RESUMO: O presente trabalho trata das questões atinentes ao foro por prerrogativa de função conferido constitucionalmente a alguns membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Com uma abordagem doutrinária e jurisprudencial, apresenta os contornos dessa temática, que tem sido objeto de discussões nos últimos anos ante as constrovérsias existentes, principalmente no que concerne à reunião de processos de réus com prerrogativa e sem prerrogativa, fim da prerrogativa em virtude da perda/renúncia do cargo e competência do Tribunal do Júri.
Palavras Chave: Foro por prerrogativa de função – Perda de mandato – Tribunal do Júri – Competência – Julgamento.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo definir os aspectos legais e constitucionais do foro privilegiado, justificando o motivo pelo qual algumas figuras do cenário jurídico-político nacional devem ser processadas e julgadas por órgãos superiores de nossa justiça. Para tanto, far-se-á uma breve análise do procedimento utilizado nos casos de foro por prerrogativa de função, seja no âmbito dos Tribunais de Justiça, dos TRFs, do STJ e do STF.
No transcorrer do estudo, será possível analisar a atual situação dos processos que tramitam em foro privilegiado, bem como os benefícios e prejuízos que tal procedimento vem acarretando na prática.
2 FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO
O foro por prerrogativa de função surgiu como meio de resguardar o interesse público, evitando que pessoas que exercem função de alta relevância no cenário jurídico-político brasileiro possam vir a sofrer qualquer tipo de pressão - no que tange ao desenvolvimento de suas atividades-, em decorrência da prática de crime, ou ainda, que pudessem exercer pressão sobre os responsáveis pelo seu julgamento (caso o Presidente da República fosse julgado por juiz de 1a instância, por exemplo). Para tanto, estabeleceu o constituinte que determinadas autoridades devem julgadas por órgãos de instância superior, mesmos nas situações em que a competência originária seria de órgão de instância inferior.
Nos casos de competência em razão da pessoa, a ação penal originária terá início no STF, STJ, STM, TRFs, Tribunais de Justiça ou Tribunais de Justiça Militar, ainda que o crime cometido seja de competência do juízo comum, uma vez que deve se levar em conta apenas o sujeito passivo da pretensão punitiva (TOURINHO FILHO, 2010) e não o tipo de infração praticada. A título exemplificativo, se o Presidente da República for acusado de homicídio culposo, a ação penal responsável pelo seu julgamento, de acordo com o art. 102, I, “b” da CF, tramitará no Supremo Tribunal Federal. Em contrapartida, se seu motorista for acusado pela prática do mesmo crime, terá seu processo em trâmite na justiça comum.
Nesse ínterim, faz-se necessário mencionar que o foro privilegiado terá incidência apenas nos casos em que se trate de prática de infração penal, ou seja, cometimento de crime comum, eleitoral, de imprensa, militar, da alçada do Tribunal do Júri ou da Justiça Federal. Não incidirá a prerrogativa de função quando se tratar de prática de crime de responsabilidade, uma vez que o próprio Código de Processo Penal, em seu art. 1º, II[1], assim estabelece.
3 PREVISÃO LEGAL DO FORO PRIVILEGIADO NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO
Como visto, a prerrogativa de função impõe a eleição legal de um foro privilegiado para julgar determinado réu que cometeu infração penal investido de função especial. Tal prerrogativa é conferida para determinadas autoridades com o escopo de evitar que ocupantes de cargos judiciários de menor hierarquia julguem os detentores de cargos públicos mais elevados, a exemplo de magistrados e membros de outros Poderes do Estado.
Hodiernamente, o foro privilegiado encontra-se previsto em dispositivos esparsos da Constituição Federal de 1988 (artigos 29, X, 52, I e II, 53, § 1º, 102, I, "b" e "c" e 105, I, "a", 108, I, "a") e da legislação infraconstitucional, a exemplo da Leis 1.079/50, 8.038/90 e 8.658/93.
Dentre os artigos insertos na Lei Maior, destacam-se aqueles que disciplinam a competência originária dos órgãos superiores da Justiça. Confira-se:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente: [...] b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;
Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
I - processar e julgar, originariamente: a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
A Lei nº 1.079/50 prevê os crimes de responsabilidade do Presidente da República, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal e outras autoridades, cujo julgamento cabe ao Senado.
Já a Lei 8.038/90, por sua vez, institui, em seu Título I, normas procedimentais para os processos de competência originária, perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.
Por fim, a Lei nº 8.658/93 dispõe acerca da aplicação das normas procedimentais previstas pela Lei 8.038, sobre ações penais originárias, nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais.
Questão de grande controvérsia e que merece uma análise mais aprofundada é a que diz respeito ao foro por prerrogativa de função e sua relação com a manutenção do cargo ou mandato. Em síntese, a questão é: o foro por prerrogativa de função permanece após o encerramento do exercício funcional nos casos em que a conduta tenha se iniciado no exercício do cargo ou mandato?
A início, pelo entendimento que consta na Súmula nº 394 do STF a resposta seria positiva, uma vez que previa que “cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício.” A razão de ser de tal súmula se devia basicamente por dois motivos. O primeiro deles era que, adotando tal posicionamento, o julgamento dos mais altos tribunais seria mais imparcial do que o dos juízes de 1º grau. Já o segundo era referente ao fato de que a prorrogação da competência dos tribunais superiores, mesmo depois de cessado o exercício funcional, não deixava de ser uma maneira de proteger o próprio exercício da função pública.
Entretanto, o entendimento da referida súmula foi cancelado em 1999, fato que se deu em decorrência de uma interpretação restritiva do STF[2] em relação ao art. 102, I, “b” da Constituição Federal – que estabelece a competência do STF para processar e julgar originariamente "nas infrações comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República" –, entendendo que aquele dispositivo não alcança pessoas que não mais exercem mandato ou cargo.
Assim, ao revogar sua Súmula nº 394, o STF passou a entender que (MAZZILLI, 2003):
“A prerrogativa de foro visa a garantir o exercício do cargo ou do mandato, e não a proteger quem o exerce. Menos ainda quem deixa de exercê-lo. Também pesou o fato de que a prerrogativa de foro perante a Corte Suprema, como expressa na Constituição brasileira, mesmo para os que se encontrem no exercício do cargo ou mandato, não é encontradiça no Direito Constitucional comparado. Menos, ainda, para ex-exercentes de cargos ou mandatos. Ademais, as prerrogativas de foro, pelo privilégio, que, de certa forma, conferem, não devem ser interpretadas ampliativamente, numa Constituição que pretende tratar igualmente os cidadãos comuns, como são, também, os ex-exercentes de tais cargos ou mandatos[3]”
Já no ano de 2002, a questão seguiu novo rumo com o advento da Lei nº 10. 628, dada a alteração que esta trouxe ao art. 84 do Código de Processo Penal[4], que passou a prever que os ilícitos decorrentes de atos administrativos praticados pelo agente no exercício de suas funções ficariam a cargo do competente Tribunal, mesmo nas hipóteses em que o inquérito se iniciasse após o encerramento da atividade funcional. Vale dizer ainda, que tal alteração também contemplou com foro privilegiado os agentes que incorressem em improbidade administrativa, em seu § 2º.
Tais alterações, todavia foram alvo de duas ações diretas de inconstitucionalidade[5], as quais foram julgadas procedentes pelo STF, fato que remete ao entendimento de que não prevalece mais o foro por prerrogativa de função uma vez encerrado o cargo ou mandato.
O entendimento atual acerca da questão em comento, ao nosso ver, mostra-se o mais adequado, tendo em vista que a razão de ser da prerrogativa de foro é garantir o exercício do cargou ou do mandato, mas não proteger quem o exerce, entendimento que está em consonância com aquele que consta na decisão do STF acerca da interpretação restringente do art. 102, I, “b”da CF.
5 QUESTÕES ESPECÍFICAS CONCERNENTES AO FORO PRIVILEGIADO
5.1 Conexão e continência
A conexão e a continência são causas modificativas da competência, possibilitando um processo único, o que prioriza a celeridade e economia processual. É imprescindível perceber que a conexão e a continência só podem incidir sobre espécies de competência relativa, na medida em que a competência absoluta não pode ser alterada.
Desta forma, chega-se a conclusão de que a inobservância da conexão e da continência é causa de mera nulidade relativa, não podendo ser declarada de ofício. Além disso, a reunião dos processos tem limite temporal, só sendo possível até o proferimento da sentença de 1ª instância, que encerra essa primeira fase processual, sendo tal decisão passível de recurso, como demonstra a Súmula 235 do STJ, “a conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado”.
No caso dos processos que tramitaram separadamente, advindo sentença no juízo não prevalente, caberá à jurisdição posterior a unificação das penas, não podendo mais se falar em reunião dos processos na primeira fase.
A conexão consiste na interligação de duas ou mais infrações, fazendo com que elas sejam julgadas pelo mesmo órgão jurisdicional, evitando possíveis decisões contraditórias. Para compreensão das causas que proporcionam a conexão, é válida a classificação das suas espécies, que são três: a conexão intersubjetiva, a objetiva e a instrumental.
A conexão intersubjetiva envolve várias pessoas e vários crimes, obrigatoriamente, podendo ocorrer por simultaneidade, por concurso ou, ainda, por reciprocidade.
A conexão intersubjetiva por simultaneidade é aquela em que dois ou mais delitos são praticados por diversas pessoas, ao mesmo tempo, estando elas ocasionalmente reunidas. Assim, o vínculo entre elas se estabelece pela prática da infração nas mesmas circunstâncias de tempo e espaço. Como exemplo está o caso de um caminhão da cerveja Skol que tomba na estrada e população, sem combinar, rouba latinhas que estão espalhadas.
A segunda espécie de conexão intersubjetiva é a concursal em que duas ou mais infrações são cometidas por várias pessoas, em concurso, ou seja, com prévio acordo, ainda que em tempo e local diversos. Por exemplo, quando uma quadrilha assalta bancos em várias cidades, sendo diversos o tempo e o lugar dos delitos.
Há, por fim, a conexão intersubjetiva por reciprocidade que se configura quando duas ou mais infrações são cometidas por diversas pessoas umas contra as outras. Por exemplo, o comum caso de torcidas rivais que provocam lesões corporais em integrantes do outro grupo.
A segunda classificação da conexão é a objetiva, também chamada de lógica ou material, ocorrendo quando uma infração é praticada para facilitar, ocultar, conseguir impunidade ou vantagem em relação a outro delito. Como exemplo, o caso dos ladrões do Banco Central de Fortaleza que praticaram diversas outras infrações, visando encobertar a principal (o roubo).
O último tipo de conexão é a instrumental, denominada de probatória ou processual, na qual a prova de uma infração influencia na prova de outro delito. Situação que pode ser encontrada quando há um furto e a receptação da coisa por terceiro, sendo evidente o vínculo entre as infrações o que leva ao julgamento em processo único.
Por outro lado, a continência é o vínculo que une vários infratores a uma única infração. Pode ser dividida em duas espécies: a continência por cumulação subjetiva e a continência por cumulação objetiva. A primeira ocorre quando duas ou mais pessoas são acusadas pela mesma infração penal (por exemplo, dois agentes que praticaram homicídio conjuntamente). A outra é a continência por cumulação objetiva que pode se dar no caso do concurso formal de delitos, no caso de aberractio ictus (art. 73, CP) e, por fim, no caso de aberractio criminis (art. 74, CP).
Portanto, são efeitos da conexão e da continência o processo e julgamento único, chamado simultaneus processus, e a atratividade deles por um dos juízos competentes.
Assim, havendo conexão e continência, resta compreender qual dos juízos exerceria a maior força atrativa. Caso o concurso se dê entre o Tribunal do Júri e a jurisdição comum ou especial, o Tribunal popular prevaleceria, pois é de sua competência apreciar os delitos contra a vida e seus crimes conexos.
Quando o concurso de crimes envolve a jurisdição comum e especial, prevalecerá a última. Por exemplo, se duas infrações conexas eram relativas à justiça do trabalho e à justiça comum, ambos os casos serão apreciados pela justiça do trabalho. Porém, essa rega não se aplica à justiça militar, ocasião em que a separação dos processos será inevitável.
Com relação aos delitos entre jurisdições da mesma categoria, os processos serão reunidos perante o juízo em que foi consumada a infração mais grave, ou naquele local em que foi praticado o maior número de crimes.
Já na situação em que é praticada infração por agentes com jurisdições de hierarquia distintas, os tribunais superiores já demonstraram posições diversas no decorrer dos anos.
De acordo com a Súmula 704 do Supremo: “não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do co-réu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados”. Em que pese o disposto na referida súmula, autorizando a reunião de processos na instância superior quando um dos réus tiver foro por prerrogativa de função, o STF se manifestou posteriormente no sentido da regra ser o desmembramento dos processos. Ou seja, ainda que haja conexão ou continência entre as condutas delituosas, se apenas um dos réus tiverem foro por prerrogativa de função, a regra será o desmembramento dos processos. Tal se dá em virtude da competência do STF estar prevista expressamente na Constituição Federal, não sendo possível aplicação ampliativa de seus dispositivos, tampouco norma infraconstitucional em sentido oposto.
Diante do exposto, percebe-se que existem diversas regras supervenientes à competência e conexão, devendo estes institutos ser aplicados com cautela, evitando ilegalidades.
5.2 Tribunal do júri
De acordo com o art. 5º, XXXVIII, da CF, a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri. No entanto, tal prerrogativa não se aplicará às autoridades que detenham foro privilegiado estabelecido pela Constituição Federal, cabendo a essas serem julgadas pelo respectivo tribunal competente, uma vez que elas não irão a júri.
A súmula 721 do STF[6], no entanto, determina que mesmo não será aplicado às autoridades com prerrogativa de função estabelecida pela Constituição Estadual, o que significa que caso incorram em crime doloso contra vida deverão ir a júri.
Questão interessante que merece ser suscitada diz respeito a possibilidade de conexão e continência quando for praticado crime doloso contra vida por agente detentor de foro privilegiado em concurso com alguém que não detenha tal prerrogativa. Nessas situações, o foro privilegiado não atrairá a competência do outro agente, que terá que ser julgado pelo Tribunal do Júri. Desse modo, caso o Procurador Geral da República pratique crime doloso contra vida de alguém junto com sua esposa, somente aquele será julgado pelo SFT, enquanto que esta será processada pelo Tribunal do Júri. Sobre o assunto, constata-se que a jurisprudência já firmou entendimento[7].
6 CONCLUSÃO
Em face da relevância do cargo ou da função exercida por determinadas pessoas, são elas julgadas originariamente por órgãos superiores da jurisdição e não pelos órgãos comuns, sendo tal regra prevista principalmente pela Constituição Federal, nos artigos que contemplam a competência originária dos órgãos superiores da Justiça, como já abordado.
Ademais, outra questão de fundamental importância no contexto da prerrogativa de função é a sua relação com o encerramento do exercício do cargo ou mandato. Apesar de ainda ser tema grande contorvérsia, o entendimento atual, decorrente de duas ações declaratórias de inconstitucionalidade, é o de que não há que se falar de manutenção do foro privilegiado uma vez encerrado o cargo ou mandato, salvo quando isso puder causar grande prejuízo ao julgamento, retardar o processo a ponto de causar a prescrição ou quando houver má-fé daquele que renuncia ao mandato tão somente para retardar sua punição.
Por último, cabe atentar para situações específicas concernentes ao foro por prerrogativa de função, como a incidência das regras acerca da conexão e continência, e a questão do Tribunal do Júri, que excepcionalmente não é competente para julgar as autoridades que encontram-se sob o manto das regras atinentes à prerrogativa de função.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Stella Fulanetto de Mattos. Foro por prerrogativa de função: prefeitos municipais. Disponibilizado em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/view/10974 Consultado em: 30.01.2016.
MAZZILLI, Hugo Nigro. O foro por prerrogativa de função e a Lei nº 10.628/2002. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/15064/14628. Acesso em 26/10/2010
TAVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 4. Ed. Salvador: Jus Podvim, 2014.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
[1] Art. 1o: O processo penal reger-se-á, em todo o território brasileiro, por este Código, ressalvados: II - as prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade (Constituição, arts. 86, 89, § 2o, e 100);
[2] EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. PROCESSO CRIMINAL CONTRA EX-DEPUTADO FEDERAL. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA. INEXISTÊNCIA DE FORO PRIVILEGIADO. COMPETÊNCIA DE JUÍZO DE 1º GRAU. NÃO MAIS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CANCELAMENTO DA SÚMULA 394. 1. Interpretando ampliativamente normas da Constituição Federal de 1946 e das Leis nºs 1.079/50 e 3.528/59, o Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência, consolidada na Súmula 394, segunda a qual, "cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício". 2. A tese consubstanciada nessa Súmula não se refletiu na Constituição de 1988, ao menos às expressas, pois, no art. 102, I, "b", estabeleceu competência originária do Supremo Tribunal Federal, para processar e julgar "os membros do Congresso Nacional", nos crimes comuns. Continua a norma constitucional não contemplando os ex-membros do Congresso Nacional, assim como não contempla o ex-Presidente, o ex-Vice-Presidente, o ex-Procurador-Geral da República, nem os ex-Ministros de Estado (art. 102, I, "b" e "c"). Em outras palavras, a Constituição não é explícita em atribuir tal prerrogativa de foro às autoridades e mandatários, que, por qualquer razão, deixaram o exercício do cargo ou do mandato. Dir-se-á que a tese da Súmula 394 permanece válida, pois, com ela, ao menos de forma indireta, também se protege o exercício do cargo ou do mandato, se durante ele o delito foi praticado e o acusado não mais o exerce. Não se pode negar a relevância dessa argumentação, que, por tantos anos, foi aceita pelo Tribunal. Mas também não se pode, por outro lado, deixar de admitir que a prerrogativa de foro visa a garantir o exercício do cargo ou do mandato, e não a proteger quem o exerce. Menos ainda quem deixa de exercê-lo. Aliás, a prerrogativa de foro perante a Corte Suprema, como expressa na Constituição brasileira, mesmo para os que se encontram no exercício do cargo ou mandato, não é encontradiça no Direito Constitucional Comparado. Menos, ainda, para ex-exercentes de cargos ou mandatos. Ademais, as prerrogativas de foro, pelo privilégio, que, de certa forma, conferem, não devem ser interpretadas ampliativamente, numa Constituição que pretende tratar igualmente os cidadãos comuns, como são, também, os ex-exercentes de tais cargos ou mandatos. 3. Questão de Ordem suscitada pelo Relator, propondo cancelamento da Súmula 394 e o reconhecimento, no caso, da competência do Juízo de 1º grau para o processo e julgamento de ação penal contra ex-Deputado Federal. Acolhimento de ambas as propostas, por decisão unânime do Plenário. 4. Ressalva, também unânime, de todos os atos praticados e decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, com base na Súmula 394, enquanto vigorou. (Inq. 687 QO /SP, Rel. Ministro SYDNEY SANCHES, TRIBUNAL PLENO, julgado em 25/08/1999, Dje 09/11/2001)
[3] MAZZILLI, Hugo Nigro. O foro por prerrogativa de função e a Lei nº 10.628/2002. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/15064/14628. Acesso em 26/10/2010.
[4] Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade.
§ 1.º A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública.
§ 2.º A ação de improbidade, de que trata a Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1.º.
[5] ADIN’s 2.797-2 e 2.860-0
[6] Súmula 721: “A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual”.
[7]RECLAMAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO. AUTORIA INTELECTUAL IMPUTADA A DESEMBARGADOR E SEU CÔNJUGE. COMPETÊNCIA. REGRAS FIXADAS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SEPARAÇÃO DOS PROCESSOS. OBRIGATORIEDADE. NECESSIDADE DE DESCONSTITUIÇÃO DA COMPETÊNCIA PRORROGADA E PREVENTA DESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NULIDADE DO RECEBIMENTO DO ADITAMENTO DA DENÚNCIA PELO JUÍZO DO PRIMEIRO GRAU E DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA PARA O MESMO JUÍZO. PARCIAL PROCEDÊNCIA DA RECLAMAÇÃO.1. A norma constitucional de competência, somente excluída por outra da mesma natureza e hierarquia, afasta a incidência da norma legal que determina a unidade de processo e julgamento em razão da continência.2. Em caso de co-autoria em crime doloso contra a vida, o privilégio de foro ostentado por um dos agentes, porque desembargador, não atrai para competência do Superior Tribunal de Justiça o julgamento do outro envolvido, que deve ser julgado pelo Tribunal do Júri, seu juiz natural. Precedentes do STF e do STJ.3. O reconhecimento da competência do Tribunal do Júri para processar e julgar a reclamante não prescinde da prévia desconstituição da competência até então prorrogada e preventa deste Superior Tribunal de Justiça em decorrência de anterior deferimento de quebra dos sigilos bancário e telefônico dos acusados, que não podia ser ignorada nem pelo Ministério Público, nem pelo Juízo do primeiro grau, nos seus efeitos jurídico-processuais.4. Declaração de nulidade do recebimento do aditamento da denúncia pelo Juízo do primeiro grau, exclusão da reclamante da condição de investigada no inquérito fluente neste Superior Tribunal de Justiça e de todas as medidas probatórias jurisdicionais a ela relativas, com declinatória de competência para o Juízo do Júri.5. Reclamação parcialmente procedente.(Rcl 2.125/CE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/12/2008, DJe 05/02/2009);
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PREFEITO E VICE-PREFEITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. IMPUGNAÇÃO. QUESTÃO EXAMINADA EM OUTRAS IMPETRAÇÕES. WRIT PARCIALMENTE PREJUDICADO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA PROCESSAR E JULGAR O PREFEITO, NÃO O VICE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. CISÃO DO PROCESSO.1. Quanto ao Prefeito, está prejudicada a impetração, uma vez que a questão acerca da fundamentação da prisão preventiva foi objeto de apreciação no HC n.º 34.480/PA, julgado em primeiro lugar por esta Eg. Quinta Turma por ser mais abrangente. 2. Quanto ao Vice-Prefeito, tem-se que também está prejudicada a questão acerca da fundamentação da prisão preventiva, porque fora noticiada, anteriormente, a revogação do decreto prisional, o que ensejou, inclusive, a manifestação desta Eg. Quinta Turma no sentido de julgar prejudicado o HC n.º 32.687.3. Inexistindo previsão constitucional que confira ao Vice-Prefeito prerrogativa de foro, exsurge a competência do Júri Popular para julgá-lo, devendo os dispositivos constitucionais serem harmonizados, isto é, mantém-se a competência do Tribunal de Justiça para processar e julgar, originariamente, o Prefeito (art. 29, inciso X, CF); e, com relação ao Vice-Prefeito, a competência é do Tribunal do Júri (art. 5º, inciso XXXVIII, alínea d, CF).4. Habeas corpus parcialmente prejudicado. Ordem concedida para, apenas com relação ao Vice-Prefeito, declarar a incompetência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará para processar e julgar o feito, que deverá ser cindido para a preservação da competência do Tribunal do Júri.(HC 32.863/PA, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 08/06/2004, DJ 02/08/2004, p. 449);
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte; Pós-graduada em Direito Público pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PIRES, Camilla Motta Meira. Ação penal originária e foro privilegiado Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 fev 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46003/acao-penal-originaria-e-foro-privilegiado. Acesso em: 26 nov 2024.
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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