RESUMO: Considerando que as hipóteses de utilização do sistema de Monitoração Eletrônica no Brasil previstas pela Lei 12.258/2010 contrariam as justificativas da implantação do sistema, a proposta nuclear do presente trabalho reside na verificação da consequência jurídica dessa divergência sobre o aspecto da tríplice valoração normativa trazida pro Bobbio. Uma vez concluído que a nível estritamente jurídico não há consequências na divergência entre a justificativa e o conteúdo legislativo, foi feita a análise desse conteúdo sob a tríplice valoração. Concluiu-se que toda vez que a Monitoração Eletrônica for utilizada sem justificação proporcional da imposição de vigilância, ela violará o princípio da proporcionalidade e a dignidade da pessoa humana, devido ao excesso no controle penal da medida executada, sendo sua aplicação, no caso, respectivamente inválida e injusta. Por fim, no tocante à eficácia legislativa, foi observado que para que ME possua eficácia deve ser utilizada de forma a cooperar com a satisfação da missão garantista do Direito Penal.
PALAVRAS-CHAVE: Monitoração Eletrônica. Justificativas. Justiça. Validade. Eficácia.
ABSTRACT: Whereas the possibility of using Electronic Monitoring system in Brazil provided for by law 12,258/2010 contradict justifications of deployment of the system, the nuclear proposal of this work lies in verifying the legal consequence of this disagreement over the triple aspect of normative valuation brought pro Bobbio. Once completed the level strictly no legal consequences on the divergence between the background and the legislative content, that content analysis was made under the triple assessment. It was concluded that every time that the electronic monitoring is used without proportional justification of the imposition of surveillance, it will violate the principle of proportionality and the dignity of the human person, due to excess in the criminal control of measurement performed, and their application in the case invalid and unfair, respectively (unconstitutional). Finally, as regards the legislative effectiveness, it was observed that for ME has effectiveness must be used to cooperate with the satisfaction of the mission guarantist the author of criminal law.
KEY-WORDS: Electronic Monitoring. Justifications. Justice. Validity. Effectiveness
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. A divergência entre a justificativa normativa e o respectivo conteúdo legislativo: problema de validade, justiça ou eficácia? - 3. A racionalidade da Monitoração Eletrônica e sua conformidade com os fins constitucionais: um problema de justiça -3.1 A dignidade da pessoa humana e Monitoração Eletrônica4. A constitucionalidade das hipóteses de utilização da ME no Brasil: um problema de validade5. A monitoração eletrônica e o necessário abandono do paradigma prisional: um problema de eficácia- 6. Notas conclusivas - 7. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O Brasil adotou o formalmente sistema de ME em 2010, com a Lei 12.258/2010, com a justificativa de redução de custos, população carcerária e prevenção da reincidência. A lei previu a utilização da Monitoração Eletrônica em duas hipóteses: saída temporária em regime semiaberto e prisão domiciliar. Posteriormente, a Lei 12.403/2011inseriu mais uma hipótese, como medida cautelar substitutiva da prisão processual.
Das três hipóteses de Monitoração Eletrônica (ME) previstas no ordenamento jurídico brasileiro, em apenas uma, a inserida posteriormente pela Lei 12.403/2011, é substituta da prisão, sendo capaz, a priori, de gerar os efeitos de redução de custos e da população carcerária[1].
Assim, apesar de ser invocada com base nos discursos de redução de custos, de população carcerária e reincidência, a maiorias das hipóteses de previsão da utilização da ME no Brasil frustra estes discursos, eis que não previstas como alternativas à prisão.
Diante desta constatação, ou seja, que a ME não vem cumprir os propósitos pelos quais sua previsão no ordenamento foi invocada (justificativas ao PL), insta saber que efeito jurídico essa divergência gera.
A resposta à questão ora proposta será feita com base na doutrina de Noberto Bobbio, analisando a previsão normativa da ME sobre o tríplice critério de valoração normativa: validade, justiça e eficácia.
2 A DIVERGÊNCIA ENTRE A JUSTIFICATIVA NORMATIVA E O RESPECTIVO CONTEÚDO LEGISLATIVO: PROBLEMA DE VALIDADE, JUSTIÇA OU EFICÁCIA?
Uma vez entendendo que a Monitoração Eletrônica no Brasil não cumpre as finalidades para a qual foi proposta, resta saber se essa divergência gera algum efeito sobre a norma elaborada, seja no plano da validade, eficácia ou justiça.
O problema da validade é o problema da existência da regra. É um problema de fato, ou seja, de constatação se uma regra jurídica existe ou não. De acordo com Noberto Bobbio (2008, p. 26), em particular, para decidir se uma norma é válida é necessário realizar três operações.
A primeira consiste em verificar se a autoridade que a emanou tinha poder legítimo para tanto – questão de distribuição de competência prevista em texto constitucional (BOBBIO; 2008, p. 27). No presente caso, nota-se que este critério foi satisfeito, pois a legislação que trata da Monitoração Eletrônica, Lei 12.258/2010 e Lei 12.403/2011, é federal, seguindo as regras do inciso I do art. 22 da Constituição.
A segunda envolve a verificação de não abrogação da lei, ou seja, se não há outra norma posterior que a ab-rogou expressamente ou regulou inteiramente a matéria (BOBBIO; 2008, p. 27). Este também não é o caso da ME. As duas leis que tratam da matéria preveem hipóteses distintas de aplicação do sistema.
Já a terceira operação diz respeito à verificação da compatibilidade com outras normas do ordenamento, sobretudo normas hierarquicamente superiores ou normas sucessivas (BOBBIO; 2008, p. 27). No tocante a este aspecto, como não há normas sucessivas sobre o tema, restaria então a análise da conformidade constitucional da legislação de ME, ponto que será analisado adiante.
Desde já, é possível concluir que a análise da validade não considera a motivação da elaboração da norma jurídica. Ou seja, uma vez a norma inserida no ordenamento, a sua validade é observada em relação às demais normas nele previstas.
Assim, a divergência entre conteúdo jurídico e motivação normativa não gera implicações no tocante à validade normativa. “À ciência jurídica atribui-se um objeto: o estudo das regras de direito entendidas de tal maneira que constituem um domínio perfeitamente distinto e perfeitamente isolável de todos os fenômenos sociais” (MIAILLE; 2005, p. 59).
Assim, como o direito preocupa-se apenas com a coerência das normas jurídicas postas, só é relevante o seu conteúdo, desconsiderando, em uma análise puramente no plano da validade, os fundamentos que justificam a produção normativa.
Por sua vez, o problema da justiça diz respeito à correspondência ou não da norma aos valores últimos ou finais que inspiram determinado ordenamento. Tais valores dirigem toda a produção normativa. Questionar a justiça de uma norma envolve saber se ela está apta ou não a realizar os valores históricos que inspiram aquele regramento jurídico concreto e historicamente determinado. (BOBBIO; 2005, p. 26)
Tal análise envolve saber o contraste entre o mundo ideal e o mundo real, ou seja, norma justa é aquilo que deve ser, e norma injusta é aquilo que não deveria ser. O problema da justiça, para Bobbio, é um problema deontológico. Visa identificar os valores supremos pelos quais o direito se orienta, os fins sociais a que se busca. (BOBBIO; 2005, p. 31)
Nota-se que, neste aspecto, também não se levam em consideração os motivos que ensejaram a produção normativa, mas apenas a conformidade do conteúdo da norma com os valores eleitos por um determinado ordenamento, geralmente expostos na Constituição, através de processos históricos, para orientar toda a produção normativa. Assim, o conceito de justiça oferecido por Bobbio pode, em certos aspectos, se confundir com uma análise de constitucionalidade da norma.
Por fim, a questão da eficácia normativa perpassa pelo conhecimento se a “norma é ou não seguida pelas pessoas as quais se destina, e caso seja violada, seja feita valer com meios coercitivos pela autoridade que a estabeleceu” (BOBBIO; 2005, p. 27). O que se observa mais uma vez é que a motivação legislativa é, a priori, também desconsiderada neste aspecto de valoração normativa.
Logo, de todo exposto, conclui-se que a divergência entre finalidade e conteúdo normativo não tem relevância no plano jurídico da norma em questão. Isto se deve a mudança de apreensão dos sentidos normativos ao longo de sua produção, face aos discursos apresentados nos diferentes momentos de produção normativa[2]. A mesma norma passa por três atribuições de significado: o que motiva a produção normativa, o de seu conteúdo jurídico e ainda o da sua aplicação judicial.
Em um primeiro momento, fixa-se um sentido focado nos argumentos que motivam a produção legislativa. Nos discursos que iniciam a elaboração da norma, ela possui uma ratio ab initio, cuja função é motivar o interesse do tratamento da questão a nível político. A partir de então se iniciam as escolhas legislativas dentro de um universo de possibilidades jurídicas. Para NiklasLuhman (1983, p.08):
O direito não se origina da pena do legislador. A decisão do legislador (e o mesmo é válido, como hoje se reconhece, para a decisão do juiz) se confronta com uma multiplicidade de projeções normativas já existentes, entre as quais ele opta com um grau maior ou menor de liberdade. Se não fosse assim, ela não seria uma decisão jurídica. Sua função, não reside na criação do direito, mas na seleção e na dignificação simbólica de normas enquanto direito vinculativo.
Neste processo de elaboração da lei, vai se abandonando progressivamente o discurso meramente político para que o tema passe a ganhar contornos jurídicos. Neste processo de judicialização do discurso, um novo significado é dado àquele fenômeno de normatização. No momento de sua aplicação, novos sentidos são apreendidos da norma, através da atividade hermenêutica. Assim, “quando as expectativas juridicamente normatizadas são contrariadas, o juiz deve resguardar a expectativa e não adaptá-la aos fatos. Para o legislador, no entanto, as normas e os fatos se apresentam em uma outra ótica e em um outro contexto”. (LUHMAN; 1983, p. 38)
Assim, observa-se que uma vez elaborada a norma, ela se desvincula do seu processo legislativo e as questões de validade, justiça e eficácia passam a ser analisadas em relação apenas a seu conteúdo jurídico.
Pelo até então exposto, poder-se-ia concluir que a motivação normativa não tem nenhuma relevância no fenômeno normativo. Contudo tal conclusão mostra-se precipitada na medida em que toda norma possui uma funcionalidade social no ordenamento, e a análise dessa funcionalidade perpassa pelo conhecimento dos motivos que ensejaram a sua produção normativa. Nikklas Luhnman (1985, p. 121) discorrendo sobre a necessidade de compreensão do direito além dos seus critérios jurídicos entende que
A sociedade não pode ser reconstruída apenas a partir de sua constituição jurídica. O direito é apenas um momento estrutural entre outros.Por isso uma compreensão adequada do caráter social do direito não pode será alcançada apenas pela exegese e pela interpretação, e também não se esgota na busca de usa imposição. Masque isso, a sociologia do direito deve começar indagando quanto á compatibilidade estrutural do direito.
A compatibilidade estrutural do direito com a sociedade que ele regula perpassa pela verificação do propósito da norma na gerência da vida em sociedade. Se a justificativa da inserção de uma lei no ordenamento jurídico fosse irrelevante, culminaria na possibilidade de produção aleatória de normas, que geraria incoerência e a consequente disfuncionalidade regulatória do direito. Logo, o conteúdo normativo não pode ser avaliado unicamente sob o seu prisma jurídico. Para Jürgen Habermas (1997, p. 54)
Nos imperativos funcionais de sociedades extremamente complexas, entra em jogo uma facticidade social que não mantém mais uma relação interna com a pretendida legitimidade da ordem jurídica. A autocompreensão normativa pode ser desmentida através de fatos sociais que intervêm no sistema jurídico a partir de fora.
Assim, se uma norma não pode ser avaliada sob o aspecto de sua funcionalidade apenas por razões jurídicas, propõe-se, por ora, uma nova valoração normativa, considerando o conteúdo legal e sua justificativa política.
3. A RACIONALIDADE DA MONITORAÇÃO ELETRÔNICA E SUA CONFORMIDADE COM OS FINS CONSTITUCIONAIS: UM PROBLEMA DE JUSTIÇA
Segundo a linha de pensamento exposta por Bobbio, a questão de saber se uma norma é justa no plano jurídico perpassa pela análise de sua coerência com os fins supremos do ordenamento. Considerando que a Constituição é a norma suprema, que por excelência fundamenta todo o ordenamento jurídico, saber se uma norma é justa ou não, reclama saber, sob este enfoque, se ela se encontra condizente com os fundamentos e finalidades constitucionais. A investigação aqui feita caminha no sentido positivo, qual seja, analisar se a implantação da ME no Brasil está coerente com os valores que fundamentam o Estado, que não deixa de ser uma análise de constitucionalidade.
Assim, a análise da justiça de uma norma proposta por Bobbio é o primeiro juízo que se faz de valoração jurídica. Desse modo, no próprio processo de elaboração, o Projeto de Lei passa por uma Comissão de Constituição e Justiça, que avalia justamente se ela está em conformidade com os fins constitucionais[3].
Partindo da operacionalização dada por Bobbio, o primeiro passo a se fazer é identificar quais valores um ordenamento jurídico considera como supremos.
O artigo 1º da CF de 1988 dispõe que a República Federativa do Brasil,formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; o pluralismo político. Destes fundamentos, o mais complexo e que demanda uma maior exegese para verificação é, sem dúvidas, a dignidade da pessoa humana. Para avaliar a conformidade de uma norma, sobretudo penal, com a dignidade da pessoa humana, é necessário primeiro delimitar o conteúdo desse princípio e posteriormente verificar se a utilização da ME está em conformidade com esse.
3.1 A dignidade da pessoa humana[4] e Monitoração Eletrônica
A discussão jurídica em torno da dignidade humana remonta as ideias difundidas no movimento filosófico do Renascimento do séc. XVI e, sobretudo, do Iluminismo do séc. XVIII, quando a dignidade foi paulatinamente afastada de seu conteúdo divino e passou a assumir caráter ontológico do homem. O humanismo e o individualismo difundidos no séc. XVIII embasaram a noção de que a razão humana seria o fundamento de sua dignidade. (MELLO; 2010, p. 30)
Nesse sentido, ganhou espaço o imperativo categórico de Kant, segundo o qual o homem é um fim em si mesmo e o respeito à dignidade humana de cada pessoa proíbe o Estado de dispor de qualquer indivíduo apenas como meio para outro fim, mesmo se for para salvar a vida de muitas outras pessoas (HABERMAS; 2012, p. 09)
A partir do pensamento kantiano, a dignidade passa a ser reconhecida e relacionada com o Direito, que servirá para a construção de teorias de direitos fundamentais inerentes a todo e qualquer ser humano (MELLO; 2012, p. 38).
Entretanto, é curioso notar que o conceito de dignidade humana como conceito jurídico não aparece nem nas declarações clássicas dos direitos humanos do séc XVIII, nem nas codificações do séc. XIX. O discurso dos direitos humanos surgiu mais cedo do que o da dignidade humana. Embora o conteúdo de um esteja ligado ao outro, a invocação explícita da dignidade só apareceu após a Segunda Guerra, em vista dos massacres nazistas. Mas ainda que implicitamente, a dignidade humana sempre foi fonte moral do conteúdo dos direitos fundamentais[5] (HABERMANS; 2012, p. 10-12)
Desse modo, observa-se que a dignidade concretiza-se no reconhecimento de direitos fundamentais, sem os quais a condição humana fica desconfigurada. Esta constatação leva a outra discussão acerca de quais seriam os direitos fundamentais do homem. Em que pese ser esta uma tarefa de reconhecimento normativo no âmbito de cada estado baseado em sua configuração política, a discussão da dignidade a nível supranacional conduz à existência de dois elementos indispensáveis nessa normatização: igualdade e liberdade (MELLO; 2012, p. 45-51).
Chegando à definição de um conteúdo mínimo de dignidade, focado na igualdade e liberdade, então uma norma penal punitiva que limita a liberdade (viola a dignidade humana em uma de suas dimensões) deve estar, por conseguinte, limitada pela noção de igualdade.
Essa relação de igualdade e liberdade como conteúdo mínimo da dignidade pode ser compreendida na ideia de John Rawls, que parte da noção de justiça como equidade, trazendo um paralelo dessa noção com a de dignidade acima exposta. Para Rawls
Cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem o bem-estar fundada na justiça que nem o bem-estar de toda sociedade de pode desconsiderar. Por isso, a justiça nega que a perda da liberdade de alguns se justifique por um bem maior desfrutado por outros. Não permite que os sacrifícios impostos sejam contrabalançados pelo número maior de vantagens de que desfrutam muitos. Por conseguinte, na sociedade justa as liberdades da cidadania igual são consideradas irrevogáveis; os direitos garantidos pela justiça não estão sujeitos a negociações políticas nem ao cálculo de interesses sociais (RAWLS; 2002, p. 04)
Chegada a discussão a este ponto, cumpre investigar como a igualdade limitaria essa norma positiva. Como definir um conteúdo jurídico de igualdade demandaria um outro trabalho científico apenas para esta investigação, então, para o presente estudo se fixará como significado de igualdade o valor que fundamenta o reconhecimento de direitos fundamentais na medida em que os indivíduos necessitam deles para se igualarem, face a uma desigualdade de fato. No entender de Luigi Ferrajoli (2004; p. 91),“[...] el valor de la igualdad resulta confirmado y reafirmado [...] em virtud del análisis de la diferencia y de las implicaciones que de ella deben extraerse para uma igual y efectiva valorización de las diversas identidades”.
Então, a partir desse raciocínio, e vislumbrando-se duas racionalidades da Monitoração Eletrônica, aumento do controle penal na esfera de liberdade individual (na prisão domiciliar e saída temporária em regime semiaberto[6]), e desencarceramento (medida cautelar substituta), conclui-se que, apenas neste último sentido, a ME funciona como instrumento de preservação da dignidade da pessoa humana.
A previsão da Monitoração como medida cautelar substitutiva da prisão preventiva, cerceia a liberdade individual em apenas alguns aspectos, permitindo que a pessoa, mesmo com a restrição de locomoção, continue a conviver com seus familiares e tenha acesso ao contato com as demais pessoas de seu círculo social. Diferente da prisão, que isola o indivíduo do convívio em sociedade, e neste caso, fundamentada apenas em um juízo de verossimilhança, já que ainda não há condenação.
Assim, pensando na ME como substituta cautelar, é possível vislumbrar que o cerceamento da liberdade neste caso foi limitado por aspectos de igualdade, na medida em que se é a condenação penal que justifica a imposição da pena, por excelência, o cárcere, uma vez que não há condenação, não se poderia impor tal medida, sob pena de tratar os desiguais (condenados e processados) de forma igual. Contudo, as situações excepcionais previstas no art. 312 do CPP podendo ter sua finalidade alcançada por medida menos gravosa, no caso a ME[7], insere uma diferença de tratamento daqueles que se encontram em situação de desigualdade, reafirmando, portanto, o princípio da igualdade.
No que se refere à racionalidade do aumento do controle penal na esfera de liberdade individual, a conclusão é diferente. Retomando a linha de racioncínio em que uma norma punitiva deve ser limitada por noção de igualdade, não é possível impor uma limitação da esfera de liberdade individual sem que esta situação de desigualdade jurídica não seja justificada por uma razão de desigualdade fática, sob pena de se instrumentalizar o indivíduo alvo da medida, retirando-lhe o reconhecimento de sua dignidade humana, fato inaceitável em um Estado democrático garantista.
Assim, o aumento do controle penal não justificado é insustentável em um ordenamento garantista, não se podendo sequer invocá-lo com o argumento de beneficiar mais pessoas em sacrifício de outras. Logo, pode-se concluir que, no caso da Monitoração Eletrônica prevista pela Lei 12.258/2010 (prisão domiciliar e saída temporária em regime semiaberto), a imposição da vigilância antes não prevista e sem justificativa contraria a noção de igualdade e, por conseguinte, de dignidade da pessoa humana, tornando-se, no entender da teoria de Bobbio, uma norma injusta. Buscar a justiça deve ser uma finalidade de todo ordenamento político, sempre se permitindo repensar os usos dos institutos de modo a promovê-la.
No entender de Amartya Sem (2011; p. 99):
A busca da justiça é em parte uma questão de formação gradual de padrões comportamentais – não há nenhum salto imediato na aceitação de alguns princípios de justiça e um redesenho total do comportamento real de todos os membros de uma sociedade em consonância com essa concepção política da justiça. Em geral, as instituições têm que ser escolhidas não apenas em consonância com a natureza da sociedade em questão, mas também em conformidade com os padrões reais de comportamento que se pode esperar, mesmo que numa concepção política de justiça seja aceita por todos, e até mesmo depois dela ser aceita.
Assim, por exposto, é possível concluir, que toda vez que a ME for utilizada como limitação da esfera de liberdade, sem que esta se justifique por critérios de igualdade, ela afrontará a dignidade da pessoa humana, estando em desconformidade com os fins constitucionais, sendo, pelo aqui exposto, considerada injusta, como é o caso da saída temporária em regime semiaberto e da prisão domiciliar.
4. A CONSTITUCIONALIDADE DAS HIPÓTESES DE UTILIZAÇÃO DA ME NO BRASIL: UM PROBLEMA DE VALIDADE
Antes de analisar a constitucionalidade das hipóteses de utilização da Monitoração Eletrônica no Brasil, é importante esclarecer que a análise aqui feita não pretende verificar se a prática como um todo é ou não Constitucional. Conforme exposto no art. 2º do Decreto 7.627 de 2011, que regulamenta a Lei 12.258/2010, a Monitoração Eletrônica é a vigilância telemática posicional à distância de pessoas presas sob medida cautelar ou condenadas por sentença transitada em julgado, executada por meios técnicos que permitam indicar a sua localização.
Logo, não é possível analisar a constitucionalidade da ME enquanto a prática de vigilância não for adotada no ordenamento. Assim, far-se-á a verificação da constitucionalidade da ME enquanto utilizada como meio de implementação da prisão domiciliar, medida cautelar substituta da prisão processual e medida de fiscalização em saída temporária de regime semiaberto, hipóteses normativas previstas no Brasil.
Toda norma nasce, a priori, constitucional. Para afastar essa constitucionalidade, é necessário apontar algum dispositivo constitucional que a norma violaria.
A Monitoração Eletrônica parte da lógica de controle comportamental pela vigilância e necessariamente implica na invasão estatal da esfera não só de liberdade, mas também de intimidade do indivíduo monitorado. Logo, a princípio, poder-se-ia invocar a violação ao direito à intimidade e à liberdade como parâmetro na avaliação da constitucionalidade da norma. Ocorre que, nenhum direito é absoluto, incluindo entre eles os fundamentais. Se o Estado não pudesse limitar esses direitos e até mesmo em alguns casos suspendê-los, seria inviável qualquer espécie de sanção penal e não simplesmente a ME. Assim, a simples alegação de violação ao direito à intimidade e à liberdade não é suficiente para sustentar a inconstitucionalidade da norma.
Quando se fala em direitos fundamentais, o que se deve levar em consideração é o fundamento em que se ampara a restrição ou mesmo a suspensão desse direito fundamental e sua proporcionalidade com a medida. Logo, desde já se verifica que o parâmetro de constitucionalidade neste caso será o princípio da proporcionalidade.
A proteção da liberdade e consequentemente dos demais direitos fundamentais, o princípio da proporcionalidade fornece critérios de limitações estatais à liberdade individual (BONAVIDES; 2007, p. 395)
A utilização da monitoração envolve, em regra, três tipos de práticas:ou ela é uma medida alternativa à prisão (podendo funcionar como alternativa ou coadjuvante), ou é meio de implementação de medida penal já prevista ou é mecanismo de aumento do controle penal sobre a esfera de liberdade individual.
No caso de ME como medida coadjuvante ao sistema prisional, sua função é de reforço de uma expansão anterior do direito penal sobre áreas que não possuía legitimidade para atuar[8], na tentativa de restabelecer a proporcionalidade entre gravidade de sanção e gravidade de lesão.
Quando a monitoração é utilizada como substituta da prisão, como é o caso da medida cautelar substitutiva à prisão preventiva, um controle é substituído por outro, no caso, o cárcere pela monitoração. Assim, a esfera de liberdade e de intimidade individual invadidas com a medida não implicaria, a priori, em aumento do controle penal, mas em mera substituição desse controle, adicionando, sob o aspecto individual do monitorado, vantagens como a preservação da integridade física e psíquica do apenado, afastando-o do ambiente prisional[9].
No tocante ao aumento do controle penal sobre a esfera de liberdade individual, a ME significa o aumento do rigor pena, através da imposição de vigilância antes não prevista e sem vinculação direta com a execução da medida, como é o caso da saída temporária em regime semiaberto. O que se vislumbra nessas hipóteses, como já dito, é o aumento do controle penal na esfera de liberdade individual.
Na hipótese da prisão domiciliar, como os casos previstos no Brasil referem-se a situações excepcionais do art. 318 do CPP e esta ocorre sem a fiscalização estatal, a imposição de vigilância através da Monitoração, nestes casos, também implica em um aumento do controle penal sobre a esfera de liberdade individual.
Desde logo, vislumbra-se que a previsão normativa da ME como substitutiva da prisão cautelar não viola o princípio da proporcionalidade. A vigilância eletrônica ora imposta substitui outra espécie de vigilância inerente à execução da medida, não há o que se falar em desproporcionalidade, e consequentemente, em inconstitucionalidade.
Fica então para a análise as hipóteses de vigilância eletrônica em regime semiaberto e de prisão domiciliar do art. 318 do CPP. Como nestes casos, houve um aumento do rigor penal na execução da medida, cabe a verificação da compatibilidade com o princípio.
De acordo com Paulo Bonavides (2007, p. 393), o princípio da proporcionalidade busca instituir “a relação entre fim e meio, confrontando o fim e o fundamento de uma intervenção com os efeitos desta para que torne possível um controle do excesso”.
A questão de saber ser o meio escolhido pela norma está compatível com o fim a ela destinado passa pela verificação do atendimento do subprincípios de proporcionalidade, quase sejam: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
Assim, no caso, a Monitoração Eletrônica é adequada para a fiscalização do cumprimento das condições impostas ao apenado na saída temporária em regime semiaberto. As obrigações incluem o recolhimento residencial noturno e proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimento congênere. Bom, como também é adequada para a fiscalização do cumprimento de prisão domiciliar.
A segunda análise seria acerca de sua necessidade.
No que se refere à saída temporária em regime semiaberto, antes de responder se a ME é necessária nestes casos, cabe indagar se as obrigações impostas pela Lei 12.258/2010 são necessárias. Se a concessão do benefício de saída temporária parte da lógica de progressão de pena e consequentemente de progressivo retorno do individuo ao convívio social, o que fundamentaria então a imposição de restrições como recolhimento noturno e proibição de frequentar bares e casa noturnos indistintamente? No plano teórico, nada, inclusive esta seria uma medida contrária à finalidade normativa prevista. O que poderia ocorrer, seria no caso concreto a imposição dessas obrigações para algum apenado cuja conduta criminal praticada tivesse conexão com a frequência a bares a casas noturnas.
Assim, uma vez não sendo necessária a imposição de restrições, consequentemente não o é a utilização da ME nestes casos. E na hipótese de concessão da saída temporária sem as imposições do §1º do art. 124 da LEP, entende-se que também seria necessária a imposição da vigilância eletrônica nestes casos, pois se a finalidade do instituto é facilitar a ressocialização, impor a utilização da tornozeleira eletrônica geraria um obstáculo, ainda que se alegue a possibilidade de ocultação do dispositivo.
A alegação de utilização da ME nestes casos como prevenção da evasão de presos não prospera, tanto do ponto de vista da própria lógica argumentativa, quanto da compatibilidade com valores fundamentais, conforme já visto. Em relação à lógica argumentativa, primeiro, o dispositivo não impede fugas[10],segundo estatisticamente o número de evasão de presos nestes casos é ínfimo comparado aos que retornam[11], logo, a fiscalização seria desnecessária para o cumprimento da medida.Já em relação a sustentar a imposição de vigilância antes não prevista por conta de benefícios sociais de que o apenado não cometa crimes enquanto em benefício da medida, viola a noção de dignidade, pois estaria sacrificando o ainda mais o direito de alguns para a um suposto benefício dos demais, sem justificativa concreta para o caso.
No tocante à proporcionalidade em sentido estrito, em que pese a ausência de necessidade já desconfigurar a proporcionalidade lato sensu. No caso, ainda que se fosse fazer uma análise de proporcionalidade. Seguindo a mesma, a imposição da vigilância também seria desproporcional, pois não seria plausível impor uma vigilância sem fundamento prévio, tornando a invasão na esfera de liberdade do apenado desmedida. Restringir a intimidade e a liberdade do apenado no momento em que lhe é concedida temporariamente como um estímulo ao bom comportamento carcerário e como forma de reinseri-lo no meio social representa uma imposição estatal de restrição destes direitos desproporcional ao motivo que os limitou, no caso, o cumprimento de pena.
Em relação à prisão domiciliar, a necessidade não está presente, pois impor o uso de tornozeleira a aos apenados: maiores de 80 (oitenta) anos; extremamente debilitados por motivo de doença grave; imprescindíveis aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; e gestantes a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco; configuraria a imposição de um controle de restrição de liberdade desnecessário na medida em que as próprias circunstâncias fisiológicas do apenado restringe a sua circulação no meio social. Bem como lhe faltaria a proporcionalidade em sentido estrito, pois se a medida é prevista para casos excepcionais e era executada sem vigilância, logo a Monitoração representa um controle desproporcional. Nota-se também que dos quatro casos previstos, três deles o monitorado necessita de cuidados médicos (idade avançada, doença grave e grávida) e a utilização da tornozeleira eletrônica poderia culminar também em um constrangimento desproporcional com o que se espera da medida.
Logo, pelo exposto, conclui-se que a ME não é por si inconstitucional, mas a sua utilização na saída temporária em regime semiaberto e prisão domiciliar o é, por violação ao princípio constitucional da proporcionalidade.
5. A MONITORAÇÃO ELETRÔNICA E A CONFORMIDADE COM OS FINS PENAIS GARANTISTAS: UM PROBLEMA DE EFICÁCIA
De acordo com a doutrina de Bobbio, eficácia normativa perpassa pelo conhecimento se a norma é ou não seguida pelas pessoas a quem se destina, e caso, seja violada, seja feita valer com meios coercitivos pela autoridade que a estabeleceu – um problema de eficácia jurídica e social. No caso, como a Monitoração Eletrônica é uma medida administrativa penal, não faz sentido analisar a eficácia da medida sobre o prisma de seguimento ou internalização normativa pelas pessoas.
Entendendo que a ME é voltada para a satisfação dos fins de execução penal, faremos a análise aqui proposta considerando o papel da Monitoração na satisfação da eficácia do Direito Penal.
Cabe ao Direito Penal a função de proteção subsidiária de bens jurídicos. Bens jurídicos são todos aqueles que pressupõe um convívio pacífico entre as pessoas. Só seriam dignos de tutela penal aquelas situações de ofensa que não pudessem ser solucionadas por outros meios jurídicos (ROXIN, 2006, p.35).
Logo, conclui-se que, ao menos em tese, a função do direito penal é a tutela subsidiária de bens jurídicos. No momento em que uma norma penal é violada, impõe-se uma sanção como meio de garantir a manutenção de sua função coativa em relação às demais pessoas (função preventiva geral) e também ao indivíduo infrator (função preventivo especial). Contudo, essa punição deve respeitar os direitos e garantias fundamentais previstos na ordem constitucional (que resguardam a dignidade do indivíduo), só podendo limitá-los de modo proporcional ao mal causado pela conduta criminal. Do contrário, o mesmo ordenamento que protege bens jurídicos incoerentemente os violaria.
Assim, o papel da ME deve contribuir para manter o equilíbrio entre punição e direto à liberdade, pois se contribuir para reforçar um paradigma punitivo, sua função destoará das ideias de justiça (p. da dignidade) e de validade (p. da proporcionalidade). Sobre a importância da validade e justiça da norma, Nikklas Luhman(1983, p. 121):
A sociedade não pode ser reconstruída apenas a partir de sua constituição jurídica. O direito é apenas um momento estrutural entre outros.Por isso uma compreensão adequada do caráter social do direito não pode será alcançada apenas pela exegese e pela interpretação, e também não se esgota na busca de usa imposição. Masque isso, a sociologia do direito deve começar indagando quanto á compatibilidade estrutural do direito.
Logo, propõem-se o retorno às justificativas da implantação para a na análise normativa. Se estas justificativas forem condizentes com os fins e normas constitucionais, então a aplicação normativa deve buscar satisfazê-las, afastando os casos em que não é possível.
A busca por redução de custo e da população carcerária são propósitos coerentes com os fins constitucionais. Assim, no Brasil, apenas a Monitoração Eletrônica prevista como medida cautelar seria capaz de atender essas finalidades, portanto, as demais hipóteses devem ser descartadas do ordenamento jurídico, caso queiram obter eficácia funcional sistêmica.
6. NOTAS CONCLUSIVAS
Diante do exposto, verificou-se que, em que pese as justificativas não tenham relevância a nível de valoração exclusiva jurídica, elas devem ser consideradas na análise, sobretudo da eficácia da norma, de forma a se obter a coesão jurídica sistêmica com os fundamentos da Constituição.
A Monitoração Eletrônica tanto pode servir como instrumento tanto de aumento do controle penal, quanto de promoção da dignidade da pessoa humana, a depender a previsão jurídica de sua utilização.
Assim, não se defende aqui o descarte do sistema de ME como um todo, mas sim a sua utilização de forma compatível com os valores que um ordenamento entende como justos, ou seja, suas garantias penais e constitucionais, quebrando um ciclo de expansão irracional da rede de repressão do estado.
Toda vez que sua utilização passar do limite do razoável e do justo e implicar em aumento despropositado de rigor na execução da medida, a ME deve ser descartada.
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Noberto. Teoria Geral do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
HABERMANS, Jurgen. Direito e democracia. Entre facticidade e validade. V. I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
_______________. Sobre a constituição da Europa: Um ensaio. Trad. Denilson Luis Werle, Luiz Repa e Rúrion Melo. São Paulo: Unesp, 2012.
LUHMANN, Niklas. A sociologia do direito II. Trad. Gustavo Bayer. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 1985.
MELLO, Sebástian Borges de Albuquerque. O conceito material de culpabilidade: Fundamento da imposição da pena a um indivíduo concreto em face da dignidade da pessoa humana. Salvador: Jus Podivm, 2010.
MIAILLE, Michel. Introdução crítica ao direito. Trad. Ana Prata. São Paulo: Estampa, 2005
RAWLS, John. Uma Teoria da justiça. Trad. Jussara Simões. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
ROXIN, Claus. Estudos de direito penal. Trad. Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. Trad. Denise Bottmann, Ricardo Doninelli Mendes. São Paulo: Companhia das letras, 2011.
[1] No tocante à prevenção da reincidência, não há como assegurar a existência desse efeito, pois ele estaria condicionado a manutenção constante da vigilância.
[2] Chamar-se-á aqui de discurso, a definição dada por Michel Miaille (2005, p. 33), para o qual consiste em “um corpo coerente de proposições abstratas implicando uma lógica, uma ordem e a possibilidade não só de existir mas, sobretudo, de se reproduzir, de se desenvolver segundo leis internas à sua lógica”.
[3] Esse é o controle de constitucionalidade prévio feito pelas Comissões de Cidadania e Justiça.
[4]A pretensão deste trabalho não repousa na análise da dignidade da pessoa humana, seja esta entendida como valor, princípio ou regra, pois isto demandaria uma outra dissertação sobre o tema. O que se busca aqui é firmar um consenso sobre o que seria essa dignidade (seu conteúdo mínimo) e consequentemente se a ME é compatível com ela.
[5]É coerente então a Constituição brasileira em prever a dignidade como um fundamento, e não simplesmente como um princípio ou norma.
[6] A previsão de vigilância onde não existia representa um aumento do controle penal estatal na esfera de liberdade individual.
[7]Aqui está se fazendo o comparativo da Monitoração com a prisão preventiva e não com as demais medidas cautelares previstas na Lei 12.403/2011. Defende-se que o magistrado em respeito a igualdade, liberdade e dignidade, deve optar, caso seja possível, por outra medida menos gravosa que a ME, já que esta implica na imposição de vigilância.
[8] Quando prevista para a substituição da prisão em caso de crimes de maior ou médio potencial ofensivo. Nestas hipóteses, apesar de ser prevista como substituta do cárcere, são casos em que a prisão sequer deveria ser imposta. Vide parte 4.2.1.1 deste trabalho.
[9]Entretanto, a expansão do controle penal nestes casos ocorreria com o efeito colateral da adoção da ME, pois na medida em que a monitoração liberasse vagas no sistema carcerário, elas seriam preenchidas com outras pessoas, fazendo com que o Estado passasse a arcar com a manutenção de dois sistemas, possuindo encarcerados e monitorados, e consequentemente na expansão do controle estatal com ingresso de novos indivíduos no sistema punitivo. Contudo, esse é um problema situado no campo da política criminal e não a nível de análise de constitucionalidade.
[10]Tal fato inclusive foi constatado por uma recente experiência com a ME em presos beneficiário da saída temporária no Rio de Janeiro, cujo presidente do TJ do Rio de Janeiro suspendeu a utilização da monitoração nestes casos, alegando a ineficácia da medida. Notícia “Justiça do Rio suspende o uso de tornozeleiras”, de 05/04/2011. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2011-abr-05/justica-rio-suspende-uso-tornozeleira-eletronica-fugas>, acessado em 14.11.2013.
[11]Um levantamento realizado pelo G1 com base nos dados enviados pelas secretarias responsáveis pelo sistema penitenciário de todos os 26 estados e do Distrito Federal. Na saída de fim de ano anterior, em 2011, o número da evasão é coincidentemente o mesmo: 2.407. Na ocasião, 46.523 presos haviam sido beneficiados com a saída. Em relação ao ano anterior, 2012 teve aumento de 2% no número de beneficiados.O número representa 5,1% do total de 47.531 detentos que receberam o benefício da Justiça. Notícia “Mais de 2,4 mil presos não voltam às celas após festas de fim de ano”, disponível em <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2013/01/mais-de-24-mil-presos-nao-voltam-celas-apos-festas-de-fim-de-ano.html>, acessado em 18.02.2013.
Mestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana-Ba (UEFS). Servidora Pública Federal, atualmente ocupando a função de Oficial de Gabinete do Juiz Federal Substituto da 2ª Vara Federal de Feira de Santana-Ba..
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FALCONERY, Pollyanna Quintela. A monitoração eletrônica, a expansão do controle penal e sua conformidade com os fins constitucionais: problemas de justiça, eficácia e validade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 set 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45165/a-monitoracao-eletronica-a-expansao-do-controle-penal-e-sua-conformidade-com-os-fins-constitucionais-problemas-de-justica-eficacia-e-validade. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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