RESUMO: O presente artigo visa analisar de forma crítica os princípios aplicáveis ao artigo 28 da Lei de Drogas, tipo legal que prevê a conduta de portar/adquirir drogas para consumo pessoal. O tema, objeto de muitos debates acadêmicos, encontra-se em voga em decorrência do início do enfrentamento de sua inconstitucionalidade pelo plenário do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário (RE) 635659. Longe de querer exaurir todos os valores aplicáveis à temática, perpassaremos por princípios como o da intimidade, igualdade, lesividade e dignidade humana. Será realizada uma análise dogmática e, posteriormente, verificação da legitimidade da incriminação da conduta do usuário frente aos anseios constitucionais do Estado Democrático de Direito.
PALAVRAS-CHAVE: ARTIGO 28 DA LEI 11.343/2006 – PRINCÍPIOS APLICÁVEIS – INTIMIDADE – LESIVIDADE – IGUALDADE – DIGNIDADE HUMANA.
ABSTRACT: This article aims to analyze critically the principles applicable to article 28 of the Law on Drugs, a legal type that provides for the conduct of carrying / purchasing drugs for personal consumption. The subject, the subject of many academic debates, is in vogue as a result of the beginning of the confrontation by the plenary of the Federal Supreme Court in Extraordinary Appeal (RE) 635659 on the unconstitutionality of said article. Far from wanting to exhaust all the values applicable to the subject, we will go through principles such as intimacy, equality, lesivity and human dignity. A dogmatic analysis will be carried out and, later, verification of the legitimacy of the incrimination of the conduct of the user against the constitutional longings of the Democratic State of Right.
KEYWORDS: ARTICLE 28 OF LAW 11.343 / 2006 - APPLICABLE PRINCIPLES - INTIMACY - LESIVITY - EQUALITY - HUMAN DIGNITY.
1. ANÁLISE DO CRIME DE ADQUIRIR/PORTAR DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL
1.1 Artigo 28 da Lei n.° 11.343 de 2006
O Direito Penal regula as condutas humanas que se ajustam aos seus dispositivos legais, ou seja, ações ou omissões especificadas nos denominados tipos penais. Destarte, por interlúdio dessas descrições normativas, busca-se tutelar os valores mais nobres dos seres humanos, a exemplo da liberdade, à vida, dentre outros bens jurídicos.
Nessa senda, os elementos insertos nos textos normativos possibilitam a diferenciação entre os atos de vontade proibidos dos permitidos, isto é, quando uma pessoa pratica uma ação ou omissão que se ajuste a um desses comandos descritivo-normativos, diz-se que fora praticada um fato típico. Consoante explicita Zaffaroni e Pierangeli (2011, p. 387), “obtivemos já duas características do delito: uma genérica (conduta) e outra específica (tipicidade), ou seja, que a conduta típica é uma espécie do gênero conduta”.
Assim sendo, são modelos absortos de comportamentos que, se forem realizados, haverá responsabilização penal. Ainda sobre o tema, expõe Zaffaroni e Pierangeli (2011, p. 388) que “os tipos penais são instrumentos legais, logicamente necessários e de natureza predominantemente descritiva, que tem por função a individualização de condutas humanas penalmente relevantes”.
A conduta que ora se analisa e seus demais delineamentos estão expressos no artigo 28 da Lei de Drogas, segue a redação:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. § 1° Às mesmas medidas submeti-se quem, para consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substâncias ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica. § 2° Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. § 3° As penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 5 (cinco) meses. § 4° Em caso de reincidência, as penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses. § 5° A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas. § 6° Para garantia das medidas a que se refere o caput, nos incisos I, II, III, a que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a: I – admoestação verbal; II – multa. § 7° O juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado[1].
Merece ser dito que essa norma pode ser visualizada de acordo com os seus elementos: os objetivos-descritivos, os normativos (expressões que necessitam de uma verificação cognitiva para extrair seus sentidos) e os subjetivos. É preciso verificar cada uma dessas informações para entendermos de forma clara e precisa quais comportamentos humanos que se amoldam ao tipo em comento.
Os verbos - elementos objetivos - são os núcleos do tipo penal alocados no texto, consubstanciando em ações penalmente relevantes. Pela redação do artigo retrotranscrito, verifica-se que foi promovido um alargamento na criminalização do usuário de drogas. Antes, o artigo 16 da Lei n.° 6.368 de 1976 previa apenas as condutas de adquirir, guardar e ter em depósito, sendo acrescido pela nova lei os verbos transportar ou trazer consigo substâncias ou produtos proscritos pela lei brasileira, ocorrendo à chamada novatio legis incriminadora.
Praticar a conduta constante no verbo adquirir significa comprar, angariar mediante o pagamento ou de forma gratuita. Em relação à expressão guardar, possui o sentido de conservar para utilização em curto período, proteger. Ademais, trazer consigo denota a ideia de ter junto ao corpo, na carteira, bolso, ou outro meio. Ter em depósito significa maior perpetuidade e quantidade relacionada às substâncias psicotrópicas. Por fim, transportar significa levar de um lugar para outro por intermédio de veículos, sacolas, malas, e etc.
A posteriori, em seu parágrafo primeiro, o artigo também prevê os comportamentos de semear (propalar), cultivar (amanhar) ou colher (recolher) substâncias ou produtos que possam causar dependência física ou psíquica, não havendo maiores controvérsias quanto ao sentido desses verbos.
Importante destacar que as condutas de usar ou consumir não configuram ilícito penal por falta de previsão normativa (em consonância com o princípio da legalidade). Basta imaginarmos uma pessoa sendo flagrada após a utilização de alguma substância estupefaciente, a saber, a maconha, a cocaína, o crack, dessa forma, terminantemente este indivíduo não terá praticado qualquer conduta ilícita (ou antijurídica).
Em outro giro, o elemento subjetivo do crime se consubstancia no dolo, ou seja, na vontade livre e consciente de praticar alguma conduta descrita como delito. Traçando os contornos do tema, Moraes e Capobianco afirmam que o crime doloso:
É aquele praticado pelo agente que objetiva o resultado ou que, no mínimo, assume o risco de produzi-lo, isto é, tem consciência da conduta que pratica. Dolo é a vontade livre e consciente de praticar a ação ou omissão, de executar o fato definido como crime pela letra da lei (MORAIS; CAPOBIANCO, 2010 p.150).
In casu, seria a vontade livre e consciente de adquirir ou trazer consigo substância entorpecente na forma prevista no artigo 28 da Lei de Drogas. Não menos importante, porém, que a assunção do risco de produzir o resultado desejado (dolo), é impreterível à vontade “específica” de obter a droga para uso pessoal. Sem a presença desse elemento específico da redação legal, o autor terá praticado crime diverso ou o fato será irrelevante para o Direito Penal.
Corroborando o exposto, verbi gratia, na hipótese de alguma pessoa trazer consigo algum tipo de substancia estupefaciente (o crack, por exemplo) com o objetivo de vendê-la, ao invés de consumi-la, estará inserto na figura prevista no art. 33 da Lei n.° 11.343 de 2006, praticando o tráfico ilícito de drogas.
Nesse ponto, com o fito de diferenciar o usuário do traficante de drogas - isso porque as cinco condutas que estão previstas no artigo 28 da Lei n.° 11.343 de 2006 também aparecem em seu artigo 33 que dispõe sobre a figura do tráfico de drogas - o § 2° traz critérios objetivos e subjetivos de diferenciação. Desta maneira, os operadores do direito como os Delegados de Polícia, Promotores e Juízes deverão se atentar à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoas, bem como à conduta e aos antecedentes do agente[2].
2 PANORAMA JURÍDICO
2.1 Questão Principiológica
A criminalização da conduta de obter substância entorpecente para consumo pessoal entra em colisão com princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito. Dessa maneira, para compreensão do campo de aplicação e efetividade dos princípios consagrados em nosso ordenamento jurídico, passemos à sua análise, verificando seus conceitos e desmembramentos doutrinários, investigando cada uma das normas que se relacionam com a temática em comento.
Destarte, inegável a importância de tais proposições genéricas na elaboração e aplicação das leis do ordenamento jurídico. Quando da regulamentação de determinado interesse social, as autoridades competentes devem se basear na seleção das cargas valorativas que fundamentem tal ingerência estatal, assim explicita Paulo Nader:
Quando se vai disciplinar uma determinada ordem de interesse social, a autoridade competente não caminha sem um roteiro predelineado, sem planejamento, sem definição prévia de propósitos. O ponto de partida para composição de um ato legislativo deve ser o da seleção dos valores e princípios que se quer cosagrar, que se deseja infundir no ordenamento jurídico (NADER, 2007, p. 200).
Toda legislação pressupõe a existência de normas jurídicas que a norteia e delimita. E não apenas isso, a legitimidade destas mesmas leis depende, dentre alguns outros fatores, da observância dos princípios fundamentais em consonância com a Constituição Federal, diploma regulador de todo sistema de normas. Com clareza de ideias Nilo Batista afirma que:
Tais princípios básicos, embora reconhecidos ou assimilados pelo direito penal, seja através de norma expressa (como, por exemplo, o princípio da legalidade – art. 1° CP), seja pelo conteúdo de muitas normas a eles adequadas (como, por exemplo, a inexistência de pena de morte ou mutilações – art. 32 CP – e o objetivo de integração social na execução da pena – art. 1° LEP – com relação ao princípio da humanidade), não deixam de ter um sentido programático, e aspiram ser a plataforma mínima sobre a qual possa elabora-se o direito penal de um estado de direito democrático (BATISTA, 2007, p. 61-62).
Inegavelmente, estes comandos valorativos que permeiam o ordenamento jurídico brasileiro possuem papel de extrema importância para consecução da justiça no caso concreto. Por conta disso, passemos, neste momento, a perquirir sobre sua definição, começando a partir do Dicionário Priberam da Língua Portuguesa:
Princípio. (latim principium, -ii) S. m. 1. O primeiro impulso dado a uma coisa. 2. Ato de principiar uma coisa. 3. Origem. 4. Causa primária. 5. O que constitui a matéria. 6. O que entra na composição de algo. 7. Opinião. 8. Frase que exprime uma conduta ou um tipo de comportamento. 9. Aquilo que regula o comportamento ou a ação de alguém; preceito moral. 10. Frase ou raciocínio que é base de uma arte, de uma ciência ou de uma teoria[3].
No mesmo dicionário podemos obter o significado de princípios – no plural – consubstanciando o seguinte: “Princípios. (...) 11. O princípio da vida, as primeiras épocas da vida. 12. Antecedentes. 13. Educação, instrução. 14. Opiniões, convicções. 15. Regras ou conhecimentos fundamentais e mais gerais”[4].
De tais acepções, conseguimos extraídas conotações que nos remetem ao começo de algo, o que está a princípio, premissas iniciais de alguma ciência, teoria, de onde emana algo, nascente. Chega-se à conclusão que nos vários campos de cognição, sejam relacionados com uma ciência, teoria etc., princípios designam ideias iniciais que lhes servem de arrimo, não sendo outro o sentido conferido à Ciência Jurídica. Posicionando-se sobre o tema, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald trazem a seguinte proposição:
[...] Os princípios revestem-se de grade relevância porque marcam, basicamente, todo sistema jurídico. São proposições genéricas que informam uma ciência. Sua base valorativa. [...] São, portanto, as bases sobre as quais se constrói o sistema jurídico. Em outras palavras: constituem as proposições genéricas que servem de substrato para organização de um ordenamento jurídico. Daí sua induvidosa importância no estudo das ciências jurídicas (CHAVES; ROSENVALD, 2007, p. 35-36).
Para José Afonso da Silva (2005, p. 92) os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas. Igualmente, Luiz Flávio Gomes (2005, p. 01) afirma em seu artigo que “princípios são diretrizes gerais de um ordenamento jurídico (ou de parte dele)”[5].
Conforme demonstrados pelos brilhantes autores supramencionados os princípios possuem inestimável relevância para ciência jurídica, por tal razão, faz-se imperioso esquadrinhá-los para compreensão da matéria. Alertando sobre esta necessidade, o autor Chade Rezek Neto citado por Djalma Eutímio em seu Curso de Direito Penal aduz:
Desnecessário sublinhar, por evidente, sua importância na interpretação e aplicação do direito, pois “com o auxílio dos Princípios Jurídicos, a interpretação do Direito se modifica para melhor, enfocando ao aplicador do Direito não apenas a localização de uma regra para sua aplicação imediata, mas, sim, a construção da norma jurídica aplicável ao problema jurídico. Portanto, os Princípios Jurídicos se caracterizam por serem de importância fundamental, em relação à evolução do direito positivo, para a regulação de novos fenômenos sociais” (REZEK, 2004, p. 44 apud DJALMA, 2007, p. 53).
Vale salientar que a Ciência Jurídica se localiza no campo da cultura, então, possui como característica a mutabilidade, onde as teorias e ideologias mudam em conformidade com os discursos que a corroboram. Bem assim, possui uma linguagem plurívoca, discursos polivalentes destinados a prescrever modelos de conduta social a serem seguidas.
Não restam dúvidas que a gama de ideias que fundamentam tal ciência traduzem uma peculiaridade ao conceito de princípios jurídicos, qual seja, várias designações. No livro dedicado ao tema, “Conceito de Princípios Constitucionais”, Ruy Samuel Espíndola expõe a seguinte ilação:
Assim, na Ciência Jurídica, tem-se usado o termo princípio ora para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas construídas independentemente de uma ordem jurídica concreta ou de institutos de direito ou normas legais vigentes. Essa polissemia não é benéfica neste campo do saber, em que a confusão de conceitos e ideias pode levar à frustração da práxis jurídica ou à sonegação, por uma prática equívoca, de direitos ou de situações protegíveis pelo sistema jurídico posto (ESPÍNDOLA, 2002, p. 55).
Nesse diapasão, dependendo do contexto em que se encartam, aos princípios são conferidas pela Ciência do Direito diferentes funções e modos de aplicação. Repisando este raciocínio continua Ruy Samuel Espíndola:
Ao se tratar de princípios, neste campo das ciências humanas, deve-se distinguir claramente entre a norma e o texto que a contempla; a norma do discurso sobre a norma; as categorias de normas que veiculam princípios. E mais: os princípios constantes nas normas devem distinguir-se dos princípios próprios à interpretação das normas. E ao se realizar esse exercício de distinção, chega-se à conclusão de que a noção de princípio antes apontada é apenas o primeiro momento de uma indagação teórica tendente a dar conta dos grandes problemas que são colocados aos operadores do Direito, no momento de lidarem com os “princípios no Direito” (ESPÍNDOLA, 2002. p. 56).
Diante da supramencionada polissemia conceitual, surge a incontornável necessidade de distinguir os princípios jurídicos das regras de direito. Traçando este perfil exegético e ressaltando obrigatória distinção acima apontada aduz José Afonso da Silva:
Há, no entanto, quem concebe regras e princípios como espécies de normas, de modo que a distinção entre regras e princípios constitui uma distinção entre duas espécies de normas. A compreensão dessa doutrina exige conceituação precisa de normas e regras, inclusive para estabelecer a distinção entre ambas, o que os expositores da doutrina não têm feito, deixando assim obscuro seu ensinamento (AFONSO, 2005, p. 92).
Nessa sistemática, sendo o Direito preponderantemente dogmático, pois objetiva resolver as pretensões com a menor insegurança social possível, necessita de mecanismos para este arrefecimento da realidade fática. As normas, nesse contexto, seriam a forma com que se identificaria o direito. Alguns doutrinadores, a exemplo de Hans Kelsen, desenvolveram teorias que colocavam a norma como objeto central, senão exclusivo, da Ciência Jurídica. Nesse sentido explica Tércio Sampaio Ferraz Jr:
[...] Kelsen afirma que os comportamentos humanos só são conhecidos mediatamente pelo cientista do direito, isto é, enquanto regulado por normas. Os comportamentos, a conduta de um ser humano perante outro, diz ele, são fenômenos empíricos, perceptíveis pelos sentidos, e que manifestam um significado. Por exemplo, levantar o braço numa assembleia é uma conduta. Seu significado tem um aspecto subjetivo e outro objetivo. O significado subjetivo desse ato pode ser, conforme a intenção do agente, um simples movimento de preguiça, o ato de espreguiçar-se. Entretanto, no contexto, esse ato pode ter um significado objetivo: manifestou-se, ao levantar a mão, um voto computável para tomar uma decisão. Esse significado objetivo é constituído por uma norma, a norma segundo a qual o ato de votar será contado pelo erguimento do braço (SAMPAIO, 2007, p. 98).
Nas próprias palavras de Hans Kelsen:
O que transforma este fato num ato jurídico (lícito ou ilícito) não é a sua facticidade, não é o seu ser natural, isto é, o seu ser tal como determinado pela lei da causalidade e encerrado no sistema da natureza, mas o seu objetivo que está ligado a esse ato, a significação que ele possui. O sentido jurídico específico, a sua particular significação jurídica, recebe-a o fato em questão por intermédio de uma norma que a ele se refere com o seu conteúdo, que lhe empresta a significação jurídica, por forma que o ato pode ser interpretado segundo esta norma (KELSEN, 1998, p. 03).
Essa teoria, chamada de pura, sofreu diversas críticas devido a sua abordagem extremista, isso porque, o autor isolou a norma de suas intenções subjetivas, sociais e etc. Não obstante, deve-se mencionar que a teoria em comento foi desenvolvida em um momento histórico denominado de fenômeno da positivação, onde o direito era entendido basicamente como disposto por atos humanos, atos de legislar.
É certo, porém, que as normas se referem a enunciados verbais abstratos que projetam como deve ser o comportamento, por isso consisti em um dever-ser. Constituem em imperativos a ser observados, ou seja, caso haja descumprimento se impõe sobre a vontade das pessoas por intermédio de uma sanção. Trançando estes contornos Paulo Nader aduz:
[...] instrumento de definição da conduta exigida pelo Estado. Ela esclarece ao agente como e quando agir. O Direito Positivo, em todos os sistemas jurídicos, compõe-se de normas jurídicas, que são padrões de conduta social impostos pelo Estado, para que seja possível a convivência dos homens em sociedade (NADER, 2007, p. 83).
Decorre disso que as normas seriam o gênero do qual derivam as espécies regras e princípios jurídicos. Robert Alexy expõe esta diferenciação:
Trata-se de dois tipos distintos de norma. Regras são "mandamentos definitivos", quer dizer, que ordenam fazer uma coisa numa medida previamente definida. Princípios, por outro lado, são "mandamentos de otimização", ou seja, ordenam fazer uma coisa na máxima medida possível. Assim, regras são normas cuja medida de aplicação já vem previamente definida, enquanto princípios são normas cuja medida de aplicação deve ser definida, pelo julgador, em cada situação de aplicação (ALEXY, 2001, p. 202).
Repisando o quanto exposto Inocêncio Mártires Coelho explica:
Noutras palavras, em se tratando de regras de direito, sempre que a sua previsão se verificar numa dada situação de fato concreta, valeta pata essa
situação exclusivamente a sua conseqüência jurídica, com o afastamento de quaisquer outras que dispuserem de maneira diversa, porque no sistema não podem coexistir normas incompatíveis.[...] No campo da aplicação dos princípios, ao contrário, a maioria entende que não se faz necessária a formulação de regras de colisão, porque essas espécies normativas — por sua própria natureza, finalidade e formulação — parece não se prestarem a provocar conflitos, criando apenas momentâneos estados de tensão ou de mal-estar hermenêutico, que o operador jurídico prima facie verifica serem passageiros e plenamente superáveis no curso do processo de aplicação do Direito (MENDES; MÁRTIRES; GONET, p. 53-55).
Visto a diferenciação entre as espécies de normas jurídicas, torna-se imprescindível ressaltar que, nos dias atuais, a doutrina majoritária reconhece o excessivo grau de juridicidade dos princípios. Assim, afirma Alexy (2001, p. 86) que “Los principios son normas que ordenan que algo sea realizado en la mayor medida posible, dentro de las posibilidades jurídicas existentes. Por lo tanto los principios son mandatos de optimización”[6].
Estes mandamentos valorativos são normas, obrigam, possuem eficácia jurídica com relação aos comportamentos humanos, independente da separação conceitual entre Princípios Gerais do Direito e Princípios Positivos do Direito. Nesse ponto, traçando as principais características desses dois institutos, Eberhard Grabitz delineia o seguinte:
Repartem-se os princípios, numa certa fase da elaboração doutrinária, em duas categorias: a dos que assumem o caráter de ideias jurídicas norteadoras, postulando concretização na lei e na jurisprudência, e a dos que, não sendo apenas ratio legis, mas, também, lex, se cristalizam desse modo, consoante Larenz assinala, numa regra jurídica de aplicação imediata (1973, p. 240-241 apud BONAVIDES, 2000, p. 272).
A partir daí, os princípios gerais do direito podem ser valorados a partir de premissas falsas ou verdadeiras, em consonância com as descrições normativas da Ciência Jurídica. De outra parte, os princípios positivos do direito são estimados conforme o válido ou inválido, vigente ou não, eficaz ou ineficaz, enquanto sistema lógico de normas positivas.
Inegável é, porém, a normatividade que os acobertam, independente das diferenciações supracitadas. Sendo assim, o artigo 4° da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro corroborando esta tese, prevendo estarem insertos os primeiros na locução que os descrevem, e o segundo, no vernáculo “lei”. Ruy Samuel Espíndola (2002, p. 61) vai além, conferindo normatividade não só aos princípios que são expressa e explicitamente contemplados no âmago da ordem jurídica, mas também aos que, defluentes de seu sistema, são enunciados pela doutrina e descobertos no ato de aplicar o Direito.
Enfim, feito tais considerações, passemos agora a análise principiológica na perspectiva Constitucional, vertente esta de inestimável relevância para consecução dos objetivos desse trabalho acadêmico. Como assenta Luís Roberto Barroso (2009, p. 203) “os princípios – notadamente os princípios constitucionais – são a porta pelo qual os valores passam do plano ético para o mundo jurídico”.
2.2 Perspectiva Constitucional
O Estado de Direito se consolidou ao longo do século XIX na Europa, modelo que separa os poderes e protege os direitos individuais, ideologia esta sublimada pela Revolução Francesa. Na segunda metade do século XX com o fim da Segunda Guerra Mundial erguem-se as Constituições Normativas, sobrepujando o valorativo papel do Direito nessas mudanças sociais.
Nesse novo panorama, para que uma norma jurídica possua validade terminantemente deve estar em conformidade com a Constituição, norma fundamental de todo o sistema jurídico. Tecendo ilações sobre o exposto, Luiz Roberto Barroso dar por certo que:
A validade das leis já não depende apenas da forma de sua produção, mas também da efetiva compatibilidade de seu conteúdo com as normas constitucionais, às quais se reconhece a imperatividade típica do Direito. Mas que isso: a Constituição não apenas impõe limites ao legislador e ao administrador, mas lhes determina, também, deveres de atuação (BARROSO, 2009, p. 244-245).
O grande marco no Brasil desse novo direcionamento foi a Constituição Federal de 1988. É estabelecido, incontroversamente, o caráter humanitário com esteio na nova tábua axiológica idealizada pela justiça distributiva e igualdade substancial, paralelo aos dois postulados fundamentais: dignidade humana e solidariedade social. Nesse contexto, a Carta Magna em seu preâmbulo estabelece que:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL[7].
Deste modo, a Carta Superior não é mais vista como um simples documento essencialmente político, passando a carrear status de norma jurídica inaugural de uma nova era para os direitos humanos. Assim, nos dizeres de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:
[...] é certo e induvidoso que a Constituição é a norma suprema do sistema jurídico brasileiro, devendo-lhe obediência, formal e material, todos os demais atos normativos, sob pena de se lhes reconhecer a inconstitucionalidade, com a consequente expulsão do sistema (CRISTIANO; ROSENVALD, 2007, p. 20-21).
Certamente, os princípios estabelecidos no cume mais alto do ordenamento, ou seja, em âmbito Constitucional, são as diretrizes supremas do sistema jurídico brasileira. Tamanha importância é explicada pelo doutrinador Paulo Bonavides:
A inserção constitucional dos princípios ultrapassa, de último, a fase hermenêutica das chamadas normas programática. Eles operam nos textos constitucionais da segunda metade deste século uma revolução de juridicidade sem precedente nos anais do constitucionalismo. De princípios gerais se transforma, já, em princípios constitucionais. [...] Impossível deixar de reconhecer, pois, nos princípios gerais de Direito, conforme veremos, a base e o teor da eficácia que a doutrina mais recente e moderna, em voga nas esferas contemporâneas da Ciência Constitucional, lhes reconhece e confere, escorada em legítimas razões e excelentes argumentos (BONAVIDES, 2009, p. 259).
Compactuando das mesmas ideias são os argumentos de Ruy Samuel Espíndola:
Sem dúvida, a teoria dos princípios é, antes de tudo, um capítulo deveras rico e inovador na teoria jurídica contemporânea, na era do pós-positivismo. [...] A distinção entre regras e princípios como espécie do gênero norma, bem como as demais problematizações dela decorrentes, formam o alicerce para sólida compreensão da atual natureza principialista do Direito Contemporâneo. [...] Assim, é no Direito Constitucional que a teoria dos princípios ampliou o seu raio de circunferência científica, ganhando maior vigor, latitude e profundidade para desenvolver-se, pois seu campo, agora, é o universo das constituições contemporâneas, é o estalão das normas constitucionais, é o da explicitação conceitual e iluminação das positivações normativas de realidades jurígenas mais vastas e complexas, reflexos da estatuição jurídica do político (ESPÍNDOLA, 2002, p. 75-76-77).
Em preciosa análise do tema, Cezar Roberto Bitencourt arremata dizendo:
Poderíamos chamar de princípios reguladores do controle penal princípios constitucionais fundamentais de garantia do cidadão, ou simplesmente de Princípios Fundamentais de Direito Penal de um Estado Social e Democrático de Direito (itálico conforme texto original). Todos esses princípios são de garantias do cidadão perante o poder punitivo estatal e estão amparados pelo novo texto constitucional de 1988 (art. 5°). [...] Todos esses princípios, hoje insertos, explícita ou implicitamente, em nossa Constituição (art. 5°), têm a função de orientar o legislador ordinário para a adoção de um sistema de controle penal voltado para os direitos humanos, embasado em um Direito Penal da culpabilidade, um Direito Penal mínimo (itálico conforme texto original) e garantista (BITENCOURT, 2007, p. 10).
Eis o ponto nevrálgico que pretendíamos chegar com o presente artigo: analisar a criminalização da conduta de adquirir substâncias entorpecentes para consumo pessoal imanizada pela luz irradiante dos princípios constitucionais. Até porque, conforme assenta Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli (2011, p. 125) “a Constituição Federal constitui a primeira manifestação legal da política penal, dentro de cujo âmbito deve enquadrar-se a legislação penal propriamente dita, em face do princípio da supremacia constitucional”.
2.2.1 Princípio da Igualdade ou Isonomia
Consoante exposto anteriormente, a Constituição Federal de 1988 angariou diversos avanços nas proposições relativas aos direitos e liberdades individuais em comparação com as Constituições precedentes. Sem sombra de dúvidas, o princípio da igualdade constitui um dos pilares do direito penal do Estado de Direito ou, se preferir, do direito penal liberal, carreando valores fundamentais da Democracia.
A Carta Maior prevê o princípio da igualdade em seu artigo 5°, caput, prescrevendo:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes[8]:
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em seu artigo 1° também cunhou o referido princípio afirmando que os homens nascem e são livres e iguais em direitos, sendo que as distinções sociais só podem fundar-se na utilidade comum[9].
Assim, em sentido formal (isonomia possui intrínseca relação com o princípio da legalidade), poderia ser externalizado pela expressão: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Em apressada interpretação - separada do sentido empírico – poder-se-ia chegar à conclusão de que igualdade seria visualizada apenas em relação à lei (indistinção subjetiva), ou seja, deveria ser aplicada sem levar em consideração as pessoas sob sua égide. Maurício Antônio Ribeiro Lopes explica que:
Entendia-se, por tradição, que a igualdade de todos perante a lei se referia, fundamentalmente, à exigência de igualdade na aplicação da lei. As leis deveriam ser cumpridas sem que se levassem em conta as pessoas que viessem a ser por elas alcançadas (RIBEIRO, 1999, p. 279).
No entanto, qualquer interpretação e aplicação da referida norma desconexa de sua vertente material desaguariam, indubitavelmente, na inconstitucionalidade. Sem hesitação, deve-se buscar a igualdade material e, corroborando o exposto, Pedro Lenza aduz:
Deve-se, contudo, buscar não somente essa aparente igualdade formal (consagrada no liberalismo clássico), mas, principalmente, a igualdade material, na medida em que a lei deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente dos desiguais, na medida de suas desigualdades. Isso porque, no Estado Social ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa daquela apenas formalizada perante a lei (LENZA, 2008, p. 595).
Essa dissonância interpretativa levou a algumas classificações doutrinárias que se tornaram desnecessárias diante da orientação já delineada pela jurisprudência e doutrina, na qual se busca o tratamento desigual aos desiguais visando à isonomia substancial. Ensina, dessa maneira, Inocêncio Mártires Coelho:
Como, por outro lado, no texto da nossa Constituição, esse princípio é enunciado com referência à lei — todos são iguais perante a lei —, alguns juristas construíram uma diferença, porque a consideram importante, entre a igualdade na lei e a igualdade diante da lei, a primeira tendo por destinatário precípuo o legislador, a quem seria vedado valer-se da lei para fazer discriminações entre pessoas que mereçam idêntico tratamento; a segunda, dirigida principalmente aos intérpretes/aplicadores da lei, impedir-lhes-ia de concretizar enunciados jurídicos dando tratamento distinto a quem a lei encarou como iguais (MENDES; MÁRTIRES; GONET, 2009, p. 179).
Em diversos momentos a Constituição apregoa esta isonomia material, exempli gratia, estabelecendo a igualdade entre os homens e mulheres em direito e obrigações, conferindo às presidiárias condições de permanecerem com seus filhos durante o período de amamentação (artigo 5°, L, da CF). Em outras passagens, o sentido desse princípio deve ser extraído do conjunto sistêmico da Lei Superior, tendo por objetivo a igualdade de oportunidades entre as pessoas.
Indubitavelmente, os seres humanos são desiguais por diversos aspectos, mas, por essência, também podemos ser descritos como criaturas iguais, pois, em cada um de nós existe um sistema biopsicológico destinado a nos proporcionar a existência. Essa pluralidade de ângulos que nos diferem um dos outros constitui a riqueza humana, sendo extremamente salutar. Todavia, nefastos são os efeitos decorrentes das diferenças econômicas e sociais, inviabilizadoras de uma vida saudável e justa.
Enxergando o referido valor na área penal, podemos chegar à conclusão de que as leis estarão sendo aplicadas corretamente quando, pessoas de diferentes níveis sociais e econômicos, depois de realizarem uma conduta típica, serão responsabilizadas de maneira semelhante pelo estatuto correcional. Assim, a Constituição prevê no próprio texto do artigo 5°, caput, a igualdade sem distinção de qualquer natureza, devendo a lei penal ser aplicada de forma equânime independente das distinções acima apontadas.
Realizadas tais considerações, passemos agora a analise do artigo 28 da Lei de Drogas em consonância com o referido princípio. Conforme ficou estabelecido anteriormente, a Lei n.° 11.343/2006 prevê a figura típica do crime de adquirir drogas para consumo pessoal, sedimentando quais as substâncias são consideradas ilícitas por intermédio da Portaria do Ministério da Saúde.
Ora, senão extremamente incongruente, pelo menos deveria causar espanto perante nossos olhos tal descrição ilícita analisada em consonância com o princípio da igualdade. Isso porque, por interlúdio de uma norma penal em branco, determinam-se quais as drogas que são permitidas para consumo e as proibidas, em outras palavras, o que é lícito ou ilícito, quando ambas possuem potencialidade lesiva ao consumidor. Nesse sentido afirma Salo de Carvalho:
A ofensa ao princípio da igualdade estaria exposta no momento em que se estabelece distinção de tratamento penal (drogas ilícitas) e não-penal (drogas lícitas) para usuários de diferentes substâncias, tendo ambas potencialidade de determinar dependência física ou psíquica. A variabilidade da natureza do ilícito tornaria, portanto, a opção criminalizadora essencialmente moral (CARVALHO, 2010, p. 270).
Não restam dúvidas que, quando se proíbe determinadas drogas com o discurso de que causam danos para quem às utiliza, mas se permite outras substâncias que também causam prejuízos para integridade das pessoas, claramente faz-se sangrar a Constituição notadamente em relação ao princípio da isonomia. O álcool, exemplo de substância lícita, é indutor de tolerância e síndrome de abstinência, em níveis elevados no sangue pode causar náuseas e vômitos, diplopia, coma, hipotermia e morte por parada respiratória.
Em sendo o real objetivo com a proibição de certas drogas a preocupação com a saúde pública, congruente seria também a decisão de vedar todas as substâncias que de uma forma ou de outra causassem efeitos deletérios para o organismo humano. Como pensamos que a resposta para essa afirmativa é negativa, dever-se-iam possibilitar o consumo de todas aquelas substâncias que provoquem efeitos equivalentes às permitidas, só assim estaria respeitando a tão obnubilada isonomia constitucional. Nesse ponto, são precisas as lições de Lycurgo de Castro Santos:
Desse modo, cremos que ou o legislador proíbe a utilização de todos os tipos de estupefacientes que cientificamente comprovados prejudicam de maneira mais ou menos uniforme a saúde, ou permite o uso e o consumo de todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, provocam em quem os utiliza situações em certo grau equivalentes. O que não pode ocorrer, desde uma perspectiva penal, é uma diversidade de tratamento que compromete seriamente esse princípio constitucional (LYCURGO, Tóxicos, pp. 123/124 apud CARVALHO, 2010, p. 270).
Aduz-se, então, a patente inconstitucionalidade da criminalização da conduta de adquirir/portar drogas para consumo pessoal em face do princípio da igualdade, realizando, isto sim, uma discriminação legislativa. Merecem serem destacadas as ilações proferidas por Maurício Antônio Ribeiro Lopes (1999, p. 279) no sentido que “o referido princípio não proíbe que a lei estabeleça distinções, mas que estas não sejam discriminatórias dando tratamento desigual fundado em categorias meramente subjetivas”.
A partir dessa circunspecção é insustentável juridicamente a referida proibição legal prevista no artigo 28 da Lei Antidrogas. Imiscuindo-se no tema sobre o manto do princípio da igualdade, inquestionavelmente situações similares em consequências advindas com a utilização das drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas, são arbitrariamente cuidadas pelo poder legiferante, consubstanciando um verdadeiro moralismo criminalizador.
2.2.2 Direito à Privacidade
Previsto como um direito dos cidadãos, a privacidade vem expressa no artigo 5°, inciso X, da Constituição Federal, consubstanciando um mínimo de garantia contra as ingerências ilegais na vida íntima das pessoas. Dessa forma, o referido artigo aduz o seguinte:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação[10];
Igualmente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu artigo XII, regulamenta a matéria:
XII - Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques[11].
Imperioso observar que a Constituição Federal de 1988, ao contrário das anteriores, regulou expressamente o referido princípio. A doutrina e a jurisprudência inferem dos artigos acima mencionados uma diferenciação entre o direito a intimidade e o relativo à vida privada. Não obstante, ambos se assemelham e, quanto se tem o desiderato de distingui-los, verifica-se uma maior ou menor amplitude das referidas normas jurídicas. Delineando essa variabilidade terminológica sustenta Manuel Gonçalves Ferreira Filho que:
Os conceitos constitucionais de intimidade e vida privada (itálico conforme texto original) apresentam grande interligação, podendo, porém, ser diferenciados por meio da menor amplitude do primeiro, que se encontra no âmbito de incidência do segundo. Assim, intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo etc. (GONÇALVES, 1997, p. 35).
No mesmo sentido são os ensinamentos de Paulo Gustavo Gonet Branco:
Embora a jurisprudência e vários autores não distingam, ordinariamente,entre ambas as postulações — de privacidade e de intimidade —, há os que dizem que o direito à intimidade faria parte do direito à privacidade, que seria mais amplo. O direito à privacidade teria por objeto os comportamentos e acontecimentos atinentes aos relacionamentos pessoais em geral, às relações comerciais e profissionais que o indivíduo não deseja que se espalhem ao conhecimento público. O objeto do direito à intimidade seriam as conversações e os episódios ainda mais íntimos, envolvendo relações familiares e amizades mais próximas (MENDES; MÁRTIRES; GONET, 2009, p. 420).
Inobstante a clareza de opiniões acima proferidas, alguns autores preferem se referir aos princípios da intimidade e da vida privada como espécies do gênero direito à privacidade. Este, na hipótese ventilada, seria uma norma jurídica prenhe de significados, assim, não é outro o entendimento de José Afonso da Silva:
De fato, a terminologia não é precisa. Por isso, preferimos usar a expressão direito à privacidade, num sentido genérico amplo, de modo a abarcar todas essas manifestações da esfera íntima, privada e da personalidade, que o texto constitucional em exame consagrou (AFONSO, 2005, p. 206).
Em convergência de entendimentos afirma Dirley da Cunha Júnior:
A novel ordem constitucional oferece, expressamente, guarida ao direito à privacidade, que consiste fundamentalmente na faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos na sua vida particular e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade e intimidade de cada um, e também proibir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial humano (JÚNIOR, 2008, p. 636).
Tércio Sampaio Ferraz com clarividência de ideias explicita sua opinião:
Um direito subjetivo fundamental, cujo titular é toda pessoa, física ou jurídica, brasileira ou estrangeira, residente ou em trânsito no país; cujo conteúdo é a faculdade de constranger os outros ao respeito e de resistir à violação do que lhe é próprio, isto é, das situações vitais que, por só a ele lhe dizerem respeito, deseja manter para si, ao abrigo de sua única e discricionária decisão; e cujo objeto é a integridade moral do titular (SAMPAIO, 1992, p. 77).
A intimidade constitui uma esfera intangível das pessoas (salvo algumas exceções), legitimadora, só para ilustrar, dos segredos que escolhemos não compartilhar. Em havendo transgressões a esse direito fundamental, incidirão sanções cíveis e criminais sobre o autor do fato, até porque se trata de uma prerrogativa imprescindível para o desenvolvimento da personalidade das pessoas.
Com relação à vida privada, esta seria um garantia de independência dos indivíduos de viverem sua existência da forma que bem entenderem. Nesse sentido, são precisas as palavras de José Afonso da Silva:
[...] como conjunto de modo de ser e viver, como direito de o indivíduo viver sua própria vida. Parte da constatação de que a vida das pessoas compreende dois aspectos: um voltado para o exterior e outro voltado para o interior. A vida exterior, que envolve as pessoas nas relações sociais e nas atividades públicas, pode ser objeto das pesquisas e das divulgações de terceiros, porque é pública. A vida interior, que se debruça sobre a mesma pessoa, sobre os membros de sua família, sobre seus amigos, é a que integra o conceito de vida privada, inviolável nos termos da Constituição (AFONSO, 2005, p. 208).
Evidente, pois, que apesar das diferenciações terminológicas, o direito à privacidade abrange todos aqueles atributos pessoais garantidores de uma vida íntima e digna. Dessa maneira, constitui o gênero do qual decorrem direitos como a imagem, segredos de trabalho, hábitos, o nome, as relações familiares, os pensamentos e etc.
Para realizar na prática os anseios apregoados em um Estado Democrático, necessário honrar e valorizar os fatores subjetivos dos seres humanos, percorrendo, dessa maneira, na direção do progresso, limitando a ingerência estatal em vista do desenvolvimento dos indivíduos. Em consonância com essa extensão ideológica, a criminalização da conduta de consumir substância modificadora dos sentidos humanos, a nosso viso, constitui intervenção indevida na vida privada e íntima das pessoas.
As legislações proferidas em âmbito nacional e internacional criminalizadoras da referida conduta não subsistem a partir da análise do texto constitucional. Repisando essa afirmação são as conclusões de Maria Lúcia Karam:
A desautorizada interferência na vida privada manifesta-se claramente em legislações nacionais que, como a brasileira, reproduzem a imposição explicitamente criminalizadora da Convenção de Viena. Observa-se que as regras do artigo 28 da Lei 11.343/2006 mantêm a criminalização da posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas, apenas afastando a imposição de pena privativa de liberdade, para cominar a tal conduta as penas de advertência, prestação de serviços à comunidade, comparecimento a programa ou curso educativo e, em caso de descumprimento, admoestação e multa (KARAM, 2009, p. 30).
Aliás, aproveitando o ensejo, pretensões surgiram objetivando dar fé a fantasia de que a partir da entrada em vigor do novel diploma (Lei n.° 11.343/06) os consumidores de drogas não iriam mais à prisão, como forma de nos conformar com a nova legislação interventiva. Ledo engano, isso porque o não encarceramento já ocorria com a Lei n.° 6.368/76 que cominava pena de 06 meses a 02 anos e, por causa daquela pena máxima, a conduta se enquadrava como de menor potencial ofensivo aplicando-se a Lei n.° 9.099/95 (Juizados Especiais), introdutora da transação penal e da suspensão condicional do processo.
Outra questão a ser abordada em relação ao princípio ora analisado, diz respeito à separação entre o que faz parte do Direito e o que não esta compreendida nesta esfera. Assim, salienta Salo de Carvalho que um dos grandes fundamentos da inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas reside nessa questão:
Os direitos à intimidade e à vida privada instrumentalizam em nossa Constituição o postulado da secularização que garante a radical separação entre direito e moral. Neste aspecto, nenhuma norma penal criminalizadora será legítima se intervir nas opções pessoais ou se impuser padrões de comportamento que reforçam concepções morais. A secularização do direito e do processo penal, fruto da recepção constitucional dos valores do pluralismo, da tolerância e do respeito à diversidade, blinda o indivíduo de intervenções indevidas na esfera da interioridade (CARVALHO, 2010, p. 270).
Vale repisar que na atual conjuntura em que vivemos, qual seja, sobre a égide de um direito penal liberal, não podemos nos resignar com a definição pelo Estado de padrões de comportamento pertencentes à esfera privada das pessoas. Mesmo que a conduta em comento interfira na saúde dos indivíduos que a realizam, não deve ser objeto de regulamentação pelo Direito Penal, ingerência esta inadmissível em um Estado Democrático de Direito.
Destarte, em consonância com o quanto exposto, o Tribunal de Justiça de São Paulo proferiu o seguinte acórdão:
[...] O artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é inconstitucional. A criminalização primária do porte de entorpecentes para uso próprio é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal, porque não há tipificação de conduta hábil a produzir lesão que invada os limites da alteridade, afronta os princípios da igualdade, da inviolabilidade da intimidade e da vida privada e do respeito à diferença, corolário do princípio da dignidade, albergados pela Constituição Federal e por tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil.
Parece-nos, pois, que os aplicadores do direito começam a observar os equívocos perpetrados pela atual ordem jurídica, indubitavelmente, pela função interpretativa conferida pelos princípios, possibilitando a correção de eventuais enganos perpetrados pelo legislador em sua função político-criminal. Ressaltando o valor desta garantia fundamental, Salo de Carvalho em livro dedicado ao debate das reformas penais afirma:
Os princípios da inviolabilidade da intimidade e do respeito à vida privada (art. 5°, inciso X), aliado a outros dispositivos análogos [...] representam verdadeira pedra angular de um sistema jurídico democrático, pois fornecem, no aspecto processual, uma ferramenta pródiga de legitimação/deslegitimação da ação (ou omissão) do poder estatal (atividade legiferante, administrativa e/ou judicial) em sua relação com o “ser” do cidadão. Ou seja, por serem princípios diretamente ligados aos direitos de personalidade, determinam a esfera de não intervenção dos Poderes Públicos. Lembre-se que o respeito destes princípios possibilita não apenas a averiguação dos níveis de legitimidade do sistema, mas os graus de justiça e validade de toda estrutura jurídica infraconstitucional (BUENO; CARVALHO, 2005, p. 153).
Segundo Maria Lúcia Karam (2009, p. 33) “condutas desta natureza dizem respeito tão somente às escolhas pessoais, ao campo em que a liberdade do indivíduo é absoluta não podendo ser objeto de qualquer intervenção”. Portanto, a liberdade individual conferida às pessoas possibilita, da forma como elas bem entenderem, o desenvolvimento da esfera íntima (desde que não interfiram em outras pessoas), logo, a contumácia ingerência por parte do Estado nesse direito fundamental constitui patente inconstitucionalidade.
2.2.3 Princípio da Lesividade ou Ofensividade
Questão imprescindível para compreensão desde princípio e da própria Ciência Jurídica diz respeito ao Direito e a Moral. Em primeiro momento, até por conta da inteligibilidade do assunto, teremos que salientar as discussões acerca do que podemos inserir dentro do âmbito dogmático-jurídico e o que está fora desse contexto.
A princípio, o Direito e a Moral possuem algumas similaridades, pois, nos dizeres de Tércio Sampaio Ferraz Júnior (2007, p. 370) “ambos têm caráter prescritivo, vinculam e estabelecem obrigações numa forma objetiva, isto é, independentemente do consentimento subjetivo individual”. Não obstante, eles não se confundem, e traçar essas desigualdades não é tarefa das mais simples.
Desta forma, uns dos critérios diferenciadores aceitos pela doutrina correspondem à exterioridade e alteridade do direito. Como restará demonstrado, podemos colimar uma grande dessemelhança entre os preceitos morais e as normas jurídicas muito em decorrência daquelas duas características.
A saber, fatos sociais possuirão importância jurídica se causarem algum tipo de lesão (ou perigo concreto de lesão) a bem jurídico de outrem, ao passo que comportamentos internos estão fora dessa análise. Nessa feita, para que as manifestações humanas obtenham pertinência jurídica, deveras transpassar as introspecções pessoais (exterioridade) lesando direito de outrem (alteridade). Esse desiderato é corroborado por Nilo Batista:
No direito penal, à conduta do sujeito autor do crime deve relacionar-se, como signo do outro sujeito, o bem jurídico (que era objeto da proteção penal e foi ofendido pelo crime – por isso chamado de objeto jurídico do crime). [...] À conduta puramente interna, ou puramente individual – seja pecaminosa, imoral, escandalosa ou diferente – falta a lesividade (itálico conforme texto original) que pode legitimar a intervenção penal (BATISTA, 2007, p. 91).
Curial ressaltar que a diferenciação acima apontada não pode ser vista como verdade inconteste, de fato, motivos e intenções são proeminentemente relevantes para o Direito Penal, basta rememorarmos as questões atinentes aos elementos subjetivos do crime consistentes no dolo e na culpa. Do mesmo modo, a moral não é alheia à exterioridade da conduta, até mesmo quando a intenção é boa pode ser pranteada. Explicando estas características, Tércio Sampaio Júnior aduz:
A despeito da objeção apontada, há uma diferença importante entre a norma jurídica e o preceito moral. Enquanto aquela admite a separação entre a ação motivada e o motivo da ação, o preceito moral sempre os considera solidariamente. Isto é, o direito pode punir o ato independentemente dos motivos - por exemplo, nos caso de responsabilidade objetiva – mas isto não ocorre com a moral, para a qual a motivação e ação motivada são inseparáveis (TÉRCIO, 2007, p. 371).
Por consequência - inobstante a advertência realizada no parágrafo anterior - questões que não ultrapassem o âmago dos indivíduos, terminantemente devem ficar restritas à moral. Nessa dimensão ideológica, a partir do momento que nós, seres humanos, pudermos resolver nossos problemas sem afetar bem jurídico alheio por intermédio do dano (ofensividade), o direito não deve intervir. Repisando esse raciocínio, Roxin infere a seguinte ilação:
[...] só pode ser castigado aquele comportamento que lesione direito de outras pessoas e que não é simplesmente um comportamento pecaminoso ou imoral [...] o direito penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade, e além desse limite nem está legitimado nem é adequado para a educação moral dos cidadãos (1981, p. 25 e 28 apud BATISTA, 2007, p. 91).
Outro argumento assaz utilizado diz respeito aos efeitos decorrentes da inobservância das regras jurídicas, nesse caso, será infligida ao contraventor uma sanção expressamente prevista na lei (coerção). Diferentemente, os preceitos morais podem ser realizados espontaneamente ou não por estar inserido no íntimo das pessoas e, em havendo vitupério, o castigo não advém de seu conteúdo.
Inobstante as características acima esposadas, os institutos convergem em algumas situações, até porque a Justiça enquanto fim almejado pelo direito nada mais é do que um princípio moral regulativo (e não constitutivo). Doravante, passemos a análise do crime de adquirir/trazer consigo drogas para consumo pessoal, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, em face do princípio da lesividade.
O pressuposto lesividade, altaneiro para constituição de crimes, evidencia o porquê da diferenciação supramencionada. Nos dizeres de Rogério Greco (2008, p. 53) “remonta ao período iluminista, que por intermédio do movimento da secularização, procurou desfazer a confusão que havia entre direito e moral”. Extraído do artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal, explicita que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”[12].
Alguns doutrinadores preferem discorrer acerca do escopo fundamental do Estado Democrático de Direito, a saber, a Dignidade Humana, para referendarem o referido princípio. A norma jurídica da lesividade apregoa que, para o legislador erigir uma conduta humana a crime, faz-se imperioso que haja efetiva lesão ou, ao menos, um perigo concreto de lesão ao bem jurídico tutelado.
Nessa senda, bem jurídico nos dizeres de Cezar Roberto Bitencourt (2007, p. 07) pode ser definido “como o valor da vida humana protegido pelo Direito, e, como o ponto de partida da estrutura do delito é o tipo de injusto, representa a lesão ou perigo de lesão do bem juridicamente protegido”. Prenhe de significados, este conceito revela ser imanente ao fato delitógeno a ofensa ou ameaça concreta de dano a um valor relevante ao Direito.
Constata-se, nesses termos, consoante expõe Fernando Capez (2004, p. 25) que “não há crime quando a conduta não tiver oferecido ao menos um perigo concreto, real, efetivo e comprovado de lesão à bem jurídico”. Trazendo à baila as principais funções do princípio da ofensividade, Nilo Batista ensina que:
Podemos admitir quatro principais funções do princípio da lesividade. Primeira: proibir a incriminação de uma atitude interna [...] Segunda: proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor [...] Terceira: proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais [...] proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico (BATISTA, 2007, pp. 92, 93 e 94).
Merece ser dito o reflexo deste princípio em dois planos distintos: um direcionado ao legislador, delimitando as condutas que podem ser proibidas, e o outro destinado ao operador do direito na sua função interpretativa, adequando as normas aos princípios norteadores do Estado de Direito.
Acontece que, a semelhança do flutuar da areia entre os dedos sob a forte influência de uma ventania, o discurso legitimador do delito previsto no artigo 28 da Lei de Drogas degenera a teoria criminal acima coligida. Esta criminalização se atrela aos seguintes fundamentos: a) consistir em um crime de perigo abstrato e; b) tutelar o bem jurídico saúde pública. Nas instruções de Rogério Greco crime de perigo abstrato:
[...] também reconhecido como de perigo presumido, em que basta a prática do comportamento previsto pelo tipo para que a infração penal reste consumada, independentemente da produção efetiva de perigo ao bem juridicamente tutelado, a exemplo do que ocorre com a posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei n° 10.826, de 22 de dezembro de 2003), bem como o art. 306 do Código de Trânsito brasileiro que, com a nova redação que lhe foi dada pela Lei n° 11.705, de 19 de junho de 2008, que presume o perigo do comportamento daquele que é surpreendido conduzindo veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência (GRECO, 2012, p. 39).
Nesse ponto, torna-se irrelevante para configuração de um crime de perigo abstrato um dano real, concreto, ao valor que se pretende tutelar com a norma, visto que, na maioria das vezes não são bens jurídicos palpáveis, como o exemplo da saúde pública. Esses bens coletivos justificam a intervenção estatal sobre o fundamento de que, nesses casos, os indivíduos não podem dispô-los sem afetar os demais titulares.
Denominados de crimes vagos, não possuem vítimas determinadas. Dessa maneira, na lição de Damásio de Jesus (1994, p. 184) “são os que têm por sujeito passivo entidades sem personalidade jurídica, como a família, o público ou sociedade. Ex: ato obsceno (CP, art. 233)”.
Eis julgado da Turma Recursal do Rio Grande do Sul que corrobora as teorias legitimadoras do crime previsto no artigo 28 da Lei Antedrogas:
POSSE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. ART. 28 DA LEI 11.343/2006. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA.POSSE DE ENTORPECENTES. Constitucionalidade do art. 28, da Lei de Drogas. A quantidade de entorpecente apreendida com o acusado já presume ameaça a bem jurídico que extrapola a individualidade estrita do agente possuidor. Conduta típica. Absolvição. Prova judicialmente produzida se mostra insuficiente a dar suporte à sentença condenatória. Art. 386, inc. VII, do CPP.RECURSO PROVIDO. (Recurso Crime Nº 71002404556, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Newton Luís Medeiros Fabrício, Julgado em 22/02/2010).
No mesmo sentido, podemos visualizar outro julgado proferido pela Turma Recursal Criminal do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. ART. 28 DA LEI Nº. 11.343/2006. CONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO. Inexiste inconstitucionalidade, porquanto o art. 28 da Lei de Drogas tenha como objetivo tutelar a saúde pública, que se reveste do caráter de direito coletivo, sobrepondo-se ao direito individual daquele que utiliza substância entorpecente. A conduta de quem porta substância entorpecente, mesmo que ínfima a quantidade, afigura-se típica, o que se constitui em característica do delito em questão. Não se cogita quanto à descriminalização da conduta em face do advento da lei nº. 11.343/06. A infração tipificada no artigo 28 da Lei de Drogas se caracteriza como de menor potencial ofensivo, comportando a aplicação de penas mais brandas, dentre as quais não se insere a privação de liberdade, o que não significa a descriminalização da conduta. Jurisprudência majoritária que vê no cometimento do delito em questão dano à saúde pública, bem jurídico tutelado, não se abrindo espaço, portanto, para a aplicação do Princípio da Insignificância (Recurso Crime N° 71003823838, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Fábio Vieira Heerdt, Julgado em 07/08/2012).
Data vênia, tal linha ideológica não encontra mais espaço diante do contexto teórico que estamos encartados. Em uma ordem jurídica pautada pelo Estado Democrático de Direito, somente na hipótese (salvo algumas exceções) de efetiva e concreta investida contra interesse social relevante, estar-se-ia justificada alguma repressão penal (salvo hipóteses excepcionais, como o porte de arma de fogo de forma irregular). Não é outro o motivo que, no entender de Cezar Roberto Bitencourt:
Por essa razão, são inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstrato, pois, no âmbito do Direito Penal de um Estado Democrático de Direito, somente se admite a existência de infração penal quando há efetivo, real e concreto perigo de lesão a um bem jurídico determinado. Em outros termos, o legislador deve abster-se de tipificar como crime ações incapazes de lesar ou, no mínimo, colocar e perigo concreto o bem jurídico protegido pela norma penal. Sem afetar o bem jurídico, no mínimo colocando-o em risco efetivo, não há infração penal (BITENCOURT, 2007, p. 22).
Objetivando impedir que a soberania do Estado, na sua mais alta expressão, a da Justiça, reduza-se a arbitrariedades, e traçando os contornos necessários para mínima garantia dos direitos fundamentais, evidenciando a inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, aduz Luigi Ferrajoli:
O mesmo pode-se dizer dos denominados “delitos de perigo abstrato” ou “presumido”, nos quais tampouco se requer um perigo concreto, como “perigo” que corre um bem, senão que se presume, em abstrato, pela lei; dessa forma, nas situações em que, de fato, nenhum perigo subsista, o que se castiga é a mera desobediência ou a violação formal da lei por parte de uma ação inócua em si mesma. Também estes tipos deveriam ser reestruturados, sobre a base do princípio da lesividade, como delitos de lesão, ou, pelo menos, de perigo concreto, segundo mereça o bem em questão uma tutela limitada ao prejuízo ou antecipada à mera colocação em perigo (FERRAJOLI, 2002, p. 383).
Corroborando a opinião do doutrinado contrária ao denominados crimes de perigo abstrato instituidores de presunções dentro do Direito Penal, Luiz Flávio Gomes afirma:
Em virtude do princípio da ofensividade, de outro lado, está proibido no direito penal o perigo abstrato. Porte de arma de fogo quebrada ou desmuniciada: para quem não considera o princípio da ofensividade, há crime. Essa concepção, entretanto, segundo nosso ponto de vista, é inconstitucional (não se pode restringir direitos fundamentais básicos como a liberdade ou o patrimônio sem que seja para tutelar concretas ofensas a outros direitos fundamentais) [...] O aspecto valorativo da norma fundamenta o injusto penal, isto é, só existe crime quando há ofensa concreta a esse bem jurídico. Daí se conclui que o crime exige, sempre, desvalor da ação (a realização de uma conduta) assim como desvalor do resultado (afetação concreta de um bem jurídico). Sem ambos os desvalores não há injusto penal (não há crime). Contrariando praticamente toda doutrina do século XX, essa é a nossa clara posição a respeito do assunto (GOMES, 2006, p. 116).
Não se podem punir os seres humanos por intermédio de fatos que aos olhos de outrem constitua mera imoralidade, ainda mais com a utilização de uma ferramenta causadora de transtornos irreversíveis como é o caso do Direito Penal. Inconcebível, pois, por meio de interposto conjunto de frases se legitimarem o entendimento de que o ato de adquirir/portar substâncias entorpecentes para consumo pessoal causaria riscos por si só a coletividade. Inconformado quanto a isso, Salo de Carvalho faz a seguinte ilação:
O discurso da periculosidade presumida do ato (expansividade) e do escopo da Lei em tutelar interesses coletivos e não individuais permite, inclusive, que a posse de pequena quantidade de droga seja objeto de incriminação. A impossibilidade de constatação empírica das teses de legitimação do discurso criminalizador, decorrente sobretudo da intangibilidade do bem jurídico, por si só desqualifica a manutenção da opção proibicionista (CARVALHO, 2010, p. 267).
Como o próprio dispositivo especifica, a conduta prevista no artigo 28 da Lei de Drogas se destina a consumo pessoal, logo, poderá haver danos à saúde do próprio consumidor. Fato esse que evidencia a inexistência de expansividade do perigo, não existindo ofensa à saúde pública quando o único afetado é o usuário de drogas.
Nessa linha ideológica, não há como negar a contraposição entre ofensa ao bem jurídico abstrato “saúde pública” e a aquisição ou posse para uso pessoal de drogas, isso porque, a dilatação do perigo é incompatível com a destinação individual. Com identidade de raciocínio afirma com clarividência de ideias Maria Lúcia Karam:
A destinação pessoal não se compatibiliza com o perigo para interesses jurídicos alheios. São coisas conceitualmente antagônicas: ter algo para difundir entre terceiros, sendo totalmente fora de lógica sustentar que a proteção à saúde pública envolve a punição da posse de drogas para uso pessoal (KARAM, 1991, p. 126).
O Estado por interlúdio dos direitos e garantias fundamentais expressos na Constituição Federal se autolimitou, freando o ímpeto intervencionista que por ventura tenha existido em um dado momento histórico. Sem sombra de dúvidas a conduta que tem como fim a utilização de drogas consubstancia autolesão que, a exemplo do suicídio, não deve ser erigida a crime, decerto, a única lesão ocasionada se direciona ao próprio autor, nesse sentido Maria Lúcia Karam:
A simples posse das drogas tornadas ilícitas para uso pessoal, ou seu consumo em circunstâncias que não envolvam um perigo concreto, direto e imediato para terceiros, são condutas que dizem respeito unicamente ao indivíduo, à sua intimidade e às suas opções pessoais. Não estando autorizado a penetrar no âmbito da vida privada, não pode o Estado intervir sobre condutas de tal natureza [...] (KARAM, 2009, p. 29).
Em arremate, salientando a imprescindibilidade do princípio em comento, até porque constitui limite à intervenção na esfera privada das pessoas, pugna Guilherme de Souza Nucci:
Defendemos, portanto, que a ofensividade ou lesividade deve estar presente no contexto do tipo penal incriminador, para avaliá-lo, legitimá-lo, sob pena de se esgotar o Direito Penal em situações inócuas e sem propósito [...] a ofensividade é um nítido apêndice da intervenção mínima ou subsidiariedade do Direito Penal Democrático (NUCCI, 2007, p. 74/75).
O princípio da lesividade constituiu qualitativamente umas das maiores conquistas dos indivíduos em sociedade, ao passo que constitui óbice à intervenção Estatal nas liberdades de pensamento, ideologias políticas, filosóficas, de crença, e etc. Em outras palavras, conforme esclarece Juarez Cirino dos Santos (2008, p. 26), “essas liberdades constitucionais individuais devem ser objeto da maior garantia positiva como critério de criminalização e, inversamente, da menor limitação negativa como objeto de criminalização por para do Estado”.
Como explicita Salo de Carvalho (2010, p. 268) “mecanismos retóricos abstratos de legitimação da punição aos usuários produz significativa violência ao núcleo constitucional que deveria sustentar o direito penal”. Menoscabar o trato com a saúde das pessoas e criminalizar a conduta com a justificativa de uma pseudo tutela de interesses coletivos, consubstancia assinar atestado de incompetência referente às políticas públicas de redução dos danos. Com o atual sistema criminal de drogas vivenciamos o modelo de direito penal do autor, onde todo o usuário poderia se tornar em algum momento traficante.
2.2.4 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
É sabido por todos que a Constituição Federal de 1988 sistematizou regras jurídicas referentes à forma de Estado, à forma de Governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, bem como ao estabelecimento de seus órgãos e aos limites de suas ações. Aquela, também chamada de Constituição-Garantia, visa garantir a liberdade dos seus governados por meio da limitação do próprio poder. Dessa maneira, vivemos sob a égide da democracia que, conforme assenta Inocêncio Mártires Coelho:
[...] no plano das relações concretas entre o Poder e o indivíduo, considera-se democrático aquele Estado de Direito que se empenha em assegurara aos cidadãos o exercício efetivo não somente dos direitos civis e políticos, mas também e sobretudo dos direitos econômicos, sociais e culturais, sem os quais de nada valeria a solene proclamação daqueles direitos (MENDES; MÁRTIRES; GONET, 2009, p. 171).
Extraída do texto constitucional, a Dignidade Humana evidencia um dos grandes pilares do nosso corpo jurídico de normas, arrimando, fundamentalmente, o Estado Democrático de Direito. Dessa forma, delineando os contornos da República Federativa do Brasil, aduz o artigo 1°, inciso III, da Constituição Federal que, dentre os seus princípios democráticos a dignidade da pessoa humana estabelece garantia de incomensurável importância, destinada a assegurar uma ordem social equânime e pacífica.
O primeiro reconhecedor do princípio ora esboçado foi o filosofo de Königsberg, Immanuel Kant, um dos maiores expoente na seara da Ciência Ética. Em artigo dedicado ao tema, Victor Santos Queiroz (2005, p. 1) afirma que “Kant foi o primeiro a reconhecer que ao homem não se pode atribuir valor (preço), devendo ser considerado um fim em si mesmo e em função da sua autonomia enquanto ser racional”[13].
Destarte, o conjunto sistemático de ideias sobre os direitos humanos, construído posteriori à Segunda Guerra Mundial, consubstancia resposta aos regimes totalitários (grande parte responsáveis pelos conflitos) cuja ideologia prescinde os direitos e ressalta os deveres diante do Estado. Kant foi o defensor da liberdade inerente aos indivíduos, seres racionais e submetidos às leis morais, fundamentando todo o sistema internacional de proteção aos direitos humanos.
Immanuel é taxativo ao afirmar a impossibilidade de conceber qualquer coisa no mundo, ou mesmo fora dele, que possa ser considerada boa sem qualificação, exceto uma boa vontade, aquela dirigida pelo imperativo categórico. Por conta disso, fundamenta que os seres humanos são fins em si mesmo, pois não se concebe a sua vinculação como meio destinado a alcançar outros fins que não sejam os endomorais.
Dessa maneira, a Dignidade Humana se identifica como uma meta geral a ser alcançada fundamentando o Estado Democrático de Direito. Luiz Flávio Gomes inscreve de modo seguro que:
[...] esse princípio é a base de todos os demais, assim como do próprio modelo de estado que adotamos (Estado Constitucional e Democrático de Direito – CF, art. 1°, III). De qualquer maneira, no âmbito penal, cabe destacar o seguinte aspecto da sua força normativa: nem a lei e muito menos a pena pode ser ofensiva à dignidade humana sob pena de inconstitucionalidade patente (GOMES, 2006, p. 120/121).
Para Alexandre de Morais o referido princípio:
[...] concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das funções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estado jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos (MORAIS, 2008, p. 22).
Destacam-se, desta maneira, duas funções exercidas pelo princípio in concreto, enquanto direito pertencente a indivíduos determinados e como um valor absorvido por toda uma ordem social. As pessoas devem ser consideradas dignas seja qual for o objetivo colimado, somos sujeitos de direitos e não meros objetos.
A tipificação penal e o tratamento criminal dispensado ao adquirente/portador de drogas para consumo pessoal caminham na contramão dos preceitos estabelecidos acima, desrespeitando diretos imanentes aos seres humanos. Assim sendo, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana constitui a viga mestra de todos os direitos constitucionalmente consagrados, como a liberdade, igualdade, intimidade, a privacidade, dentre outros.
Claramente, quando o legislador delibera em criminalizar condutas prenhes de significados pessoais, mesmo que questionados a partir da moralidade, abnega-se o referido fundamento constitucional. Consoante insta Mauricio Antônio Ribeiro Lopes:
[...] somente as infrações mais graves da ordem social devem ser eleitas pelo Direito Penal como objeto de sua incidência [...] a importância da lesão do ordenamento jurídico (fundamentalmente a hierarquia do bem jurídico lesado) é codeterminante da gravidade do fato. Portanto, fatos que afetem bens jurídicos de pouco valor ou que importam lesões de pouca significância não poderão ser reprimidos [...] (RIBEIRO, 1999, pp. 254/256).
Continua o supracitado autor afirmando que (1999, p. 243) “muito embora a tutela dos direitos fundamentais do homem tenha sido expressa na Constituição, a nosso ver, carece de maior amplitude e pormenorização aos direitos preservados”. Nesse diapasão, respeitar a dignidade da pessoa humana pressupõe a proteção dos direitos e garantias fundamentais. A liberdade não pode ser vista como um simples direito de existência, devendo ser intangível às escolhas individuais, seja lá qual o fator determinante para tal, desde que, evidentemente, sejam respeitados os bens jurídicos alheios.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para respeitarmos o Estado Democrático de Direito, deve-se promover uma sociedade equânime que prime pelo reconhecimento da diversidade de valores e comportamentos, ora, democracia é justamente isso, tratar de forma igual e garantir o respeito às minorias ideológicas, até porque todos os seres humanos estão imantados pela dignidade humana.
Sem sombra de dúvidas, de igual importância é o papel do operador do direito na perspectiva de minimizar a criminalização e efetivar a Constituição Federal, especialmente devido à densificação do constitucionalismo no século XX. A partir daí, aquele diploma altera a percepção do ordenamento jurídico, passando a servir de filtro a produção legislativa infraconstitucional, ou seja, exercendo seu papel em um Estado Democrático de Direito.
Nesse contexto, no sentido de proceder à máxima efetividade das regras e dos princípios constitucionais, inicia-se o desprendimento acerca da legalidade estrita, criticando-se o saber derivado do positivismo dogmático. Quando se analisa a criminalização do adquirir/portar drogas para consumo pessoas à luz dos princípios constitucionais, observamos uma fragilidade do discurso legitimador da tipificação penal, onde o Estado nos dias atuais se vê obrigado a buscar alternativas para o combate das drogas, guerra esta perdida há muito tempo.
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NOTAS:
[1] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em 01 Set. 2012.
[2] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em 05 Set. 2012.
[3] Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=princ%C3%ADpio>. Acesso em 26 Set. 2012.
[4] Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=princ%C3%ADpio>. Acesso em 26 Set. 2012.
[5] Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/7527/normas-regras-e-principios>. Acesso em 27 Set. 2012.
[6] “Os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas existentes. Portanto os princípios são mandamentos de otimização”.
[7] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 02 Out. 2012.
[8] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 03 Out. 2012.
[9] Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf>. Acesso em 04 Out. 2012.
[10] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 05 Out. 2012.
[11] Disponível em: < http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso em 05 Out. 2012.
[12] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso 10 Out. 2012.
[13] Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/7069/a-dignidade-da-pessoa-humana-no-pensamento-de-kant>. Acesso em 24 Out. 2012.
Advogado, formado na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC); Pós-graduado em ciências criminais.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Dark Blacker de. Análise crítica e dogmática dos princípios aplicáveis ao artigo 28 da Lei 11.343 de 2006 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jan 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/48544/analise-critica-e-dogmatica-dos-principios-aplicaveis-ao-artigo-28-da-lei-11-343-de-2006. Acesso em: 22 nov 2024.
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