RESUMO: O hodierno artigo jurídico tem como desígnio analisar de forma lacônica algumas reflexões no que tange a Tutela Penal Econômica, bem como as principais conjecturas dirigidas à compreensão do conceito de bem jurídico Penal econômico.
PALAVRAS-CHAVE: Tutela; Penal; Crimes; Economia.
SUMÁRIO: Introito – Capítulo I. A seriedade da guarida Penal – Capítulo II. A demarcação do bem jurídico – Capítulo III. Delinquências econômicas – Capítulo IV. Conclusão – Referências.
INTROITO
Elaborar um aparelho jurídico penal depreca tempo e concretude de ideias, que nem de bem longe conseguem acompanhar a celeridade dos eventos no mundo contemporâneo.
Verifica-se então, um contexto cada vez mais assombroso de total desafino entre as estruturas penais clássicas e os instrumentos necessários ao eficaz combate dessa criminalidade vivenciada e expandida mundialmente.
O Direito penal clássico não consegue alcançar os sujeitos da criminalidade econômica, especialmente por que eles, não raramente, raiam como propulsores do alargamento econômico mundial.
O hodierno artigo jurídico tem como desígnio analisar de forma lacônica algumas reflexões no que tange a Tutela Penal Econômica, bem como as principais conjecturas dirigidas à compreensão do conceito de bem jurídico penal econômico.
CAPÍTULO I. A SERIEDADE DA GUARIDA PENAL
O Estado Democrático de Direito impõe importantes balizamentos em toda estrutura social, mormente na esfera penal, ante o poder interventivo que representa a limitação dos direitos fundamentais.
O Direito Penal representa a forma mais brutal de intervenção estatal na vida das pessoas, pois a única possibilidade de que sejam promovidas limitações em direitos fundamentais, na sociedade democrática, é a consequência penal ao delito, de sorte que, em seu conteúdo estão as sanções mais gravosas de todo o ordenamento positivo”.
Importa frisar que o poder punitivo não pode ser utilizado de forma indiscriminada, mas calcado no conceito de efetiva necessidade, sob pena de ao invés de constituir instrumento de proteção a interesses relevantes para o corpo social, assumir a obliquidade de agressão do Estado contra o cidadão.
Ressalta-se que a definição de bem jurídico dentro da ciência penal, ganhou enorme relevância após a Segunda Guerra Mundial. Sua principal função foi a de legitimar e dar validade às normas penais, sob o argumento de que não pode haver norma penal sem bem jurídico para tutelar.
O princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos em sua concepção mais moderna visa, portanto, retirar da possibilidade de atuação do sistema jurídico criminal, o conteúdo meramente moral ou pessoal, eis que o indivíduo não pode ser punido pelo que é ou pelo que pensa ou sente.
Além de se afastar da incidência penal conteúdos morais, observa-se que só será considerado relevante para fins penais aqueles interesses extraídos direta ou indiretamente do quadro axiológico constitucional.
Compreende-se que o conteúdo punitivo penal é bastante restrito, apenas se fazendo atual nos casos de necessidade protetiva de bens jurídicos relevantes, ou seja, agregados às diretrizes constitucionais.
De tal forma, cumpre sempre investigar sobre o objeto específico de proteção da norma, eis que a legitimidade da tipificação penal depende do efetivo ataque ao bem jurídico constitucionalmente protegido.
CAPÍTULO II. A DEMARCAÇÃO DO BEM JURÍDICO
As discussões, contudo, sobre quais seriam os bens jurídicos constitucionalmente tutelados também vêm sofrendo diversas transformações e se tornam cada vez mais abstrusas. Isto porque, após a década de 80, o direito penal como um todo, experimentou uma onda de expansão, fomentada pelas novas exigências de uma sociedade massificada e de risco, que clama por mais segurança, especialmente nos delitos de grande repercussão social, que atingem interesses difusos, como ocorrem nos denominados delitos dos prestigiados, tais como, os delitos econômicos, ambientais e políticos.
Nesse estreito, resta evidente um aparente contrassenso: na medida que o direito penal busca se expandir para atender os anseios sociais, ele se coloca no centro de uma severa crise, evidenciada pela inadequação de seus institutos clássicos à essa nova espécie de delinquência. Atualmente se defende a existência de um direito penal de duas velocidades, ou seja, duas maneiras diferentes de justificar e aplicar o sistema penal.
O bem jurídico pretende orientar a atividade legiferante de política criminal somente para realidades ou interesses relevantes para a vida em sociedade. Afastam-se interesses não relevantes para o convívio em sociedade, se garantindo, por conseguinte um ius puniendi mais racional e integrado a realidade fática, sendo certo que o direito penal não se estenda para áreas administrativas ou indefinidas.
O conceito de bem jurídico está em mutação, uma vez que por razões de política criminal o legislador penal tem utilizado tal conceito para regular atividades das áreas da vida social, econômica, ecológica, onde as condutas, apenas indiretamente, ocasionaram alguma espécie de lesão aos componentes concretos da vida individual.
Algumas teorias contemporâneas se propuseram à análise do bem jurídico. Após a Segunda Grande Guerra, o poder punitivo estatal foi mais uma vez limitado e a noção de bem jurídico foi reavaliada. A partir de então, podem ser identificadas duas correntes principais: as sociológicas e as constitucionais.
Como representantes da corrente sociológica merecem destaque Amelung, Hassemer e Habermas. Para Amelung o Direito Penal é fundado num conceito de dano social, e o direito tem que garantir condições para a convivência humana. Já para Hassemer é necessário o dano social para a legitimação punitiva, isto é, os bens jurídicos são considerados para a efetivação de uma política criminal De acordo com Habermas para que haja legitimidade do direito penal é imperativo que haja um consenso social sobre os problemas, assim sendo a criminalização de condutas dependeria do consenso social.
Nota-se que as teorias socialistas não conseguiram delimitar com precisão o conceito de bem jurídico, nem definir o que seria uma conduta lesiva, nem explicar o motivo pelo qual determinada sociedade criminaliza certas condutas, e outras não.
Dentre os adeptos do pensamento constitucionalista, cabe citar Claus Roxin. Segundo o autor, a única limitação para a eleição de bens jurídicos é a Constituição, levando-se em conta a liberdade do indivíduo e delimitando o ius puniendi do Estado. Nos Estados democráticos de Direito, há o estreitamento necessário a interação entre a proteção jurídico- penal de bens jurídicos e a Constituição.
Então, chega-se à conclusão de que o bem jurídico funciona no sentido limitador do poder punitivo estatal. Welzel afirmava que bem jurídico deveria ser aquele necessário para o resguardo da vida social, por conseguinte o direito num estado existe para proteger lesões.
CAPÍTULO III. DELINQUÊNCIAS ECONÔMICAS
Posteriormente a sucinta apreciação das doutrinas contemporâneas sobre bem jurídico, cumpre destacar o valor que a tutela penal assume nos delitos econômicos.
Orientando-se pela suposição de que a ordem econômica é objeto de proteção do direito penal, impende distinguir duas espécies de proteção, segundo adverte Reale:
(I) proteção ampla: não há uma individualização à tutela econômica, nem de forma direta nem em sentido técnico, porquanto o que se visa é a ordem jurídica da produção, distribuição e consumo de bens e serviços;
(II) proteção estrita: a ordem econômica deve tutelar a regulação jurídica do intervencionismo estatal na economia de uma nação, incluindo como objeto de proteção o próprio interesse do Estado, suscetível de concreção particularizada.
Posteriormente, o Autor questiona se a interferência penal no âmbito econômico já sinaliza o fracasso da convivência entre cidadãos. Isto porque, em suas palavras “não nos parecendo ser o castigo e a perseguição por meio da via criminal, o meio mais adequado para tutelar os dirigentes da comunidade que atentarem contra o livre mercado”, justificando tal argumento, pelo fato de que a maioria das punições penais econômicas já se encontram resguardadas por outras vias, tais como a administrativa ou a negocial.
O próprio jurista ainda acrescenta que os dois melhores instrumentos preventivos de contenção da criminalidade econômica são a informação e a organização administrativa. A informação enquanto meio que previne o desregramento do mercado e suas eventuais afrontas a economia, e a organização administrativa, no sentido de que incute a ideia de que os agentes estatais estão preocupados e atentos ao andamento da economia e sendo assim, maior deverá ser o respeito as regras do jogo, sob pena de efetiva sanção, seja pecuniária ou restritiva.
Conclui sobressaindo que a distinção entre a interferência penal ou administrativa se resume basicamente na natureza política da sanção proposta por cada uma das searas, figurando formal a diversidade entre os âmbitos de proteção, especialmente em função do órgão impositivo à sanção.
Por sua vez, Luiz Flávio Gomes defende que o direito penal não pode trabalhar com bens jurídicos extremamente amplos e dessa forma, a análise do bem jurídico tutelado deve ser feita em cada crime, no caso concreto.
O referido autor busca conter o fenômeno de expansão do direito penal e estimular o crescimento do Direito de Intervenção. Aduz que o direito penal deve ser aplicado apenas nas questões mais graves, as quais possui vocação para combater, sob pena de se transformar num direito penal simbólico.
Em contraposição, Leonardo Sica levanta importante observação acerca dessa “vocação” do direito penal para tutela de bens meramente individuais. Acrescenta que bens tão relevantes ao ser humano e à sociedade, na verdade, são tutelados por todos, ou vários, ramos do direito:
“errônea a ideia de que saúde, honra, administração pública, costumes, patrimônio, dentre outros, são bens resguardados apenas – ou mesmo primordialmente - pelo Direito Penal. Desse modo, a divisão dos ramos do direito, ocorre muito mais com base na estrutura da situação que atente ao bem jurídico, do que na natureza deste. ”
Note-se que os delitos econômicos acabam colocando em cheque essa vocação individualista do direito penal, pois reclamam a tutela penal de bens jurídicos supra individuais. Afasta-se da visão predominantemente antropocêntrica de bem jurídico em prol de uma visão com forte influência da sociedade de risco.
Diante desse novo contexto, a tutela penal de bens de conteúdo abstrato se torna cada vez mais frequente, dificultando a identificação em um indivíduo em particular os reflexos dos valores protegidos pelo direito penal. Aliás, a característica principal dos bens jurídicos penais supra individuais é a titularidade em caráter não pessoal, afetando um grupo de pessoas ou toda a coletividade, sem perder a referência individual.
Sobre esse tema, descreve Alice Bianchini:
“A preocupação com condutas que venham a violar a ordem econômica, tal qual ocorre em relação ao meio ambiente, passaram a integrar o direito repressivo a pouco tempo, constituindo-se em modernas formas de criminalidade. Suas peculiaridades diferem, sobremaneira, da denominada criminalidade clássica, já que transcende direitos consagrados no âmbito individual, para ocupar-se com a violação de bens jurídicos cuja ofensa afeta a coletividade, ainda que não possa percebê-la diretamente. Possui, portanto, caráter supra individual”
Não se pretende aqui desprezar as dificuldades inerentes a tipificação penal desses delitos. Justamente a ausência de dano facilmente identificável assim como de vítimas definidas, propicia a criação pelo legislador de crimes de perigo, sobretudo abstrato, a priori, em afronta à princípios basilares do direito penal, como o da ofensividade.
Entretanto, a despeito das abalizadas opiniões, acredita-se que a Administração pública não possui nenhuma vocação para conduzir processos, nem aplicar penas mais graves. Isto porque não se pode fazer tabula rasa quanto à gravidade dos delitos econômicos e os prejuízos deles advindos.
É certo que o modelo de Direito Penal Clássico, de cunho individualista, não fornece respostas fáceis de combate à criminalidade moderna, ao revés, para problemas complexos se exigem respostas igualmente complexas e conjunturais. Mas antes de se negar a sua aplicação, desafia os operadores do direito e os teóricos a evoluir, a buscar alternativas, aliás, como é natural no desenvolvimento das ciências.
Ademais, apenas o Direito Penal se encontra suficientemente sistematizado e composto por um conjunto de garantias que não podem ser postas de lado. E somente a Carta Constitucional de 1988 possui legitimidade para elencar os bens jurídicos que merecem especial proteção. Aplica-se o princípio da subsidiariedade, segundo o qual, o direito penal deve atuar nas hipóteses de maior ou mais grave violação ao bem jurídico constitucionalmente tutelado.
Comporta ainda atentar que a criação de novas categorias ou searas punitivas toda vez que surgir uma nova espécie de criminalidade que não se adapte perfeitamente ao modelo anterior, pode se revelar temerária ou trazer insegurança jurídica.
CAPÍTULO IV. CONCLUSÃO
Almejar sagrar o Direito Penal como a saída para todos os problemas modernos, não é a solução, mas, não há ambiguidade de que tal ramo jurídico compõe uma admirável ferramenta. Se empregado adequadamente, com todas as garantias e princípios que lhe são inerentes, acomodados às novas espécies de criminalidade e as suas peculiaridades, não há de se transformar em um mero direito penal simbólico.
Subsistirá um direito mais pausado para algumas espécies de criminalidade, e para outros, mais célere, adaptado assim, às exigências de combate à criminalidade moderna. Atenta-se de tal forma, ao que determinados doutrinadores, cognominam de Direito Penal bi veloz.
V. REFERÊNCIAS
COSTA. Gisela França da. Bem Jurídico e Estado Democrático de Direito. Disponível em: www.castelobranco.br/pesquisa/vol4/pdfs/REVISTA_ELETRONICA_DE_DIREITO_DA_UCBBEM_JURIDIPENAL_E_ESTADO_DEMOCRATICO_DE_DIREITO.pdf.
GOMES, LUIZ Flávio Gomes. As grandes transformações do direito penal tradicional. Série as ciências criminais no século XXI. São Paulo. RT,2005.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito penal Brasileiro, vol.1. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
REALE, Miguel. Legislação penal antitruste: direito penal econômico e sua acepção constitucional. Disponível em www.realeadvogados.com.br . Acesso em 01 de dezembro de 2015.
ROCHA, Patrícia Barcelos Nunes de Mattos. As transformações do Direito Penal clássico. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, nº 193. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1521>
ROXIN, Claus. Derecho penal, parte geral. Madrid: Civitas, 1997.p.52, apud GOMES, Luiz Flávio As Grandes transformações do direito penal tradicional. São Paulo, 2005.
SICA, Leonardo. Caráter simbólico da intervenção penal na ordem econômica. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, n.02, julho-dezembro de 1998. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. Aproximación al derecho penal contemporâneo. Barcelona: Bosch, 1992. p.182.
TASSE, Adel el. Crime contra o Sistema Financeiro Nacional: O bem jurídico específico necessário para a incidência da lei nº 7492/86 à determinação da conduta.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TEIXEIRA, André Luiz Rapozo de Souza. O que protege o direito penal econômico? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 abr 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46362/o-que-protege-o-direito-penal-economico. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
Precisa estar logado para fazer comentários.