condições da ação.[4]
Ainda na mesma linha são as lições de ElpídioDonizetti:
Há quem sustente que a nova sistemática dos embargos à execução, por não mais condicionar a oposição à segurança do juízo, teria eliminado a exceção de pré-executividade. Ocorre que os embargos, embora não exijam a garantia da penhora, pressupõe o atendimento de outros requisitos de ordem formal, aos quais não se pode sujeitar o devedor quando a execução não tiver a menor viabilidade. Por outro lado, não se opondo os embargos imediatamente depois da citação, proceder-se-á á penhora em bens do devedor.
Ora, para evitar tais inconvenientes, deve-se facultar ao executado a possibilidade de levar ao conhecimento do juiz, por meio de instrumento mais simplificado, a existência de vícios ou circunstâncias que, uma vez conhecidos, obstaculizarão inclusive a penhora. Isso, porque, antes mesmo de ouvir o exeqüente, poderá o juiz, diante da relevância das alegações do executado, conceder efeito suspensivo à exceção de pré-executividade. Afinal, a fundamentação dirá respeito a questões que o juiz poderia conhecer de ofício.[5]
Ainda na mesma linha são as lições de Arruda Alvim:
Indaga-se, neste passo, se haveria espaço, após o advento da Lei 11.382/06, em se falar de objeção/exceção de pré-executividade no caso de execução fundada em título extrajudicial. Isto porque, segundo a nova redação do art. 736, o oferecimento dos embargos prescinde de prévia garantia do juízo. Uma leitura mais açodada e assistemática das modificações poderia conduzir à resposta negativa.
Temos para nós, todavia, que o exame do § 1.º do 739-A autoriza a respostapositiva, pois referido dispositivo legal possibilita a concessão de efeito suspensivo aos embargos após prévia garantia do juízo e desde que estejam presentes a relevância dos fundamentos e o risco de grave dano de difícil ou incerta reparação.[6]
Segundo Alexandre Freitas Câmara:
Poderia, então, parecer que a partir do momento em que se modificou o modelo processual (por força da Lei n° 11.382/2006), e se passou a admitir o oferecimento dos embargos independentemente da garantia da execução, teria se tornado desnecessária a objeção de não-executividade. Assim, porém, não nos parece. Em primeiro lugar, é preciso recordar que na execução de sentença a prévia garantia do juízo ainda é exigida para oferecimento da impugnação. Além disso, é preciso recordar que tanto a impugnação à execução de sentença como os embargos do executado estão sujeitos ao requisito da tempestividade. Pode, então, acontecer de o executado perder o prazo para oferecimento daqueles meios defensivos e, apesar disso, pretender apresentar uma alegação de defesa referente a matéria de ordem pública, não sujeita a preclusão. Evidentemente, em casos assim, deve-se continuar a admitir a objeção de não executividade, que continua a ser extremamente útil para a inteireza do sistema.[7]
Destaca-se que para os adeptos desta corrente apontam que além de caracterizar mais uma opção de defesa ao injustamente executado, também configura um meio processual mais simples e menos oneroso que os embargos do devedor.
Diante do exposto, depreende-se que o instituto processual da objeção de pré-executividade ainda possui espaço no mundo processualista civil pátrio, mesmo após as alterações processuais.
Assim, a Leinº 11.382/2006 não colocou fim ao cabimento da objeção de pré-executividade como hipótese de defesa do executado nas execuções por título executivo extrajudicial, uma vez que encontra seu fundamento nos princípios norteadores expressos em nossa Carta Maior, tais como princípio do devido processo legal, princípio do contraditório, princípio da economia processual, celeridade da prestação jurisdicional, dentre outros.
Por meio da objeção de pré-executividade pode-se chegar rapidamente à extinção de execuções nulas, em benefício da economia processual, evitando diversas diligências e atos processuais realizados inutilmente, e dispensando, também, um processo mais complexo e demorado que é os embargos do devedor, a quem, apesar de estar sendo executado, não é, claramente, devedor.
Como todos os institutos do Direito deve ser utilizado com cautela, pois a sua utilização ampla deduzida de má-fé cria o risco de dissipação ou de ocultação de bens, na pendência de execução oferecida sem prévio depósito ou penhora, porém seu uso de forma correta conduz a celeridade e efetividade do processo, que são em última análise os objetivos almejados pelas reformas do CPC.
Diante do exposto, com a devida vênia aos que pensam diferente, observa-se que a objeção de pré-executividade continua a ser utilizada (utilidade/necessidade) no processo civil brasileiro.
REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVIM, Eduardo Arruda. A Recente Reforma do Código de Processo Civil operada pela Lei 11.382/06 e a Objeção se Pré- Executividade em matéria fiscal. Disponível em:http://www.panoptica.org/novfev2009/PANOPTICA_014_III_32_53.pdf. Acesso em: 01/08/2011.
ASSIS, Araken de. Manual da Execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
________________Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, Vol. II. 18ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2010.
DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 5. 2ª edição. Salvador:JusPodivm:, 2010.
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 11ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.
FUX, Luiz. O novo processo de execução (o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial). Rio de Janeiro: Forense, 2008.
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Vol. II. 46ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
________________________A reforma da execução do título extrajudicial. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; e MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à Nova Sistemática Processual Civil 3. São Paulo; Revista dos Tribunais, 2007.
[1] BRASIL. Exposição de motivos n. 120, de 26 de agosto de 2004.
[2] FUX, Luiz. O novo processo de execução (o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial). Rio de Janeiro: Forense, 2008. pág. 409.
[3]ASSIS, Araken de. Manual da Execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. págs. 1069/1070.
[4]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Vol. II. 46ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2011. pág. 409/410.
[5]DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 11ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. pág. 777.
[6]ALVIM, Eduardo Arruda. A RECENTE REFORMA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL OPERADA PELA LEI 11.382/06 E A OBJEÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVIDADE EM MATÉRIA FISCAL. Disponível em: http://www.panoptica.org/novfev2009/PANOPTICA_014_III_32_53.pdf. Acesso em: 01/08/2011.
[7] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, Vol. II. 18ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2010. pág. 416.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Katiane da Silva. A objeção de pré-executividade na execução de títulos extrajudicias Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 nov 2014, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41965/a-objecao-de-pre-executividade-na-execucao-de-titulos-extrajudicias. Acesso em: 22 nov 2024.
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