ADEMIR GASQUES SANCHES
(Orientador)
RESUMO: No presente artigo, foram tratados os principais pontos do crime de lavagem de dinheiro, sua origem histórica, conceituação, fases, modalidades, bem como a realização de uma análise crítica dos aspectos materiais e processuais do crime. Posteriormente, foi abordado o mecanismo da delação premiada à luz da lei 9.613/1998 (atualizada pela Lei 12.683/2012), servindo como instrumento efetivo na elucidação dos fatos, contribuindo para o combate à criminalidade organizada, trazendo, a título prático, sua aplicabilidade na operação Lava Jato, realizada pela Polícia Federal no Brasil, que apurou grande mecanismo de lavagem de dinheiro que movimentou bilhões de reais em propinas, envolvendo muitos políticos de grandes partidos e a empresa petrolífera brasileira Petrobrás. Por último, fez-se necessário analisar os métodos de combate à lavagem de dinheiro em âmbito nacional e global. Conclui-se, portanto, que a finalidade deste estudo é justamente demonstrar a relevância que tal prática criminosa possui, tendo em vista seus reflexos sociais negativos, bem como perante o Sistema Financeiro Nacional e Internacional, exigindo uma atuação precisa e eficiente do Estado em busca da redução de atos delitivos desta natureza e alcance da paz social e econômica.
PALAVRAS-CHAVE: Lavagem de Dinheiro. Delação Premiada. Operação Lava Jato. Polícia Federal. Métodos de Combate.
ABSTRACT: In this article, the main points of the practice of money laundering, its historical origin, conceptualization, phases, modalities, as well as a critical analysis of the material and procedural aspects of the crime were treated. Subsequently, the awarding mechanism was addressed in light of Law 9.613 / 1998 (updated by law 12683/2012), serving as an effective instrument in the process of elucidation of the facts, contributing to the fight against organized crime, bringing, in a practical way, its applicability in Operation Lava Jato, carried out by the Federal Police in Brazil, which established every money laundering scheme involving many politicians from large parties and the Brazilian oil company Petrobrás. Finally, it was necessary to analyze the methods of combating money laundering at national and global levels.
Key Words: Money Laudering. Plea Bargain. Lava Jato Operation. Federal Police. Methods of Combat.
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Metodologia – 3. Breve Histórico: 3.1 Conceituação; 3.1.2 Fases da Lavagem – 4. Análise dos aspectos Materiais e Processuais após alterações dadas pela lei 12.683/2012: 4.1 Análises acerca da quebra da Dependência Punitiva e Extinção do Rol Taxativo – 5. Análise das alterações Processuais: 5.1 Tipo Penal Objetivo e Objeto Material do Crime; 5.2 Sujeito Ativo, Passivo e Bem Jurídico Tutelado; 5.3 Elemento Subjetivo; 5.4 Competência – 6. Mecanismo da Delação Premiada sob a Ótica da Lei de Lavagem de Dinheiro; 6.1 Benefícios Consistentes da Delação Premiada; 6.2 Efeitos da Delação Premiada na Operação Lava Jato – 7. Métodos de Combate à Lavagem de Capitais no Brasil – 8. Conclusão – 9. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O crime organizado existe desde os primórdios de uma sociedade objetivamente organizada, e, ao longo dos anos, fora sendo aprimorado e arquitetado, de forma a contribuir com o aumento da criminalidade, principalmente, no que tange ao tráfico internacional de drogas.
Em decorrência desse aumento, surge a necessidade de se utilizar de mecanismos que proporcionem às organizações criminosas a segurança de movimentação de valores de cunho valorativo, econômico, advindos de tais práticas criminosas, dentro do mercado financeiro, concedendo aparência de licitude.
Deste ponto, as atuações no âmbito financeiro, para burlar o sistema fiscalizatório, e conseguir a convolação de capital ilícito em “aparentemente lícito”, pronto para ser manuseado em movimentações financeiras, evoluíram de tal forma que atingiu diretamente a sociedade, nos aspectos econômicos, sociais, e políticos (como se demonstra nos gigantescos esquemas de corrupção no Brasil), preocupando o sistema de segurança pública de alcance internacional.
Chega-se ao grande questionamento de, quais as melhores ferramentas para que se viabilize a ruptura por completo da prática constante dos crimes financeiros, quais os tratados já realizados, se realmente tem surtido efeitos positivos, quais mecanismos legislativos poderão, além dos já existentes, serem criados para garantir uma maior efetividade na investigação dos crimes financeiros, em especial a lavagem de dinheiro, com atuação conjunta da máquina Policial e Ministério Público? Tendo em vista todo aparato interno e externo que já vem sendo construído para o combate à corrupção, e diante da evolução do profissionalismo por parte dos grupos criminosos, no tocante às práticas de crimes de ordem financeira, faz-se necessária a obtenção de ampla análise acerca das particularidades do crime de lavagem de dinheiro, seus efeitos, bem como os tratados internacionais já existentes para o enfrentamento ao crime organizado, para alcançar um senso crítico concreto acerca de quais os métodos que seriam eficientes no combate ao delito estudado no presente artigo.
2. METODOLOGIA
Neste trabalho serão utilizados métodos de análise literária, análise de legislação, de entendimento dos tribunais superiores, periódicos, matérias jornalísticas e demais materiais bibliográficos.
A princípio será feita uma breve análise introdutória, abordando traços históricos, conceituação e fases do delito de lavagem de dinheiro, tipificado no Código Penal, estabelecendo seus pressupostos e características principais.
Para desenvolver o estudo, será feita uma análise técnico-jurídica acerca da lei 9.613/98, principalmente com as alterações feitas pela lei 12.683/12, evidenciando os principais pontos legislativos que compõem a lei que rege tal delito, bem como a sua aplicabilidade nos casos concretos, concedendo destaque à operação Lava Jato, ocorrida no Brasil, que envolveu extensos esquemas de lavagem de capitais e corrupção no cenário político-administrativo público, envolvendo a empresa brasileira Petrobrás/SA.
O ponto chave deste trabalho é obter um amplo conhecimento acerca do tipo penal tratado, os institutos responsáveis pelo combate às práticas criminosas, para que se chegue a conclusões que possam expressar métodos de fiscalização e controle do mercado financeiro nacional e internacional efetivos, de modo a validar a metodologia de pesquisa utilizada.
3. BREVE HISTÓRICO
A título de noção introdutória, interessante ressaltar o contexto histórico da prática da lavagem no presente artigo, para uma abrangente compreensão do crime tratado em tela.
A prática recorrente do delito de lavagem de capitais não é um fato novo, pelo contrário, trata-se de prática que obtivera seu surgimento há muitos anos e que fora aprimorada e arquitetada constantemente, principalmente pelas organizações criminosas, servindo como meio de manutenção e sustento das facções.
O surgimento da Lavagem de capitais, historicamente, se deu na Inglaterra, no século XVII.
Constata-se que, nessa época, tempo em que as embarcações eram o centro de circulação de mercadorias e o canal da movimentação econômica, os piratas roubavam mercadorias de diversos navios e, posteriormente, depositavam tais objetos roubados com negociadores americanos. Tais negociadores trocavam toda mercadoria depositada por moedas de alto valor, consolidando o processamento de validação de tais bens obtidos de forma criminosa, para que, ulteriormente, pudessem ser utilizados pelos piratas.
A tipificação delitiva se deu na Itália, em 1978, em virtude do conjunto de ações realizadas pelo grupo criminoso “Brigadas Vermelhas” com intuito de manobrar o poder político estatal vigente. Todavia, o desenvolvimento do crime foi muito maior nos Estados Unidos da América (Money Laudering), que teve seu início com o caso Al Capone, um americano que havia comprado uma série de lavanderias e criado uma “empresa de fachada”, na cidade de Chicago. Empresa essa que possibilitava a concretização de depósitos bancários de baixo valor, considerados regulares, tendo em vista a média lucratividade que uma lavanderia oferecia (o que não levantava nenhuma suspeita por parte dos órgãos fiscalizadores), mas que na verdade, eram valores oriundos de vendas de bebidas alcóolicas, o que era proibido em território americano, consoante a vigência da Lei Seca. (BRAGA, 2010).
Após as primeiras tipificações ocorridas na Itália e EUA, surge a consolidação dos diplomas legais internacionais relevantes apenas no fim dos anos 1980 pela ONU (Organização das Nações Unidas), através da Convenção de Viena de 1988, e nove anos depois, pelo Grupo de Ação Financeira (GAFI). Também, a Convenção de Palermo, que discutiu o combate ao crime organizado transnacional em 2000, promulgada no Brasil por meio do Decreto 5015/2004. (BRAGA, 2010).
Frise-se o crescimento da preocupação mundial para com a prática de lavagem de capitais, em decorrência da intensa globalização e fortalecimento do crime organizado, principalmente o tráfico internacional de drogas, nascendo, portanto, convenções internacionais com o objetivo de coibir tal prática, cuja premissa primária tratada consiste em: “Coibindo a lavagem, coíbe-se, ou ao menos se reduz a prática criminosa.”
A partir daí, seguiu-se o processo de evolução legislativa. De acordo com Renato Brasileiro, num primeiro momento, a tipificação incidia somente nos casos de o crime antecedente ser o crime de tráfico ilícito de drogas (1ª Geração). Num segundo momento, com a edição da lei 9.613/1998, já se formalizou um rol taxativo de crimes anteriores como pressupostos à aplicação da lei sobre a lavagem de dinheiro (2ª Geração). Mais tarde, o rol taxativo se extinguiu, após alterações legislativas (Lei 12.683/2012), determinando-se a incidência da lei de lavagem de dinheiro sobre bens, direitos e/ou valores advindos de qualquer ilícito penal, o que vigora até os tempos atuais no ordenamento brasileiro (3ª Geração). (LIMA, 2016).
Com o conhecimento da origem histórica do crime, cumpre agora definir o conceito de “Lavagem de Capitais”, que possui vários sinônimos, como “branqueamento de capitais”. Porém, o termo utilizado no Brasil é “lavagem”, justamente pelo fato do termo “branqueamento” não ser tão conveniente, diante da natureza discriminatória.
Muitos crimes geram voluptuosas quantias monetárias – como por exemplo: o tráfico de armas, de drogas e de pessoas, sendo necessário que se tome algumas medidas, a fim de que haja a possibilidade concreta de usufruir de tais quantias, trazendo aparência de licitude, nascendo, por conseguinte, o crime de “ Lavagem de dinheiro”.
O termo “Lavagem de Dinheiro” ou “Lavagem de Capitais” significa conceder aparência lícita a quantias, bens e valores resultantes de crime. Consiste num processamento de transformação do capital obtido ilicitamente, tornando-o aparentemente lícito. Daí, portanto, o termo “lavagem”, ou seja, “limpar” o dinheiro sujo, tornando-o apto a adentrar ao mercado financeiro formalmente.
Em suma, em complemento ao raciocínio anterior, Lavagem de Dinheiro consubstancia-se numa sistemática procedimental incidida sobre bens, direitos e valores oriundos de atos criminosos (de 3ª geração, ou seja, infrações penais PRODUTORAS), com finalidade de convolar a natureza ilícita em lícita, para que sejam introduzidos ao Sistema Econômico de forma legal. Trata-se de um conjunto de ações que visam “mascarar” a natureza ilícita de determinado bem, direito ou valor.
Para melhor clareza, trago ao presente capítulo as palavras de José Paulo Baltazar Junior : “É a atividade de desvinculação ou afastamento do dinheiro da sua origem ilícita, para que possa ser aproveitado.” (BALTAZAR JUNIOR 2015, p. 1088).
Cumpre dizer que a finalidade primordial da lavagem de dinheiro é justamente mascarar a origem de recursos obtidos de forma criminosa, através de mecanismos de camuflagem do capital obtido ilicitamente, e não essencialmente a obtenção de lucro.
3.1.1. FASES DA LAVAGEM
Todo mecanismo de operações de lavagem se delimita em três fases: Colocação, Ocultação e Integração, consoante modelo do GAFI(Grupo de Ação Financeira). Alerte-se de que não se trata de procedimento necessário para que se caracterize a lavagem de dinheiro.
Consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal e da doutrina majoritária, basta a colocação do proveito ilícito para que se configure o delito de lavagem. Expõe-se posicionamento e entendimento recente consolidado pela Jurisprudência:
“PENAL. LAVAGEM DE DINHEIRO. OCULTAÇÃO. SIMULAÇÃO. DEPÓSITO DOS VALORES OBTIDOS ILICITAMENTE EM CONTAS DE TERCEIROS. QUADRILHA. INDÍCIOS. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. Para fins didáticos, o crime de lavagem de dinheiro se dá em três fases, de acordo com o modelo do GAFI - Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro, a saber: colocação (separação física do dinheiro dos autores do crime; é antecedida pela captação e concentração do dinheiro), dissimulação (nessa fase, multiplicam-se as transações anteriores, através de muitas empresas e contas, de modo que se perca a trilha do dinheiro [paper trail], constituindo-se na lavagem propriamente dita, que tem por objetivo fazer com que não se possa identificar a origem dos valores ou bens) e integração (o dinheiro é empregado em negócios lícitos ou compra de bens, dificultando ainda mais a investigação, já que o criminoso assume ares de respeitável investidor, atuando conforme as regras do sistema). Todavia, o tipo penal do art. 1º da Lei nº 9.613/98 não requer a comprovação de que os valores retornem ao seu proprietário, ou seja, não exige a comprovação de todas as fases (acumulação, dissimulação e integração). (...)" - g. N. - (TRF-4 - RCCR 50080542920124047200, Rel. José Paulo Baltazar Junior, D. E. 9.4.2014)
COLOCAÇÃO (PLACEMENT)
Trata-se da fase inaugural do procedimento de lavagem. Consiste na integração do capital oriundo de prática ilícita ao mercado financeiro, através do desmembramento do montante em quantias menores para posteriores depósitos em contas bancárias (smurfing), aplicações financeiras, investimentos diversos, utilização de “laranjas” e/ou doleiros intermediários que se incumbem de realizar transações para outros países, dentre outras formas. É a fase mais delicada para o criminoso ou a organização criminosa, tendo em vista ser a etapa de maior proximidade entre o capital e o(s) agente(s) criminoso(s), sendo, portanto, o momento mais oportuno para atuação eficaz da autoridade combatente. Diante disso, logicamente, nos tempos presentes, essa fase se aperfeiçoou muito, dificultando o rastreio das autoridades fiscalizadoras.
Menciona Walter Fanganiello Maierovitch que é a fase “de apagar a mancha caracterizadora da origem ilícita”. (MAIEROVITCH, Walter Fanganiello, 2009. P. 37.).
Um dos meios mais preferidos para os criminosos é o meio de jogos e bingos. Suponhamos que determinada organização criminosa obtivera R$300.000,00 (trezentos mil reais) de proveito em decorrência da prática de narcotráfico. Imediatamente, tais agentes compram bilhetes premiados no valor de R$200.000,00 (duzentos mil reais) - a título de prêmio em dinheiro - por R$300.000,00 (trezentos mil reais). Dessa forma, retornam à organização criminosa R$200.000,00 (duzentos mil reais). No caso em tela, perderam-se R$ 100.000,00 (cem mil reais) “sujos” em troca de R$200.000,00 (duzentos mil reais) “limpos”. É caso clássico de lavagem tratado pela doutrina. Denota-se, portanto, que a finalidade da lavagem não é o lucro, mas sim convolar bens, direitos e valores ilícitos em “aparentemente lícitos”, a fim de se utilizar de tais proveitos formalmente e sem suspeitas dentro do mercado financeiro.
OCULTAÇÃO (LAYERING)
Após a colocação do capital no Sistema financeiro, através de ações concatenadas, surge a necessidade de “apagar o passado”, eliminar a conexão do capital injetado no mercado com sua origem ilícita. Neste momento, como o objetivo principal é buscar distanciar o capital de sua origem, são realizadas transações variadas, depósitos para contas fantasmas ou paraísos fiscais, dificultando, por conseguinte, a identificação da ligação existente entre a infração antecedente e o capital resultante deste. Dois pontos relevantes que lideram o ranking de preferências dos criminosos: Utilização de paraísos fiscais e aplicações no setor imobiliário.
O conjunto de transações internacionais, geralmente intermediadas por doleiros, efetuadas por uma cadeia de empresas em conluio, é medida que demonstra muita eficácia na dissimulação da origem ilícita do capital, justamente pelo fato de existirem muitos países com políticas de fiscalização menos rigorosas, servindo como centros de atração dos criminosos. São os chamados “Paraísos fiscais”.
Diante da intensidade da prática de dissimulação entre países, vários tratados internacionais foram celebrados, a fim de que, havendo mecanismos de fiscalização e cooperação informativa entre vários países acerca de negociações internacionais, haja efetivo combate à pratica da lavagem, gerando segurança negocial e econômica. Destacam-se: Convenção de Viena, Convenção de Palermo e Convenção de Mérida, tendo como entidade internacional principal na atuação de combate, o GAFI (Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro), do qual o Brasil faz parte.
No tocante a prática da lavagem de capitais perante o setor imobiliário, o agente realiza compra de imóvel por um valor menor declarado, e em seguida, aliena-o para terceiros pelo preço de mercado, a fim de “limpar” todo o recurso ilícito.
Diante da extrema dificuldade de percepção da ocorrência criminosa nesta fase, o COAF(Conselho de Controle de Atividades Financeiras), com finalidade precípua de barrar o sucesso da ocultação de valores na esfera imobiliária, incumbiu as empresas a informar toda e qualquer transação imobiliária cujos valores negociados sejam iguais ou superiores a R$100.000,00 (cem mil reais), bem como, no prazo de 24 horas, encaminhar ao órgão fiscalizador qualquer tipo de negócio que traga alguma suspeita da prática delituosa constante na lei 9.613/1998, nos termos dos Arts. 7º a 12, da Resolução COFECI 1336/2014. (BRASIL. Resolução nº 1336, de 20 de outubro de 2014).
INTEGRAÇÃO
Trata-se da fase final do processo de lavagem, etapa em que todo o capital ilícito com aparência lícita é integrado formalmente ao Sistema Financeiro, por meio de investimentos ou compra de ativos, documentalmente legais, para serem usufruídos normalmente.
Após a separação física do capital ilícito e o agente criminoso, através da Integração de tal proveito no mercado financeiro (Colocação), com posterior multiplicação negocial, apagando o caminho do dinheiro sujo desde sua origem (Ocultação), este dinheiro se encontra apto a ser aplicado em investimentos lícitos, como a compra de bens, e tudo com registros fiscais formalmente regulares, a fim de servir de justificativa de ser o recurso, lícito, bem como todo o negócio, completando a “limpeza” do capital. (RÉGIS, Gian Carlos, 2017).
4. ANÁLISE DOS ASPECTOS MATERIAIS E PROCESSUAIS APÓS ALTERAÇÕES DADAS PELA LEI 12.683/12
Sabe-se que alterações impactantes foram feitas sobre os pontos materiais e processuais do crime de lavagem de dinheiro. Por isso, é de suma importância que se faça uma análise metódica das principais alterações trazidas pela lei 12.683/2012, bem como as novas características legislativas.
A título de conhecimento preliminar, cumpre frisar que o crime de lavagem de dinheiro é crime denominado pela doutrina como crime “parasitário”, “derivado” ou “acessório”, pois sua configuração depende de infração penal anterior, tal como ocorre com o crime de receptação. Por conseguinte, alterações relevantes foram efetuadas acerca deste aspecto parasitário.
Definido nas palavras de WALKER e FRAGOSO:
”Há de se registrar que o crime de lavagem de dinheiro tem a característica de ser derivado, acessório ou parasitário, sendo que o seu objeto material, bens, direitos e valores são provenientes da infração penal antecedente. e alterações significativas foram efetuadas acerca deste aspecto parasitário”. (WALKER JUNIOR, James; FRAGOSO, Alexandre, 2017).
O primeiro ponto a ser tratado, portanto, após esclarecimento supra, incide na alteração substancial do art.1º da lei 9.613/98. Antes das alterações, era dada a seguinte redação:
“Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II - de terrorismo;
II - de terrorismo e seu financiamento; (Redação dada pela Lei nº 10.701, de 9.7.2003).
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;
IV - de extorsão mediante seqüestro;
V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
VI - contra o sistema financeiro nacional;
VII - praticado por organização criminosa.
VIII - praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal). (Inciso incluído pela Lei nº 10.467, de 11.6.2002).” (BRASIL. Lei 9.613, de 03 de março de 1998. Diário Oficial da União, Brasília, 03 mar. 1998).
Note-se que havia um rol taxativo de crimes antecedentes para que se configurasse o crime de lavagem posteriormente. Vigorava, portanto, a sistemática de 2ª Geração.
Entretanto, com a vigência da lei 12.683/2012, este rol deixou de ser taxativo, trazendo como atual redação do art.1º:
“Art. 1º - Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.” (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Vê-se que, sob o aspecto material, a nova lei trouxe relevantíssima alteração, possibilitando a incidência da lei de lavagem de dinheiros sobre qualquer infração penal antecedente, desde que, entretanto, essa infração seja produtora, ou seja, capaz de produzir quantias (bens, direitos, valores) a serem posteriormente dissimuladas. E quando se diz “qualquer infração penal”, inclui-se até contravenção penal, como por exemplo, dinheiro auferido com "jogo do bicho”. Estabeleceu, portanto, a sistemática de 3ª geração.
Exemplificando: Caso um funcionário público cometa o crime de Prevaricação, descrito no art.319 do Código Penal, aonde ele retarde ato de ofício para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, não pode, em tese, este crime servir de base antecedente para ulterior prática de lavagem, uma vez que este crime não possuiu caráter “produtor”. Já se houvesse a prática de Corrupção Passiva, descrita no art.317 do Código Penal, poderia sim servir de base antecedente para ulterior crime de lavagem, vez que este crime possui caráter “produtor”, podendo o agente dissimular toda vantagem indevida recebida.
Cumpre ressaltar que não se deve confundir a prática de lavagem de dinheiro com mero exaurimento do crime anterior. Consoante a doutrina majoritária, o usufruto do produto oriundo do crime antecedente caracteriza mero exaurimento da infração, diante da ausência do elemento volitivo (querer dissimular a origem ilícita).
Portanto, caso o agente do crime de furto, por exemplo, compre um imóvel com a quantia monetária adquirida pelo furto e registre em seu próprio nome, não se configura lavagem, mas sim mero exaurimento da infração, vez que, a finalidade precípua do crime de lavagem é a ocultação, dissimulação da origem da vantagem indevida.
4.1. ANÁLISES ACERCA DA QUEBRA DA DEPENDÊNCIA PUNITIVA E EXTINÇÃO DO ROL TAXATIVO
Antes, para que houvesse punição pelo crime de Lavagem de Dinheiro, era necessária a identificação do crime antecedente. Hoje, não há necessidade de provar o crime antecedente, bastando que haja indícios suficientes que indiquem o recurso ser proveniente de atividade criminosa, havendo, portanto, a quebra da dependência punitiva.
De acordo com a lei 12.683/12 em seu art. 2º § 1º:
“§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.” (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Assim delineado o entendimento da Jurisprudência:
Habeas Corpus nº 94958 SP
“Ementa HABEAS CORPUS. CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO. PROVA DA MATERIALIDADE DO DELITO ANTECEDENTE. DESNECESSIDADE, BASTANDO A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE MOTIVO SUFICIENTE PARA O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM DENEGADA. Não é inepta a denúncia que, como no caso, individualiza a conduta imputada a cada réu, narra articuladamente fatos que, em tese, constituem crime, descreve as suas circunstâncias e indica o respectivo tipo penal, viabilizando, assim, o contraditório e a ampla defesa. A denúncia não precisa trazer prova cabal acerca da materialidade do crime antecedente ao de lavagem de dinheiro. Nos termos do art. 2º, II e § 1º, da Lei 9.613/1998, o processo e julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro "independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes", bastando que a denúncia seja "instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente", mesmo que o autor deste seja "desconhecido ou isento de pena". Precedentes (HC 89.739, rel. min. Cezar Peluso, DJe-152 de 15.08.2008).
Veja: mesmo que o agente tenha recebido a extinção de sua punibilidade pela infração penal antecedente, não haverá descontinuidade acerca do prosseguimento do processo por lavagem de dinheiro.
Insta salientar que há notória inconstitucionalidade da norma contida no art. 2º, inciso II justamente pelo fato de que não se pode valer-se de decisão não transitada em julgado do crime antecedente para justificar condenação pelo crime de lavagem de dinheiro.
Art. 2º - O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei: II - independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento ( BRASIL. Lei 9.613, de 03 de março de 1998. Código Penal. Diário Oficial da União, Brasília, 03 mar. 1998.)
Há real necessidade de que haja decisão fundamentada, certa e inequívoca, dotada de coisa julgada material, para que seja o agente punido pelo crime acessório. Caso contrário, haveria ofensa direta ao princípio da não culpabilidade, estatuído no art. 5º, inciso LVII da Constituição Federal, configurando, na maioria das vezes, decisões contraditórias. Haveria de se discutir punibilidade pelo crime de lavagem de dinheiro se o agente for absolvido pelo crime antecedente? Notório que não.
Outra alteração em questão, versa sobre a extinção de rol taxativo de crimes precedentes à investigação e processamento pelo crime de lavagem de dinheiro, firmando a possibilidade de ser, desde que produtora, qualquer infração penal antecedente suficiente para que haja incidência da lei de lavagem, conforme bem explicado acima.
Sob um primeiro aspecto, essa quebra do rol taxativo causou uma Incongruência jurídica, visto que, cometido uma contravenção penal, o agente “pagaria menos” pelo crime que originou os ativos ilícitos e mais pela Lavagem. Por outro lado, a amplitude concedida permite uma maior eficiência no combate às práticas criminosas, bem como na fiscalização, eliminando quaisquer brechas possíveis para viabilização da lavagem, fortalecendo o controle econômico.
Para Sérgio Moro, tal extinção "facilita a criminalização e a persecução penal de lavadores profissionais, ou seja, de pessoas que se dedicam profissionalmente à lavagem de dinheiro.” (MORO, 2010, p. 36).
5. ANÁLISE DAS ALTERAÇÕES PROCESSUAIS
No tocante às alterações de cunho processual, o primeiro ponto incide sobre algumas alterações no que tange ao aspecto processual da lei de lavagem de dinheiro, a começar pelos efeitos diferidos na ocorrência de citação por edital.
Antes da nova redação, o Art.2º, §2º trazia: “No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal)”.
Com a lei 12.683/2012, este artigo trouxe a seguinte:
“Art.2º, § 2º: No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), devendo o acusado que não comparecer nem constituir advogado ser citado por edital, prosseguindo o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor dativo.” (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Destaca-se aqui que, diferentemente do padrão adotado pelo Código de Processo Penal, o acusado que não comparecer, nem constituir advogado, e ser citado por edital, o processo não ficará suspenso, mas sim prosseguirá, podendo configurar o instituto da Revelia em determinado caso concreto.
Ato contínuo, outra alteração significativa incide no art.3º, que fora totalmente revogado, deixando a lei explicitação sobre o cabimento de fiança ou liberdade provisória em casos de sentença condenatória, trazendo fragmento definido pela norma constitucional elencada no art.5º, inciso XLIII, que prevê a lista de crimes inafiançáveis, e lá não consta o referido tipo penal, não podendo de forma alguma o legislador infraconstitucional proibir aplicabilidade do instituto da fiança em determinado caso concreto.
A terceira interessante alteração consiste no aprimoramento das medidas assecuratórias, com intuito de resguardar o patrimônio do acusado para suportar os efeitos da condenação, conforme disciplina o art. 4º da lei de Lavagem após nova redação:
“Art. 4o O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em 24 (vinte e quatro) horas, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta Lei ou das infrações penais antecedentes.” (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Aproveitando o ensejo, em continuidade ao art. 4º, seu parágrafo primeiro trouxe a possibilidade de Alienação antecipada, para a devida preservação valorativa dos bens:
“Art. 4º, § 1o Proceder-se-á à alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.” (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Dentre tantas outras alterações, cumpre ponderar como última alteração relevante a este estudo, a incorporação definitiva de pessoas Físicas e Jurídicas de caráter permanente ou eventual no art.9º, numa amplitude genérica, a estarem sujeitas às obrigações emanadas dos artigos 10 e 11 da referida lei, como por exemplo: a identificação de seus clientes e manutenção de cadastro atualizado, nos termos de instruções emanadas das autoridades competentes; e atendimento às requisições formuladas pelo Coaf na periodicidade, forma e condições por ele estabelecidas, cabendo-lhe preservar, nos termos da lei, o sigilo das informações prestadas.
“Art. 9o Sujeitam-se às obrigações referidas nos artigos 10 e 11 as pessoas físicas e jurídicas que tenham, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não:
I - a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;
II – a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial;
III - a custódia, emissão, distribuição, liquidação, negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários”. (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012).
5.1. TIPO PENAL OBJETIVO E OBJETO MATERIAL DO CRIME
No tocante à análise deste artigo 1º da lei de lavagem de dinheiro, destaca-se a pluralidade de ações nucleares. Todavia, caso o agente pratique mais de uma ação nuclear disposta na norma, este responderá pelo único crime de lavagem de dinheiro. Trata-se de tipo penal misto alternativo.
Ocultar significa esconder, resguardar o bem a fim de se evitar o conhecimento, a visibilidade deste.
Dissimular consiste numa ocultação qualificada, ou seja, o agente oculta se utilizando de meios fraudulentos, ardis, mecanismos complexos para dificultar a natureza/origem do bem.
Destaca-se que as ações nucleares incidirão sobre a natureza (gênero/espécie), origem (procedência), localização, disposição (emprego/uso), movimentação (circulação do proveito) ou propriedade.
O objeto material está descrito no primeiro artigo da lei de lavagem, não sendo somente a espécie “dinheiro”, mas todo e qualquer produto oriundo de vantagem ilícita. São os bens, direitos e valores obtidos com o proveito sujo.
Art.1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. (BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012).
5.2. SUJEITO ATIVO, PASSIVO E BEM JURÍDICO TUTELADO
O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa, sendo, portanto, um crime comum. Todavia, ao investigar a prática delituosa, por ser este crime, em sua maioria, composto por múltiplas ações complexas, o Ministério Público acaba tendo sérias dificuldades na identificação dos autores, tendo permissão para oferecer Denúncia genérica, desde que seja possível elucidar o mecanismo de lavagem para que haja a devida ampla defesa. É o que preconiza o STF, mais especificamente no Inquérito 2.471:
Inquérito 2.471, do Pleno STF: “não é inepta a denúncia por crime de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha ou bando que, em vista de diversos agentes supostamente envolvidos, descreve os fatos de maneira genérica e sistematizada, mas com clareza suficiente que permita compreender a conjuntura tida por delituosa e possibilite o exercício da ampla defesa”.
Há ainda controvérsias acerca da possibilidade de penalização das pessoas jurídicas. Isso já foi firmado, sendo a resposta negativa, vez que a incidência penal sobre pessoas jurídicas ocorre somente na lei de crimes ambientais (lei. 9605/98). Não há qualquer previsão de sanção penal sobre pessoa jurídica na lei de lavagem de dinheiro. O que se faz em situações de lavagem feita através de empresas, é justamente a imposição de sanções administrativas, dentre outras sanções de natureza diversa.
O sujeito passivo do crime é o ESTADO, visto que é o responsável pela ordem econômica e tributária afetada, bem como pela Administração da Justiça. É aí que adentramos ao objeto jurídico do crime de lavagem de dinheiro. Existem três correntes acerca do bem jurídico tutelado pela norma penal no que tange ao delito em tela tratado: A primeira corrente preconiza que o bem jurídico tutelado do crime de lavagem é o mesmo do crime antecedente, ocorrendo apenas um agravamento da lesão. A segunda preconiza que o objeto de tutela jurídica afetado pelo crime de lavagem é diverso do objeto jurídico do crime antecedente (Parcela adepta à defesa de ser a Administração da Justiça e outra parcela adepta à defesa de ser a própria ordem econômico-tributária). Por fim, uma terceira corrente que defende ser o crime de lavagem complexo, com múltipla ofensividade, permitindo acatar uma corrente anterior como majoritária, e outra, como subsidiária.
Longe de se obter uma definição harmônica, vêm prevalecendo nas disposições doutrinárias majoritárias, bem como pelo corpo jurisprudencial, ser o bem jurídico tutelado a ordem econômico-tributária propriamente dita.
5.3. ELEMENTO SUBJETIVO
Por óbvio, o elemento subjetivo consiste na figura “DOLO”. Todavia, a doutrina longe está de obter pacificidade no que tange ao abarcamento da modalidade DOLO EVENTUAL.
Em tese sumária, necessário se faz discernir Dolo Direto do Dolo Eventual:
Dolo direto, descrito no art. 18, inciso I, parte primeira, consiste na vontade integral da realização de conduta típica. O agente, portanto, prevê e age a fim de realizar determinada conduta típica. Já o Dolo Eventual está descrito no art. 18, inciso I, parte final, do Código Penal:
“Art.18, Diz-se o crime:
Crime doloso
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;”
(BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 31 dez. 1940).
Aqui, o agente assume o risco do resultado, embora não queira que aconteça. Há previsibilidade da conduta.
E toda discussão surgiu após a alteração do texto legal trazida pela nova lei de lavagem, retirando o termo (supressão da expressão “que sabe serem provenientes”), denotada no Art. 1º, parágrafo § 2º, inciso I, trazendo tacitamente a possibilidade da aplicação da lei pelo cometimento a título de dolo eventual.
A princípio, consoante a parcela da doutrina, não caberia a incidência da modalidade de dolo eventual.
Nas linhas de Callegari; Weber:
"A conduta do sujeito deve estar dirigida à ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimento ou propriedade dos bens provenientes dos crimes enumerados na lei de lavagem, o que significa, em princípio, que só é possível o dolo direto nestas condutas (CALLEGARI e WEBER, 2015, p.89). Grifo
Porém, outra parcela da doutrina defende que, em virtude da teoria da “Cegueira Deliberada”, bastaria que a previsibilidade e aceitação da conduta estejam incutidas no indivíduo para que este responda pelo crime de lavagem de dinheiro, assim aplicado pela jurisprudência norte-americana.
Essa tese defensiva tomou corpo na jurisprudência pátria após reincidentes aplicações da teoria da “cegueira deliberada” em processos relevantes, como é o caso do Mensalão, e mais recentemente, da Lava Jato, em que o Juiz Federal Sérgio Moro defendeu intensamente a aplicação da referida teoria, alegando que o sujeito se colocaria numa situação de ignorância para que se evite a ciência do que realmente está acontecendo, devendo responder pelo fato típico em tutela à segurança jurídica. (BRAGA,2010).
Conforme o Supremo Tribunal Federal definiu seu entendimento no Informativo 677 - Mensalão:
Informativo 677:
“No tocante ao crime de lavagem de dinheiro, [o Min. Celso de Mello] observou possível sua configuração mediante dolo eventual, notadamente no que pertine ao caput do art. 1º da referida norma, e cujo reconhecimento apoiar-se-ia no denominado critério da teoria da cegueira deliberada ou da ignorância deliberada, em que o agente fingiria não perceber determinada situação de ilicitude para, a partir daí, alcançar a vantagem prometida. Mencionou jurisprudência no sentido de que o crime de lavagem de dinheiro consumar-se-ia com a prática de quaisquer das condutas típicas descritas ao longo do art. 1º, caput, da lei de regência, sendo pois, desnecessário que o agente procedesse à conversão dos ativos ilícitos em lícitos. Bastaria mera ocultação, simulação do dinheiro oriundo do crime anterior sem a necessidade de se recorrer aos requintes de sofisticada engenharia financeira.” AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27, 29 e 30.8.2012. (AP-470)
Ante o exposto, finaliza-se que a incidência do dolo eventual vem sendo aceita pela jurisprudência brasileira, além do dolo direto já consubstanciado desde o início.
5.4. COMPETÊNCIA
Como regra, a competência para processamento e julgamento do crime de lavagem de dinheiro se opera no âmbito da Justiça Estadual, seguindo-se o Rito Comum Ordinário. Contudo, como toda boa análise sistêmica dos corpos legislativos, de maneira indistinta, a lei 9.613/98 traz exceções, em seu art. 2º, inciso III:
“Art. 2º: O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
III - são da competência da Justiça Federal:
a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;
b) quando a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal.”
(BRASIL. Lei 9.613, de 03 de março de 1998. Diário Oficial da União, Brasília, 03 mar. 1998).
6. MECANISMO DA DELAÇÃO PREMIADA SOB A ÓTICA DA LEI DE LAVAGEM DE DINHEIRO
O instituto da delação premiada está elencado como uma das ferramentas mais efetivas no procedimento de elucidação dos fatos, com consequente identificação de grupos criminosos e alcance do objetivo policial, que é justamente coibir a prática criminosa pela raiz, desvendando articulações criminosas e atingindo todos envolvidos, com a ajuda daqueles que já foram descobertos e capturados pela autoridade policial.
Consiste a delação premiada na concessão de benefícios ao colaborador, em troca de informações relevantes ou entrega de outros criminosos envolvidos no ato delituoso, colaborando para a investigação criminal.
Possui natureza jurídica de “meio especial de obtenção de prova, materializado em um “acordo” reduzido a “termo” para devida homologação judicial” (art. 4º, §§ 6º e 7º, da LCO).
Poderá ser procedida a delação tanto em fase pré-processual, quando judicial, ou até pós-processual, explicitados pelo artigo 4º, caput, §§ 2º , 4º e 5º, da lei 12.850/13.
Adentrando ao quadro dos crimes contra a ordem econômica, mais precisamente no crime de Lavagem de Capitais que vem sendo tratado no presente estudo, o instituto da colaboração premiada possui relevância de uma magnitude considerável, visto que a prática delituosa de lavagem de dinheiro, como visto anteriormente, é consubstanciada, em sua maioria, no conjunto complexo de ações feitas por organizações criminosas, havendo uma circulação de valores monetários voluptuosos resultantes de crimes de grande porte, e neste caso, a delação premiada é uma ferramenta que muitas vezes quebra a cadeia lógica da organização, alcançando a autoridade policial maiores resultados, e consequentemente, obtendo o Estado maior efetividade na aplicação jurisdicional e contribuindo para com a segurança jurídica e financeira em âmbito não só nacional, como global (claro, em cooperação com outros países).
A delação premiada se encontra em diversos diplomas normativos, e na lei de pauta – 9.613/98 – encontra-se no artigo 1º, § 5º, cuja redação trazida pela lei 12.683/12 denota:
“§ 5o A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.”
(BRASIL. Lei 12.683/2012, de 09 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 09 jul. 2012). Grifo
Antes de se concretizar a análise metódica do texto legal, importante destacar que, para que o objetivo da delação premiada seja alcançada, é preciso que as informações prestadas gerem resultados autônomos previstos. São estes:
- apuração da infração;
- identificação dos autores, coautores e partícipes;
-localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime
Veja que são resultados contributivos diretos para a cooperação da investigação criminal. Caso contrário, sendo informações irrelevantes, não terá direito algum o autor, coautor ou partícipe às benesses da premiação colaborativa.
Partindo, agora, à análise do texto legal, verifica-se que o texto diz que a colaboração deverá ser ESPONTÂNEA, VOLUNTÁRIA. (ato espontâneo é aquele ato que tem sua origem na vontade do agente, que nasce de circunstâncias intrínsecas à pessoa, sem que haja interferência externa). Todavia, o entendimento prevalecente acerca da configuração de concessão dos benefícios da colaboração premiada é de que não é a espontaneidade elemento substancial para aplicação dos prêmios legais. Sendo assim, desde que não haja coação, caso o agente tenha recebido conselhos e sido motivado por terceiro, não impede a aplicação dos prêmios legais.
6.1 BENEFÍCIOS CONSISTENTES DA DELAÇÃO PREMIADA
Serão concedidos, consoante o art.1º, §5º da lei de lavagem, os benefícios de redução de pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços); cumprimento da pena em regime aberto ou semiaberto; possibilidade de não aplicação da pena; substituição, a qualquer tempo, por pena restritiva de direito.
Um ponto a se destacar, é justamente a retroatividade da substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Destarte, poderá o magistrado retroagir este elemento legislativo a um condenado que aceite a colaboração premiada, vez que é permitida a retroatividade quando traga benefícios ao réu, aplicando a substituição de pena, podendo legalmente ser efetuada até em fase de execução penal, como explicado anteriormente.
Conclui-se, por fim, que a delação premiada (concessão de prêmios do Estado para aquele que colabora com a justiça) é ferramenta importantíssima na conjunção probatória, devendo ser constantemente realizada de forma bem aparelhada, para que se combata o crime organizado de uma forma mais célere e eficaz, trazendo maior segurança ao mercado financeiro e às apurações investigatórias, buscando a satisfação plena da aplicação jurisdicional em modo mais eficiente do que se só houvesse utilização apenas de recursos clássicos de obtenção probatória.
6.2. EFEITOS DA DELAÇÃO PREMIADA NA OPERAÇÃO LAVA JATO
Eis o maior caso concreto no âmbito nacional de corrupção e lavagem de dinheiro, a denominada operação Lava Jato, iniciada precisamente em março do ano de 2014, por meio de investigações acerca de possíveis movimentações de capitais ilícitos em postos de combustíveis e lava a jato, fato que originou o nome da operação, desencadeando o descobrimento por parte da Polícia Federal e Ministério Público, conjuntamente, de várias redes realizadoras de movimentação de recursos ilícitos operada por quatro organizações criminosas.
A sistemática da lavagem envolvia um conluio entre a maior empresa estatal brasileira: Petrobrás, Empresas Públicas e Privadas, destacando-se as Empreiteiras, e alguns Partidos Políticos. Consistia, portanto, em cobranças de propinas efetuadas por diretores e funcionários da Petrobrás às empresas e empreiteiras, em troca de facilitação negocial entre essas empresas e a estatal. As propinas variavam entre 1% a 5% do valor contido nos contratos superfaturados bilionários, intermediadas por doleiros, causando um desvio de Bilhões de Reais nos cofres da empresa estatal. (G1, 2018).
O objeto de facilitação negocial era justamente o procedimento licitatório. As empresas combinavam entre si quem realmente seria a empresa escolhida para efetuar determinado serviço, gerando uma concorrência aparente, mais precisamente um Cartel. Dessa forma, foram ramificadas as seguintes fases a seguir expostas que constituíram todo o esquema:
Em fase inicial, as propinas eram direcionadas aos intermediários, quais sejam, os operadores financeiros, que recebiam das empresas através de contratos simulados com empresa de fachada, ou por movimentações no exterior (paraísos fiscais), e posteriormente, após a validação valorativa do capital ilícito operado pelos doleiros intermediários, eram transferidas aos beneficiários diretos.
Em fase intermediária, era preciso manter o corpo de diretores e funcionários da estatal, que manteriam o esquema. Tais diretores e funcionários eram indicados por partidos políticos.
O diretor Paulo Roberto da Costa (indicado pelo Partido Progressista - PP), que ocupava a diretoria de abastecimento , Renato Duque(indicado pelo Partido dos Trabalhadores – PT), que ocupava o setor de Serviços, e Nestor Cerveró (indicado pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB) , que ocupava o setor Internacional. Tais grupos políticos atuavam em forma de associação criminosa, cujos crimes principais eram Corrupção Passiva e Lavagem de Dinheiro. (G1, 2018).
Tudo isso fora descoberto graças ao instituto das delações premiadas, operadas mediante delegação do Procurador Geral da República, que apresentou 28 petições de abertura de inquéritos criminais destinados à apuração de envolvimento de pessoas políticas citadas nas referidas delações premiadas ocorridas em primeira instância, ao Supremo Tribunal Federal.
E a fase conclusiva constituía o seguinte mecanismo de lavagem: - Indicação política dos diretores da Petrobrás; - cobrança de propinas às empresas públicas e empreiteiras, com posterior fraudes em licitações, de modo a garantir a facilitação negocial em troca de tais propinas; - destinação das propinas aos diretores da estatal, bem como aos partidos políticos envolvidos, através dos intermediários doleiros, em especial: Alberto Youssef, João Vaccari e Fernando Baiano. Este mesmo mecanismo ocorrendo nos três setores: Abastecimento, Serviços e Internacional.
Em atenção à aplicabilidade da delação premiada realizada pela força tarefa da polícia federal, somente com as colaborações foi possível descobrir todo esquema, cumprir mandados de busca e apreensão, bem como prender os principais agentes do esquema, dentre os quais foram o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, o ex-senador Delcídio do Amaral, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e Guido Mantega, o publicitário João Santana, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, o empresário Eike Batista e, em abril de 2018, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. (G1, 2018).
Vale ressaltar que, conjuntamente com a justiça brasileira, houvera cooperação da Suíça (principal alvo de transferências milionárias envonvendo as empreiteiras e a estatal), bloqueando todas as contas a agindo positivamente na identificação dos agentes movimentadores dos recursos ilícitos, contribuindo com a investigação, graças aos tratados e convenções internacionais que dispuseram de instrumentos de cooperação entre os países em prol do combate à lavagem de dinheiro. (LIMA, 2016).
Não se trata de qualquer esquema de corrupção e lavagem de capitais, trata-se do maior esquema nacional deflagrado pela Polícia Federal, e por este motivo, até os dias atuais, a justiça brasileira atua incessantemente na operação, que ainda está longe de ter um fim, mas que traz esperança ao povo brasileiro, garantindo a descoberta de todo esquema corruptivo, incidindo as consequencias devidas aos criminosos, como aplicação da mais lídima justiça.
7. MÉTODOS DE COMBATE À LAVAGEM DE CAPITAIS NO BRASIL
É de se enaltecer o principal momento do presente artigo. Trata-se do momento em que serão analisados os principais conjuntos operacionais e medidas já existentes em âmbito global para combater o crime de lavagem de dinheiro, ou seja, diante de todo o exposto acerca das peculiaridades de tal delito, sua abrangência de atuação, bem como consequências catastróficas que pode gerar numa sociedade, há de se concentrar, neste momento, sobre como, quais as melhores formas, quais os instrumentos adequados e medidas legislativas suficientes a quebrar referida ação criminosa.
No tocante ao Brasil, com a Lei 9.613/98, houve a institucionalização do COAF (Conselho de controle de atividades financeiras), responsável pela regulamentação fiscalizatória, administrativa e punitiva sobre toda e qualquer atividade financeira realizada em território nacional, com políticas de cooperação para com entidades governamentais e grupos financeiros, a fim de que haja completa reciprocidade na troca de informações, e consequente prevenção à atividades suspeitas. De forma simplificada, a título prático, as instituições financeiras fornecem informações acerca dos titulares de determinada movimentação financeira, a quantidade, destinação e finalidade de tal movimentação, a fim de garantir a segurança negocial. Caso haja alguma prática dentro do mercado financeiro suspeita, tais entidades devem imediatamente efetuar comunicação ao COAF, para que este analise a denúncia, investigue, e, se for o caso, tome as providências legais dentro de sua competência.
Com intuição de aumentar a eficiência do COAF e a consequente repressão mais severa às condutas ilícitas dentro do mercado financeiro, a elaboração da Medida Provisória nº 870, de 2019, alterou a lei da lavagem de dinheiro, precisamente em seu art.14, incorporando o Conselho de Controle de Atividades Financeiras no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, retirando-o do Ministério da Fazenda, para ampliar sua autonomia, fortalecendo o corpo investigativo na atuação de combate à lavagem.
Art. 72. A Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 14. Fica criado, no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades.” (Redação dada pela Medida Provisória nº 870, de 2019).” ( BRASIL. Lei 9.613, de 03 de março de 1998. Código Penal. Diário Oficial da União, Brasília, 03 mar. 1998.).
Além disso, é de suma importância no combate á lavagem de dinheiro, a existência do GAFI (Grupo de Ação financeira Internacional), um órgão intergovernamental que atua, em âmbito Sul-Americano, fortemente, no combate à lavagem de Dinheiro, funcionando como um protetor do Sistema Financeiro.
Mas afinal, quais as medidas efetivas que realmente coíbem, combatam intensamente a prática da lavagem? É exatamente para a implementação de tais medidas que existem os mencionados grupos de combate aos crimes financeiros, que atuam em conjunto para fortalecer o mecanismo econômico de todos os países.
Finalmente, chega-se ao ponto primordial, o ponto que realmente fortalece a camada de proteção aos crimes financeiros: As 40 Recomendações do GAFI.
São recomendações de medidas a serem tomadas para combater efetivamente o crime de lavagem de dinheiro. Dentre elas, destacam-se:
a) Planejamento a base de Risco
Essa medida consiste no direcionamento dos investimentos, implementação de recursos de controle negocial, às áreas que possuem maior risco. Para isso, necessário se faz a realização de um planejamento prévio para delimitar as áreas de maior risco, merecedoras de controle intensivo.
b) Transparência
Trata-se de uma medida importantíssima na PREVENÇÃO à lavagem. Consiste na exigência de troca de informações entre entidades financeiras e grupos controladores acerca das estruturas empresárias, movimentações, transferências eletrônicas, justamente com o fim de dificultar a dissimulação de recursos por parte dos agentes criminosos.
c) Cooperação Internacional
Consubstancia-se na proximidade entre Entidades Governamentais e setores de Inteligência Financeira, para fortalecer o poderio fiscalizatório, investigativo e punitivo das entidades combatentes de cada país.
d) Confisco
Por último, e não menos importante, aliás, pelo contrário, uma das mais interessantes medidas: Amparo Legislativo às autoridades para facilitar o confisco de bens lavados; produtos ou instrumentos usufruídos ou com a intenção de que fossem usufruídos em crimes de lavagem de dinheiro ou crimes antecedentes; bens que sejam produtos, ou que tenham sido usados, ou com a intenção de que fossem usados ou alocados para uso no financiamento do terrorismo, de atos ou de organizações terroristas; ou bens de valor equivalente.
E ademais, que a possibilidade de confisco seja permitida sem que haja exigência de condenação criminal prévia (Non Conviction Based Forfeiture). Isso acaba por prevenir negociações ilícitas futuras, evitando de forma genérica as ações das facções criminosas.
Essas são as medidas mais relevantes já colocadas em pauta e prática para o combate aos crimes financeiros, e tem reduzido consideravelmente a prática da lavagem de dinheiro, principalmente em virtude da forte interação de todas entidades combatentes nacionais e internacionais.
Portanto, finaliza-se este tópico com o reconhecimento da efetividade funcional que COAF obteve no Brasil, principalmente com o sucesso da operação Lava Jato, recebendo o prêmio Brasil de destaque no combate à corrupção na 5ª conferência internacional promovida pela associação nacional dos delegados de polícia Federal, em virtude dos serviços prestados em prol do combate à corrupção no país.
8. CONCLUSÃO
O presente artigo retratou as peculiaridades do instituto penal da lavagem de dinheiro sob a ótica do ordenamento jurídico nacional, e após este conhecimento, chega-se à conclusão de que os crimes financeiros afetam diretamente as relações sociais, bem como cessa o fortalecimento econômico do Estado. Entretanto, não só isso nos é chegado à conclusão (embora sejam as consequências imediatas da prática prevalecente de tal crime, não só no Brasil, mas no mundo todo), mas, chega-se, a título conclusivo, à confirmação de que a prática dos crimes financeiros, muitas vezes decorrentes da Corrupção, reflete a ausência de probidade, moralidade do ser humano. Valores ético-sociais que se esvaem, e justamente em decorrência disso, enxergam-se milhares de políticos, eleitos pelo povo, que só contribuem para com o crescimento da corrupção, do enriquecimento ilícito, e que pensam em si próprios. Apenas se trata de um mero espelho de como os tais valores sociais estão sendo apagados.
Nos dias atuais, notícias acerca de práticas de lavagem de dinheiro, praticadas principalmente por políticos, já não é motivo de espanto.
Demonstrou-se, neste artigo, a real necessidade de combate, tendo em vista a alta evolução tecnológica e o aprimoramento dos mecanismos de lavagem sendo realizados pelas facções criminosas. Para tanto, num outro aspecto do artigo, retratamos os meios e órgãos de combate ao crime organizado para com as práticas de lavagem de dinheiro que já foram instalados e estão em constante evolução na busca efetiva da paz econômica, como, no Brasil, o COAF (CONSELHO DE CONTROLE DE ATIVIDADES FINANCEIRAS), cuja funcionalidade é indispensável à diminuição de práticas criminosas do setor financeiro.
O crescimento do tipo penal estudado no presente artigo foi imensamente notório no Brasil, com os escândalos de corrupção para com a Estatal Petrobrás. E para combater esta predominância criminosa no Brasil, imprescindível foi a cooperação interna (Polícia Federal e Ministério Público), através da aplicabilidade da Delação Premiada como forma de desmembrar os mecanismos corruptivos (Cuja importância para o sucesso do combate no Brasil fora explanado no presente trabalho), bem como a cooperação entre os demais países, através de compartilhamento de dados e rígida fiscalização das movimentações financeiras externas.
Além disso, altos benefícios materiais e processuais foram também relevantes para a livre e efetiva atuação do Estado no combate à lavagem dinheiro, através da edição da Lei 12.683/2012, cujo ponto principal foi a maior amplitude de alcance de tal crime para toda e qualquer infração penal (Com a modificação do Artigo 1º da referida lei), e que, vale a pena ressaltar, a observância de aplicabilidade da lei 12.683/12 para as práticas de lavagem nas modalidades “ocultação” e ‘dissimulação” que se iniciaram antes de sua edição, mas que se protraíram no tempo e vieram a cessar após sua edição
(Aplicação da Súmula 711 do STF: “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”).
Há de se concluir o raciocínio trazido nas primeiras linhas desta conclusão. A agonia do presente artigo foi justamente trazer um pensamento de como a sociedade pode contribuir para o combate à lavagem de dinheiro no Brasil e no mundo. O corpo social precisa resgatar os valores éticos, morais, de repúdio ao crime organizado, à corrupção, e entender que não é apenas do Estado a função de combater a criminalidade. Não deve a sociedade se manter inerte, aguardando que o Estado consiga suprir todas as suas necessidades, mas sim, deve a sociedade atuar positivamente em cooperação com o Estado para eliminar de vez a mancha que um dia foi colocada perante ela e que vem aumentando cada vez mais, qual seja, as recorrentes práticas criminosas.
Necessário se faz a união entre nações, a fim de que os mecanismos de repressão à lavagem de dinheiro venham a se aperfeiçoar cada vez mais, enfraquecendo a cadeia criminosa e fortalecendo o Sistema Financeiro, para que os valores sociais e de conduta sejam reestabelecidos, e que práticas criminosas sejam cada vez menos recorrentes em toda a sociedade.
8. REFERÊNCIAS
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LIMA, Vinícius de Melo. Lavagem de dinheiro e ações neutras: critérios de imputação penal legítima. Curitiba: Juruá, 2014. Disponível em < https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/91159/lavagem_dinheiro_acoes.pdf >
Acesso em: jan. 2019.
BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 10ª ed., ver., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2015. Disponível em < https://forumdeconcursos.com/wp-content/uploads/wpforo/attachments/2/1403-Crimes-Federais-2017-Jos-Paulo-Baltazar-Junior.pdf > Acesso em: mar. 2019.
MAIEROVITCH, Walter Fanganiello. O crime de lavagem de dinheiro e o início de sua execução. Apud RISSI MACEDO, Carlos Márcio. Lavagem de dinheiro – Análise crítica das Leis 9.619, de 03 de março de 1998 e 10.701 de 09 de julho de 2003. Curitiba: Juruá, 2009. Disponível em < http://www.portaldeperiodicos.unisul.br/index.php/U_Fato_Direito/article/viewFile/1467/1123 > Acesso em: mar. 2019.
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Bacharelando em Direito pela Universidade Brasil Campus de Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JUNIOR, Antonio Sérgio Paulino. Análise sistêmica do crime de lavagem de dinheiro e o instituto da delação premiada sob a ótica da Lei 9.613/98 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 maio 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52869/analise-sistemica-do-crime-de-lavagem-de-dinheiro-e-o-instituto-da-delacao-premiada-sob-a-otica-da-lei-9-613-98. Acesso em: 22 nov 2024.
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