FERNANDO BEZERRA
(Orientador)
RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo central propor uma análise crítica referente ao instituto do foro por prerrogativa de função na esfera penal que consiste no direito de determinadas pessoas serem julgadas, em virtude dos cargos ou funções que exercem, pelos Órgãos Superiores da Jurisdição, em competência atribuída pela Constituição Federal ou constituições estaduais, sendo voltado as controvérsias causadas pelo instituto, uma vez que muitas das vezes nos julgamentos dos detentores de tal prerrogativa transmite-se a sociedade uma sensação de impunidade e se realmente este instituto jurídico viola ou não o princípio da isonomia, uma vez que o foro privilegiado foi pensado para ser um instrumento destinado a garantir o livre exercício de certas funções públicas, e não para acobertar a pessoa ocupante do cargo.
Palavras- chave: Foro especial. Prerrogativa de foro. Impunidade. Isonomia. Funções Públicas
ABSTRACT: The report work is the work in the main site is the right of the non-right of the nondireito of the non-direito of the non-direito of the nonary The presence of constitution federal is constitution the constituencies in the governance of the governance is the probabilization of the governance is the probabilization of the governance of the governor is not behaviour or real principle or real of isonomia, uma vez that the foro privilegiado was pensado para ser um dado storage a guarantee of the perth is your cliente.
Key words: Special Forum. Forum prerogative. Parliamentary impunity. Isonomy. Public Functions.
INTRODUÇÃO
O foro por prerrogativa de função é um tema que divide muito a opinião tanto da sociedade quanto de grandes doutrinadores, uma vez que há muitas críticas decorrentes das condutas ilícitas envolvendo agentes públicos que usufruem dessa prerrogativa, pela sensação de impunidade que é passada para sociedade, ainda mais por estes serem autoridades investidas pelo poder do estado democrático de direito, e da forma que se tornou um privilégio em razão da pessoa possuidora, e não da função exercida, ainda mais pelo atual cenário da política brasileira, onde há vários escândalos políticos envolvendo detentores do foro.
Porém este instituto não seria fundamental para o exercício da jurisdição de forma imparcial?
Pois para o julgamento dos ocupantes de cargos de maior hierarquia evitaria ou reduziria a utilização política do processo penal contra titulares de mandato eletivo ou altas autoridades, em prejuízo do desempenho de suas funções, evitando assim um julgamento imparcial a favor do réu.
Para tal objetivo, o presente estudo apresenta um conteúdo amplo referente ao foro por prerrogativa de função, exemplificando as autoridades que gozam dessa competência, analisando o foro desde seu início em nosso ordenamento jurídico, o objetivo de compreender como se desenvolveu o instituto da prerrogativa de foro no ordenamento pátrio.
A pesquisa que se propõe é um trabalho acadêmico de investigação do tema, baseando-se nas doutrinas desenvolvidas por diversos autores, o ordenamento pátrio, súmulas do STF e STJ, além de outros meios de informação em periódicos (revistas, boletins, jornais), sites da internet, entre outros.
1) A PRERROGATIVA DE FUNÇÃO
O foro privilegiado ou prerrogativa de função Trata-se de um instituto previsto pela Constituição, segundo a qual as pessoas ocupantes de alguns cargos ou funções, somente serão processadas e julgadas criminalmente (não engloba processos cíveis) por determinados Tribunais (TJ, TRF, STJ, STF). Onde indivíduos detentores da função política estatal, sendo autoridades investidas pelo poder do estado democrático de direito, possuem certa proteção política para o exercício de suas atividades.
Sua razão de ser é a especial posição política ou funcional ocupada por certas autoridades, que lhes vale um tratamento distinto daquele reservado aos demais cidadãos brasileiros.
Em síntese, a prerrogativa de foro no nosso ordenamento é considerada uma garantia e não um privilégio. Desta forma, não se direciona aos interesses individuas da pessoa que realiza uma função pública relevante, mas sim à preservação das instituições, em razão de suas atribuições. A prerrogativa de foro será incessantemente examinada ao longo do trabalho, por meio dos tópicos mais relevantes sendo, ainda, analisados seus pontos controversos.
1.1) ORIGEM NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Como se sabe o Brasil o Brasil teve uma tardia movimentação a respeito da elaboração de uma Constituição, sendo sua primeira constituição produzida em 1824, tendo como grande parâmetro a constituição francesa e americana.
Essa Carta, em seu art. 47, dispunha ser atribuição exclusiva do Senado imperial “conhecer dos delictos individuaes, commettidos pelos Membros da Familia Imperial, Ministros de Estado, Conselheiros de Estado, e Senadores; e dos delictos dos Deputados, durante o periodo da Legislatura”, bem como “conhecer da responsabilidade dos Secretarios, e Conselheiros de Estado”. O artigo 99 estabelecia ainda um privilégio absoluto para o Imperador, cuja pessoa era “inviolável e sagrada”, não estando sujeito a responsabilidade alguma. Ao Supremo Tribunal de
Justiça, mais alta corte de justiça imperial, cabia “conhecer dos delictos, e erros do Officio, que commetterem os seus Ministros, os das Relações, os Empregados no Corpo Diplomatico, e os Presidentes das Provincias”.
Após proclamada a República em 1889, surge uma nova Constituição (1891), o qual abrangeu ainda mais o foro privilegiado. Após alguns anos, especificamente em 1934, criou-se um Tribunal Especial para julgar esses casos; agora não mais o Senado julgava os privilegiados, mas sim um tribunal. Em 1937 em outra Constituição, ficou disposto que os privilegiados seriam julgados por uma comissão criada pelo Presidente da República, algo parecido com o que temos hoje, chamado de Supremo Tribunal Federal. E desde então, até chegar na Constituição de 1988 esta questão vem se tornando mais sólida e extensa.
No decorrer do tempo, houveram várias evoluções do instituto da prerrogativa de função, sendo que o modelo atual da Carta Magna de 1988 aumenta substancialmente os casos em que são admitidos o denominado foro privilegiado. Isso se deve pelo fato da Constituição Federal ter sido elaborada no auge da redemocratização do país, após um longo período de ditadura militar.
1.2) CONCEITO E PREVISÃO LEGAL
A Constituição Federal estabeleceu que determinadas pessoas são detentoras de foro especial, sendo assim, serão julgadas por órgãos superiores como o STJ e o STF. Trata-se, neste caso, da competência pela prerrogativa de função.
Insta salientar que há certa divergência em relação aos termos Foro Privilegiado e Foro por Prerrogativa de Função se traduzem o mesmo significado, pois para alguns doutrinadores, teoricamente não, uma vez que o foro por prerrogativa de função é estabelecido em razão do cargo ou função desempenhada pelo indivíduo. Trata-se, portanto, de uma garantia inerente à função. Já o chamado “foro privilegiado” é aquele previsto, não por causa do cargo ou da função, mas sim como uma espécie de homenagem, deferência, privilégio à pessoa. Ex: foro privilegiado para condes e barões. Porém o STF utiliza em seus julgamentos a expressão “foro privilegiado” como sendo sinônimo de “foro por prerrogativa de função”.
Esse também é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
A prerrogativa de foro é outorgada, constitucionalmente, "ratione muneris", a significar, portanto, que é deferida em razão de cargo ou de mandato ainda titularizado por aquele que sofre persecução penal instaurada pelo Estado, sob pena de tal prerrogativa - descaracterizando-se em sua essência mesma - degradar-se à condição de inaceitável privilégio de caráter pessoal.(Inq.1376 MG, relator: Min. Celso de Melo, data do julgamento 15/02/2007).
Sendo o órgão máximo e o principal guardião da lei no ordenamento jurídico, de acordo com o artigo 102, I, alíneas “b” e “c” da CF, o Supremo Tribunal Federal possui competência originária para processar e julgar os agentes públicos nas seguintes ocasiões: nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; Nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente.
Já o Superior Tribunal de Justiça conforme o artigo 105, I, “a” da Constituição Federal é competente para processar e julgar nos crimes comuns: os Governadores dos Estados e do Distrito Federal; nos crimes comuns e de responsabilidade: os Desembargadores dos
Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais
Regionais Federais, os dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os dos Ministérios Públicos da União que oficiem perante Tribunais.
Os Tribunais Regionais Federais cabe a competência para processar e julgar, nos crimes comuns e de responsabilidade, os Juízes Federais no âmbito de sua jurisdição, Justiça Militar e da Justiça do Trabalho e os Membros do Ministério Público da União.
E os tribunais de justiça, de acordo com o art.96, X, da Constituição Federal, compete privativamente processar e julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral, pois se um prefeito cometer um crime eleitoral deverá ser julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral.
2) PRIVILÉGIO OU PRERROGATIVA? FERE O PRINCÍPIO DA ISONOMIA?
Em função do atual cenário brasileiro de corrupção dos agente públicos detentores do foro de prerrogativa de função, os cidadãos entendem que a prerrogativa de função é sinônimo de privilégio, pela sensação de impunidade que é transmitida a sociedade, e também doutrinadores do direito, que afirmam que tal imunidade se transformou em um instrumento de vantagem dos detentores, para se esquivarem dos processos criminais a que deveriam responder e das possíveis penalidades que lhes seriam cabíveis como se posicionou o Ministro Luiz Roberto Barroso, em palestra no Centro Universitário de Brasília, no final de janeiro de 2016:
Foro por prerrogativa de função é um desastre para o país, a minha posição é extremamente contra [...]. É péssimo o modelo brasileiro e estimula fraude de jurisdição, na qual, quando nós julgamos, o sujeito renúncia, ou quando o processo avança, ele se candidata e muda a jurisdição. O sistema é feito para não funcionar. [...]A autoridade, o parlamentar, as pessoas que estão expostas às vezes a um determinado tipo de má vontade ou de perseguição, elas podem ter algum tipo de proteção institucional, mas isso se realizaria com juízo de primeiro grau, em Brasília, com recursos para o Supremo ou o STJ (Superior Tribunal de Justiça) (TERRA, 2016).
Atualmente há um grande número de autoridades detentoras de foro, estima- se que 37 mil agentes públicos, e Infelizmente há também um grande número de processos contra as autoridades possuidores de prerrogativa de foro, e como exemplo, o Supremo Tribunal Federal não tem estrutura para julgar todos os casos de forma definitiva, o que contribui ainda mais para a indignação dos populares contra a imunidade, uma vez que transmite sensação de impunidade, como afirmou o ministro do STF, Gilmar Mendes, em entrevista à istoÉ (2016):
Há um elenco muito significativo (de pessoas com foro privilegiado). O modelo foi pensado para situações excepcionais. Mas no Brasil temos neste momento, creio eu, 90 parlamentares investigados, dos quais 45 ou alguma coisa assim já com ação em tramitação. Esperava-se que fosse um número excepcional, mas infelizmente isso se tornou algo um tanto quanto comum. [...] Depende de emenda constitucional, mas acredito que já há um bom consenso na percepção de que processos não podem estar originariamente no STF [...]. Depois que o STF aplicou penas elevadas, eles (parlamentares) começaram a achar desinteressante o foro privilegiado. (istoÈ,2016)
A Ministra Cármen Lúcia, em entrevista concedida à revista Época, em abril de 2016, quando questionada sobre a prerrogativa de foro em crimes comuns para parlamentares, presidentes e vice-presidentes, alegou ser contra e não haver razão para a existência de tal instituto, visto que a República tem pilares definidos na igualdade:
Sou contrária a esse foro especial para qualquer pessoa. E já votei assim. Acho que qualquer um de nós tem de responder em igualdade de condições. Uma característica essencial da República é a igualdade. Temos ótimos juízes, competentes e sérios no Brasil. Não vejo nenhuma razão para que casos de algumas pessoas sejam transferidos para o Supremo (ÉPOCA, 2016)
Porém nem todos veem o instituto como instrumento de vantagem dos detentores, uma vez que, o foro privilegiado fora originariamente criado para que no julgamento dos ocupantes de cargos de maior hierarquia, não se utilizasse a política para que houvesse um julgamento parcial e cheio de pressões, garantido assim um julgamento justo.
Sobre o tema, Fernando da Costa Tourinho Filho (2007, v. 2, p. 136), enfatizando o fato de o foro especial não ser concedido em virtude da pessoa, mas do cargo por ela ocupado, traz, em sua obra, justificativas à existência de tal critério, defendendo que não se verifica, in casu, ofensa à igualdade:
É verdade que a Lei Maior, no art. 5º, caput, estabelece que “todos são iguais perante a lei”. Sendo, como efetivamente são, esse direito concedido a tais pessoas não conflitaria com aquela igualdade? Obviamente não. Não se trata (conforme dissemos) de um privilégio, o que seria odioso, mas de uma garantia, de elementar cautela, para amparar, a um só tempo, o responsável e a Justiça, evitando, por exemplo, a subversão da hierarquia, e para cercar o processo e julgamento de especiais garantias, protegendo-os contra eventuais pressões que os supostos responsáveis pudessem exercer sobre os órgãos jurisdicionais inferiores.
No mesmo sentido Tourinho Filho (p.138, 2008) concorda:
Não seria adequado que um Desembargador pudesse ser processado e julgado por um Juiz de Direito, em face da subversão hierárquica” visto que, “o Desembargador faz parte de um órgão superior que reexamina as decisões dos Juízes de Direito, [...] integra um órgão que exerce fiscalização sobre a conduta dos Magistrados.
Em semelhante análise, José Frederico Marques (2000, p. 75) defendeu:
O que veda esse dispositivo [artigo 5º, XXXVII, da Constituição da República] é o foro estabelecido em atenção à pessoa em si (como nos casos dos foros pessoais, - rectius, profissionais). Aqueles instaurados em razão da relevância da função se acham perfeitamente legitimados, mesmo porque efetivam certa subversão hierárquica, como, por exemplo, o julgamento de um magistrado de grau superior perante um juiz inferior.
Maria Lúcia Karam (2005, p. 38), ressaltou que nem sempre a competência originária dos tribunais traz consigo vantagens ao acusado (haja vista, por exemplo, a possibilidade recursal para a reforma das decisões emitidas apenas em primeiro grau de jurisdição), explica que a competência privativa não consiste em privilégio, já que provém de simples opção política adotada para a proteção da dignidade e da importância do cargo.
Assim, é evidente a existência de uma série de justificativas erigidas no sentido de que a regra do foro especial por prerrogativa de função não consubstancia violação ao princípio da igualdade, sendo, para muitos, antes de tudo, uma necessária garantia fornecida tanto aos julgadores como aos processados, a fim de obter-se a justa resolução do processo penal. Ainda, como se viu, há o argumento de que a eventual inexistência do foro privativo poderia prejudicar a ordem de governo estabelecida, uma vez que esta seria alvo de frequentes ações criminais, muitas vezes infundadas e com caráter exclusivamente político.
2.1) TRIBUNAIS SUPERIORES E JULGAMENTO DOS PROCESSOS
Tribunais superiores, como o STF, foram concebidos para serem tribunais de teses jurídicas, e não para o julgamento de fatos e provas, como regra, pois o juízo de primeiro grau tem melhores condições para conduzir a instrução processual, tanto por estar mais próximo dos fatos e das provas, quanto por ser mais bem aparelhado para processar tais demandas com a devida celeridade, conduzindo ordinariamente a realização de interrogatórios, depoimentos, produção de provas periciais, entre outras.
Pois como foi abordado anteriormente, há em nosso país um extenso rol de autoridades detentoras de foro por prerrogativa de função, algo que dificulta ainda mais o trabalho do Supremo Tribunal Federal, como exemplo, órgão não tem estrutura para julgar todos os casos de forma definitiva, o que contribui ainda mais para a indignação dos populares contra a imunidade, uma vez que transmite sensação de impunidade pela morosidade do julgamento ou até mesmo quando o agente é excluída sua responsabilidade pela prescrição.
A sobrecarga de trabalho e a necessidade uma verificação minuciosa dos processos das autoridades servem como justificativa para a demora.
Cabe destacar a visão do Ministro do STF, Luís Roberto Barroso, quando se menciona o foro por prerrogativa e as críticas que o cercam. O Ministro possui diversos artigos sobre o tema; em um deles, “Foro privilegiado deve acabar ou ser limitado aos chefes dos Poderes”, classifica a competência por prerrogativa com uma doença para o STF e também para o país. Defende como solução a extinção dessa competência ou sua restrição ao menor número possível de autoridades. O mesmo destaca três elementos para embasar sua opinião:
1) Razões filosóficas: trata-se de uma reminiscência aristocrática, não republicana, que dá privilégio a alguns, sem um fundamento razoável.
2) Razões estruturais: Cortes constitucionais, como o STF, não foram concebidas para funcionarem como juízos criminais de 1º grau, nem têm estrutura para isso.
3) Razões de justiça: o foro por prerrogativa é causa frequente de impunidade, porque é demorado e permite a manipulação da jurisdição do Tribunal. (Min. Luís Roberto Barroso, “Foro privilegiado deve acabar ou ser limitado aos chefes dos Poderes”, data da publicação 23/05/2016).
Ainda como solução propõe o Min. Luís Roberto Barroso:
Criar uma vara federal especializada no Distrito Federal, para julgar os casos que hoje desfrutam de foro privilegiado. O juiz titular seria escolhido pelo STF e teria um mandato de quatro anos, ao final dos quais seria automaticamente promovido para o 2º grau. Teria tantos juízes auxiliares quantos necessários, mas seria um único titular para dar unidade aos critérios de decisão. De suas sentenças caberia recurso para o STF ou para o STJ, conforme a autoridade. (Min. Luís Roberto Barroso, “Foro privilegiado deve acabar ou ser limitado aos chefes dos Poderes”, data da publicação 23/05/2016).
Esta não parece ser a solução mais razoável para o problema, vez que violaria o princípio do juiz natural, porém o Ministro é adepto da instauração de um órgão jurisdicionado não previsto pela Constituição Federal especialmente para conhecer e decidir sobre determinadas causas.
O Ministro Celso de Mello também exarou sua opinião sobre o instituto com uma alternativa diferente:
Supressão pura e simples de todas as hipóteses constitucionais de prerrogativa de foro em matéria criminal. Mas, para efeito de debate, poderia até concordar com a subsistência de foro em favor do presidente da República, nos casos em que ele pode ser responsabilizado penalmente, e dos presidentes do Senado, da Câmara e do Supremo. E a ninguém mais. Eu sinto que todas as autoridades públicas hão de ser submetidas a julgamento, nas causas penais, perante os magistrados de primeiro grau. Ao contrário do STF, que é um tribunal com 11 juízes, você tem um número muito elevado de varas criminais [na primeira instância], e pelo Estado inteiro. Com essa pluralização, a agilidade de inquéritos policiais, dos procedimentos penais é muito maior. Acho importante nós considerarmos a nossa experiência histórica. Entre 25 de março de 1824, data da primeira carta política do Brasil, e 30 de outubro de 1969, quando foi imposta uma nova carta pelo triunvirato militar, pela ditadura, portanto um período de 145 anos, os deputados e os senadores não tiveram prerrogativa de foro. Mas nem por isso foram menos independentes ou perderam a sua liberdade para legislar até mesmo contra o sistema em vigor. A Constituição de 1988, pretendendo ser republicana, mostrou-se estranhamente aristocrática, porque ampliou de modo excessivo as hipóteses de competência penal originária. (Folha de São Paulo,26/02/2012)
2.2) DIREITO COMPARADO
Não há uma democracia no mundo com número tão elevado como o Brasil, em certas potências mundiais como Reino Unido, Alemanha, Canadá e os Estados Unidos nem existe foro de prerrogativa de função, como disse o procurador da Lava-jato Diogo de Mattos:
O Brasil é um dos países que mais tem pessoas com prerrogativa de foro, só se compara à Venezuela e à Espanha, mas lá o foro é para os crimes funcionais. (Correio Braziliense, 21/06/2016).
Ainda afirmou o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho:
Quando Bill Clinton foi acusado de mentir sobre o caso envolvendo a Monica Lewinsky, ele foi julgado por juiz de 1° instância, [...] nem por isso houve diminuição na democracia americana. (Correio Braziliense, 21/06/2016).
Na Itália, somente o Presidente da República detém a prerrogativa de foro, e em Portugal, passa a ser 3 autoridades com foro privilegiado, sendo o Presidente da República, o Primeiro-Ministro e o Presidente da Assembleia da República.
Na Suécia, o rei têm imunidade absoluta (algo que Dom Pedro I e II também tinham, graças à Carta Constitucional de 1824). Em contrapartida, nenhuma outra autoridade possui foro privilegiado. Na Noruega, o rei também possui imunidade, além de conselhos de estado, ministros da Suprema Corte, além dos representantes do parlamento.
Não existe uma sistemática homogênea, cada país escolheu um sistema que lhe é peculiar, entretanto nota-se que em nenhum dos países analisados a quantidade de autoridades detentoras do foro privilegiado chega perto das proporções brasileiras.
3) A RELAÇÃO DO FORO ESPECIAL POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO E A IMPUNIDADE PARLAMENTAR
A conjuntura política brasileira atual evidencia o grande volume de corrupção no país, envolvendo parlamentares e demais autoridades. Por conseguinte, os cidadãos, que acompanham os desdobramentos de diversas investigações há tempos, questionam a impunidade relativa estes parlamentares e autoridades que possuem foro especial, visto que os processos perduram por anos.
Contudo, com a evolução do instituto busca-se cada vez mais que este não seja uma imunidade para o agente, sendo que, caso a autoridade detentora de foro por prerrogativa de função cometa um ilícito, esta seja julgada com a devida duração razoável do processo, e ainda foi estabelecido um limite temporal, porque era comum haver um constante deslocamento da competência das ações penais de competência originária do STF (um verdadeiro “sobe-edesce” processual). Isso gerava, muitas vezes, o retardamento dos inquéritos e ações penais, com evidente prejuízo para a eficácia, a racionalidade e a credibilidade do sistema penal. Houve inclusive casos de prescrição em razão dessas mudanças.
3.1) AÇÃO PENAL 937 QO
O Min. Luís Roberto Barroso, antes do julgamento de uma ação penal que tramitava no Supremo, suscitou, em uma questão de ordem, duas propostas.
Em outras palavras, o Ministro disse o seguinte: antes de discutirmos este processo, gostaria de propor que o Plenário do STF analisasse duas questões que envolvem foro por prerrogativa de função.
A primeira é quanto a interpretação que era dada ao art. 102, I, “b”, da CF/88 e passar a entender que o foro por prerrogativa de função dos Deputados Federais e Senadores deve se aplicar apenas a crimes cometidos durante o exercício do cargo e desde que relacionados com a função desempenhada; e a segunda o limite temporal sendo que se o réu deixou de ocupar o cargo antes de a instrução terminar, cessa a competência do STF e o processo deve ser remetido para a 1ª instância, porém se o réu deixou de ocupar o cargo depois de a instrução se encerrar: o STF permanece sendo competente para julgar a ação penal.
As duas propostas foram acolhidas pelo STF, a primeira se justifica em razão de exceções ao princípio da igualdade devem ser interpretadas restritivamente, Trata-se da chamada “redução teleológica” (Karl Larenz) ou, de forma mais geral, da aplicação da técnica da “dissociação” (Riccardo Guastini), que consiste em reduzir o campo de aplicação de uma disposição normativa a somente uma ou algumas das situações de fato previstas por ela segundo uma interpretação literal, que se dá para adequá-la à finalidade da norma, Já a segunda, como foi dito anteriormente visa coibir prejuízo no julgamento.
A AP 937 ainda trouxe uma significativa mudança quanto as investigações envolvendo Deputado Federal ou Senador, que somente poderiam ser iniciadas após autorização formal do STF.
Assim, por exemplo, se, a autoridade policial ou o membro do Ministério Público tivesse conhecimento de indícios de crime envolvendo Deputado Federal ou Senador, o Delegado e o membro do MP não poderiam iniciar uma investigação contra o parlamentar federal.
Hoje, Se o crime foi praticado antes da diplomação ou se o crime foi praticado depois da diplomação (durante o exercício do cargo), mas o delito não tem relação com as funções desempenhadas, a Polícia (Civil ou Federal) ou MP, não tem necessidade de autorização do STF, as medidas cautelares são deferidas pelo juízo de 1ª instância.
Agora se o crime foi praticado depois da diplomação (durante o exercício do cargo) e o delito está relacionado com as funções desempenhadas, a Polícia Federal e Procuradoria Geral da República, com supervisão judicial do STF, prescindem de autorização do STF para o início das investigações.
Este entendimento foi estendido para Ministros de Estado, foi o que decidiu o próprio STF no julgamento do Inq 4703 QO/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/06/2018.
3.2) AÇÃO PENAL 878/DF QO
O STJ também decidiu que a restrição do foro deve alcançar Governadores e Conselheiros dos Tribunais de Contas estaduais.
A Corte Especial do STJ, seguindo o mesmo raciocínio do STF, limitou a amplitude do art. 105, I, “a”, da CF/88 e decidiu que:
O foro por prerrogativa de função no caso de Governadores e Conselheiros de Tribunais de Contas dos Estados deve ficar restrito aos fatos ocorridos durante o exercício do cargo e em razão deste.
“Assim, o STJ é competente para julgar os crimes praticados pelos Governadores e pelos Conselheiros de Tribunais de Contas somente se estes delitos tiverem sido praticados durante o exercício do cargo e em razão deste.” STJ. Corte Especial. APn 857/DF, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/06/2018.STJ. Corte Especial. APn 866/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/06/2018.
A exceção ao entendimento é referente aos desembargadores que o entendimento permaneceu o mesmo, haja vista que o STJ entendeu que haveria um risco à imparcialidade caso o juiz de 1º instância julgasse um Desembargador (autoridade que, sob o aspecto administrativo, está em uma posição hierarquicamente superior ao juiz). Assim, os desembargadores dos Tribunais de Justiça continuam sendo julgados pelo STJ mesmo que o crime não esteja relacionado com as suas funções, como afirmou o Min. Relator Benedito Gonçalves:
É que, em se tratando de acusado e de julgador, ambos, membros da Magistratura nacional, pode-se afirmar que a prerrogativa de foro não se justifica apenas para que o acusado pudesse exercer suas atividades funcionais de forma livre e independente, pois é preciso também que o julgador possa reunir as condições necessárias ao desempenho de suas atividades judicantes de forma imparcial.
Esta necessidade (de que o julgador possa reunir as condições necessárias ao desempenho de suas atividades judicantes de forma imparcial) não se revela como um privilégio do julgador ou do acusado, mas como uma condição para que se realize justiça criminal. Ser julgado por juiz com duvidosa condição de se posicionar de forma imparcial, afinal, violaria a pretensão de realização de justiça criminal de forma isonômica e republicana.
A partir desta forma de colocação do problema, pode-se argumentar que, caso Desembargadores, acusados da prática de qualquer crime (com ou sem relação com o cargo de Desembargador) viessem a ser julgados por juiz de primeiro grau vinculado ao Tribunal ao qual ambos pertencem, se criaria, em alguma medida, um embaraço ao juiz de carreira. (STJ. APn 878/DF QO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 30/05/2016.)
Min. João Otávio de Noronha acompanhou o Relator argumentando que:
Por mais que acredite na lisura dos juízes brasileiros, seria muito constrangedor para esse juiz em determinada situação votar ou condenar um superior hierárquico, que votou ou votará nele para uma promoção. Sem considerar outras hipóteses. Eu não daria essa carta em branco. Não assinaria um cheque em branco para os juízes nessa hipótese. Eu prefiro a cautela. Não quero ver juiz perseguido nem promovido por favores concedidos que pode gerar até a impunidade. Minha preocupação é sobretudo a impunidade, vamos ver Estado em que a pressão no juiz é muito grande. Juiz que tem vínculo com investigado não pode julgar. É uma blindagem que se faz à independência da magistratura. O juiz que está subordinado a um investigado não deve julgá-lo. (STJ. APn 878/DF QO, Min. João Otávio Noronha, julgado em 30/05/2016.)
3.3) INSTRUMENTO DE GARANTIA INERENTE A FUNÇÃO
O foro privilegiado é defendido como uma via judicial que permite a punição mais eficaz de autoridades públicas, sendo apenas uma proteção ao cargo. A ONG Transparência Brasil divulgou nota rejeitando a proposta de extinção desse instituto.
Não havendo privilégio de foro, os processos contra esses políticos correrão na primeira instância, seja nas Justiças estaduais, seja na Justiça Federal. Condenados, recorrerão aos tribunais de Justiça ou aos tribunais federais. Se os recursos forem negados, recorrerão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em outras palavras, se os processos nos tribunais superiores já demoram anos e anos para se concluírem, levá-los para a primeira instância fará aumentar ainda mais esse tempo.
Nesse sentido, o foro especial asseguraria a imparcialidade dos órgãos judicantes, impedindo o uso indevido do Poder Judiciário em conflitos político eleitorais. Não por acaso, a ditadura militar suspendeu o que então se chamou o “privilégio do foro por prerrogativa de função”, como parte do pacote de suspensão de direitos políticos veiculado pelo artigo 5º do Ato Institucional nº 5
Outrossim, a prerrogativa do foro especial se encerra necessariamente com a cessação do exercício da função pública, e o Tribunal cancelou a sua súmula 394, que dispunha em sentido contrário. Vale destacar que o STF já declarou inconstitucional uma tentativa do Congresso Nacional de prolongar, por via legislativa (Lei nº 10.628/2002), o foro especial para além desse prazo.
É claro que ainda há certos pontos que necessitam evoluir para que não haja a disfuncionalidade do foro privilegiado, porém a solução não é a extinção da prerrogativa, mas sim o aprimoramento do instituto.
CONCLUSÃO
O foro privilegiado é um instituto brasileiro introduzido pela Constituição Federal de 1988 para manutenção de um estado democrático, em que as autoridades o detêm apenas para o exercício do cargo e não para serem utilizados como meio de se chegar à impunidade. Ocorre que, com o atual cenário da política brasileira com um grande volume de corrupção no país, envolvendo parlamentares e demais autoridades. Por conseguinte, os cidadãos, que acompanham os desdobramentos de diversas investigações há tempos, questionam a impunidade relativa estes parlamentares e autoridades que possuem foro especial, visto que os processos perduram por anos.
Porém, ressalta-se a importância da evolução da competência por prerrogativa de foro frente ao ordenamento jurídico, evidenciou-se que a mudança de entendimento de doutrinadores e da jurisprudência foi significativa ao longo dos anos, revelando uma melhora considerável do ponto de vista de jurídico do instituto
Conforme abordado, a morosidade é um ponto grave, não obstante, é preciso ter cautela para não responsabilizar a competência por prerrogativa de foro pelo abarrotamento do sistema judiciário, pois não é somente nos julgamentos realizados pelas cortes que o princípio da duração razoável do processo não é respeitado.
Foi possível ressaltar que é realmente necessário que este instituto seja interpretado de forma restritiva, uma vez que se trata de uma exceção ao princípio da igualdade, como vem fazendo o STF, para que esta prerrogativa não se torne um privilegio em relação ao detentor.
Conclui-se que as controvérsias dentro da competência por prerrogativa de foro estão longe de acabar. Conforme fora demonstrado a doutrina diverge em muitos pontos o que é importante para o desenvolvimento do foro por prerrogativa, pois de acordo com que a sociedade se desenvolve, novas situações surgem, exigindo novas reflexões e posicionamentos de nossos juristas.
REFERÊNCIAS
BARROSO. Luís Roberto. Foro privilegiado deve acabar ou ser limitado aos chefes dos Poderes. Revista Consultor Jurídico. Disponível em:
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STJ. Corte Especial. APn 857/DF, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/06/2018.STJ. Corte Especial. APn 866/DF, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 20/06/2018.
Bacharelando no Curso de Direito do Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – CIESA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Leonardo de Oliveira. Imunidade parlamentar e o foro por prerrogativa de função no contexto jurisprudencial atual Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 out 2019, 04:47. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53566/imunidade-parlamentar-e-o-foro-por-prerrogativa-de-funo-no-contexto-jurisprudencial-atual. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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