RESUMO: O presente artigo pretende expor reflexões sobre o concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes, previsto no artigo 67 do Código Penal (CP), à luz da jurisprudência dos Tribunais Superiores. O ensaio tecerá comentários a respeito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que considera como preponderante a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, CP), compensando-a com a agravante da reincidência (art. 61, I, CP), com a agravante relativa ao crime cometido com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do CP), bem assim com a agravante da promessa de recompensa (art. 62, IV, CP). Será abordada ainda a divergência em relação à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que considera a agravante da reincidência preponderante à atenuante da confissão espontânea.
PALAVRAS-CHAVE: Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Jurisprudência dos Tribunais Superiores.
COMMENTS ON THE POSSIBILITY OF COMPENSATION OF AGGRAVATING AND MITIGATING CIRCUMSTANCES, BASED ON JURISPRUDENCE OF THE SUPERIOR COURTS.
ABSTRACT: This article aims to present reflections on the competition of aggravating and mitigating circumstances provided for in article 67 of the Criminal Code (CP), in the light of the jurisprudence of the Superior Courts. This essay test will weave comments about the jurisprudence of the High Court of Justice which considers dominant the attenuating of spontaneous confession (art. 65, III, "d", CP), compensating it with the aggravating circumstance of recidivism (Art. 61, I CP), with the aggravating circumstance on the crime committed with use of violence against women (art. 61, II, "f", the CP), as well as with the aggravating circumstance of promise of reward (art. 62, IV, CP ). It will be also discussed the divergence from the jurisprudence of the Supreme Court, which considers the aggravating of recurrence preponderant to the attenuating of spontaneous confession.
KEYWORDS: Competing aggravating and mitigating circumstances. Jurisprudence of the Superior Courts.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. O Procedimento de fixação da pena. 2.2. A dosimetria da pena. 2.3. O concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Possibilidade de compensação entre a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, CP) e a agravante da reincidência (art. 61, I, CP), a agravante do crime praticado com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do CP) e a agravante do crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa (art. 62, IV, CP). 3. Conclusão.
A Constituição Federal, em seu artigo, 5º, inciso XLVI, determina que competirá à lei regulamentar a individualização da pena. O Código Penal (CP), concretizando a norma constitucional, adotou, quanto ao sistema de individualização da pena, o sistema da pena determinada. De acordo com esse sistema o julgador deverá fixar a pena dentro de limites mínimos e máximos indicados prévia e abstratamente pela lei, que igualmente estabelece critérios que o magistrado deverá seguir na aplicação da pena (ESTEFAM; GONÇALVES, 2015).
Já no que tange à fixação da dosimetria da pena, o Código Penal adotou o critério trifásico de aplicação da pena, previsto no art. 68 do Código Penal. Segundo esse critério, as circunstâncias agravantes, previstas nos artigos 61 e 62 do Código Penal, e as circunstâncias atenuantes, previstas nos artigos 65 e 66 do mesmo diploma legal, serão analisadas na segunda fase de dosimetria da pena.
Pode ocorrer de incidirem em um mesmo crime tanto circunstâncias agravantes como atenuantes, o art. 67 do Código Penal trata do tema, determinando que a pena deverá se aproximar das circunstâncias preponderantes, entendendo como tal as que dizem respeito aos motivos determinantes do crime, à personalidade do agente e à reincidência.
O presente artigo abordará a questão do concurso entre circunstâncias agravantes e atenuantes à luz da jurisprudência dos Tribunais Superiores, notadamente entre a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, CP) e a agravante da reincidência (art. 61, I, CP), a agravante do crime praticado com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do CP) e a agravante do crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa (art. 62, IV, CP). Será demonstrada ainda a divergência entre a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça quanto à possibilidade de compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência.
2. DESENVOLVIMENTO.
2.1. O Procedimento de fixação da pena.
De início, sobre o conceito de fixação da pena, importa destacar a lição do mestre Guilherme de Souza Nucci:
Conceito de fixação da pena: trata-se de um processo judicial de discricionariedade juridicamente vinculada visando à suficiência para prevenção e reprovação da infração penal. O juiz, dentro dos limites estabelecidos pelo legislador (mínimo e máximo, abstratamente fixados para a pena), deve eleger o quantum ideal, valendo-se do seu livre convencimento (discricionariedade), embora com fundamentada exposição do seu raciocínio (juridicamente vinculada). Na visão de LUIZ LUISI, “é de entender-se que na individualização judiciária da sanção penal estamos frente a uma ‘discricionariedade juridicamente vinculada’. O Juiz está preso aos parâmetros que a lei estabelece. Dentre deles o Juiz pode fazer as suas opções, para chegar a uma aplicação justa da lei penal, atendo as exigências da espécie concreta, isto é, as suas singularidades, as suas nuanças objetivas e principalmente a pessoa a que a sanção se destina. [...] Diz a Exposição de Motivos do Código de Processo Penal: “A sentença deve ser motivada. Com o sistema do relativo arbítrio judicial na aplicação da pena, consagrado pelo novo Código Penal, e o do livre convencimento do juiz, adotado pelo presente projeto, é a motivação da sentença que oferece garantia contra os excessos, os erros de apreciação, as falhas de raciocínio ou de lógica ou os demais vícios de julgamento[1]. (Destaques acrescidos).
Conforme exposto brevemente na introdução deste artigo, a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XLVI, delegou ao legislador ordinário a competência para regular a individualização da pena, estabelecendo as seguintes penas:
Art. 5º, XLVI, CF/88 - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
Regulamentando o processo de aplicação da pena, o artigo 59 do Código Penal determina:
Fixação da pena
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.
Como se vê, o magistrado deverá seguir a seguinte ordem na aplicação da pena: a) primeiro irá verificar qual o tipo de pena prevista em lei para o delito cometido, se reclusão, detenção ou multa; b) na sequência deverá proceder com a dosimetria da pena, a fim de definir a quantidade de pena a ser aplicada (tema melhor abordado no tópico seguinte); c) fixado o quantum de pena, será analisado o regime de cumprimento da pena, em conformidade com o artigo 33 do Código Penal; e d) por fim, deverá avaliar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por outras penas, como, por exemplo, as penas restritivas de direito (art. 44 do Código Penal).
2.2. A dosimetria da pena.
Definido o tipo de pena prevista em lei para o delito imputado ao agente, o próximo passo, conforme exposto, será determinar a quantidade da pena aplicável, dentro dos limites impostos pela lei.
No que tange à dosimetria da reprimenda, o Código Penal, em seu artigo 68, adotou o método trifásico de fixação da pena, preconizado por Nelson Hungria.
Cálculo da pena
Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.
Como se vê, em um primeiro momento o juiz analisará as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, na sequencia considerará as circunstâncias agravantes e atenuantes (artigos 61, 62, 65 e 66, todos do Código Penal) e, ao final, as causas de aumento e de diminuição de pena.
Seguindo esse método, na primeira fase de aplicação de pena o magistrado sopesará as circunstâncias judicias previstas no artigo 59 do Código Penal, quais sejam: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias, as consequências do crime e o comportamento da vítima. Ao fixar a pena-base o magistrado deverá observar os limites indicados no preceito secundário do tipo penal.
Nesse ponto, importante ressaltar que a lei não prevê um patamar mínimo e máximo a ser atribuído a cada circunstância judicial, ficando esse quantum a critério do juízo sentenciante, que sempre deverá motivar a sua decisão, bem como se pautar pelo princípio da proporcionalidade.
Muito embora a lei não preveja o limite mínimo e máximo para incidência de cada circunstância judicial, a jurisprudência estipula razoável que o aumento observe a fração de 1/6 (um sexto) da pena para cada circunstância judicial. Caso o juiz, diante das circunstâncias do caso concreto, entenda que o fato praticado merece uma maior reprovabilidade, deverá fundamentar a razão pela qual atribuí à determinada circunstância fração de aumento superior a 1/6 (um sexto), sob pena de configurar constrangimento ilegal.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. RESTRIÇÃO DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO. NOVA ORIENTAÇÃO DESTA CORTE SUPERIOR E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. DOSIMETRIA. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÕES DISTINTAS PARA CARACTERIZAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES E REINCIDÊNCIA. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE EM 3/4 (TRÊS QUARTOS) PELA EXISTÊNCIA DE 3 (TRÊS) CONDENAÇÕES ANTERIORES. ACRÉSCIMO DESPROPORCIONAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE EVIDENCIADA. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. O atual entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que não deve ser conhecido o habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Nada impede, contudo, que se verifique a existência de flagrante constrangimento ilegal que autorize a concessão de habeas corpus de ofício, notadamente porque a impetração é anterior à referida mudança jurisprudencial.
2. Inexiste o alegado bis in idem, pois a pacífica orientação do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, havendo mais de uma condenação, está o julgador autorizado a utilizar uma para caracterização da reincidência e as demais para majoração da pena-base na primeira fase do cálculo da pena.
3. O aumento no patamar de 3/4 a título de maus antecedentes, ainda que levado em consideração tratar-se de três condenações anteriores, mostra-se desproporcional e por demais severo. Muito embora a lei não estabeleça o patamar mínimo e o máximo para incidência de cada circunstância judicial, sedimentou-se no Superior Tribunal de Justiça a orientação de que o acréscimo superior a 1/6 (um sexto) para cada circunstância judicial desfavorável deve ser devidamente justificado.
Apontada na sentença a existência de três condenações para caracterização dos maus antecedentes, está autorizada a fixação da pena-base em patamar acima do mínimo, contudo, sem chegar aos 3/4 adotados pelas instâncias ordinárias. Na linha dos precedentes desta Corte, mostra-se adequado e suficiente para reprovação e prevenção da conduta o acréscimo em 1/3 (um terço) na pena-base pelo reconhecimento dos maus antecedentes.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para reduzir a pena imposta ao paciente para 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 16 (dezesseis) dias de reclusão, mais 20 (vinte) dias-multa. (STJ, HC 180.514/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 12/04/2016, DJe 20/04/2016). (Destaques acrescidos).
Na segunda fase de aplicação da pena, partindo da pena-base fixada na primeira fase de aplicação da pena, o juiz analisará as circunstâncias agravantes e atenuantes. Tais circunstâncias são chamadas genéricas, pois previstas na parte geral do Código Penal. Segundo Rogério Sanches (2015, p. 406) “[...] as agravantes e atenuantes genéricas podem ser definidas como circunstâncias objetivas ou subjetivas que não integram a estrutura do tipo penal, mas se vinculam ao crime, devendo ser consideradas pelo juiz no momento de aplicação da pena”.
As circunstâncias agravantes estão previstas nos artigos 61 e 62 do Código Penal:
Circunstâncias agravantes
Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:
I - a reincidência;
II - ter o agente cometido o crime:
a) por motivo fútil ou torpe;
b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;
c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;
d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;
g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão;
h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida;
i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;
j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido;
l) em estado de embriaguez preordenada.
Agravantes no caso de concurso de pessoas
Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que:
I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes;
II - coage ou induz outrem à execução material do crime;
III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal;
IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa.
Por sua vez, as circunstâncias atenuantes estão previstas nos artigos 65 e 66 do Código Penal:
Circunstâncias atenuantes
Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença;
II - o desconhecimento da lei;
III - ter o agente:
a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;
e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.
Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.
Em que pese a lei seja silente sobre o assunto, a doutrina e a jurisprudência entendem que na segunda fase o juiz também estará atrelado ao limite mínimo e máximo de pena previstos pelo legislador no preceito secundário da norma incriminadora.
Nesse sentido é o teor da Súmula nº 231, do Superior Tribunal de Justiça: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. (TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/09/1999, DJ 15/10/1999, p. 76).
A lei também não previu patamar mínimo e máximo a ser atribuído a cada circunstância agravante ou atenuante, ficando a critério do juiz, sendo considerado proporcional pela jurisprudência, assim como na primeira fase de aplicação de pena, a fração de 1/6 (um sexto) de pena a ser atribuída a cada circunstância agravante ou atenuante:
PENAL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PENA-BASE. ART. 42 DA LEI DE DROGAS. EXASPERAÇÃO. LEGALIDADE. ART. 33, § 4°, DA LEI N. 11.343/2006. INAPLICABILIDADE. AGENTE QUE TRANSPORTA ENTORPECENTES NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO DE "MULA". REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. REGIME INICIAL FECHADO. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. ELEVADA QUANTIDADE DE DROGA.
1. A dosimetria da pena está inserida no âmbito de discricionariedade do julgador, estando atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas dos agentes, elementos que somente podem ser revistos por esta Corte em situações excepcionais, quando malferida alguma regra de direito.
2. Na hipótese do tráfico ilícito de entorpecentes é indispensável atentar para o que disciplina o art. 42 da Lei 11.343/2006, segundo o qual o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.
3. No caso concreto, o Tribunal de origem expressamente fundamentou a majoração da pena-base, considerando, em especial, a quantidade e a qualidade da droga apreendida - 1.118 gramas de cocaína -, nos termos do art. 42 da Lei 11.343/2006, não se mostrando desproporcional ou desarrazoada, porquanto fundamentada a fração em elementos concretos e dentro do critério da discricionariedade vinculada do julgador.
4. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que o acusado, enquanto no exercício da função de transportador ("mula"), integra organização criminosa e, portanto, não preenche os requisitos exigidos para a aplicação da causa de diminuição de pena descrita no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.
5. "O Código Penal não estabelece frações fixas de aumento ou diminuição da pena quando do reconhecimento de atenuantes, sendo dever do magistrado, com base em elementos concretos dos autos, determiná-las de forma fundamentada" (AgRg no REsp 1362030/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 10/11/2015, DJe 19/11/2015).
6. Nessa linha, a jurisprudência do STJ tem se consolidado no sentido de reconhecer que, não obstante a legislação não estabelecer frações específicas para o aumento ou diminuição em razão das agravantes e atenuantes, a fração de 1/6 (um sexto) mostra-se razoável e proporcional, de modo que é efetivamente desproporcional a redução da pena em somente 1/13 em decorrência da atenuante da confissão espontânea, sem qualquer justificativa.
7. Em se tratando de tráfico de entorpecentes, desde o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do HC n. 111.840/ES, inexiste a obrigatoriedade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados, determinando, também nesses casos, a observância do disposto no art. 33, §§ 2º e 3º, c/c o art. 59, do Código Penal.
8. No entanto, verifico que, não obstante o recorrente seja tecnicamente primário, condenado a pena privativa de liberdade superior a 4 e não excedente a 8 anos, houve a fixação de circunstâncias judiciais desfavoráveis, envolvendo o presente caso tráfico transnacional de expressiva quantidade e deletéria natureza dos entorpecentes - 1.118 g de cocaína - , o que justifica a manutenção do regime inicial fechado.
9. Agravo regimental parcialmente provido para, aplicando a fração de 1/6 referente à atenuante genérica da confissão espontânea, fixar a pena privativa de liberdade em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 675 dias-multa. (STJ, AgRg no REsp 1288284/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 29/04/2016). (Destaques acrescidos).
Poderá se processar no contexto de um mesmo crime a ocorrência tanto de circunstância agravantes como atenuantes. Nesse caso, sobrevindo o concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes, o artigo 67 do Código Penal estabelece que a pena deverá se aproximar das circunstâncias preponderantes, considerando como tais as que dizem respeito aos motivos determinantes do crime, à personalidade do agente e à reincidência. Esse é exatamente o tema do nosso ensaio, que será melhor delineado nos tópicos posteriores.
Por fim, na terceira fase de aplicação da pena serão analisadas as causas de aumento e de diminuição de pena, são as majorantes e minorantes. As causas de aumento de pena podem estar previstas na parte geral, na parte especial do Código Penal e ainda na legislação extravagante. Aqui o juiz não estará restrito aos limites mínimos e máximos impostos no preceito secundário da pena.
Vale ressaltar que havendo concurso homogêneo de causas de aumento ou de diminuição, isto é, mais de uma causa de aumento ou mais de uma causa de diminuição, previstas na parte especial do Código Penal, poderá o juiz aplicar só um aumento ou só uma diminuição, prevalecendo a que mais aumente ou diminua (art. 68, parágrafo único, Código Penal).
Observe que não se trata de concurso heterogêneo, isto é, concurso entre causas de aumento e de diminuição, nesse caso o juiz deverá aplicar tanto a majorante quanto a minorante.
Deveras, o critério trifásico de aplicação de pena permite que a individualização da pena se proceda de uma maneira racional, objetiva, privilegiando o exercício do direito de defesa, na medida em que expõe ao réu os parâmetros que motivaram o juiz a fixar determinada reprimenda (CUNHA, 2015).
2.3. O concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Possibilidade de compensação entre a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, CP) e a agravante da reincidência (art. 61, I, CP), a agravante do crime praticado com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do CP), bem como a agravante do crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa (art. 62, IV, CP).
Conforme exposto, o artigo 67 do Código Penal versa sobre o concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes:
Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes
Art. 67 - No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência.
Isso significa que em um mesmo contexto, caso coexistam circunstâncias agravantes e atenuantes, o juiz sentenciante, na segunda fase de aplicação da pena, deverá analisar quais dessas circunstâncias são consideradas preponderantes. Se nenhuma das duas circunstâncias forem preponderantes ou se ambas as circunstâncias forem preponderantes haverá compensação, mantendo-se a pena inalterada. De outro modo, havendo o confronto entre uma circunstância genérica comum e outra preponderante, a pena deverá aproximar-se da circunstância preponderante, reduzindo, caso a circunstância preponderante seja uma atenuante, ou aumentando, caso seja uma agravante.
Destarte, as circunstâncias preponderantes são aquelas que dizem respeito aos motivos determinantes do crime, à personalidade do agente e à reincidência.
Tema que vem gerando grande controvérsia entre os Tribunais Superiores é a possibilidade de compensação entre a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do Código Penal) e a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal).
Antes de ingressar propriamente no tema, cumpre ressaltar julgado do Superior Tribunal de Justiça que bem explica os limites dados por essa Corte aos conceitos de confissão espontânea e reincidência:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO. COMPENSAÇÃO ENTRE ATENUANTE DE CONFISSÃO COM AGRAVANTE DE REINCIDÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Se a confissão do acusado foi utilizada para corroborar o acervo probatório e fundamentar a condenação, deve incidir a atenuante prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal, sendo irrelevante o fato de a confissão ter sido espontânea ou não, total ou parcial, ou mesmo que tenha havido posterior retratação.
2. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, pacificado por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.341.370/MT, da relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea são igualmente preponderantes, pelo que devem ser compensadas.
3. Para o reconhecimento da reincidência são necessários os seguintes pré-requisitos: a) a condenação, por crime, com trânsito em julgado anterior à prática do novo delito; b) não superação do prazo de cinco anos entre a data do cumprimento da pena relativa ao crime anterior, ou a declaração de extinção de sua punibilidade; e c) prática do novo delito. Reincidência não reconhecida.
4. Agravo regimental não provido. Provimento alterado para fixar a nova pena. (STJ, AgRg no REsp 1567351/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016). (Destaques acrescidos).
No que tange à atenuante da confissão espontânea, o Superior Tribunal de Justiça, inclusive, editou a Súmula nº 545, que afirma: “Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal”. (TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe 19/10/2015).
A aludida Súmula abrange as hipóteses de confissão retratada, confissão qualificada e confissão parcial. Assim, sempre que o réu confessar a pratica do delito e a confissão interferir no convencimento do julgador, fará jus à atenuante da confissão espontânea (artigo 65, III, d, do Código Penal).
Voltando ao tema propriamente dito, o Superior Tribunal de Justiça, assim como parte da doutrina, entende que a atenuante da confissão espontânea configura circunstância preponderante, por relacionar-se à personalidade do agente, na medida em que demonstra a capacidade do réu de reconhecer seus erros e assumir suas consequências (CUNHA, 2015). Sendo considerada circunstância preponderante, essa Corte conclui que a atenuante da confissão espontânea poderá ser compensada com a agravante da reincidência.
Sob esse prisma, deliberou seguindo a sistemática dos recursos repetitivos:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (ART. 543-C DO CPC). PENAL. DOSIMETRIA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA E REINCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. É possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência.
2. Recurso especial provido. (STJ, REsp 1341370/MT, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2013, DJe 17/04/2013). (Destaques acrescidos).
Nesse pórtico, válido destacar o escólio de Guilherme de Souza Nucci:
Reincidência versus confissão espontânea: vínhamos sustentando devesse a reincidência, por ser preponderante, superar a atenuante da confissão espontânea. Admitíamos que a confissão espontânea, para ser reconhecida como abrandamento da pena, haveria de ser sincera – o real alcance e significado de espontaneidade, sem subterfúgios, com intenção de colaborar com a Justiça. E defendíamos constituir a espontaneidade, em alguns casos, fruto de aspecto positivo da personalidade do agente. Quando assim fosse, a confissão espontânea tornar-se-ia, igualmente, preponderante, pois personalidade é um dos elementos indicados no art. 67 do Código Penal. Em suma, admitida a confissão espontânea como preponderante, em confronto com a reincidência, haveria compensação entre ambas. Porém, na nossa atividade judicante, notamos a carência de provas e dados para detectar quando a confissão espontânea é fruto da personalidade positiva do agente – e quando seria por outros fatores. Desse modo, não se pode prejudicar o réu, buscando uma prova que, na maioria das vezes, inexiste nos autos, gerando dúvida mais que razoável acerca da origem da confissão espontânea. Por outro lado, é de se supor que, sendo espontânea, é sincera, representando, de algum modo, fiel espelho de uma personalidade íntegra no tocante à assunção dos próprios erros. Diante disso, alteramos a nossa posição, passando a admitir a compensação entre reincidência e confissão espontânea, basicamente lastreados no princípio constitucional do in dubio pro reo. [...][2].
Todavia, necessário observar que o Superior Tribunal de Justiça faz uma ressalva, não admitindo a integral compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea quando o réu for multirreincidente, isto é, quando o agente for reincidente em mais de um crime.
Com efeito, constatada hipótese de multirreincidência, haverá uma proporcional compensação, preponderando a circunstância agravante da reincidência:
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. NÃO CONHECIMENTO.
1. A via eleita revela-se inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes.
2. Contudo, o alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal.
TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CULPABILIDADE. ELEVADA QUANTIDADE DE ENTORPECENTE APREENDIDO.
POSSIBILIDADE. AUMENTO PROPORCIONAL. ILEGALIDADE NÃO DEMONSTRADA.
1. Na fixação da pena-base de crimes previstos na Lei n.
11.343/2006, como ocorre na espécie, deve-se considerar, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância entorpecente, a personalidade e a conduta social do agente, consoante o disposto no artigo 42 da Lei de Drogas.
2. Na espécie, a reprimenda de piso acima do mínimo legal, em razão da culpabilidade e da excessiva quantidade do estupefaciente apreendido, encontra-se devidamente justificada e proporcional as especificidades do caso versado.
COMPENSAÇÃO ENTRE A REINCIDÊNCIA E A CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PACIENTE QUE OSTENTA VÁRIAS CONDENAÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
1. A compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea pressupõe a existência de apenas uma condenação transitada em julgado contra o acusado.
2. Tratando-se de condenado multirreincidente, mostra-se inviável promover a compensação integral e exata entre a confissão e a reincidência.
3. Habeas corpus não conhecido. (STJ, HC 344.193/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/04/2016, DJe 19/04/2016). (Destaques acrescidos).
Assim, verificado que o réu é reincidente em mais de um crime, tendo confessado espontaneamente o delito, o Superior Tribunal de Justiça entende que deverá haver a compensação entre a circunstância agravante e a atenuante, porém não de forma integral, preponderando a agravante.
Analisando o caso, o Superior Sodalício manifestou-se pela possibilidade do aumento da pena-base na fração de 1/8 (um oitavo), percentual inferior à que usualmente se atribui às agravantes genéricas, que, apesar de não ter parâmetro previsto na lei, é aplicada na fração de 1/6 (um sexto). Observe:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. USO DE DOCUMENTO FALSO. AUTODEFESA. ATIPICIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RÉU MULTIREINCIDENTE. DOSIMETRIA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. MAUS ANTECEDENTES E RECIDIVA. BIS IN IDEM NÃO EVIDENCIADO. COMPENSAÇÃO ENTRE AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PREPONDERÂNCIA DA AGRAVANTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM NÃO CONHECIDA.
1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. No caso, não se observa flagrante ilegalidade a justificar a concessão do habeas corpus de ofício.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que não fica afastada a tipicidade do delito previsto no art. 304 do Código Penal em razão de a atribuição de falsa identidade originar-se da apresentação de documento à autoridade policial, quando por ela exigida, não se confundindo o ato com o mero exercício do direito de defesa. Precedentes.
3. Não se infere manifesta desproporcionalidade na pena imposta, porquanto a jurisprudência desta Corte admite a utilização de condenações anteriores transitadas em julgado como fundamento para a fixação da pena-base acima do mínimo legal, diante da valoração negativa dos maus antecedentes, da conduta social e, ainda, da personalidade do agente, ficando apenas vedado o bis in idem.
4. A Terceira Seção, em 10/4/2013, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.341.370/MT, de Relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, firmou o entendimento de que, observadas as especificidades do caso concreto, "é possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência".
5. Tratando-se de réu multireincidente, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal, sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade. (Precedentes.) Assim, mostra-se razoável a exasperação da pena em 1/8 na segunda fase da dosimetria.
6. Habeas corpus não conhecido. (STJ, HC 313.868/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 17/03/2016, DJe 29/03/2016). (Destaques acrescidos).
Em outra oportunidade, o Superior Tribunal de Justiça destacou a impossibilidade de compensação integral entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência quando o réu ostentar a condição de reincidente específico, isto é, for reincidente na prática de crime da mesma espécie. Segundo essa Corte a reincidência específica revela a maior reprovabilidade da conduta do agente.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. RECEPTAÇÃO. ABSOLVIÇÃO. VEDAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. ART. 155 DO CPP. DOSIMETRIA. MULTIRREINCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO COM A CONFISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. No processo penal, vigora o princípio do livre convencimento motivado, em razão do qual pode o julgador livremente absolver ou condenar, desde que sua decisão seja suficientemente motivada e apoiada sobre as provas produzidas sob o contraditório judicial, conforme verificado nos autos.
2. Constatada a regularidade das decisões proferidas pela Corte de origem, não é cabível a apreciação do pedido de absolvição, pois a alteração da convicção motivada da instância ordinária demandaria reexame aprofundado do quadro fático-probatório, inviável no rito de cognição sumária da ação constitucional.
3. Não há que se falar em inobservância ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal, visto que o Juiz sentenciante confrontou elementos informativos obtidos na fase extrajudicial (como o depoimento de testemunhas) com as provas colhidas judicialmente, submetidas, portanto, ao crivo do contraditório.
4. Não se permite a compensação integral entre a confissão e a reincidência, quando a recidiva do réu for específica e numerosa, por evidenciar maior reprovabilidade da conduta.
5. Habeas corpus não conhecido. (STJ, HC 337.809/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 03/12/2015). (Destaques acrescidos).
Noutro viés, utilizando-se do mesmo raciocínio aplicado à agravante da reincidência, o Superior Tribunal de Justiça já entendeu pela possibilidade de compensação entre a circunstância agravante concernente ao crime cometido com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do Código Penal) e a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do Código Penal).
Argumentou-se que se tratavam de circunstâncias igualmente preponderantes, uma vez que a circunstância agravante do emprego de violência contra a mulher diz respeito aos motivos determinantes do crime e a circunstância atenuante da confissão, como exposto em linhas anteriores, refere-se à personalidade do agente:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 59 E 68, AMBOS DO CP. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DA CULPABILIDADE, PERSONALIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME VALORADAS NEGATIVAMENTE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PENA-BASE REDUZIDA. OFENSA AOS ARTS. 65, III, "D", E 67, AMBOS DO CP. COMPENSAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DO CRIME TER SIDO PRATICADO COM VIOLÊNCIA CONTRA MULHER. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS IGUALMENTE PREPONDERANTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Ausentes fundamentos idôneos, aptos a permitir a valoração negativa das circunstâncias judiciais da culpabilidade, da personalidade e das circunstâncias do crime, elas não podem ser utilizadas para fundamentar a majoração da pena-base quando da realização da dosimetria.
2. Esta Corte Superior tem firme entendimento de que a atenuante da confissão espontânea, por envolver a personalidade do agente, deve ser utilizada como circunstância preponderante quando do concurso entre agravantes e atenuantes, nos termos consignados pelo artigo 67 do Código Penal, razão pela qual foi pacificado neste Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.341.370/MT, da relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, o entendimento de que a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, por serem igualmente preponderantes, devem ser compensadas entre si, cognição que deve ser estendida, por interpretação analógica, à hipótese em análise, dada sua similitude, por também versar sobre a possibilidade de compensação entre circunstâncias preponderantes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp 689.064/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/08/2015, DJe 26/08/2015). (Destaques acrescidos).
Seguindo a mesma linha, ao apreciar o concurso entre a circunstância agravante do crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa (art. 62, IV, do Código Penal) e a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do Código Penal), o Superior Tribunal de Justiça admitiu a compensação entre as mencionadas circunstâncias. Assentou-se que a citada agravante refere-se aos motivos determinantes do crime, enquanto a atenuante alude à personalidade do agente, sendo, portanto, ambas circunstâncias consideradas preponderantes:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA DA PENA. COMPENSAÇÃO DA AGRAVANTE DE EXECUTAR O CRIME MEDIANTE PAGA COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS IGUALMENTE PREPONDERANTES. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI N. 11.343/06. RÉU NA CONDIÇÃO DE "MULA". POSSIBILIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
I - A Primeira Turma do col. Pretório Excelso firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus substitutivo ante a previsão legal de cabimento de recurso ordinário (v.g.: HC n. 109.956/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 11/9/2012; RHC n. 121.399/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 1º/8/2014 e RHC n. 117.268/SP, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 13/5/2014). As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte alinharam-se a esta dicção, e, desse modo, também passaram a repudiar a utilização desmedida do writ substitutivo em detrimento do recurso adequado (v.g.: HC n. 284.176/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 2/9/2014; HC n. 297.931/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 28/8/2014; HC n. 293.528/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe de 4/9/2014 e HC n. 253.802/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 4/6/2014).
II - Portanto, não se admite mais, perfilhando esse entendimento, a utilização de habeas corpus substitutivo quando cabível o recurso próprio, situação que implica o não-conhecimento da impetração. Contudo, no caso de se verificar configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, recomenda a jurisprudência a concessão da ordem de ofício.
III - A col. Terceira Seção deste eg. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.341.370/MT (Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 17/4/2013), firmou entendimento segundo o qual "é possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência", entendimento este que deve ser estendido à presente hipótese, pois cuida-se de compensação entre circunstâncias igualmente preponderantes, nos termos do art. 67, do Código Penal, quais sejam, motivos determinantes do crime (mediante paga) e personalidade do agente (confissão espontânea).
IV - In casu, "descabe afastar a incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 com base em mera conjectura ou ilação de que os réus integrariam organização criminosa. O exercício da função de mula, embora indispensável para o tráfico internacional, não traduz, por si só, adesão, em caráter estável e permanente, à estrutura de organização criminosa" (STF - HC n. 124.107, Primeira Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 24/11/2014).
Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício. (STJ, HC 318.594/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 24/02/2016). (Destaques acrescidos).
Ocorre que, conforme mencionado anteriormente, impera acentuada divergência entre os Tribunais Superiores. Enquanto o Superior Tribunal de Justiça possui consolidado entendimento pela possibilidade de compensação entre a circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do Código Penal) e a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal), o Supremo Tribunal Federal considera preponderante a mencionada circunstância agravante.
Abaixo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
Ementa: Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário. Roubo circunstanciado. Compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea. Impossibilidade 1. O acórdão impugnado está em conformidade com a jurisprudência de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que, a teor do art. 67 do Código Penal, “a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea, razão pela qual é inviável a compensação pleiteada” (RHC 110.727, Rel. Min. Dias Toffoli). 2. Habeas Corpus extinto sem resolução de mérito por inadequação da via processual. (STF, HC 105543, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 29/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 26-05-2014 PUBLIC 27-05-2014). (Destaques acrescidos).
Como visto no início deste artigo, a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XLVI, delegou ao legislador a tarefa de regulamentar a individualização da pena. Ademais, como se sabe, a Carta Magna atribuiu ao Superior Tribunal de Justiça a função de interprete da legislação infraconstitucional (art. 105, III, da Constituição Federal).
De fato, o Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição Federal, competindo-lhe dar a última palavra no que tange à interpretação e aplicação das normas constitucionais, bem como quanto à compatibilidade do ordenamento jurídico com a Carta-Mãe. Na espécie, contudo, comtempla-se hipótese de interpretação da legislação federal, notadamente o artigo 67 do Código Penal, função imputada pela própria Constituição Federal ao Superior Tribunal de Justiça.
3. CONCLUSÃO.
Conforme elucidado, na segunda fase de aplicação da pena deverá o juiz sentenciante analisar as circunstâncias agravantes e atenuantes e, observando a concomitância de tais circunstâncias, cumprirá avaliar quais as circunstâncias consideradas preponderantes pela lei.
Deveras, há divergência nos Tribunais Superiores no que tange à possibilidade de compensação entre a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do Código Penal) e a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal). O Superior Tribunal de Justiça entende, em regra, pela possiblidade da compensação, por considerar ambas as circunstâncias preponderantes – aplicando o mesmo raciocínio às agravantes do crime praticado com emprego de violência contra a mulher (art. 61, II, “f”, do Código Penal) e do crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa (art. 62, IV, Código Penal) – o Supremo Tribunal Federal, todavia, interpreta que a agravante da reincidência é circunstância preponderante à confissão espontânea.
Pelo exposto, considerando que a confissão, decerto, refere-se à personalidade do agente, na medida em que demonstra a capacidade do réu em admitir o seu erro e se responsabilizar pelas consequências de suas ações e, bem assim, tendo em vista que cumpre ao Superior Tribunal de Justiça a função de interpretar a legislação infraconstitucional, conclui-se acertado o entendimento dessa Corte pela possibilidade da compensação das aludidas circunstâncias atenuantes e agravantes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, Marcelo André de; SALIM, Alexandre. Coleção Sinopses Para Concursos: Direito Penal. Parte Geral. 5. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm, 2015.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais Julgados STF e STJ comentados 2015. Manaus: Dizer o Direito, 2016.
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal: parte geral. 3. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm, 2015.
ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal Esquematizado: parte geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; VIEIRA, Albino Carlos Martins. Súmulas do STJ Organizadas por assunto, anotadas e comentadas. 7. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm, 2015.
MASSON, Cleber. Direito penal esquematizado: Parte geral. vol. 1. 8. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 14. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 14. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 459.
[2] NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 14. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 528.
Servidora Pública, atualmente ocupa o cargo de Técnico do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte. Graduada em Direito pela Universidade Potiguar. Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Anhanguera - UNIDERP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINTO, Simone Carlos Maia. Comentários sobre a possibilidade de compensação de circunstâncias agravantes e atenuantes, à luz da jurisprudência dos tribunais superiores Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 maio 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46580/comentarios-sobre-a-possibilidade-de-compensacao-de-circunstancias-agravantes-e-atenuantes-a-luz-da-jurisprudencia-dos-tribunais-superiores. Acesso em: 22 nov 2024.
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