RESUMO: A atribuição de valor da causa de modo arbitrário a fim de estabelecer a competência dos Juizados Especiais Federais, além de um ataque aos princípios da boa-fé e lealdade processual, tem trazido inúmeras dificuldades no processamento dos feitos, que podem em último caso provocar a nulidade da sentença ante opossível reconhecimento da incompetência do juízo.
Palavras-chave: Juizados Especiais Federais; Valor da Causa;Incompetência Absoluta;Boa-fé Processual.
O valor da causa éque representa a pretensão econômica do autor e deve ser atribuído com base nas regras contidas no art. 258 e seguintes do CPC:
“Art. 258. A toda causa será atribuído um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediato.
Art. 259. O valor da causa constará sempre da petição inicial e será:
I - na ação de cobrança de dívida, a soma do principal, da pena e dos juros vencidos até a propositura da ação;
II - havendo cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles;
III - sendo alternativos os pedidos, o de maior valor;
IV - se houver também pedido subsidiário, o valor do pedido principal;
V - quando o litígio tiver por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação ou rescisão de negócio jurídico, o valor do contrato;
VI - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais, pedidas pelo autor;
VII - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, a estimativa oficial para lançamento do imposto.
Art. 260. Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, tomar-se-á em consideração o valor de umas e outras. O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado, ou por tempo superior a 1 (um) ano; se, por tempo inferior, será igual à soma das prestações.
Art. 261. O réu poderá impugnar, no prazo da contestação, o valor atribuído à causa pelo autor. A impugnação será autuada em apenso, ouvindo-se o autor no prazo de 5 (cinco) dias. Em seguida o juiz, sem suspender o processo, servindo-se, quando necessário, do auxílio de perito, determinará, no prazo de 10 (dez) dias, o valor da causa.
Parágrafo único. Não havendo impugnação, presume-se aceito o valor atribuído à causa na petição inicial.”
No entanto, é hábito entre os acionantes em Juizados Especiais Federais, em sua peça vestibular, apontar como valor da causa um montante completamente aleatório, sem demostrar como atingiram tal cifra, para, de forma conveniente, fixar da competência dos Juizados.
O Ente Público demandado por sua vez, raramenteimpugna o valor da causa, como dispõe o art. 261 do CPC. A impugnação é de difícil operacionalização, poispor vezes o pedido é genérico epor ser o procedimento de apuração por meio de calculistas demorado é incompatível com a celeridade do procedimento. Em casos como o do INSSé inviável calcular a suposta condenação devidoaos milhares de ações que são propostas diariamente contra a autarquia.
Ao interpretar o artigo Art. 1º da Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Especiais Federais, cumulado com o Parágrafo único do Art. 38 da9.099/95, conclui-se que é vedada nosJuizadosEspeciaisFederais a prolação de sentença ilíquida.Apesar da Lei, é comum juízos pelo Brasil prolatarem sentenças ilíquidas, pois os pedidos são genéricos, os cálculos dependem de informações ainda não constantes nos autos ou, simplesmente, não tem condições de liquidá-las com a mesma agilidade queas sentencia.
Assim, o procedimento do Juizado, que deveria ser descomplicado e rápido, passa a ter uma nova fase, a de liquidação.
O maior problema reside quandose apura, em verdade, que o valor da causa era superior ao arbitrado pela parte Autora, superando em muito a alçada de competência do JEF para processamento e julgamento do feito, de modo que para que fosse mantida a competência do JEF sentenciante, haveria, necessariamente, que se extirpar dos cálculos apresentados a quantia que ultrapassasse ao teto dos Juizados na época do ajuizamento (60 salários-mínimos).
No entanto, muitos entendem não existir “renúncia tácita” no rito do JEFs(Enunciado 16 - FONAJEF), em se constando que o valor apurado a título de atrasados supera, na data do ajuizamento da ação,a quantia de 60 (sessenta) salários-mínimos, não podendo deste modo o juiz de ofício limitar a condenação ao teto.
Recusando-se a parte autora a renunciar expressamente ao excedente, outra solução não há senão a anulação do julgado, com o reconhecimento da incompetência absoluta do Juizado para processamento e julgamento do feito, com consequente remessa dos autos a uma das Varas da Justiça Federal comum.
Entendimento diverso abriria brecha para que pessoas mal intencionadas, ou simplesmente descuidadas, proponham ações de valores elevados nos Juizados e se aproveitem do procedimento descomplicado e célere.
CONCLUSÃO
Deste modo, os que litigam em Juizados, tendo como norte a boa-fé e lealdade processual (art.14,II do CPC), devem atribuir valor da causa condizente com o benefício econômico que pretende alcançar,de forma a preservar os objetivos pelos quais os juizados foram criados e garantir que continuem a ser um meio eficiente e democrático de acesso a justiça.
A conduta de atribuir valores meramente estipulatórios traz prejuízos aos Entes Públicos, que não podem se defender da mesma forma que se defenderiam no procedimento ordinário, além de representar injustiça com aqueles outros jurisdicionados que de forma reta, cuidadosa e leal revelaram o real valor de suas causa.
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