RESUMO: O presente artigo visa tecer comentários acerca da legitimidade ativa da União nas ações de busca e apreensão com base na Convenção de Haia sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças.
I-INTRODUÇÃO
Os Estados signatários da referida convenção, convictos de que os interesses da criança são de primordial importância em todas as questões relativas à sua guarda e objetivando protege-las, no plano internacional, dos efeitos prejudiciais resultantes de mudança de domicílio ou de retenção ilícitas, estabeleceram procedimentos que garantem o retorno imediato da criança ao Estado de sua residência habitual, bem como assegurar a proteção e efetividade do direito de visita.
II-DA CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE ASPECTOS CIVIS DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS.
A Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, prevê explicitamente a promoção de medidas judiciais tendentes à restituição ao país de residência habitual de menores ilicitamente transferidos para outro território.
Conforme o art.3º da referida Convenção, a transferência ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando:
a) tenha havido violação a direito de guarda atribuído a pessoa, individual ou conjuntamente, pela lei do Estado onde a criança tivesse sua residência habitual imediatamente antes de sua transferência ou da sua retenção; e
b) esse direito estivesse sendo exercido de maneira efetiva, individual ou em conjuntamente, no momento da transferência ou da retenção, ou devesse está-lo sendo se tais acontecimentos não tivessem ocorrido.
O direito de guarda pode resultar de uma atribuição de pleno direito, de uma decisão judicial ou administrativa, ou de um acordo vigente segundo o direito do Estado onde a criança reside.
Conforme a jurisprudência do STF, a Convenção sobre Sequestro visa, em seus artigos 16 e 17, coibir o deslocamentop ilegal de crianças e permitir a rápida devolução ao país de sua residência habitual anterior ao sequestro.
A ideia é tudo fazer para que a criança possa, no futuro mais próximo possível, manter contato com ambos os pais, mesmo que estes estejam vivendo em países diferentes.
O art.7 da Convenção enuncia que as autoridades centrais devem cooperar entre si e promover a colaboração entre as autoridades competentes dos seus respectivos Estados, de forma a assegurar o retorno imediato das crianças e a realizar os demais objetivos da presente Convenção.
Ainda, a aplicação das exceções à regra da devolução da criança, previstas nos artigos 13 e 20 da referida convenção, devem ser interpretadas restritivamente, conforme entendimento majoritário do STF e da doutrina, sob pena de a Convenção se tornar pouco efetiva e admitir-se o estímulo à remoção ilícita.
As exceções devem ser entendidas em caráter humanitário, impedindo que as crianças sejam submetidas a maus tratos ou a ambientes incompatíveis com sua formação física e psicológica.
De antemão, o Estado Brasileiro, por meio do Poder Judiciário, não pode negar pedido de restituição de menores se os requisitos do Tratado estiverem presentes.
Impende destacar a previsão inserta no art.12 da Convenção de Haia:
Art.12 Quando uma criança tiver sido ilicitamente transferida ou retida nos termos do Artigo 3 e tenha decorrido um período de menos de 1 ano entre a data da transferência ou da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa do Estado Contratante onde a criança se encontrar, a autoridade respectiva deverá ordenar o retomo imediato da criança.
A autoridade judicial ou administrativa respectiva, mesmo após expirado o período de um ano referido no parágrafo anterior, deverá ordenar o retorno da criança, salvo quando for provado que a criança já se encontra integrada no seu novo meio.
A doutrina enuncia que, o objetivo da Convenção de Haia é precipuamente defender o melhor interesse da criança, encerrando sua manutenção ilícita em país signatário.
III-DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DA UNIÃO FEDERAL. DA COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL.
Ao corroborar os termos da Convenção de sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, concluída na cidade de Haia, em 25 de outubro de 1980, em consonância com o previsto nos arts.84, VII, cumulado com o art.49, I, ambos da CF/88, a República Federativa do Brasil, assume compromisso que, violado, enseja sua responsabilização no plano internacional.
Impende destacar que a responsabilidade internacional do Estado advém de uma violação a norma jurídica internacional, bem como do desempenho de conduta que transgrida o inserto nos tratados firmados.
Assim, ante a possibilidade de responsabilização da União, a busca e apreensão por ela requerida deve ser deferida integralmente, sob pena de afronta aos compromissos internacionais da República Federativa do Brasil assumidos quando da ratificação e internalização da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças.
IV -DA LEGITIMIDADE E DO INTERESSE PROCESSUAL DA UNIÃO PARA AJUIZAD AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO NOS TERMOS DA CONVENÇÃO DE HAIA.
Ante ao exposto no presente artigo, se faz relevante destacar a legitimidade e o interesse da União para propositura de ação de busca e apreensão de criança com base na Convenção de Haia.
A responsabilidade internacional é instituto de direito internacional pelo qual o estado ou organização internacional que descumpriu norma internacional e causou dano a outro sujeito de direito da gentes, deve reparar o prejuízo causado.
Nos termos do entendimento consolidado do STJ e do STF, a União tem interesse direto nos casos referentes à Convenção de Haia sobre o sequestro internacional de crianças, pois, por intermédio da AGU, atua não em defesa de interesses dos particulares, mas sim, visando assegurar que obrigações internacionais assumidas pela República Federativa do Brasil, sejam cumpridas perante os estados soberanos que aderiram à referida convenção.
A União, que apresenta como integrante de sua estrutura a Secretaria Especial de Direitos Humanos, representante do Estado brasileiro, na forma do disposto no artigo 21, incisos I e IV da Constituição Federal, é dotada de competência para se utilizar de medidas necessárias ao integral cumprimento das obrigações assumidas pelo País, por ocasião da adesão e ratificação dos preceitos contidos na Convenção, inclusive a propositura de ações de busca, apreensão e restituição de menores, vez que a SDEH não apresenta capacidade postulatória.
Neste diapasão, com base no art.84,VIII, da CF/88, é legítima a atuação da União no pólo ativo de ação de busca e apreensão com base na exercida convenção, visando elidir sua responsabilidade internacional no caso concreto.
V-CONCLUSÃO
Assim, tendo em vista que a República Federativa do Brasil é signatária da Convenção de Haia sobre aspectos civis do sequestro internacional de crianças, bem como a possibilidade de responsabilização internacional pátria ante seu descumprimento, é possível afirmar ter a União legitimidade ativa para ajuizar ação cautelar de busca e apreensão, para que seja feita devolução da criança ao país de origem, visando a proteção da dignidade humana, a manutenção das boas relações com os demais signatários, sempre observando o princípio do melhor interesse da criança.
REFERÊNCIAS
PORTELA, Gonçalves Henrique Paulo, Direito Internacional e Direitos Humanos,2ª Ed. Salvador: Jus Podivum,2014.
GONÇALVES, Ribeiro Beatriz Maria, Direito Internacional Público e Privado,2ª Ed. Salvador: Jus Podivum,2015.
Portal da Advocacia Geral da União. Disponível em: http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/119651
Portal da Advocacia Geral da União. Disponível em: http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/4359727
Decreto 3413 de 14 de abril de 2013. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3413.htm
Portal da Revista Veja. Disponível em: http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/030609/sentenca.pdf
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