SUMÁRIO: 1. OBJETIVO . 2. RESULTADO . 2.1. Introdução . 2.2. A vitimização . 2.3. Sobrevitimização ou a vítimização secundária no Processo Penal Brasileiro . 2.4. A redescoberta da vítima e sua ressocialização. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS. BIBLIOGRAFIA.
1 - OBJETIVO
O presente trabalho em como objetivo analisar a vitimização no Sistema Penal Brasileiro e as garantias mínimas para a humanização e ressocialização da vítima.
2 - RESULTADOS
2.1. Introdução
O presente trabalho tem como objetivo tratar da vitimização no Sistema Penal Brasileiro, pois é sabido que o referido sistema censura e exclui pessoas, em especial as vítimas de crimes contra a honra. Podemos dizer que, de certo modo, a maneira como a legislação vigente trata os indivíduos, qual seja, de maneira seletiva, faz com que reforce as desigualdades sociais já existentes. Vejamos, ao definir as partes envolvidas como "delinquente" e "vítima", a pena imposta pelo Estado perde sua legitimidade por não guardar relação com a pessoa efetivamente prejudicada no conflito – a vítima. A vítima sofre o mesmo processo de privação de identidade que o delinquente, hipótese em que não serão levadas em conta as suas reais necessidades.
Afirmamos então, que a vítima é tratada em um segundo plano, isso porque o sistema penal o permite, fortalecendo o descaso que a própria sociedade já vem tratando a questão. O fato é que não há um cuidado especial voltado à vítima, tendo essa recebido o papel de coadjuvante ao longo da persecução penal, quando na verdade deveria receber especial trato.
Nas palavras de Molina (MOLINA. 2000), "O abandono da vítima do delito é um fato incontestável que se manifesta em todos os âmbitos: no Direito Penal (material e processual), na Política Criminal, na Política Social, nas próprias ciências criminológicas. Desde o campo da Sociologia e da Psicologia social, diversos autores, têm denunciado esse abandono (...)”.
Conforme mencionado anteriormente, e confirmado pela doutrina citada, o Direito Processual Penal Brasileiro aponta para o descaso conferido à vítima do delito no desenrolar do procedimento criminal, voltado para a punição do delinquente. Após o cometimento do delito que gerou danos à vítima, as atenções se restringem à figura do infrator e suas garantias penais e, especial, para o Estado, que passa a figurar no polo passivo do conflito, já que há violação à lei, que traz o bem jurídico a ser protegido. Contudo, a vítima é esquecida, seus anseios e necessidades quase sempre não são levados em consideração. Desse modo, o presente estudo visa questionar esse papel secundário que foi ao longo do tempo conferido ao ofendido, com um olhar especial sobre as tentativas empreendidas na busca pela mudança desse sistema excludente, na busca por direitos específicos a serem garantidos às vítimas de delitos.
2.2. A vitimização
Para designar o indivíduo que foi prejudicado nos crimes contra a pessoa, a doutrina utiliza a terminologia – vítima, enquanto nos crimes contra a honra e contra os costumes, utiliza-se do termo - ofendido, e, por fim, nos crimes contra o patrimônio – lesado. Contudo, no Código Penal e de Processo Penal brasileiros, encontramos os termos vítima, ofendido e lesado várias vezes e até mesmo com tratativas indistintas (CARVALHO. 2008).
Ao tratarmos da vitimologia, afirmamos que vítima é o indivíduo que sofre danos, ou aquele que perde direitos fundamentais, por vezes devido a violação dos direitos humanos, noutras, por crimes mais comuns (OLIVEIRA. 1993). Podemos então afirmar que vítima é aquele indivíduo que sofre ou foi agredido de alguma forma por uma infração criminal praticada por um agente.
Sendo assim, podemos Neste contexto, podemos dizer que a vitimização primária é basicamente entendida como aquela provocada pelo cometimento do crime, pela conduta violadora dos direitos da vítima, podendo causar danos variados (materiais, físicos, psicológicos), de acordo com a natureza da infração, personalidade da vítima, relação com o agente violador, extensão do dano, dentre outros.
Acerca da vitimização secundária ou sobrevitimização, entende-se aquela causada pelas instancias formais de controle social, no decorrer do processo de registro e apuração do crime, a qual aprofundaremos mais adiante.
A vitimização terciária é tratada no âmbito dos controles sociais, mediante o contato da vítima com o grupo familiar ou em seu meio ambiente social (BARROS. 2008).
Não obstante os conceitos vitimológicos acima citados, encontramos ainda o conceito de autovitimização secundária fornecido pela Psicologia Jurídica, onde, a vítima se culpa do evento criminoso, passando a "recriminar-se pelo que aconteceu, procurando encontrar motivos para explicar o fato, supondo-se co-responsável pelo evento", o que lhe poderá causar sérios problemas de ordem psicológica (TRINDADE. 2007).
2.3. Sobrevitimização ou a vítimização secundária no Processo Penal Brasileiro
Praticado o delito, eis que inicia o drama da vítima. Além da dor física, patrimonial e/ou moral decorrentes do crime, a vítima é colocada em frente a um primeiro dilema: levar o fato criminoso ao conhecimento da polícia ou não? A segunda opção (deixar de fazer algo) contribui com o índice de delitos que não chegam ao conhecimento das autoridades competentes, o que ocorre por diversos fatores, seja por medo de vingança ou represálias, falta de confiança na atuação da polícia, falta de confiança no Sistema Penal Brasileiro, ou até mesmo a sensação de que a impunidade é a regra no Brasil.
A sensação de impunidade que a vítima tem diante do ocorrido, influencia o fenômeno da autovitimização secundária, citada no final do capítulo anterior, onde a vítima, abalada psicologicamente com o fato delituoso, passa a sentir-se responsável pelo crime (MOLINA. 2000).
Tais reações são mais comuns em crimes contra os costumes – especialmente estupro e atentado violento ao pudor – e em crimes como o sequestro, o roubo, a tentativa de homicídio, os crimes de violência doméstica e nos crimes que tem por vítimas crianças e adolescentes.
Passada esta etapa, onde a vítima vence seus próprios medos e suas angústias, decidindo-se por procurar a polícia (em regra) para comunicar o fato criminoso, inicia-se o momento que talvez seja de maior sofrimento para a vítima.
Inicialmente podemos dizer que ao procurar a polícia, a vítima, por vezes, é tratada como objeto de investigação e não sujeito de direitos. A grande demanda de questões policiais faz com que a polícia não dê a devida atenção às vítimas e se importe unicamente com o suspeito do crime. O caso apresentado, de suma importância para a vítima, é fato corriqueiro para os policiais que tratam as vítimas todas de maneira igual como se um crime fosse igual aos outros e por vezes com desconfiança e sem nenhum respeito.
O fato é que desde o momento em que se apresentam na delegacia, as vítimas deveriam receber um acompanhamento especializado, seja de psicólogos, seja de algum mesmo da Secretaria de Assistência Social do município. Ocorre que isso não acontece, o que até mesmo dificulta a persecução penal, já que com o psicológico abalado a vítima muitas das vezes não consegue narrar o ocorrido com detalhes imprescindíveis à apuração do delito. A falta de acompanhamento torna-se ainda mais prejudicial tanto à vitima, quanto à persecução penal, se o crime em questão for estupro e atentado violento ao pudor, devido ao constrangimento em que a vítima já fora exposta no ato do cometimento do crime e ao constrangimento a que ainda será exposta ao longo do procedimento de investigação criminal, já que neste também será violada a sua dignidade.
Na fase policial a vitimização aparece com maior intensidade por ocasião da realização de exame de corpo de delito nos crimes sexuais e nas declarações prestadas perante a autoridade policial. Enquanto isso, na fase judicial, parece ser a audiência de instrução o maior foco de vitimização, tanto antes, como durante e depois da oitiva da vítima pelo magistrado. Antes há o constrangimento de, como dito, por vezes aguardar no corredor com o acusado. Durante, devido ao fato de ser questionada por diversas vezes com perguntas sobre o fato, trazendo à memória da vítima toda a sua dor e sofrimento.
Considerando que o processo criminal, não garante a punição do acusado, que pode ser condenado ou absolvido do crime cometido. Salientamos que independente de o acusado ser punido pelo Estado ou não, para a vítima pouco faz diferença, já que a sua dignidade já foi ferida e somente a punição do indivíduo não vai repará-la.
Com o término do processo, a vítima volta ao seu status de mera “testemunha” dos fatos já que a Justiça se preocupa somente com a punição do acusado, mas não se volta integralmente à proteção da vítima, que será mero coadjuvante da persecução penal, podendo ficar desamparada, hipótese em que o Estado enquanto responsável pela proteção do indivíduo e garantidor da ordem pública se torna vitimizador, sujeito ativo da vitimização secundária.
2.4. A redescoberta da vítima e sua ressocialização
Devido à publicização do Direito Penal Brasileiro, o sujeito passivo do crime passou a ostentar papel secundário no cenário processual, tendo sido esquecido e transformado em mero informante. Diante dessa assertiva, podemos afirmar que a situação de desamparo às vítimas de delitos perdura pelo mundo, inclusive no Brasil.
Durante a fase de revalorização do sujeito passivo do crime, surgiram diversos movimentos sociais, no intuito de assegurar os direitos das vítimas de delitos. Diante da revalorização da vítima, eis que surgiram movimentos internacionais que buscam maior compreensão acerca da vitimologia, tendo inclusive preocupação com a questão do assistencialismo às vítimas e possível indenização afim de reparar a vítima, ainda que minimamente, já que no aspecto psicossocial essa reparação está distante de acontecer, ou até mesmo impossível.
O Brasil, a partir da Lei nº 9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais Criminais, apontada pela doutrina como o instrumento normativo que inaugurou o redescobrimento da vítima no sistema processual penal brasileiro, tornou prioritária a obrigação de reparar o dano como requisito para a composição penal, de fato, atribuiu relevante importância ao sujeito passivo do crime.
Nesta senda, surgiram outras leis influenciadas pelo movimento vitimológico internacional, sendo umas com a finalidade de promover uma maior satisfação às vítimas no que diz respeito à reparação dos danos causados pelo crime. Outras, com o claro propósito de evitar a vitimização secundária do ofendido nas instâncias formais de controle social.
No que diz respeito às leis que privilegiam a vítima, merecem análise a Lei nº 9.807/99, cujo objetivo principal é promover uma proteção especial às vítimas e testemunhas ameaçadas; bem como a Lei nº 11.690/2008, que alterou diversos dispositivos do Código de Processo Penal, acrescentando cinco parágrafos ao artigo 201 que trata da vítima de crime.
Nesse interim, faz-se necessário examinar os programas de amparo e assistência às vítimas de delitos e as sugestões legislativas no tocante à reparação do dano apresentas em outros países, mas sempre com os olhos voltados para a realidade brasileira, a fim de realçar aquelas que tenham reais condições de ser, entre nós, implementadas.
Pela nova legislação, a vítima será comunicada do ingresso e da saída do acusado da prisão, das datas de todas as audiências e da sentença e do acórdão (§2º do art. 201 do CPP). Portanto, a vítima passa a ter conhecimento oficial do que de fato ocorreu com aquele que lhe causou o dano criminal já que até então, a vítima, em regra, participava apenas da audiência para sua oitiva e raras vezes sabia o que acontecia com seu algoz. A lei trata dos meios pelos quais a vítima será comunicada dos atos processuais citados e reserva espaço na sala de audiência para a vítima (§§4º e 5º do art. 201). Temos ainda que conforme §5º do art. 201 do CPP, "se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado" (CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO).
Com vistas para a ressocialização e para a proteção dos direitos humanos embasados pelos direitos e garantias fundamentais inerentes à pessoa humana (art. 5º da CF/88), além de se utilizar dos profissionais ligados aos entes federados, o Poder Judiciário deve contar, em seus quadros, com profissionais da área da psicologia, do serviço social, da saúde etc., o mesmo valendo para o Ministério Público e a Defensoria Pública, pois assim o objetivo de minorar as consequências do delito para a vítima seriam alcançados com menos dificuldades.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após analisar o papel da vítima na fase processual, compreendo que o ofendido, quase sempre, é tratado como mera testemunha de fato criminoso, onde de certa forma é o “objeto” utilizado pelo Estado na perspectiva de lograr êxito durante a persecução penal. Noutras palavras, é vista como simples pretexto da investigação processual, sendo novamente vitimizada pelos órgãos encarregados da administração da justiça.
Devido ao fato de esses órgãos serem desprovidos de uma orientação vitimológica, não atentam para as expectativas do sujeito passivo do crime, tratando o problema das vítimas como um a mais em sua rotina diária.
Pude observar, que as recentes inovações na legislação brasileira demonstram que o Brasil, seguindo a moderna tendência internacional de revalorização das vítimas de delitos, começa a caminhar por rumos marcadamente humanistas, privilegiando a satisfação das vítimas em alguns de seus diplomas normativos. Entretanto, ainda que vagarosamente, o Brasil vem tentando criar programas e centros de atenção às vítimas de violência, onde são fornecidos acompanhamento de psicólogos, assistentes sociais, apoio jurídico. Contudo, ainda não é o bastante!
Fica a impressão de que o nosso país está amadurecendo e se preocupando verdadeiramente com a valorização da vítima e com mecanismos legais capazes de minorar a sobrevitimização acarretada pelo crime, hipótese em que as vítimas passam a ser tratadas como sujeitos de direitos e respeitadas pela sociedade, assim como pelos membros do sistema de Justiça.
BARROS, Flaviane de Magalhães. A Participação da Vítima no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
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_______. Lei 9.099, de 26 set. 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm. Acesso em 04.11.2013.
_______. Lei 9.807, de 13 jul. 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9807.htm. Acesso em 04.11.2013.
_______. Lei 11.690, de 9 de jun. de 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11690.htm. Acesso em 04.11.2013.
CARVALHO, Sandro Lobato de Carvalho. Vitimização e Processo Penal. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/11854/vitimizacao-e-processo-penal. Acesso em 04.11.2013.
GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, Antônio García-Pablos de. Criminologia. 3ª ed. Trad. Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
OLIVEIRA, Frederico Abrahão de. Vítimas e Criminosos, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1993.
TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para Operadores do Direito. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
Bacharel em Direito pela Faculdade Dinâmica do Vale do Piranga.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: QUIRINO, Arthur Henrique. A vitimização e sua tratativa à luz do processo penal brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 jan 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43100/a-vitimizacao-e-sua-tratativa-a-luz-do-processo-penal-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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