Resumo: A competência pela prerrogativa de função estabelece um foro privilegiado no qual as pessoas que ocupam determinados cargos públicos de maior relevância deverão ser exclusivamente nele processadas penalmente de maneira originária. O objetivo do foro privilegiado é dispensar uma cautela a determinados cargos de alta relevância no Estado, buscando prevenir e evitar que possíveis pressões advindas do julgamento das autoridades de alto relevo do Estado possam ser exercidas sobre juízos de primeira instância. O foro privilegiado tem previsão na Constituição Federal, não podendo, por isso, ser afastada. Além disso, também poderá cada Constituição Estadual prever da mesma forma esta garantia a suas autoridades locais.
INTRODUÇÃO
O ordenamento jurídico penal brasileiro prevê uma modalidade especial de competência, chamada de ratione personae. Trata-se da competência pela prerrogativa de função, a qual estabelece um foro privilegiado no qual as pessoas que ocupam determinados cargos de maior relevância do Estado são processadas penalmente de forma originária. Em outras palavras, essas pessoas, justamente em razão do cargo que ocupam, serão julgadas através de ações penais de competência originária dos órgãos jurisdicionais superiores, de instância mais elevada.
A competência pela prerrogativa de função está prevista, essencialmente, na Constituição Federal. No entanto, as Constituições estaduais também dispõem de forma autônoma acerca da referida competência, dispensando-a em favor de determinadas autoridades que não gozam de tal previsão na Carta Magna, tais como os vice-governadores e os defensores públicos. Ademais, as Leis de Organização Judiciária também tratam da matéria, como no caso da competência do Superior Tribunal Militar, além do Código de Processo Penal.
Ressalte-se que o foro privilegiado é previsto e dispensado em função do cargo ocupado, e não da pessoa que o ocupa, ou seja, procura-se resguardar não o indivíduo em si, mas a função que este desempenha enquanto investido no cargo. Tanto que, se cessada a função exercida, cessado está o benefício do foro privilegiado, conforme será analisado mais adiante.
Não obstante, a previsão da competência pela prerrogativa de função por muitas vezes dá ensejo ao entendimento de que se trata de uma violação ao princípio da isonomia, na medida em que estabelece um benefício, qual seja o foro privilegiado, em favor de determinadas pessoas e em detrimento das demais, contrariando, assim, a regra prevista no art. 5°, caput, da Carta Magna, o qual dispõe que “todos são iguais perante a lei”. Acerca do assunto, é relevante destacar a lição do doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho (2010, p.315):
Não se trata (conforme dissemos) de um privilégio, o que seria odioso, mas de uma garantia, de elementar cautela, para amparar, a um só tempo, o responsável e a Justiça, evitando, p. ex., a subversão da hierarquia, e para cercar o seu processo e julgamento de especiais garantias, protegendo-os contra eventuais pressões que os supostos responsáveis pudessem exercer sobre os órgãos jurisdicionais inferiores.
Por conseguinte, tem-se que o foro privilegiado varia de acordo com cada cargo, de forma que cada autoridade estatal, a depender do grau de sua importância no Estado, será processada e julgada por ação penal originária no respectivo tribunal cuja graduação faça jus à relevância do cargo por ela ocupado, com a finalidade de resguardar a função desempenhada.
1. O FORO PRIVILEGIADO E O TRIBUNAL DO JÚRI
A competência do Tribunal do Júri é prevista na Constituição Federal (art. 5º, inciso XXXVIII, alínea “d”), no qual serão julgados os acusados da prática de crimes dolosos contra a vida. Por seu turno, também a competência pela prerrogativa de função é prevista, fundamentalmente, na Lei Maior, conforme visto supra. Sendo assim, surge a seguinte questão: qual o tribunal competente no caso de uma autoridade estatal, para a qual é previsto foro privilegiado, cometer um crime doloso contra a vida?
Muito embora ambas as competências acima referidas tenham previsão constitucional, é entendimento consolidado que a competência pela prerrogativa de função deve prevalecer sobre a competência do Tribunal do Júri no caso de ocorrência da hipótese supramencionada, ou seja, quando haja confusão entre ambas as competências. Isto porque prevalece o interesse no resguardo da função de alto relevo desempenhada, à qual é dispensado o foro privilegiado.
Outrossim, existem ainda disposições acerca da competência pela prerrogativa de função previstas exclusivamente em Constituições estaduais, estabelecendo foros privilegiados em favor de outras autoridades, não contempladas na Constituição Federal. Nestes casos, deve prevalecer a competência prevista nesta última, em razão de sua força normativa superior, a despeito das Constituições estaduais. Em outras palavras, no caso de uma autoridade, para a qual é dispensado o foro privilegiado com previsão exclusiva na Constituição estadual, incorrer em crime doloso contra a vida, seu julgamento deve ser procedido no Tribunal do Júri, em detrimento do foro privilegiado.
Saliente-se que referido entendimento, inclusive, foi objeto de Súmula do Supremo Tribunal Federal:
Súmula nº 721: A competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela constituição estadual.
2. O FORO PRIVILEGIADO E A CESSAÇÃO DA FUNÇÃO
Como visto, o foro privilegiado é previsto em função do cargo, e não da pessoa que o ocupa, ou seja, a competência pela prerrogativa de função só deve prevalecer e ser dispensada a determinada pessoa enquanto ela estiver investida no respectivo cargo, justamente porque a finalidade do foro privilegiado é resguardar a função de alto relevo desempenhada, e não o indivíduo em si.
Nestes termos, indaga-se se a competência pela prerrogativa de função deve ser mantida quando a pessoa à qual é previsto o foro privilegiado não mais está investida naquele determinado cargo, ou seja, não desempenha mais a função a que se pretende resguardar, muito embora o crime tenha sido praticado durante a ocupação daquele cargo. Ora, se levarmos em consideração que a essência da competência pela prerrogativa de função é a cautela em razão do cargo, da função, por serem eles de grande relevância no Estado, se o indivíduo não mais exerce tais funções, não há que se falar em foro privilegiado, o qual seria em benefício apenas da pessoa, e não do cargo.
Contudo, o entendimento acerca do assunto está longe de ser pacífico. O próprio Supremo Tribunal Federal, após editar a Súmula n° 394, que determinava a manutenção do foro privilegiado mesmo após a cessação do exercício da função pela autoridade, cancelou a referida Súmula, alterando o seu posicionamento. A doutrina, por seu turno, também diverge, sendo que alguns autores entendem que deve prevalecer o princípio do Juiz natural ao tempo da prática do crime, ou seja, sendo o delito praticado pela autoridade enquanto ainda investida no cargo, a competência será pela prerrogativa da função, mesmo que posteriormente o indivíduo desocupe aquele cargo.
Não obstante, nos casos em que a autoridade é investida em outro novo cargo, por exemplo, um desembargador federal passa a ser ministro do Superior Tribunal de Justiça, deve prevalecer a competência pela prerrogativa da nova função desempenhada, ou seja, a autoridade deve ser processada e julgada no foro privilegiado previsto para o novo cargo que ocupa. Assim, na hipótese de já haver algum processo em curso, os autos devem ser enviados para o novo tribunal competente. Muito embora tal entendimento não obedeça ao princípio do Juiz natural ao tempo da prática do crime, não se pode perder de vista a finalidade precípua da competência pela prerrogativa de função, que é o resguardo do cargo ocupado, de alto relevo na estrutura estatal.
3. O FORO PRIVILEGIADO NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA E NO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL
A Constituição Federal prevê foro de prerrogativa de função nos Tribunais de Justiça, para os Prefeitos, Juízes de Direito e os membros do Ministério Público Estadual, nos casos de crime comuns ressalvados a competência da Justiça Eleitoral, assim como, prevê esta garantia nos Tribunais Regionais Federais para julgar os Juízes Federais, Juízes do Trabalho e Militares e os membros do Ministério Público da União, salvo os que exerçam suas funções perante Tribunais, que serão julgados pelo STJ. Tendo competência o Tribunal da área da respectiva jurisdição ou atribuições de cada privilegiado.
Além do foro privilegiado na Constituição Federal, poderá cada Constituição Estadual e as Leis Orgânicas Municipais também prever esta garantia aos seus membros, podendo, desta forma, os vice-prefeitos e vice-governadores, vereadores, parlamentares, e deputados também terem esta garantia de ser julgado por um órgão específico.
Cabe ressaltar, que o texto constitucional traz ressalva expressa em relação a estas prerrogativas, em razão da natureza da infração, desta forma as pessoas que têm ali o seu foro privativo serão, nos crimes comuns, como regra, julgados naqueles tribunais, a exceção dos crimes eleitorais, que apesar de serem crimes comuns, serão julgados pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Nestes casos, segundo entendimento jurisprudencial respaldado principalmente pelo art. 108, I, "a" da Constituição Federal, mesmo que o delito seja, em tese, da competência da Justiça Comum do local onde ocorreu o delito, o julgamento será perante o Tribunal de 2ª instância onde atue o autor do fato (JSTJ 46/532), ainda que a infração penal tenha sido praticada em outro Estado da Federação, pois, a competência pela prerrogativa de função sobrepõe-se à territorial. Neste sentido, aduz Fernando da Costa Tourinho Filho (2010, p. 324):
“A expressão “da área de sua jurisdição” contida no art.108, I, a, da CF, significa que o Tribunal Regional Federal julga, apenas, os Juízes Federais, os Juízes Auditores da Justiça Militar da União, Juízes do Trabalho e os membros do Ministério Público Federal que exercem suas funções dentro no seu território jurisdicional, pouco importando onde tenham cometido a infração.”
O art. 96, III, da Constituição estabelece que compete aos Tribunais de Justiça julgar os Juízes estaduais, mesmo quando acusados de crime de competência da Justiça Federal, por esta razão se um Juiz estadual ou Membro do Ministério Publico estadual praticar crime de alçada federal, ainda que se trate de crime doloso contra a vida, a competência para julgá-lo continuará sendo do Tribunal de Justiça.
4. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO DOS PREFEITOS
Impende ressaltar que, no caso dos Prefeitos esta prerrogativa de função é ainda menos rígida, desta forma, o foro privativo na jurisdição do Tribunal de Justiça somente se aplicará quando se tratar de crimes da competência estadual, nos casos de crimes Federais, fica ressalvada a competência da Justiça Federal, e, portanto caberá ao Tribunal Regional Federal julgar o infrator. No âmbito da Justiça Eleitoral, nos casos de crime desta natureza, a competência para julgar os prefeitos caberá ao Tribunal Regional Eleitoral. Corroborando com este entendimento, o Supremo Tribunal Federal possui Súmula versando sobre o tema:
Súmula 702 do STF: A competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça Comum Estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo Tribunal de segundo grau.
Contudo, de acordo com o entendimento Jurisprudencial, há uma interpretação por analogia desta súmula, e esta não se restringe mais somente ao prefeito, também englobando os deputados estaduais. Portanto, o foro de prerrogativa de função dessas pessoas que tem o Tribunal de Justiça como seu juiz natural deve se situar no 2º grau de jurisdição, por isto, como este Tribunal não tem, em regra, competência para julgar os crimes eleitorais ou os de alçada da justiça comum federal, deverá, conforme o caso, a jurisdição ser deslocada para Tribunal Regional Eleitoral ou do Tribunal Regional Federal.
Por outro bordo, o Tribunal de Justiça representa o 2º grau de jurisdição do Tribunal do Júri estadual, portanto nos casos de competência exclusiva deste tribunal a competência deverá ser deslocada para aquele.
Outra questão de fundamental importância quanto à prerrogativa de função dos prefeitos, refere-se à competência para julgar os crimes de desvio de verbas públicas realizados por estes. Neste sentido, existe duas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça, versando sobre o tema:
Súmula nº 208 do STJ: Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal.
Súmula nº 209 do STJ: Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal.
Desta forma, para o Superior Tribunal de Justiça, quando a verba desviada por prefeito pertencer a órgão federal, a matéria será pertinente a Justiça Federal, devendo o Tribunal Regional Federal da jurisdição do prefeito julgar tal crime; já quando a verba for patrimônio municipal, caberá julgamento perante a justiça estadual, sendo, portanto competência do Tribunal de Justiça.
5. FORO PRIVILEGIADO NO STJ
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é a corte de ultima instância da Justiça Brasileira para as causa infraconstitucionais, apreciando causas advindas de qualquer parte do território nacional, em todas as vertentes jurisdicionais não-especializadas.
O STJ julga os crimes comuns praticados por governadores dos estados e do Distrito Federal, crimes comuns e de responsabilidade de desembargadores dos tribunais de justiça e de conselheiros dos tribunais de contas estaduais, dos membros dos tribunais regionais federais, eleitorais e do Trabalho.
Além disso, julga habeas corpus que envolvam essas autoridades ou ministros de Estado, exceto os que estiverem relacionados com a Justiça Eleitoral. Também, aprecia recursos contra habeas corpus concedidos ou negados por tribunais regionais federais ou dos estados, assim como causas decididas nessas instâncias, sempre que envolverem lei federal.
Essa corte superior tem a competência prevista na Constituição Federal, estabelecendo os processos originários e os casos em que o tribunal age como órgão de revisão, incluindo os julgamentos de recursos especiais. No que tange os processos originários, com fulcro na Lei 8.038/90, o STJ obedecerá ao seguinte procedimento para as Ações penais Originárias: nos crimes de ação penal pública, o Ministério Público terá o prazo de quinze dias para oferecer denúncia ou pedir arquivamento do inquérito ou das peças informativas, vale ressaltar que outras diligências poderão ser deferidas pelo relator podendo haver interrupção do prazo supramencionado.
No caso em que o indiciado esteja preso, o prazo para oferecer denúncia reduz para cinco dias e qualquer outra diligência a ser tomada não acarretará interrupção desse prazo, exceto quando o relator, tendo deferido, determine o relaxamento da prisão. É importante observar que o relator terá as atribuições que a legislação determina aos juízes singulares.
Nas ações penais originárias o relator terá a competência de determinar o arquivamento do inquérito ou das peças informativas, quando o requerer o Ministério Público, ou submeter o requerimento à decisão competente do Tribunal; decretará a extinção da punibilidade, nos casos previstos em lei; a ele também caberá convocar desembargadores de Turmas Criminais dos Tribunais de Justiça ou dos Tribunais Regionais Federais, bem como juízes de varas criminais da Justiças dos Estados e da Justiça Federal, no prazo de seis meses, podendo prorrogar por mesmo período, limitando-se a dois anos para a realização do interrogatório e de outros atos da instrução, na sede do tribunal ou no local onde se deva produzir o ato.
Ao apresentar a denúncia ou a queixa ao Tribunal, será realizada a notificação do acusado para oferecer resposta no prazo de quinze dias. Juntamente com a notificação, deverá entregar cópia da denúncia ou da queixa, do despacho do relator e dos documentos por este indicado. Caso a notificação não seja efetivada por desconhecer o paradeiro do acusado ou devido a dificuldades em cumprir a diligência, a notificação ocorrerá por meio do edital, contendo o teor resumido da acusação, para que compareça ao Tribunal, em cinco dias, onde terá vista dos autos pelo prazo de quinze dias, a fim de apresentar a resposta.
Após isso, caso haja novos documentos anexados ao processo, será intimada a parte contrária para que ela possa se manifestar, no prazo de cinco dias. Se a ação penal for de iniciativa privada será ouvido, em igual prazo, o Ministério Público.
Seguindo os procedimentos, o relator pedirá um dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas. Nesse julgamento será facultada sustentação oral pelo prazo de quinze minutos, primeiro à acusação e depois à defesa. Ao fim dos debates, o Tribunal passará a deliberar determinando o Presidente as pessoas que poderão permanecer no recinto, isto é, as partes e seus advogados, ou somente a estes, se o interesse público exigir.
Na hipótese em que a denúncia ou a queixa foi recebida, o relator se encarregará de designar o dia e a hora para o interrogatório, mandando citar o acusado ou querelado e intimar o órgão do Ministério Público, bem como o querelante ou o assistente, se for o caso. O prazo para a defesa prévia será de cinco dias, contado do interrogatório ou da intimação do defensor dativo.
Na fase da Instrução, o procedimento seguirá o Código de Processo Penal. O relator poderá delegar a realização do interrogatório ou de outro ato da instrução ao juiz ou membro de tribunal com competência territorial no local de cumprimento da carta de ordem. Ademais, vale acrescentar que o relator expressamente determinará se as intimações serão feitas por carta registrada com aviso de recebimento.
Concluída a inquirição de testemunhas, serão intimadas a acusação e a defesa, para requerimento de diligências no prazo de cinco dias. Realizadas as diligências, ou não sendo estas requeridas nem determinadas pelo relator, serão intimadas a acusação e a defesa para, sucessivamente, apresentarem, no prazo de quinze dias, alegações escritas. Nos casos em que a ação penal é de iniciativa privada, o Ministério Público terá vista por igual prazo, após as alegações das partes.
Após as alegações escritas, o relator poderá determinar de ofício a realização de provas imprescindíveis para o julgamento da causa. Finalizando a instrução o tribunal procederá com o julgamento, na forma determinada pelo regimento interno, isto é, a acusação e a defesa terão, sucessivamente, prazo de uma hora para sustentação oral, assegurado ao assistente um quarto do tempo da acusação. Encerrado os debates, o Tribunal proferirá o julgamento, podendo o presidente limitar a presença no recinto das partes e seus advogados.
Esse julgamento ocorrerá em uma ou mais sessões, a critério do Tribunal, observando, no que for aplicável, o disposto no Código de Processo Penal. Além disso, o acórdão será lavrado pelo relator e, se vencido por este, pelo Ministro que for designado. E, nos casos em que somente se procede mediante queixa, será considerada perempta a ação penal quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais, tudo na forma da lei processual.
6. FORO PRIVILEGIADO NO STF
Quanto ao Supremo Tribunal Federal, a competência originária ratione personae atinge, segundo o art. 102, I, b, da Constituição Federal, as seguintes pessoas: o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o Procurador - Geral da República nas infrações penais comuns, portanto cabe ao supremo processar e julgar essas pessoas nas infrações penais comuns, que são aquelas infrações penais que não estão no rol dos crimes de responsabilidade.
Vale lembrar que a prerrogativa de foro por crime comum perante o STF não é extensiva ao suplente de Deputado ou de Senador, salvo quando convocado, conforme jurisprudência firmada pelo STF[1]. Além de processar e julgar nas infrações penais comuns, o STF também irá julgar nos crimes de responsabilidade: os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvada a hipótese do crime de responsabilidade possuir conexão com o Presidente da República ou do Vice-Presidente, hipótese em que haverá o deslocamento para que o Senado processe e julgue, nos moldes do art. 102, I, c/c o art. 52, I, ambos da Constituição Federal; os membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União; e por fim os chefes de missão diplomática de caráter permanente, que são os Embaixadores.
A nossa Lei Maior ao empregar a expressão “crime de responsabilidade” se refere às infrações político-administrativas, as quais não devem ser confundidas com os crimes funcionais, que envolve aqueles dos arts. 312 a 326 do Código Penal, intitulados de forma equivocada no Código de Processo Penal de “crimes de responsabilidade de funcionários públicos”.
O legislador ordinário trata das infrações praticadas pelos funcionários nos exercícios de suas funções, também conhecido como delitos funcionais. Conforme se observa no parágrafo único do art. 85 os crimes de responsabilidade tratados na Constituição serão delineados e esmiuçados em lei especial, a qual estabelecerá inclusive normas específicas do processo e julgamento dos mesmos. No entanto, como ainda não foi criada essa lei, entende-se ter sido recepcionada pela lei que define os crimes de responsabilidade.
De acordo com a nossa carta política, o Presidente, o Vice-Presidente da República, os Ministros de Estado e os Comandantes das três Armas, nos crimes conexos aos daqueles, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os Membros do Conselho Nacional de Justiça, os Membros do Conselho Nacional do Ministério Público, o Advogado-Geral da União e o Procurador – Geral da República serão processados e julgados pela Câmara alta. O judicium accusationis e o judicium causae ficaram afetos ao Senado.
Quando se trata de crime comum, o Advogado – Geral da União é processado e julgado pelo STF, pois se trata de Ministro de Estado, de acordo com o parágrafo único do art. 25 da Lei nº 10.683/03. Assim, por terem sido elevados à categoria de Ministros de Estado, passam a ter como foro privativo o Supremo Tribunal Federal.
Quanto ao procedimento da ação penal originária, é o mesmo descrito no tópico anterior quando tratamos do STJ, pois a referida lei trata dos procedimentos tanto no Superior Tribunal de justiça, quanto no Supremo Tribunal Federal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A razão para a existência do foro privilegiado consiste na cautela que deve ser dispensada a certos cargos de grande importância, prevenindo e evitando as pressões que poderiam advir do julgamento das autoridades de alto relevo do Estado em juízos de primeira instância. Sendo assim, objetiva-se valorizar as funções exercidas por tais autoridades, garantindo-lhes um julgamento por órgãos de maior graduação.
Nesse contexto, evidencia-se a relevância da competência por prerrogativa de função, que tem, em sua essência, o objetivo de um julgamento imparcial de ímprobo dos mais elevados cargos do Estado, sendo, por isso mesmo, competência estabelecida em razão do cargo, e nunca em razão da pessoa que o ocupa, não podendo ser tal competência afastada, tendo em vista a sua previsão direta na Constituição Federal.
REFERÊNCIAS
AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
[1] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. P. 991
Advogada, Graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Pós-graduada/Especialização em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Damásio.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DELGADO, Beatriz Macedo. O foro privilegiado e a ação penal originária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 mar 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46172/o-foro-privilegiado-e-a-acao-penal-originaria. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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