CAUPOLICAN PADILHA JUNIOR
(Orientador)
RESUMO: O presente artigo almeja comprovar a partir da hipótese formulada, da compilação de processos adquiridos na literatura processual e da criminalização antecipada de indivíduos que passam por esse processo. Em especifico o estudo objetiva inserir na questão dos direitos fundamentais abrangidos pela Constituição Federal, como direito de informação em contraposição á dignidade da pessoa humana, também analisar a violação do devido processo legal e o princípio da presunção de inocência pela sociedade nos crimes de grande repercussão pela mídia, influenciando a decisão do juiz penal.
Palavras-chave: Influência da mídia. Direito a informação. Violação ao Devido Processo Legal. Decisão do juiz penal.
ABSTRACT: This article aims to prove from the hypothesis formulated, the compilation of processes acquired in the procedural literature and the anticipated criminalization of individuals who go through this process. Specifically the study aims to insert in the question of fundamental rights covered by the Federal Constitution, such as the right to information as opposed to the dignity of the human person, also analyze the violation of due process of law and the principle of presumption of innocence by society in crimes of great repercussion. media, influencing the decision of the criminal judge.
Keywords: Media influence. Right to information. Violation of criminal law. Judgment of the criminal judge.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO.1.A INFLUÊNCIA DA MÍDIA. 2.PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. 3.DEVIDO PROCESSO LEGAL. 4.PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente tema é de extrema importância para a formação do operador de direito bem como para a população que possui amplo acesso aos meios de comunicação. Tendo em vista que, diariamente nos deparamos com notícias veiculadas pela imprensa sobre crimes e processos criminais, sendo realizada pela mídia uma espécie de intercâmbio entre a realidade jurídica e aqueles que desconhecem esta realidade.
No entanto, essas matérias que deveriam possuir um caráter meramente informativo, facilmente descamam para uma exploração sensacionalista de determinados temas. Dando origem ao fenômeno denominado de ‘The trial by mídia’, que segundo Evaristo de Moraes é o julgamento antecipado da causa realizado pela imprensa, em regra com o veredito condenatório, seguido da tentativa de impingi-lo ao judiciário. Violando assim os consagrados princípios da presunção de inocência, o contraditório em ampla defesa e devido processo legal previsto na carta Magna.
Neste contexto destaca-se a proteção constitucional ao direito fundamental de informação, compreendida tanto no ato de informar quanto no ato de auferir livremente informações pluralistas e exatas, ou seja, protege o emissor, bem como o receptor da informação no processo de comunicação. No aspecto passivo dessa relação no que diz respeito ao direito que o cidadão tem de ser informada, a mídia tem um dever fundamental. Todavia, a mídia não é um mero veiculo de transmissão da informação. O ato de informar vincula ao ato de formar. Em um plano ideal, o cidadão, ao tomarem conhecimento de uma informação, deve formar livremente o seu juízo sobre determinados conteúdo, independente da postura que lhe é apresentada pelo comunicador. É de suma importância dar enfoque ao direito do público de ser adequadamente informado, pois a imprensa possui o dever de verdade, sendo que tal premissa é tutelada pelo direito brasileiro.
1. A INFLUÊNCIA DA MÍDIA
Desde a democratização do Brasil, a mídia tem um papel extremamente relevante para a população. Pode-se entender como mídia, qualquer meio de comunicação capaz de transmitir informações às pessoas.
O termo mídia é um termo latino que teve origem nos Estados Unidos, no final do século XIX. Este surgiu para designar três inventos da época: o telégrafo, a fotografia e a rádio. Esta designação ocorreu pelo fato de se tornar possível a transmissão de mensagens entre pessoas distantes .
A função da mídia é transmitir informações para a sociedade de maneira fidedigna. É através dela, a população é informada sobre os diversos ramos, tais como economia, saúde, segurança pública, dentre outros. Neste cenário de fácil acesso a informações rápidas e simplificadas, considerável número de pessoas são influenciadas pelas informações transmitidas na TV, em aplicativos de mensagens, divulgadas em portais de notícias e redes sociais. Estes meios de comunicação se tornaram formadores de opinião e não raras vezes manipulam os seus telespectadores a pensar e agir de determinada maneira.
Segundo José Afonso da Silva, a liberdade de expressão e de informação é a liberdade inerente a todo cidadão de externar seus pensamentos e opiniões, sendo que, no que diz respeito ao direito de liberdade de expressão e de informar que a mídia tem, esta, como comunicadora, deve sempre verificar a veracidade dos fatos divulgados, bem como as suas fontes, antes mesmo de qualquer divulgação, a fim de prestar uma notícia séria e verídica. Entretanto, a mídia, através dos meios de comunicação, tais como televisão, rádio, jornais impressos, internet, etc., no momento em que passa a utilizar-se das prerrogativas das liberdades de opinião e de expressão, constitucionalmente previstas, acaba se tornando uma fonte de propagação de ideologias, posto que influenciem na formação da opinião dos indivíduos, e no presente caso no que tange a temas relacionados com o direito penal e o direito processual penal.
Todavia, é importante ressaltar que à época de Durkheim, século XIX, a comunicação social ainda caminhava a passos curtos e lentos, enquanto hoje ela viaja por cabos de fibra óptica. Assim, ao consideramos que a mídia é mais que um mero veículo de informação, é um veiculo transmissor de informação em massa- especialmente nos tempos hodiernos pós-revolução tecnológica, a qual proporcionou a disseminação instantânea e universal de acontecimento e opiniões – podemos entender que a mídia, ao atingir parte considerável da sociedade em período cada vez mais curtos de tempo, estaria incidindo também na formação da própria consciência coletiva. Ao incutir em um numero cada vez maior de indivíduos determinados valores e ideologias, a mídia altera simultaneamente as consciências particulares e comuns (SILVA; SANTOS, 2006, p da internet).
Cicero Henrique Silva (2002. P. de internet):
A mídia como um todo, condena antecipadamente qualquer cidadão envolvido na prática de um delito, hediondo ou não, suprimindo as garantias individuais, bem como, ainda que inequivocamente culmina por ser o canal comentador do aumento da criminalidade, de que nossas leis são inoperantes, bem como as autoridades constituídas que desempenham seu árduo papel, aumentando a sensação de pânico, empurrando o legislador para o glorioso dia da “malhação e judas”, de forma inopinada e a todo custo edita lei que acredita ser mágica, mas sem reservas o dia fatídico chegará e será definitivamente malhado, primeiro pela própria imprensa, a primeira a praticar a traição mais que prevista, em segundo pela população que não vê surgir o efeito tranquilizador prometido e, em terceiro, pelos operadores do direito, os quais, tem sob seus olhos uma imensidão de falhas e veias de inconstitucionalidade.
Padilha Neto (2006, p. da internet), de forma mais incisiva e enérgica assevera que a mídia ultrapassa muitas vezes os limites de sua atividade informativa, chegando a exercer, por via extraoficial, funções competentes a autoridades estatais.
O jornalista, transcendendo o seu mister, traveste-se de delegado, promotor e juiz, tudo ao mesmo tempo, apura, acusa e condena a pessoa objeto de usa investigação, em trabalho que ele chama de jornalismos investigativo, mas que não passa de tribunal de exceção.
Segundo dados obtidos na pesquisa Digital News Reportealizada pelo Instituto Reuters para Universidade de Oxford no ano de 2017, 60% da população brasileira confia na veracidade das notícias veiculadas pela mídia, ocupando a 2ª posição no ranking, atrás somente da Finlândia com 62%.
De acordo com o entendimento de Luiz Flávio Gomes, “a mídia não é um poder (não é o quarto poder). É uma força relevante dentro da democracia, tanto quanto é a advocacia, a defensoria, o Ministério Público, a polícia etc” e, é através dela, que se garante o direito constitucional à informação.
No entanto, há um limite para a liberdade de informação, tendo em vista que não se pode transformar o direito de informar em um instrumento para proliferar o discurso de ódio e preconceito.
Segundo José Afonso da Silva, a liberdade de expressão e de informação é a liberdade inerente a todo cidadão de externar seus pensamentos e opiniões, sendo que, no que diz respeito ao direito de liberdade de expressão e de informar que a mídia tem, esta, como comunicadora, deve sempre verificar a veracidade dos fatos divulgados, bem como as suas fontes, antes mesmo de qualquer divulgação, a fim de prestar uma notícia séria e verídica. Entretanto, a mídia, através dos meios de comunicação, tais como televisão, rádio, jornais impressos, internet, etc., no momento em que passa a utilizar-se das prerrogativas das liberdades de opinião e de expressão, constitucionalmente previstas, acaba se tornando uma fonte de propagação de ideologias, posto que influenciem na formação da opinião dos indivíduos, e no presente caso no que tange a temas relacionados com o direito penal e o direito processual penal.
Nos fim dos anos de 1990 e início dos anos 2000, os programas policialescos surgiram restritos a algumas redes de tevê e poucas capitais do Brasil, formato amplamente explorado na atualidade por inúmeras transmissoras de Televisão, permanecem ao vivo horas a fio apresentando discursos contrários aos direitos humanos, em defesa da violência policial e dos “linchamentos”.
Uma pesquisa realizada pela Andi – Comunicação e Direitos, em parceria com o Intervozes, revelaram os principais tipos de violação de direitos praticados pelos policialescos: desrespeito à presunção de inocência; incitação ao crime, à violência, à desobediência às leis ou às decisões judiciárias; exposição indevida de pessoas e famílias; discurso de ódio e preconceito; identificação de adolescentes em conflito com a lei; violação do direito ao silêncio; tortura psicológica e tratamento desumano ou degradante. Tudo de acordo com a legislação atualmente em vigor no Brasil, com os tratados e convenções internacionais ratificados pelo País. A pesquisa expõe exemplos incontáveis que comprovam a sistemática dessas violações.
Diante de tamanha repercussão de tais programas, emerge um questionamento sobre essa espécie de fascínio da população por noticias relacionadas à criminalidade, o professor Sergio Salomão Shecaira, sob uma ótica psicanalítica explica que uns dos fatores que reforça esse fascínio das pessoas em relação a criminalidade é justamente porque é diferenciando do criminoso que não se deixa duvidas quanto a condição de pessoas honestas que cada um atribui a se próprio.
Criando desta forma uma visão maniqueísta, um meio de separar os fatos e as pessoas, de um lado os bons (nós), e, de outro os maus (eles), que traduz evidente reducionismo, segundo Jorge Salton, levando a “uma forma de pensar que, a partir de uma suspeita qualquer, já salta para a conclusão, a ausência de autocrítica, a inexistência de empatia e a necessidade de inimigos”.
Em uma sociedade dividida, tal como a brasileira, a esperteza reside, justamente, na apropriação e exploração desse maniqueísmo. Com efeito, quem haverá de ser contra a punição de indivíduos que cometeram crimes?
Nesse passo, abre-se espaço para a utilização de uma razão ardilosa que tudo permite na medida em que a punição e combate a criminalidade – por todos desejado – não pode encontrar limites, inclusive a ponto de os fins justificarem os meios.
Não há nenhuma dúvida, portanto, de que o Estado deve criminalizar, processar e julgar os indivíduos que cometeram crimes. Isso em uma sociedade minimamente democrática não seria nenhum problema. O problema consiste, entretanto, em como e com que fins isso é feito. Essa, aliás, é justamente a fronteira que permite dizer se determinado Estado é ou não minimamente democrático na aplicação da lei penal, ou seja, se há preponderância de um Estado policial ou de um Estado de Direito.
Como antes referido não há novidade na utilização da figura do inimigo. O poder punitivo sempre tratou de forma diferenciada, discriminando os seres humanos “desviantes” e negando-lhes a condição de pessoa ao colocá-los na posição de “inimigos da sociedade”.
A novidade trazida pelos Programas Policialescos reside na espetacularização, na realização de um verdadeiro Reality Show que expõe o acusado e as entranhas de sua privacidade porque, afinal, sendo inimigo, é uma não pessoa e, portanto, não possui direitos. Assim, expor o inimigo como se estivesse nu, desqualificá-lo em rede nacional, dia após dia, julgá-lo e condená-lo antecipadamente, tudo isso faz parte do discurso que normaliza a exceção.
2. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
Um dos princípios do Direito brasileiro indispensável à pessoa humana que figure em processo penal, a Presunção de Inocência assegura um julgamento justo. Sendo previsto pelo art. 5, LVII da Constituição Federal de 1988 que, por sua vez, enuncia: “ninguém será considerado culpado até trânsito em julgado de sentença penal condenatória’’. Assim, tendo em vista que a Constituição Federal é a lei suprema, toda legislação infraconstitucional, portanto deverá absorver e obedecer tal princípio.
Alçada à condição de princípio na Carta de 88, a presunção da inocência atuará como critério inspirador de todo o ordenamento processual penal, impondo um modelo centrado nas garantias do acusado frente ao poder punitivo estatal.
A previsão constitucional, segundo o doutrinado Antônio Gomes Filho, além de reafirmar o valor da presunção de inocência como princípio formador de um processo penal democrático, ressalta a necessidade de uma prova plena e conclusiva a respeito de todos os elementos constitutivos da infração penal imputada ao réu (nullaaccusariosineprobatione).
Nas palavras de Cesar Beccaria:
Um homem não pode ser chamado culpado antes da sentença do juiz (...) se o delito é certo, não lhe convém outra pena que não a estabelecida pelas leis (...) se é incerto, não se deve atormentar um inocente, pois é inocente, segundo as leis, um homem cujos delitos não estejam provados.
A presunção da inocência é um dos princípios mais violados pela mídia, no sentido que é uma garantia de que o status do cidadão não será afetado por qualquer medida restritiva, antes de uma condenação definitiva, diuturnamente desrespeitada, sendo o cidadão ‘condenado’ e estigmatizado pelos meios de comunicação muito antes da citada ‘condenação definitiva’.
Não está dito na Constituição Federal que todo o homem se presumirá inocente, ate que seja condenado, mas sim que ninguém será considerado culpado até o transito em julgado de sentença penal condenatória. Em vista disso, não se estaria consagrando propriamente o principio da presunção de inocência, mas sim o da desconsideração prévia da culpabilidade, de aplicação mais restrita.
Sobre o tema, endossa Ana Lúcia Menezes Viera:
O princípio da presunção de inocência pouco tem a ver com a noção de não culpabilidade. Possui um valor ideológico que é a garantia dos interesses do acusado no processo penal. É, antes de tudo, um principio de justiça pelo qual se veda considerar culpável o acusado antes da sentença definitiva. É uma presunção política, já que garante de maneira específica a posição de liberdade do já que garante de maneira específica a posição de liberdade do acusado diante do interesse coletivo da justa repressão penal.
In dubio pro reo é uma expressão latina que significa literalmente na dúvida, a favor do réu, ou seja, este é um principio de Direito Processual Penal que recomenda ao juiz, na incerteza quanto à materialidade ou à autoria da infração, absolver o réu.
Art.386 do CPP: ‘O juiz absorverá o réu, mencionando a causa na parte positiva, desde que reconheça: VII- não existir prova suficiente para a condenação.
Ainda que a dúvida existente acerca da autoria de um delito não está nas provas até então produzidas, mas na própria mente daquele que as analisa. A dúvida não é o motivo de se absolver o réu, mas, ao contrário, é a não suficiência de elementos de convicção que demonstrem ligação do acusado com o fato delituoso é que gera, no julgamento, a dúvida acerca do nexo entre materialidade de autoria.
Assim em nosso ordenamento jurídico, a dúvida deve ser interpretada em favor do acusado, sendo, portanto, o princípio in dubion pro reo uma decorrência do princípio da presunção de inocência. A despeito da previsão constitucional e dos tratados internacionais, hoje há uma superexposição das pessoas envolvidas em processo criminais, e, devido a uma cobertura de imprensa parcial e tendenciosa (na absoluta maioria das vezes contra o acusado), são veiculadas notícias que, habitualmente, propiciam a antecipação de um juízo de culpabilidade.
No caso ‘Escola Base’, por exemplo, os suspeitos dos crimes praticados contra crianças até hoje cumprem a pena aplicada pelos policiais que os expuseram à mídia e pela divulgação abusiva dos fatos e imagens através dos meios de comunicação: a pena de exclusão social. Ocorrido em 1994, São Paulo, os donos da Escola de Educação Infantil Base foram ‘acusados’ de abusar sexualmente de seus alunos e, após grande alarde e cobertura sensacionalista feita pela mídia, quando então receberam o rótulo de ‘OS MONSTROS DA ESCOLA BASE’, ao final das investigações, chegou-se à conclusão de que nada do que estava sendo apurado era verídico e o inquérito foi arquivado.
Naquela oportunidade, a revista Veja definiu a escola, em sua manchete, como ‘UMA ESCOLA DE HORRORES’ (edição de 6 abr.1994), não muito diferente da edição de 23 de abril de 2008, em relação ao ‘caso Nardoni’, com a capa exibindo a seguinte manchete: ‘PARA A POLÍCIA, NÃO HÁ MAIS DÚVIDAS SOBRE A MORTE DE ISABELLA: FORAM ELES’. Recentemente, a revista Época (edição 634, de 10 jul. 2010), sobre o caso ‘Eliza Samudio’, veiculou na capa do periódico a seguinte frase sobre o goleiro Bruno, ora averiguado: ‘INDEFENSÁVEL: AS NOVAS CONFISSÕES E OS DETALHES MACABROS DO CRIME QUE CHOCOU O PAÍS E LEVOU UM ÍDOLO DO FUTEBOL PARA A CADEIA’.
A informação midiática deve nortear-se pelo valor da dignidade humana. Não lhe assiste o direito de antecipar juízo de culpabilidade, quando nem mesmo àqueles que atuam no processo penal é licito fazê-lo. O doutrinador Dalmo Dallari afirma ser imprescindível, portanto, a correta atuação da mídia, pois o suspeito ou acusado “é um indivíduo na plenitude de seus direitos [...] Mesmo se preso preventivamente, se tiver confessado seu crime, ele, ainda, é juridicamente inocente, e como tal deve ser respeitado pela imprensa”.
Obviamente, o princípio da presunção de inocência, como norma basilar do processo penal, não exclui a liberdade de informar dos meios de comunicação, mas exige desta cautela e reserva na divulgação dos atos judiciais. As notícias de um crime atribuído a uma pessoa devem ser verdadeiras e possuir um conteúdo e uma forma de advertir o público de que a pessoa acusada ainda não foi considerada culpada [VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Op. cit., p. 173].
Toda cautela é necessária na difusão de nomes, imagens e informações sobre pessoas envolvidas em investigação ou processo-crime, sob pena da banalização das normas constitucionais.
A dimensão dos estragos acarretados pela violação do tão nobre principia da presunção da inocência é resumida por Ana Lúcia Menezes Vieira nos seguintes termos: ‘O direito de defesa, o contraditório, a inviolabilidade da liberdade pessoal, a reserva de jurisdição e a imparcialidade do juiz podem ser vistas resumidas no princípio da presunção da inocência, ou encontram neste a motivação de fundo e o elemento unificador’.
Portanto, o conteúdo e a forma da notícia do processo penal devem respeitar o princípio da presunção de inocência, evitando todos os excessos que impliquem considerar culpado o acusado antes da decisão condenatória definitiva, evitando, inclusive, expressões, imagens, fotografias além das estritamente necessárias à informação que possam ter caráter de antecipada responsabilidade do indivíduo processado.
Além disso, no caso de arquivamento das investigações ou absolvição do acusado, é dever da imprensa, que explorou o processo criminal enquanto em andamento, dar relevo à sentença, como forma de assegurar a certeza da inocência do indivíduo submetido a julgamento. Isso porque o princípio da presunção de inocência é uma garantia que opera no âmbito das normas, porém não tem a virtude mágica de atuar no psiquismo das pessoas de uma comunidade impondo também a elas uma determinada convicção de inocência do acusado.
Diante disso, com relação à sua aplicabilidade, a presunção de inocência é, na verdade, um estado de inocência, no qual o acusado permanece até que seja declarado culpado por sentença. Logo, o acusado é inocente durante o processo e seu estado só se modificará com a declaração de culpado por sentença.
3. DEVIDO PROCESSO LEGAL
Com referência ao entendimento de Carlos Eduardo Barroso (2008), o devido processo legal é a inferência de um processo democrático na apuração de um crime. É um direito que o acusado tem a um processo justo regido pelas leis. Se dentro de um processo não forem observados todas as regras instituídas em lei, este se considera nulo. Tal princípio é o que assegura os também princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
O princípio está previsto em nossa Constituição Federal brasileira, art. 5º, LIV, in verbis:
Art. LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
O devido processo legal é um reservatório de princípios constitucionais que agem como limitadores das ações dos Poderes Públicos. É um direito inerente ao acusado, que vai além de sua vontade e serve como base para qualquer tipo de processo, seja no âmbito penal ou cível.
A nossa Carta Magna associou a garantia do juiz natural ao devido processo legal, isso estabelece garantia a todos à igualdade processual, a publicidade dos atos, a motivação das decisões judiciais e presunção de inocência. Este conjunto das garantias constitucionais do processo, que se denomina due process of law, é que garante o limite da função jurisdicional e a tutela dos direitos humanos.
O Estado, pelo processo, ao aplicar o direito objetivo na solução da lide, deve fazê-lo, portanto, dentro de parâmetros legais. O magistrado, ao atuar no processo, deve guiar-se por normas e regras contidas na Constituição, nos Códigos Processuais e nas Leis de Organização Judiciária, visando, sempre, à salvaguarda não só dos direitos das partes, mas também da regularidade formal do processo As normas da Carta Magna que regulam o processo compreendem um “conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, do outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição”
Segundo os posicionamentos acima, o princípio do devido processo legal liga-se não ao direito material controvertido, mas ao processo como caminho realizado em igualdade, como condição primeira para que as decisões emitidas pelo judiciário reflitam, dentro de suas humanas possibilidades, sem qualquer perspectiva ontológica, a ideia de justiça que perpassa todo o paradigma participativo e democrático inserido em na Constituição.
Ademais, o princípio do devido processo legal impõe o respeito ao contraditório ao garantir-se às partes, envolvido em qualquer matéria litigiosa, o direito de realizar e produzir provas, levando para o interior da relação processual todos os elementos que acreditam revelar a verdade, além de poder sustentar os seus argumentos e razões, mesmo que isso signifique manterem-se em silêncio, pois ninguém é obrigado a fazer provas contra si mesmo, conforme expresso no princípio constitucional da ampla defesa, a ser apresentado posteriormente.
Em suma, o Due process of law consiste em assegurar à pessoa o direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens, sem a garantia de um processo desenvolvido na forma que estabelece a Lei. No âmbito processual garante ao acusado a plenitude de defesa, compreendendo o direito de ser ouvido, de ser informado pessoalmente de todos os atos processuais, de ter acesso à defesa técnica, de ter a oportunidade de se manifestar sempre depois da acusação e em todas as oportunidades, à publicidade e motivação das decisões, ressalvadas as exceções legais, de ser julgado perante o juízo competente, ao duplo grau de jurisdição, à revisão criminal e à imutabilidade das decisões favoráveis transitadas em julgado. Deve ser obedecido não apenas em processos judiciais, civis e criminais, mas também em procedimentos administrativos, inclusive militares.
Um ponto fundamental relacionado a este tópico, diz respeito à questão da morosidade processual. A morosidade do processo está ligada, fundamentalmente, à estrutura do Poder Judiciário e ao sistema de tutela dos direitos. O bom funcionamento do Poder Judiciário depende de uma série de fatores, exigindo, entre outras coisas, relação adequada entre o número de Juízes e o número de processos.
A lentidão do processo gera a descrença do povo na Justiça, o cidadão se vê desestimulado a recorrer ao Poder Judiciário quando toma conhecimento de sua lentidão e dos males (angústias e sofrimentos psicológicos) que podem ser provocados pela morosidade processual. Todavia, o cidadão tem direito a uma Justiça que lhe garanta uma resposta dentro de um prazo razoável.
Joaquim Falcão, afirma em artigo que ‘A pena é o processo’, discorre sobre as dificuldades de sofrer um processo no Brasil. Segundo ele, ‘um em cada quatro brasileiros tem processos na justiça’.
Diante desta informação, é fácil calcular a grande quantidade de pessoas que vivem com a ‘espada de Dâmocles’ sobre suas cabeças, aguardando, por anos a fio, o fim de um processo criminal.
Portanto, como foi visto o processo penal é infamante por si só, naturalmente. Acresça-se a isto o exagerado interesse da mídia em relação a alguns casos, os chamados ‘processos midiáticos’. Nesses casos, mesmo que a regra do due process of law seja estritamente respeitadas, resta impossível apagar o estigma e as marcas deixadas no acusado após tanta exposição pelos meios de comunicação, nem mesmo a reabilitação criminal (art. 93, CP), nesses casos, será capaz de fazer cessar os reflexos de um processo criminal.
4. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
O princípio do contraditório e da ampla defesa tem como finalidade a garantia de um processo justo, em razão de estabelecer o direito de se defender contra os fatos alegados e dar prosseguimento ao processo. Por este motivo é considerado uma extensão do princípio do devido processo legal.
Assim como os demais princípios já apresentados, os dois também são considerados garantia constitucional, com fulcro no artigo 5º, inciso LV da CF/88: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral é assegurado o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
No que tange ao contraditório, ele se perfaz pelo fato de que as partes do processo precisam ter conhecimento dos fatos que estão no processo e, ao tomarem conhecimento, tem a possibilidade contrapor o fato apresentado e assim formar uma questão. Esta nada mais é do que quando alguém apresenta um ponto, que é controvertido pela outra parte e assim forma a questão, que será resolvida ao longo da persecução penal. Isso é a bilateralidade do contraditório em razão de as duas partes contraporem um argumento.
Ademais, o princípio do contraditório também encontra respaldo do princípio da igualdade, tendo em vista que ele garante que as partes tenham as mesmas armas para garantir seu ponto dentro do processo. Acerca disso, Clara Dias Soares (2007, p.04), expõe que:
O princípio do contraditório decorre do princípio da igualdade processual, pelo qual as partes encontram-se em posição de similitude perante o Estado e perante o Juiz, sendo que ambas deverão ser ouvidas, em plena igualdade de condições.
Por conseguinte, temos o princípio da Ampla defesa, que garante ao réu a possibilidade de esgotar todos os meios possíveis para estabelecer a verdade do que diz, sendo possível ainda, se omitir. Seria esta a possibilidade do réu se utilizar de todos os elementos para provar a sua verdade. Enquanto que o contraditório seria uma forma de exteriorizar essa ampla defesa, levando a dialética entre as partes do processo.
Tal princípio é tão importante para processo que o Supremo Tribunal Federal editou a súmula vinculante de nº14 que trata do assunto:
É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
O autor quando dá inicio a ação penal dá inicio também a relação processual, que somente se perfaz com a devida citação do réu, que se faz para que ele seja chamado ao processo para se defender. E para sua defesa, deve ter a faculdade de utilizar todos os meios necessários, tendo em vista que sua liberdade é colocada em risco. Renato Ismael Ferreira Mazzomo (2014, s.p.) dispõe que:
Assim, é imprescindível que se oportunize ao réu, no processo, o direito de defesa, que abrange a faculdade de se manifestar e ser ouvido. Proporcionada essa oportunidade, satisfeito está o princípio, ainda que permaneçam inativas as partes, pois oferecida está a possibilidade de um processo dialogado.
Entretanto, alguns autores como Willis Santiago Guerra Filho, entendem que o contraditório só é efetivo e o princípio é adotado quando houver atuação concreta da parte, ou seja, a parte precisa comparecer e se defender, e não apenas a mera possibilidade de se defender. Todavia, o STF sumulou sendo contrário a esse entendimento do contraditório moderno, quando se trata de um processo administrativo, afirmando que: “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.” Súmula vinculante nº 5.
Porém, ao tratar da liberdade do individuo, o mesmo tribunal traz um enunciado distinto, dispondo que “no processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu” (Súmula 523).
Dessa forma, vemos que o contraditório e a ampla defesa para serem efetivados não precisam que o indivíduo efetivamente seu direito, basta que isso lhe seja assegurado, para que seja uma faculdade da parte utilizá-lo ou não.
Para que a ampla defesa seja garantida não pode acontecer defesa ineficiente ou inconsistente, para que o representado tenha uma defesa cabível e não seja condenado sem antes poder se defender.
Além disso, temos dois tipos de ampla defesa. O primeiro é a defesa técnica, que se resume em uma defesa realizada pelo advogado, por um profissional em prol do acusado. Ou seja, temos a presença do advogado de defesa que vai apresentar todos os argumentos e fatos possíveis para defendê-lo. Entretanto, para garantir que a ampla defesa ocorra, é necessário um profissional técnico e capaz de realizá-la, uma vez que do outro lado, temos o Ministério Público, que está equipado e preparado pelo Estado, e em razão desse princípio clamar pela igualdade entre as partes, necessita disto para ser efetivado.
Já a segunda modalidade, conhecida por autodefesa, pode acontecer em dois momentos distintos, o primeiro em seu interrogatório, quando o réu tentará convencer o juiz. E ainda, quando pode solicitar sua participação em todos os momentos de produção de provas, chamado de direito de presença.
A autodefesa se caracteriza pela defesa realizada pelo próprio réu, se defendendo da acusação que lhe foi feita, dos argumentos apresentados pela parte acusadora, mesmo que tal defesa se faça pelo silencio do réu, que é um direito que ele possui. Além disso, caso o magistrado de forma arbitraria impeça que o réu se defenda teremos caso de nulidade dentro do processo.
Temos, portanto, dois princípios de extrema importância para o devido processo legal ser efetivo, tendo em vista que, sem que ambos sejam cumpridos, o acusado fica sem possibilidade de se defender e provar que não é o responsável, ferindo assim a presunção da inocência, que faz com que o acusado seja considerado inocente até o transito em julgado da sentença condenatória.
Assim sendo, são duas garantias constitucionais que devem ser respeitadas, uma vez que o processo só é legitimo quando elas estão presentes. E ainda, através delas que é possível enxergar os dois lados do acontecimento e não apenas o que é apresentado pelo autor.
CONCLUSÃO
No artigo em tela, pretendeu-se analisar a temática na perspectiva do embate técnico, a respeito da contraposição entre a garantia de direitos do acusado no processo penal ao direito de informação, no presente caso a influência da mídia nas decisões do juiz penal. É possível concluir que a mídia tem poder determinante em julgamentos criminais, onde sua influência compromete a imparcialidade dos órgãos julgadores. O exercício inconsequente do direito a informação, em tempo que a imprensa tem fortes tendências ao sensacionalismo, acarreta violações irreparáveis ao devido processo legal, induzindo condenações exacerbadas e causando danos a acusados que podem ser inocentados.
A justificativa apresentada pela mídia de taxação da liberdade de expressão sem verificar as próprias arbitrariedades cometidas para gerar audiência, é o momento em que a mesma deixa de cumprir o papel de apurar os fatos concretos, acarretando assim o descumprindo do dever constitucional.
A publicidade dos processos é prevista com a finalidade de garantir um julgamento justo ao réu e controlar a atividade do Poder Judiciário pela sociedade. A utilização desta de maneira que acarrete ofensa a essas garantias não deve ser admitida, a censura não deve existir, no entanto é necessário que haja limites, pois somente assim os meios de comunicação utilizarão o poder que possuem para o benefício da sociedade.
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Bacharelanda em Direito do Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas - CIESA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAMELO, Camila Mayara Figueira. A influência da mídia nas decisões do juiz penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 out 2019, 04:57. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53587/a-influncia-da-mdia-nas-decises-do-juiz-penal. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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