Resumo: Trata-se de artigo dedicado ao estudo do fundamento constitucional da prisão em flagrante e seu controle jurisdicional contemporâneo. O principal enfoque do estudo, elemento indissociável do tema ora trabalhado nesta produção acadêmica, a prisão, sobretudo a prisão em flagrante, pode ser tida como fator constitutivo dos pilares de sustentação do presente artigo.
Palavras-chave: Prisão em Flagrante; Controle Jurisdicional; Fundamento Constitucional.
Sumário: 1. Introdução; 2. Conceito de Prisão; 3. Espécies de Prisão Processual Cautelar; 4. Controle de Legalidade da Prisão; 5. Da prisão em flagrante e seu controle jurisdicional; Conclusão; Referências.
1 INTRODUÇÃO
O artigo que se apresenta, pretende lançar olhares à prisão em flagrante como instituto de repressão, providência imediata em decorrência da prática de ilícitos, medida primeira da persecução criminal, por vezes, necessária ao desencadeamento da processualística, quase sempre primordial ao esclarecimento da dinâmica fática.
Trabalhar-se-á a legalidade, sua previsão constitucional, modalidades e consequências imediatas de sua realização. O posicionamento doutrinário e a que se presta tal instituto. Sobretudo, buscar-se-á verificar a prisão em flagrante como inegável instrumento de cerceamento de liberdade, carecendo de extremado cuidado e rígido controle institucional.
Nada obstante, objetiva-se dentre outros aspectos, verificar os modos de controle. Traçando uma linha de entendimento que remeta o leitor aos ditames legais, fomentando estudos posteriores, de forma tal a não esgotar as linhas de pesquisa e tampouco os questionamentos em torno do assunto abordado. Contudo sob o aspecto contextual da presente obra, o capítulo é destinado a subsidiar de forma consistente a exploração da temática central que virá a ser abordada posteriormente.
Incumbência precípua da máquina estatal é a tutela dos bens jurídicos de maior relevância, sobretudo quando se trata da aplicação da lei penal. Antecedida pela vida, a liberdade configura como um dos maiores bens a serem protegidos. A prisão, neste contexto surge como resposta institucional à prática de atos antijurídicos de extremada relevância. Contudo a liberdade de alguém, somente deverá ser cerceada em casos justificáveis, e ausentes de outros meios.
Preceitua o art. 5.º, LXI, da Constituição Federal de 1988 que:
Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.
Têm-se por regra que a prisão, no Brasil, deva ser fundada em decisão de magistrado competente, devidamente motivada e reduzida a escrito, ou necessita decorrer de flagrante delito, especificamente neste caso cabendo a qualquer do povo a sua concretização. Os incisos LXII, LXIII, LXIV e LXV, do mesmo artigo, preveem e regulamentam a forma pela qual a prisão deve ser formalizada.
Assim, na lição de Guilherme de Souza Nucci, conceitua-se que:
É a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere. Não se distingue, nesse conceito, a prisão provisória, enquanto se aguarda o deslinde da instrução criminal, daquela que resulta de cumprimento de pena. (NUCCI, 2018, p. 294).
Enquanto o Código Penal regula a prisão proveniente de condenação, estabelecendo as suas espécies, formas de cumprimento e regimes de abrigo do condenado, o Código de Processo Penal cuida da prisão cautelar e provisória, destinada unicamente a vigorar, quando necessário, até o trânsito em julgado da decisão condenatória.
A prisão no processo penal equivale à tutela de urgência do processo civil. Ilustrando, o art. 300 do Código de Processo Civil: “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (NUCCI, 2018, p. 294).
Conceitualmente, muitas serão as definições encontradas, uma vez que a percepção humana permite ao observador dos fenômenos sociais, construir seus conceitos sob os mais diversos prismas, entretanto, no que tangue a prisão, os pontos de vista são convergentes na maioria dos aspectos. De acordo com Castelo Branco, “a prisão consiste em qualquer restrição a liberdade individual, dentro de casa, ou de penitenciária, ou de dependências policiais, ou de quartel, ou de casa fechada destinada a punição ou a correção, ou, ainda, pela limitação da liberdade mediante algemas, ou ligações a pesos etc.” (BRANCO,1980, p.4).
Por sua vez, vejamos que preleciona Fernando Capez que “a prisão é a privação de liberdade de locomoção determinada por ordem escrita da autoridade competente ou em caso de flagrante delito” (CAPEZ, 2004, p.227).
Desta forma, observa-se que em qualquer caso, a prisão deverá ser precedida de regulação legislativa. A privação de liberdade carece de justa causa e fundamentação específica, apresentando-se como a última fronteira a ser ultrapassada, como forma de proteção da liberdade.
3 ESPÉCIES DE PRISÃO PROCESSUAL CAUTELAR
A prisão cautelar deve se apresentar sob as balizas constitucionais apresentadas. A matéria penal usa do instituto da prisão, ora como meio para se atingir os fins processuais, verdadeira razão de ser da prisão cautelar, ora para dar cumprimento às sanções previstas legalmente, neste momento se manifesta a prisão como pena. A respeito da prisão cautelar, preconiza José Frederico Marques que:
[...] a prisão cautelar tem por objeto a garantia imediata da tutela de um bem jurídico para evitar as conseqüências do 'periculum in mora'. Prende-se para garantir a execução ulterior da pena, o cumprimento de futura sentença condenatória. Assenta-se ela num juízo de probabilidade; se não houver probabilidade de condenação, a providência cautelar é decretada a fim de que não se frustrem a sua execução e seu cumprimento. (MARQUES, 1997, p.23)
Definindo subsidiariamente a prisão cautelar, Paulo Rangel nos aponta que:
[...] a prisão constitui uma espécie de medida cautelar, isto é, é aquela que recai sobre o indivíduo, privando-o de sua liberdade de locomoção, mesmo sem sentença definitiva. Pode ser decretada desde o inquérito policial até antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Como é exceção, só pode ser decretada quando demonstrado o fumus boni iuris e o periculum in mora (RANGEL, 2000, p.365).
Tratam-se de seis modalidades, a saber: a) prisão temporária; b) prisão em flagrante; c) prisão preventiva; d) prisão em decorrência de pronúncia; e) prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível; f) condução coercitiva de réu, vítima, testemunha, perito ou de outra pessoa que se recuse, injustificadamente, a comparecer em juízo ou na polícia.
No último caso mencionado, por se tratar de modalidade de prisão (quem é conduzido coercitivamente pode ser algemado e colocado em cela até que seja ouvido pela autoridade competente), Nucci defende que somente o juiz pode decretá-la. Aliás, nessa ótica, cumpre ressaltar o disposto no art. 3.º da Lei 1.579/52 (modificada pela Lei 10.679/2003):
Indiciados e testemunhas serão intimados de acordo com as prescrições estabelecidas na legislação penal. § 1.º Em caso de não comparecimento da testemunha sem motivo justificado, a sua intimação será solicitada ao juiz criminal da localidade em que resida ou se encontre, na forma do art. 218 do Código de Processo Penal (NUCCI, 2018, p. 294).
Demonstra-se, pois, que as Comissões Parlamentares de Inquérito, cujo poder investigatório, segundo a Constituição Federal (art. 58, § 3.º), é próprio das autoridades judiciais, não devem ter outro procedimento senão o de requerer ao magistrado a intimação e condução coercitiva da testemunha para prestar depoimento. Logo, nenhuma outra autoridade pode prender a testemunha para conduzi-la à sua presença sem expressa, escrita e fundamentada ordem da autoridade judiciária competente (art. 5.º, LXI, CF).
Naquilo que se refere a prisão cautelar, tratando-se de estrangeiro, deve-se ter em conta a possibilidade de prisão para extradição. Entretanto não é mister do Supremo Tribunal Federal se reunir para decidir a situação do extraditando, em caso de não estar este detido de forma preventiva. Por outro lado, diante da possibilidade de que o Estado requerente de extradição, antes até do ingresso oficial do pedido de extradição, busque a decretação de prisão cautelar do extraditando.
O pedido de prisão cautelar noticiará o crime cometido e deverá ser fundamentado, podendo ser apresentado por correio, fax, mensagem eletrônica ou qualquer outro meio que assegure a comunicação por escrito. O referendado pedido de prisão poderá ser apresentado ao Ministério da Justiça por meio da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), devendo estar devidamente instruído com elementos probantes (documentação) da existência de ordem de prisão emitida pelo Estado estrangeiro.
Dá-se prazo de 90 (noventa) dias, da data em que tiver sido cientificado da prisão do extraditando, para formalizar o devido pedido de extradição. Neste aspecto vejamos os dizeres de Nucci:
Há, dessa forma, duas possibilidades de decretação da prisão preventiva para extradição: a) antes do ingresso do pedido de extradição no STF e como medida de cautela para que o extraditando não fuja; b) assim que ingressar o pedido extradicional no STF, para que o extraditando seja colocado à disposição da Corte. (NUCCI, 2018, p. 295).
4 CONTROLE DE LEGALIDADE DA PRISÃO
O advento da Carta Magna de 1988, inaugurou novos tempos no que diz respeito ao controle dos mecanismos de aplicação do Direito penal e Processual Penal. Coroando o gradativo processo de redemocratização. A Constituição Federal abre os horizontes para a consolidação dos princípios que lhes serviram de alicerce. Desta forma os princípios da Legalidade e do Devido Processo Legal, configuram como verdadeiras balizas a aplicação da lei.
Tratando-se do princípio da reserva absoluta de lei formal, verifica-se que incidirá nos casos em que seja imperativa a privação de liberdade, mesmo que provisória. As formalidades legais são exigência precípua, referem-se tanto a imposição de penas privativas de liberdade, quanto à fixação de medidas de caráter cautelar que afetam a liberdade em sua amplitude.
É impositivo constitucional que toda prisão seja fielmente fiscalizada por juiz de direito. Estipula o art. 5.º, LXV, que: “A prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”.
No mesmo sentido, dispõe o art. 310, I, do CPP:
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
I - relaxar a prisão ilegal. (..)
Além disso, não se pode olvidar que, mesmo a prisão decretada por magistrado, fica sob o crivo de autoridade judiciária superior, através da utilização dos instrumentos cabíveis, entre eles o habeas corpus:
Art. 5º, LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. (art. 5.º, LXVIII, CF).
Constitui abuso de autoridade efetuar prisão ilegal, deixar de relaxar – nesse caso válido apenas para o juiz – prisão ilegalmente realizada, bem como deixar de comunicar ao magistrado a prisão efetivada, ainda que legal. Quando a prisão for indevidamente concretizada, por pessoa não considerada autoridade, trata-se de crime comum (constrangimento ilegal e/ou sequestro ou cárcere privado).
5 DA PRISÃO EM FLAGRANTE E SEU CONTROLE JURISDICIONAL
A natureza jurídica da prisão em flagrante é de medida cautelar de segregação provisória do autor da infração penal. Isto posto, a aparência da tipicidade por si só, apresenta-se como elemento suficiente à sua realização, não se exigindo qualquer valoração prévia em torno da ilicitude e a culpabilidade, que por sua vez configuram como requisitos para a configuração do crime, a serem aferidos e processados ao longo da instrução probatória processual. Trata-se a tipicidade como sendo o fumus boni juris (fumaça do bom direito), fator autorizador da ação, entretanto não podendo ser dissociada do arcabouço legal vigente.
Nos termos do ensinamento de Guilherme de Souza Nucci, em definição aduz que:
Flagrante significa tanto o que é manifesto ou evidente, quanto o ato que se pode observar no exato momento em que ocorre.
Neste sentido, pois, prisão em flagrante é a modalidade de prisão cautelar, de natureza administrativa, realizada no instante em que se desenvolve ou termina de se concluir a infração penal (crime ou contravenção penal). (NUCCI, 2018, p. 301).
Prepondera em sede constitucional, que tal modalidade de prisão ocorra sem a expedição de mandado de prisão pela autoridade judiciária, conforme aduz a Carta Magna em seu (art. 5.º, LXI), daí emerge a fundamentação de seu caráter administrativo, apresentando-se como incompreensível que qualquer do povo (autoridade policial legalmente constituída ou não) ao se deparar com um crime em pleno curso, fosse impedido por força de lei, de tomar providências no intuito de cessar a ação criminosa, quando possível, e de deter o autor imediatamente, ficando por outro lado, sujeito aos excessos de suas atitudes. Conforme nos mostra Nucci:
O fundamento da prisão em flagrante é justamente poder ser constatada a ocorrência do delito de maneira manifesta e evidente, sendo desnecessária, para a finalidade cautelar e provisória da prisão, a análise de um juiz de direito. Por outro lado, assegura-se, prontamente, a colheita de provas da materialidade e da autoria, o que também é salutar para a verdade real, almejada pelo processo penal. Certamente, o realizador da prisão fica por ela responsável, podendo responder pelo abuso em que houver incidido. (NUCCI, 2018, p. 294).
A prisão em comento, realizada ao largo da existência de um mandado da autoridade competente, sujeita-se ao crivo imediato do magistrado, conforme previsão legal, poderá relaxar a prisão quando constatada qualquer ilegalidade à luz do (art. 5.º, LXV, CF). Cabendo a ressalva de que ao ser analisada e mantida pelo juiz, imbui-se de conteúdo jurisdicional, configurando como a autoridade coatora o magistrado que a deu sustentação.
A natureza jurídica da prisão em flagrante é de medida cautelar de segregação provisória do autor da infração penal. Isto posto, a aparência da tipicidade por si só, apresenta-se como elemento suficiente à sua realização, não se exigindo qualquer valoração prévia em torno da ilicitude e a culpabilidade, que por sua vez configuram como requisitos para a configuração do crime, a serem aferidos e processados ao longo da instrução probatória processual. Trata-se a tipicidade como sendo o fumus boni juris (fumaça do bom direito), fator autorizador da ação.
Tem essa modalidade de prisão, inicialmente, o caráter administrativo, pois o auto de prisão em flagrante, formalizador da detenção, é realizado pela Polícia Judiciária, mas torna-se jurisdicional, quando o juiz, tomando conhecimento dela, conforme afirmado anteriormente. Tanto assim que, havendo a prisão em flagrante, sem a formalização do auto pela polícia, que recebe o preso em suas dependências, cabe a impetração de habeas corpus contra a autoridade policial, perante o juiz de direito. Entretanto, se o magistrado a confirmar, sendo ela ilegal, torna-se coatora a autoridade judiciária e o habeas corpus deve ser impetrado no tribunal. Nesse diapasão, Nucci assevera que:
Quanto ao periculum in mora (perigo na demora), típico das medidas cautelares, é ele presumido quando se tratar de infração penal em pleno desenvolvimento, pois lesadas estão sendo a ordem pública e as leis. Cabe ao juiz, no entanto, após a consolidação do auto de prisão em flagrante, decidir, efetivamente, se o periculum existe, permitindo, ou não, que o indiciado fique em liberdade (NUCCI, 2018, p. 294).
A reforma implementada pela Lei 12.403/2011 tornou obrigatório, para o magistrado, ao receber o auto de prisão em flagrante, as seguintes medidas:
(art. 310, CPP): a) relaxar a prisão ilegal; b) converter a prisão em flagrante em preventiva, desde que presentes os requisitos do art. 312 do CPP e se forem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP; c) conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
Nesse sentido Nucci adentra em considerações sobre o tema:
Portanto, não há mais espaço para que o juiz simplesmente mantenha a prisão em flagrante, considerando a “em ordem”. Ele deve convertê-la em preventiva ou determinar a soltura do indiciado, por meio da liberdade provisória. A única hipótese de se manter alguém no cárcere, com base na prisão em flagrante, decorre da revogação da liberdade provisória, pelo não cumprimento de suas condições.
Mesmo assim, parece-nos ideal que o magistrado, quando revogar o benefício, promova a conversão da prisão em flagrante em preventiva; afinal, motivos existem, tendo em vista o desprezo do indiciado/réu em relação aos requisitos estabelecidos para a liberdade provisória. (NUCCI, 2018, p. 301).
Há casos em que, apesar da prisão ser realizada, o auto não precisa ser formalizado, como ocorre nas infrações de menor potencial ofensivo, desde que o detido se comprometa a comparecer ao Juizado Especial Criminal, conforme preceitua a Lei 9.099/95 (art. 69, parágrafo único).
Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima. Lei 9.099/95 (art. 69, parágrafo único).
Embora a referida lei mencione que não se imporá “prisão em flagrante”, deve-se entender que esta não será apenas formalizada através do auto, pois qualquer do povo pode prender e encaminhar à delegacia o autor de uma infração de menor potencial ofensivo, até pelo fato de que tipicidade existe e o leigo não é obrigado a conhecer qual infração é sujeita às medidas despenalizadoras da Lei 9.099/95, e qual não é. Por outro lado, convém mencionar a inviabilidade total de se prender em flagrante o usuário de drogas, conforme prevê o art. 48, § 2.º, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas).
Art. 48. O procedimento relativo aos processos por crimes definidos neste Título rege-se pelo disposto neste Capítulo, aplicando-se, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal.(...) § 2o Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários art. 48, § 2.º, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas).
Em matéria penal e processual penal, deve-se elevado respeito aos prazos e às consequências oriundas de sua inobservância. Aponta a legislação um período máximo de 24 horas, contadas da efetivação da prisão, devendo-se dar nota de culpa ao preso e enviar os autos da prisão em flagrante ao juiz competente. Na verdade, a comunicação ao magistrado deverá ser imediata, conforme aduzem os arts. 306 e 307 do CPP, apontando de fora inequívoca a necessidade de submeter a prisão em comento ao crivo jurisdicional. Como se vê:
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto;
Esse prazo é improrrogável, pois a prisão, ato constitutivo de cerceamento da liberdade, configura um natural constrangimento, motivo pelo qual não se devem admitir concessões. Não se contam as 24 horas a partir do término da lavratura do auto, pois isso ampliaria muito o tempo para que o indiciado ficasse sabendo, formalmente, qual o teor da acusação que o mantém preso. O prazo se inicia quando a prisão se concretiza, ainda fora da delegacia de polícia.
A nota de culpa é o documento informativo oficial, dirigido ao indiciado, comunicando-lhe o motivo de sua prisão, bem como o nome da autoridade que lavrou o auto, da pessoa que o prendeu (condutor) e o das testemunhas do fato. Aliás, é direito constitucional tomar conhecimento dos responsáveis por sua prisão e por seu interrogatório (art. 5.º, LXIV, CF).
Se a nota de culpa não for expedida (ou for expedida fora do prazo), entendemos configurar-se ato abusivo do Estado, proporcionando o relaxamento da prisão em flagrante, bem como medidas penais – abuso de autoridade, se for o caso, havendo dolo – e administrativas contra a autoridade policial.
Com isso não podemos aquiescer, já que essa modalidade de prisão, sem o prévio aval do juiz, prescinde do mandado, mas tem uma série de formalidades fundamentais a seguir. Não respeitadas estas, a solução é considerar ilegal a detenção e não simplesmente tomar providência contra o agente do Estado. É preciso juntar o comprovante de entrega da nota de culpa ao indiciado aos autos do inquérito. (NUCCI, 2018, p. 302).
Quando o crime for cometido na presença da autoridade competente para a lavratura do auto de prisão em flagrante – ou mesmo contra esta –, estando ela no exercício das suas funções, não há cabimento em se falar em condutor, ou seja, aquele que leva o preso até a autoridade encarregada da formalização da prisão. Por isso, dada a voz de prisão, o auto se faz com menção a essa circunstância, ouvindo-se as testemunhas e o indiciado (é preciso manter essa ordem, ainda que, da leitura do art. 307 do CPP, possa-se crer deva o indiciado falar antes das testemunhas).
Em seguida, segue-se o procedimento normal, enviando-se o auto ao juiz. Se quem lavrou o auto foi o próprio magistrado – o que não é aconselhável fazer – logicamente ele mesmo já conferiu legalidade à prisão. Se houver algum questionamento, deve ser feito por habeas corpus, diretamente ao tribunal. Registremos ser a remessa dos autos da prisão em flagrante à autoridade judiciária competente, antes de tudo, uma imposição constitucional, pois somente o juiz pode averiguar a legalidade da prisão, tendo o dever de relaxá-la, se for considerada ilegal (art. 5.º, LXV, CF)” (NUCCI, 2018, p. 302).
Ao avaliar a prisão em flagrante, é preciso que o magistrado fundamente a decisão de sua manutenção e, igualmente, o faça se resolver colocar o indiciado em liberdade provisória, com ou sem fiança. Nessa ótica, está a lição de Antônio Magalhães Gomes Filho:
Daí a indispensável exigência de que essa decisão seja integralmente justificada: quanto à legalidade, devem ser explicitadas as razões pelas quais se entende válido o flagrante; quanto à necessidade, nos mesmos moldes em que tal dever é imposto em relação ao provimento em que se decreta uma prisão preventiva (FILHO, 2001, p. 227).
Inexistindo autoridade policial no lugar onde a prisão efetivou-se, o preso deve ser apresentado a do local mais próximo, conforme preconiza o Artigo 308 do código de Processo Penal. Isto posto, infere-se que dado o caráter cerceador de uma garantia fundamental, a prisão deve ser revestida de legalidade, elemento a ser aferido inicialmente pela autoridade policial e por fim pelo magistrado, em sede jurisdicional.
CONCLUSÃO
O presente trabalho tratou-se dos fundamentos constitucionais da prisão, estabelecendo sua conceituação, as espécies de prisão processual de caráter cautelar, dispensando atenção ao controle de legalidade da prisão e ainda o controle jurisdicional da prisão em flagrante. Do artigo depreende-se que a prisão, de qualquer espécie deverá ser precedida de legislação que discipline, deve ainda observar os rígidos parâmetros constitucionais e que a única exceção à obrigatoriedade de ordem fundamentada de juiz, será a prisão em flagrante, entretanto, mesmo ela será submetida a controle de legalidade e jurisdicional, portanto, devendo ser o preso apresentado a autoridade judicial imediatamente.
REFERÊNCIAS
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal: 13. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Forense, 2018.
PACELLI, Eugenio. Curso de Processo Penal. 18. ed. São Paulo : Atlas, 2015.
PAIVA, Caio. Audiência de Custódia e o Processo Penal Brasileiro. Florianópolis: Empório do Direito: 2015.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 2ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 3 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2000.
SANTOS, M. S. Os Porões da República – A barbárie nas Prisões da Ilha Grande: 1894-1945. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.
SANTOS, Pedro Luiz Mello Lobato dos. Nulidade absoluta pela não realização de prova pericial em delitos que deixam vestígios. http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/6207/Nulidade-absoluta-pela-nao-realizacao-de-prova-pericial-em-delitos-que-deixam-vestigios. > Acesso em 20 mai. 2018.
SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 476 p. ISBN 85-203-2266-2.
TELES, Ney Moura. Direito Penal Parte Geral: Arts. 1º a 120. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
TONINI, Gian Paolo. A prova no processo penal italiano: Tradução Alexandra Martins, Daniela Mróz. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1. Ed, 2002.
TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudo sistematizado). – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl et al. Direito Penal Brasileiro: primeiro volume. 2. ed. Rio de Janeiro: Renavan, 2003.
Pesquisador - UNIFOR
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TELES, FILIPE EWERTON RIBEIRO. Da prisão em flagrante no Brasil: fundamento constitucional e controle jurisdicional contemporâneo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jul 2018, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51991/da-prisao-em-flagrante-no-brasil-fundamento-constitucional-e-controle-jurisdicional-contemporaneo. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
Precisa estar logado para fazer comentários.