RESUMO: O presente artigo tem por finalidade estudar a possibilidade de reajustar e revisar contratos administrativos em concomitância, analisando os institutos jurídicos em comento, bem como seus fundamentos e objeto, verificando desta forma a oportunidade de se efetivar o reajuste e a revisão do pacto administrativo.
Palavras Chave: Contrato Administrativo. Reajuste. Revisão .
ABSTRACT: The purpose of this article is to study the possibility of adjusting and reviewing administrative contracts in concomitance, analyzing the legal institutes in question, as well as their foundations and object, verifying in this way the opportunity to carry out the readjustment and revision of the administrative agreement.
Keywords: Administrative Agreement. Readjustment. Review.
SUMÁRIO: I- Introdução; II - Reajuste, Revisão ou Recomposição Contratual; III - Conclusão; Referências Bibliográficas.
I – Introdução
Trata-se de artigo científico que busca discorrer sobre a possibilidade de reajustamento dos preços praticados em determinado contrato administrativo e em concomitância ou posteriormente a este reajuste a plausibilidade jurídica de se efetivar o reequilíbrio econômico do mesmo pacto administrativo.
Ora, vimos através deste trabalho discutir sobre as diferenças destes institutos, de seus objetos e em consequência de sua aplicação individualmente ou em conjunto.
Desta forma, o objetivo precípuo deste estudo é dirimir a controvérsia, por exemplo, acerca da possibilidade de ser concedido reajuste dentro do interregno de um ano em que fora concedido o reequilíbrio econômico-financeiro, ou o contrário.
II – REAJUSTE, REVISÃO OU RECOMPOSIÇÃO CONTRATUAL
Inicialmente, para melhor compreender o caso em questão é necessário conceituar e diferenciar o reajuste, da revisão ou recomposição, institutos jurídicos que possuem vultosa similitude, contudo, apresentam diversas particularidades.
Primeiramente, trataremos do reajuste, que, nas precisas lições de José dos Santos Carvalho Filho[1]:
“se caracteriza como fórmula preventiva, normalmente usada pelas partes já no momento do contrato, com vistas a preservar os contratados dos efeitos de regime inflacionário”
O artigo 40, inciso XI da Lei Federal 8.666/93 trata da obrigatoriedade de constar do Edital, o critério de reajuste:
"XI - critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa proposta se referir até a data do adimplemento de cada parcela;"
Dessa forma, a norma tutela o reajuste como a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos. É o realinhamento do valor estabelecido em contrato em razão do aumento do custo de produção ou queda do valor da moeda em razão da perda inflacionária.
Nos casos de reajustes, poderão ser utilizados índices pré-fixados no Edital e na Minuta de Contrato que melhor retratem a perda inflacionária de determinado segmento. Alguns comumente utilizados são: IGPM da Fundação Getúlio Vargas, IPC-FIPE, INCC, ou outro índice Oficial que venha demonstrar a queda do valor da moeda.
O reajuste somente poderá ser efetivado após o período contratual mínimo de 12 meses.
Acerca do tema, Lucas Rocha Furtado[2] assevera que:
“O reajuste de preços está relacionado a variações de custos de produção que, por serem previsíveis, poderão estar devidamente indicados no contrato. Normalmente, são utilizados como critérios para promover o reajuste do valor do contrato índices que medem a inflação, como o índice nacional de preços ao consumidor – INPC, índices setoriais, ou índices de variação salarial. As cláusulas que preveem os reajustes de preços têm o único objetivo de atualizar os valores do contrato em face de situações previsíveis (expectativa de inflação, variação de salários, etc.). A bem da verdade, o reajuste de preços deve ser visto como meio de reposição de perdas geradas pela inflação.”
Logo, ao falar em reajustamento de preços, estamos tratando da consequência natural de fatos previsíveis que ocasionam a perda do valor da moeda, incidindo de forma reflexa no contrato.
Ademais, urge salientar que a Lei nº 8.666/93 dispõe sobre critérios de reajustamento. Conforme disposto no estatuto geral de licitações e contratos administrativos, há cláusulas necessárias a todos os contratos administrativos, conforme dispõe o art. 55, da Lei nº 8.666/93:
Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
I - o objeto e seus elementos característicos;
II - o regime de execução ou a forma de fornecimento;
III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
IV - os prazos de início de etapas de execução, de conclusão, de entrega, de observação e de recebimento definitivo, conforme o caso;
V - o crédito pelo qual correrá a despesa, com a indicação da classificação funcional programática e da categoria econômica;
VI - as garantias oferecidas para assegurar sua plena execução, quando exigidas;
VII - os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores das multas;
VIII - os casos de rescisão;
IX - o reconhecimento dos direitos da Administração, em caso de rescisão administrativa prevista no art. 77 desta Lei;
X - as condições de importação, a data e a taxa de câmbio para conversão, quando for o caso;
XI - a vinculação ao edital de licitação ou ao termo que a dispensou ou a inexigiu, ao convite e à proposta do licitante vencedor;
XII - a legislação aplicável à execução do contrato e especialmente aos casos omissos;
XIII - a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação. (grifos nosso)
Ora, nos termos do, III, do art. 55, da Lei nº 8.666, é cláusula necessária em todo contrato as que estabeleçam o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento.
Para ocorrer reajuste, é necessária previsão contratual. As normas vigentes exigem que os critérios regedores do reajuste sejam previamente definidos no contrato. A ausência de previsão contratual inviabiliza o reajuste de preços.
Desta forma, o reajuste depende de previsão contratual e deste modo é apenas cumprimento de uma cláusula contratual.
Corroborando com o exposto, Wellington Pacheco Barros[3] assevera:
“Uma das saídas para manter-se o equilíbrio econômico-financeiro do contrato é inserir cláusulas de reajuste (art. 40, XI, da Lei nº 8.666/1993), o que não implica aumento real, mas tão somente a manutenção do valor de custo da execução do pactuado, enquanto esta ocorrer. Tal cláusula deve indicar o índice ou a fórmula adequada para manter o valor da execução do contrato, além da periodicidade de sua aplicação.”
Nesse sentido, observe-se a jurisprudência pátria que assinala a necessidade de previsão contratual para haver reajustamento do contrato administrativo:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - CONTRATO ADMINISTRATIVO - REAJUSTE DE PREÇOS - AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO CONTRATUAL -DESCABIMENTO.
1. O reajuste do contrato administrativo é conduta autorizada por lei e convencionada entre as partes contratantes que tem por escopo manter o equilíbrio financeiro do contrato. 2. Ausente previsão contratual, resta inviabilizado o pretendido reajustamento do contrato administrativo. 3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido. STJ – RECURSO ESPECIAL Resp. 730568 SP 2005/0036315-8(STJ)” (grifo nosso)
Frise-se que o reajuste, em obediência ao que determina a legislação não poderá ocorrer em período inferior a um ano (art. 5º do Decreto Nº 2.271, DE 7 DE JULHO DE 1997) da data da apresentação das propostas, e não da assinatura do contrato ou do início de sua vigência, além de estar previsto expressamente no contrato e decorrer de fatos previsíveis:
“Art. 5º Os contratos de que trata este Decreto, que tenham por objeto a prestação de serviços executados de forma contínua poderão, desde que previsto no edital, admitir repactuação visando a adequação aos novos preços de mercado, observados o interregno mínimo de um ano e a demonstrarão analítica da variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justificada.” (grifo nosso)
De outro lado, o instituto da revisão ou recomposição é cabível nos casos em que a modificação decorre de modificação excepcional nos preços, desvinculada da inflação. Envolve a mudança das obrigações impostas ao contratado, independentemente de circunstâncias meramente inflacionárias. Ocorre quando a execução do contrato se submete a extraordinária e inesperada alteração de custos, não apurada nos índices ordinários de variação de preços, ou quando as obrigações previstas em contrato são aumentadas ou passam a ser mais onerosas.
Ora, nos casos de revisão ou recomposição estamos diante de fatos imprevisíveis ou extraordinários, que diversamente do reajuste, não possui previsão contratual para ocorrer.
Como corolário do princípio da necessidade de adequação financeira, a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos, determina em seu art. 65, II, d:
"d) para restabelecer a relação, que as partes pactuaram inicialmente, entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual." (grifo nosso)
Observa-se, assim, pelo exposto, que o equilíbrio econômico-financeiro é uma vertente em todo contrato administrativo. Deve ser considerado como um direito da Administração e do contratado. Incide sua restauração nos casos extraordinários de forma automática, independentemente de previsão no contrato.
Nesse sentido, a Advocacia Geral da União, na Orientação Normativa nº 22, em sua ementa dispõe:
“O reequilíbrio econômico-financeiro pode ser concedido a qualquer tempo, independentemente de previsão contratual, desde que verificadas as circunstâncias elencadas na letra “d” do inc. II, do art. 65, da Lei nº 8.666, de 1993”.
Em suma, para ocorrer revisão ou recomposição contratual, é necessária a conjugação dos seguintes requisitos: a) existência de fato imprevisível ou previsível de consequências incalculáveis que incidam diretamente no ajuste; b) desequilíbrio econômico-financeiro decorrente desses fatos.
Ademais, não há necessidade de prévia disposição contratual para se realizar a revisão ou recomposição. Ocorrido o fato imprevisível ou previsível de consequências incalculáveis que gere desequilíbrio econômico-financeiro a relação contratual, o contratado, ou até mesmo o contratante, terá direito a proceder à revisão ou recomposição de preços.
Deste modo, resta evidente que os fundamentos e o objeto do reajuste e da revisão são diversos, e desta forma não se confundem.
É sabido que na execução de um contrato, a relação de igualdade pode ser abalada por dois tipos de álea, a ordinária ou empresarial, relacionada ao risco normal da atividade envolvida no contrato, e a extraordinária, no qual são consideradas questões imprevisíveis ou, se previsíveis, de consequências incalculáveis.
Atenta a essa circunstância, a Lei nº 8.666/93, auferiu a possibilidade de correção das situações que ensejem desequilíbrio, conforme assinalado nos arts. 40, inc. XI, 55, inc. III, e 65, inc. II, letra “d”.
Na fundamentação da referida Orientação Normativa - AGU, percebe-se que de fato não se pode confundir os dois Institutos:
“Embora já esteja assente na jurisprudência e na doutrina, observa-se ainda ser bastante tormentosa a utilização deste instituto, tratado equivocadamente como hipótese de reajuste. A edição de orientação normativa ganha pertinência por equacionar o tema, fixando para as Unidades Consultivas da AGU a interpretação segundo a qual o reequilíbrio apenas se aplica nos casos em que a relação de encargos e preços formada inicialmente tenha sido alterada por fatores imprevisíveis e alheios à vontade das partes. Nestas condições, não se presta o reequilíbrio econômico-financeiro para mera correção de preços alterados pela corrosão inflacionária, ou mesmo para sanar propostas elaboradas com equívocos ou distorções verificadas em razão do risco ordinário da atividade comercial.”
Ainda, e com muita propriedade, Marçal Justen Filho[4] distingue os dois institutos, da seguinte forma:
“A recomposição é o procedimento destinado a avaliar a ocorrência de evento que afeta a equação econômico-financeira do contrato e promove adequação das cláusulas contratuais aos parâmetros necessários para recompor o equilíbrio original. Já o reajuste é procedimento automático, em que a recomposição se produz sempre que ocorra a variação de certos índices, independentemente de averiguação efetiva do desequilíbrio”.
Desta forma, estamos abordando institutos distintos que tem sua aplicação conectada a fundamentos diversos e que não possuem vínculos entre si. Assim não há motivo para impedir a aplicação de ambos até mesmo em concomitância. No mesmo sentido, segue lição de Marçal Justen Filho[5]:
“Nada impede que se cumulem recomposição e reajuste. Podem ocorrer variações extraordinariamente elevadas em certos casos concretos que ultrapassem largamente a variação dos medidores de inflação. Nesse caso, o particular poderia pleitear, além do reajuste, a recomposição dos preços. A concessão do reajuste não exaure o direito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da contratação.” (grifo nosso)
Corroborando com o exposto, Célia Maria Bastos de Almeida[6] afirma:
“Vale salientar que aplicar o reajuste e a recomposição no mesmo contrato administrativo não se trata de incorrer em bis in idem já que dizem respeito a institutos diferentes, não obstante tenham o mesmo objetivo que é o de assegurar a manutenção do multicitado equilíbrio econômico financeiro...”. (grifo nosso)
Ante o exposto, asseveramos a possibilidade de haver a concessão de reajuste e reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro em concomitância, especialmente porque as causas que fundamentam o reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro e o reajuste contratual são diversas, e o reajuste nada mais é do que o cumprimento do contrato administrativo.
III – CONCLUSÃO
Por todo o exposto, considerando o que dispõem os dispositivos supracitados da Constituição Federal, Lei 8.666/93, Decreto Nº 2.271, de 7 de julho de 1997 e Orientação Normativa Nº 22 - AGU, bem como as considerações trazidas pela doutrina e jurisprudência, é plenamente crível falar em reajuste contratual e revisão em concomitância, especialmente por possuírem fundamentos e objetos distintos que podem ser aplicados individualmente ou se necessário em conjunto, quando os requisitos de ambos forem preenchidos.
Referências Bibliográficas
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 22. Ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
BARROS, Wellington Pacheco. Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Atlas, 2009.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 27. Ed. São Paulo: Atlas, 2014.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Licitações e Contratos Administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2007.
JUSTEN, Marçal Filho. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 12. ed., 2008.
Pestana, Marcio. Licitações públicas no Brasil: exame integrado das Leis 8.666/1993 e 10.520/2002. 1.Ed. São Paulo: Atlas, 2013.
Torres, Ronny Charles Lopes de. Lei de Licitações públicas comentadas. 7.ed.Salvador: Ed. JusPodivm,2015
http://www.unifacs.br/revistajuridica/arquivo/edicao_agosto2007/discente/dis2.doc
[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2010, p. 217
[2] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Licitações e Contratos Administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 616.
[3] BARROS, Wellington Pacheco. Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Atlas, 2009, p. 302.
[4] JUSTEN, Marçal Filho. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 10. ed., 2004, p. 389
[5] JUSTEN, Marçal Filho. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 12. ed., 2008, p. 733.
[6] Disponível em < http://www.unifacs.br/revistajuridica/arquivo/edicao_agosto2007/discente/dis2.doc.>. Acesso em: 22 set. 2016
Procurador do Município de João Pessoa; Ex-Chefe da Procuradoria Fiscal do Município de João Pessoa, Chefe da Procuradoria Administrativa do Município de João Pessoa, Graduado pela Universidade Federal da Paraíba, Pós-graduando em Direito Tributário e Processo Tributário; Advogado e Consultor Jurídico.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAFAEL DE LUCENA FALCãO, . A possibilidade de reajustar e revisar contratos administrativos em concomitância Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 nov 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47835/a-possibilidade-de-reajustar-e-revisar-contratos-administrativos-em-concomitancia. Acesso em: 22 nov 2024.
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