RESUMO: O assédio sexual é um tema polêmico, que traz dentre outras discussões, a questão da desigualdade entre homens e mulheres, merecendo, assim, a tutela do direito. A conduta de assédio sexual implica essencialmente, a violação de direitos e garantias fundamentais protegidos pela Constituição Federal. O assédio sexual produz consequências negativas na esfera civil, penal e trabalhista. No âmbito do direito do trabalho as consequências são prejudiciais para o assediado, para o assediador, para o empregador/empresa e para o ambiente de trabalho. Na falta de legislação específica para reprimir o assédio sexual nas relações de trabalho são aplicados os dispositivos 482 (justa causa para o assediador) e 483 (rescisão indireta a pedido do empregado assediado) da CLT, e subsidiariamente os artigos 186, 927, 932 e 933 do Código Civil para indenização dos danos morais e materiais advindos do delito. Alguns doutrinadores fazem críticas ao texto da Lei n. 10.224/01, considerando-o defeituoso e incompleto por deixar determinadas lacunas para regular situações muito comuns, não capituladas no art. 216-A do Código Penal. Na esfera trabalhista, a lei penal é insuficiente para proteção dos empregados, fazendo-se necessário a sua normatização dentro do direito do trabalho. A metodologia empregada para o desenvolvimento do trabalho é a bibliográfica, baseada em artigos de revista cientifica, legislação e doutrinas. Além disso, para fundamentar o artigo foi necessário utilizar citações de diversos autores, construindo assim a ideia central do artigo, selecionando o meio virtual, como o acesso à internet para o desenvolvimento.
Palavras-chave: assédio sexual, direito do trabalho, relações de trabalho, crime de assédio sexual, responsabilidade civil do empregador, dano moral.
ABSTRACT: Sexual harassment is a controversial theme, which brings, among other discussions, the issue of inequality between men and women, thus deserving the protection of the law. The conduct of sexual harassment essentially implies the violation of fundamental rights and guarantees protected by the Federal Constitution. Sexual harassment has negative consequences in the civil, criminal and labor spheres. Under labor law the consequences are detrimental to the harassed person, the harasser, the employer / company and the work environment. In the absence of specific legislation to suppress sexual harassment in labor relations, CLT provisions 482 (just cause for the harasser) and 483 (indirect termination at the request of the harassed employee), and in the alternative articles 186, 927, 932 and 933 of the Civil Code for indemnity for moral and material damages arising from the offense. Some indoctrinators criticize the text of Law no. 10.224 / 01, considering it defective and incomplete by leaving certain gaps to regulate very common situations, not capitulated in art. 216-A of the Penal Code. In the labor sphere, criminal law is insufficient for the protection of employees, making it necessary to regulate them within labor law. The methodology used for the development of the work is bibliographic, based on scientific journal articles, legislation and doctrines. Moreover, to substantiate the article it was necessary to use citations from several authors, thus building the central idea of the article, selecting the virtual medium, such as access to the internet for development.
Keywords: sexual harassment, labor law, labor relations, crime of sexual harassment, employer liability, moral damage.
INTRODUÇÃO
O presente artigo aborda sobre os principais aspectos do assédio sexual nas relações de trabalho, desde sua definição até a necessidade de uma adequada sistematização do ilícito na legislação trabalhista.
A abordagem deste tema tem por objetivo proporcionar aos acadêmicos e aos operadores do direito, elementos informativos que possam servir de subsídios a novos estudos e futuras discussões. Partindo da trajetória histórica, na qual o assédio sexual esteve intimamente ligado às questões sobre liberdade sexual, poder, desigualdade entre homens e mulheres, discriminação e a revolução feminista, desencadeada ao longo do século XX, chega-se à origem do termo “assédio”.
O trabalho visa abordar a conceituação doutrinária e normativa do assédio sexual nos sistemas jurídicos de diversos países, e elenca o conceito de vários doutrinadores brasileiros. Descrevem os elementos caracterizadores e as condutas praticadas pelo assediador, configuradoras do delito.
No âmbito do direito trabalhista, destacam-se duas espécies de assédio, quais sejam por chantagem ou por intimidação. A obra aponta que no ordenamento jurídico pátrio, a única forma de assédio sexual criminalizada é a ocorrida nas relações de trabalho subordinado (por chantagem), por força da Lei nº 10.224/01, que incluiu o art. 216-A no Código Penal, tipificando como crime o assédio sexual, com pena de 01 (um) a 02 (dois) anos de detenção.
A pesquisa avalia que a conduta de assédio sexual implica, essencialmente, violação de direitos e garantias fundamentais protegidos pela Constituição Federal, tais como o direito à liberdade sexual, à dignidade, à intimidade, à honra, à igualdade e à integridade física do empregado, merecedores da tutela do direito. Juridicamente, tal conduta produz inúmeras consequências no âmbito do direito penal, civil e trabalhista, mas é na área trabalhista o enfoque principal deste estudo.
Os efeitos gerados pelo assédio sexual no contrato de trabalho atingem o assediado, o assediador, o empregador, a empresa e o ambiente de trabalho. Dentre as consequências apontadas pela doutrina estão: a aplicação da justa causa para o assediante, à rescisão indireta a pedido do empregado assediado, a reparação por danos materiais e morais por parte do assediador, bem como a responsabilidade civil do empregador. Outro aspecto alcançado por este trabalho refere-se às “medidas de combate e prevenção ao assédio sexual”. São apresentadas várias medidas já utilizadas em diversos locais de trabalho e que podem ser adotadas pelas empresas, sindicatos, poder público para prevenir e reprimir o assédio sexual. Com a intenção de debater o tema, são apontadas críticas de alguns autores em relação ao texto da Lei n. 10.224/01 em especial às lacunas existentes ao restringir o crime somente à determinada conduta de assédio sexual e sua insuficiência para proteger os direitos trabalhistas advindos de tal ilícito. Por fim são apresentadas sugestões no sentido de inserir dispositivos na CLT, que conceituem a conduta e regulem questões atinentes às repercussões que a mesma pode provocar no Contrato de Trabalho, alcançando a diminuição dos casos de impunidade.
Por se tratar de uma temática que tem progressivamente ganho destaque na mídia e no cotidiano das organizações, em razão de seus efeitos nas relações trabalhistas e de suas consequências, o assédio moral e sexual no âmbito laboral tem sido mais discutido. Assim, devendo ser debatida, de forma ponderosa e comprometida, pela classe trabalhadora, pelo empresariado e por toda a sociedade, no intuito de desmistificá-lo para, por conseguinte, haver sua prevenção e erradicação.
O trabalho iniciar-se-á com uma apresentação do contexto histórico, da terminologia e conceituação empregada pela doutrina, além é claro da legislação e jurisprudência que evidenciam a prática da ação insidiosa; da natureza jurídica do fenômeno, relevantemente importante para a ciência do Direito.
1 ASPECTOS GERAIS REFERENTES AO ASSÉDIO SEXUAL
1.1 Histórico
O tema do assédio sexual reflete os conflitos de interesses, oriundos do convívio social entre os sexos e remonta à antiguidade. Atinge as sociedades e culturas do mundo todo, não sendo, portanto, um ato de ocorrência característica dos tempos atuais. Na verdade, tem-se conhecimento de situações de assédio sexual desde os primórdios da humanidade, tendo inclusive passagens registradas na Bíblia:
Gênesis 39: 5-20 Desde que José foi colocado como administrador da casa e de todos os bens do oficial egípcio Putifar, o Senhor abençoou a casa do egípcio, por causa de José: a benção do Senhor atingiu tudo o que o egípcio possuía, em casa e no campo. Putifar entregou tudo nas mãos de José, sem preocupar-se com coisa alguma. José era belo de porte e tinha um rosto bonito. Passado algum tempo, a mulher de seu amo ficou de olhos caídos em José e lhe propôs: durma comigo. José recusou, e respondeu à mulher de seu amo: veja! Meu amo não se ocupa com nada da casa e entregou em minhas mãos tudo o que possui. Nesta casa, ele não é mais poderoso do que eu: ele não reservou nada para si, a não ser você, que é mulher dele. Como posso cometer semelhante crime, pecando contra Deus? Ela insistia todos os dias, mas José não consentiu em dormir ao seu lado, nem se entregou a ela. Certo dia, José foi para casa fazer um serviço, e nenhum dos domésticos estava em casa. A mulher o agarrou pela roupa, convidando: durma comigo. José, porém, deixou as roupas nas mãos dela, saiu e fugiu. Vendo que José deixara as roupas em suas mãos e fugira, a mulher chamou os domésticos e lhe disse: vejam! Meu marido trouxe um hebreu para abusar de nós. Ele se aproximou para dormir comigo, mas eu dei um grande grito... O marido ficou furioso quando ouviu... Mandou, então, buscar José e o atirou na prisão.
Segundo Alice Monteiro de Barros (2009. p. 208):
Alguns autores equiparam o assédio sexual ao uso medieval do jus primae noctis (direito à primeira noite), que obrigava as recém casadas a passarem as noites de núpcias com o senhor do lugar, havendo decisão, de 1.409, da França, declarando ilícita essa prática.
Na visão de Lenise Fabres Machado (2001, p. 17),
A história do assédio sexual está intimamente ligada a história do poder e de desigualdade entre homens e mulheres, que por sua vez foi produzida no cerne da cultura e variou de acordo com o tipo de estrutura socioeconômica estabelecida nas sociedades em que ele se manifestava. Assim descreve a autora: A desigualdade sexual decorreu, principalmente, da típica estrutura patriarcal existente na grande maioria das sociedades primitivas, estrutura esta que, advém do poder do “pater” – o pai, o homem; “o dono”. A mulher enquanto inexistente como força geradora de trabalho, inexistente o era, também, em termos de direitos.
Na verdade, desde a Antiguidade prevaleceu a idéia preconcebida de superioridade masculina, em que a mulher era reduzida a condição de objeto, não somente sexual, mas também de direito.
Na visão sintética de Aloysio Santos (1999. p. 12), “em termos sexuais, as mulheres não representavam senão o papel de outro organismo vivo, capaz de satisfazer as necessidades do homem e de reprodutora. Ela era simples objeto sexual, socialmente subjugada ao homem”.
Neste panorama histórico das relações jurídicas relacionadas com a emancipação e o trabalho da mulher, a Revolução Industrial foi, sem dúvida, um marco divisório para a efetiva conquista do espaço feminino na sociedade moderna. Rodolfo Pamplona Filho salienta que esta introdução das mulheres no mercado de trabalho não se deu em função de um reconhecimento jurídico de sua igualdade, mas, bem ao contrário, pela sua condição de mão-de-obra mais dócil e barata. Com este reconhecimento da exploração da mão-de-obra feminina, cuja inserção no mercado de trabalho já se tornava um fato irreversível, os construtores do direito começam a centrar esforços numa efetivação da tutela de igualdade entre os sexos.
A Revolução Feminista ou Sexual desencadeada ao longo do século XX teve o objetivo de conquistar e certificar seus direitos possibilitando um tratamento mais igualitário. Mas nem sempre foi assim. A conquista de um direito à liberdade sexual foi travada em especial pelas mulheres através de uma longa batalha para a conquista de seus espaços, principalmente no que diz respeito ao reconhecimento da ordem jurídica, política e social do direito de “dispor do seu próprio corpo”.
Com a Revolução Feminista as mulheres alcançaram a tão invejada igualdade de direitos com os homens, hoje incorporada ao rol dos direitos humanos fundamentais. No Brasil esta igualdade está constitucionalmente consagrada no art. 5º, inciso I, da Carta Magna. Todavia, o simples reconhecimento jurídico da imperatividade do tratamento isonômico entre os sexos não é o suficiente para garantir, na prática, a efetividade do exercício responsável da liberdade sexual. A liberdade sexual foi uma das conquistas do movimento da emancipação feminina e da liberação dos costumes desencadeada nos anos sessenta.
Segundo Diniz (1998, p. 196), a expressão liberdade sexual pode ser entendida como “o direito de disposição do próprio corpo ou de não ser forçado a praticar ato sexual”.
Sobre o tema, Dal Bosco (2001, p. 128-131) acentua:
Modernamente, “considera-se que a liberdade sexual não é atacada apenas mediante violência física, mas também mediante violência psíquica”. É uma forma mais sofisticada de desrespeito. Como uma das maneiras de ferir a liberdade do indivíduo, pode acontecer em quaisquer circunstâncias, mas a tendência é que aconteça em maior grau naquelas relações onde está presente uma forma de hierarquia, em que um indivíduo, por ter poder sobre o outro, constrange-o a adotar procedimento sexual que não adotaria fora dessas circunstâncias.
Há, portanto, uma fundamentação doutrinária acerca da existência e importância da liberdade sexual para o convívio entre os indivíduos na sociedade moderna, estando ela, inclusive, tutelada por normas criminais. A condenação do assédio sexual constitui uma das formas de proteção dessa liberdade.
A busca da igualdade dos sexos e a liberação sexual modificaram sensivelmente a relação entre os sexos, facilitando toda sorte de aproximação de caráter amoroso, em contraste com períodos anteriores, onde prevalecia forte repressão sexual.
A iniciativa, tanto na conquista do outro, como durante o ato sexual, deixou de ser prerrogativa dos homens.
Para Pamplona (2004. p. 33) “ao conquistar o reconhecimento jurídico da liberdade sexual, homens e mulheres passaram a conviver com uma nova onda de problemas, dentre os quais se destaca o assédio sexual.”
Muitas gerações de mulheres foram, e são ainda, submetidas a solicitações de ordem sexual, não desejada.
O abuso do poder utilizado para seduzir transforma esta sedução em chantagem, faz com que a vítima muitas vezes sinta-se amordaçada e impotente, ferida na sua dignidade.
Marta Suplicy, (2001. p. 15), ao comentar o tema, salienta que:
A problemática do assédio sexual, entendido este, como a imposição de favores sexuais indesejados, é também um reflexo dos padrões culturais arraigados em nossa sociedade, que estabelecem papéis e modelos de comportamentos rígidos para homens e mulheres. É por essa razão que as mulheres, ainda que não exclusivamente, são as pessoas que mais sofrem assédio sexual.
Cabe ressaltar, entretanto, que além das mulheres, os homens e os homossexuais, também podem ser sujeitos passivos do assédio sexual, embora as estatísticas mundiais atestam que, na maioria dos casos, as vítimas são mulheres.
Contribui em muito para o estudo do assédio sexual, a observação citada por Aloysio Santos, na qual ele disserta que:
O fato de as mulheres serem as principais vítimas do assédio sexual estaria ligado à percepção de sua vulnerabilidade e dependência econômica. A discriminação contra mulheres no trabalho se manifesta de diversas formas, entre as quais destaca-se a dificuldade de ingresso no emprego (discriminação no processo seletivo), a diferença salarial (mulheres que realizam o mesmo trabalho que os homens recebem salários menores), a estagnação profissional, a instabilidade e o assédio sexual, sutil ou violento.
Mendonça (2002. p. 34), elenca os principais fatores responsáveis pela manifestação do assédio sexual como problema social e das atitudes em resposta ao fenômeno.
O primeiro fator mencionado é a presença da mulher no mundo do trabalho, que vem aumentando significativamente década a década. Segundo o autor, a maior afluência das mulheres no mercado de trabalho foi tomada, por grande parte dos homens, como uma ameaça a estes com relação à manutenção dos níveis de trabalho, e, desta maneira, estes foram agentes de discriminações, que tiveram como uma das formas de atuação, o assédio sexual.
Por fim, aduz como elemento de manifestação, o fato de que, concomitantemente aos aspectos erigidos acima, as entidades feministas e sindicais, através de incessante gestão.
2 Conceito
A Organização Internacional do Trabalho define assédio sexual como atos, insinuações, contatos físicos forçados, convites impertinentes, desde que apresentem uma das características a seguir: ser uma condição clara para manter o emprego; influir nas promoções da carreira do assediado; prejudicar o rendimento profissional, humilhar, insultar ou intimidar a vítima; ameaçar e fazer com que as vítimas cedam por medo de denunciar o abuso; e oferta de crescimento de vários tipos ou oferta que desfavorece as vítimas em meios acadêmicos e trabalhistas entre outros, e que no ato possa dar algo em troca, como possibilitar a intimidade para ser favorecido no trabalho.
Delgado (2017, p. 1.373) define assédio sexual como:
A conduta de importunação reiterada e maliciosa, explícita ou não, com interesse e conotações libidinosos, de uma pessoa física com relação a outra. Embora possa se configurar de maneira distinta, o fato é que, regra geral, as mulheres é que têm sido as vítimas principais do assédio sexual no mundo laborativo.
Logo, a própria expressão assédio sexual, em sua esfera axiológica, sintetiza a conduta de um superior hierárquico com conotação sexual, constituindo em si um exercício de poder.
Seria o abuso do poder para obtenção de vantagem sexual sem ser correspondido. Uma abordagem não desejada pelo outro com intenção sexual ou insistência inoportuna por alguém em posição hierárquica privilegiada que se utiliza deste status para obter favores sexuais, com promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou ameaças, represarias no caso de recusa, como perda de emprego ou de benefícios.
Na esfera trabalhista sua execução seria através de uma conduta física, verbal ou não verbal. Verbal através de convites verbais para sair, pressões sexuais verbais, comentários inoportunos, telefonemas obscenos; a forma física com toques, apertões, esbarrões propositais, apalpadas, agarrões; não verbal em decorrência de olhares sugestivos, exibição de fotos, textos pornográficos com insinuações, exibicionismo ou mesmo perseguição.
A diferença cultural de diversos países define o que seria o assédio sexual, sendo o povo brasileiro mais permissivo, considerando diversas condutas como normais e com o decorrer dos anos toleráveis e comuns. No entanto, na prática o índice de casos dessa natureza nas relações trabalhistas é mais recorrente do que se imagina.
O assediador pode ser tanto homem quanto mulher, o mesmo ocorrendo com o assediado, mas em regra as vítimas são mulheres.
A posição majoritária do TST é no sentido de que o constrangimento seja causado por alguém em posição hierárquica superior, existindo apenas uma corrente minoritária que entende que não seria necessária hierarquia para sua caracterização. Inclusive citando, uma situação rara que poderia ocorrer quando um empregado fica ciente de um segredo empresarial e o utiliza para obter vantagem ou favorecimento sexual.
Para Diniz (1998, p. 196), assédio sexual é o: “Ato de constranger alguém com gestos, palavras ou com emprego de violência, prevalecendo-se as de relações de confiança, de autoridade ou empregatícia, com um escopo de obter vantagem sexual”.
Já a OIT e o Ministério Público do Trabalho (MPT), em sua nova cartilha lançada em Junho de 2017, descrevem assédio sexual no ambiente de trabalho como:
A conduta de natureza sexual, manifestada fisicamente, por palavras, gestos ou outros meios, propostas ou impostas a pessoas contra sua vontade, causando-lhe constrangimento e violando a sua liberdade sexual. O assédio sexual viola a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais da vítima, tais como a liberdade, a intimidade, a vida privada, a honra, a igualdade de tratamento, o valor social do trabalho e o direito ao meio ambiente de trabalho sadio e seguro.
Dessa forma, é possível definir o assédio sexual como o ato de importunar ou perseguir alguém, insistentemente, com pedidos dotados de conotação sexual, tanto explícita quanto implícita, sendo, portanto, uma conduta sexual não desejada e reiterada, que gera constrangimento e desconforto ao assediado.
No Brasil, para que se dê a concretização do crime de assédio sexual, é necessário:
a) que haja assediador (sujeito ativo) e assediado (sujeito passivo);
b) que a conduta do assediador seja de cunho sexual;
c) que haja rejeição desta conduta pela vítima,
d) que exista uma reiteração dos atos praticados pelo agente, não sendo estes simples galanteios ou elogios.
Segundo Lipmann (2001, p. 16), o que caracteriza o assédio sexual seria:
O pedido de favores sexuais pelo superior hierárquico, com promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou de ameaças, ou atitudes concretas de represálias no caso de recusa, como a perda de emprego, ou de benefícios.
O assédio sexual, tipificado como crime no Código Penal Brasileiro, ocorre no ambiente do trabalho e, desta maneira, a Justiça Trabalhista também pode ser acionada. No âmbito trabalhista, portanto, o conceito de assédio sexual é mais amplo do que no Direito Penal, onde a conduta virou crime por força da Lei 10.224, de 2001, como já citado no capítulo anterior.
O assédio sexual consiste normalmente em uma conduta reiterada, baseada em investidas, insistência e perseguição, com o objetivo de praticar um comportamento sexual não desejado pela outra parte. Esse ato viola os direitos da pessoa humana que são garantidos pela Constituição Federal, dentre eles, a honra, a integridade física, a dignidade, entre outros (BRASIL, 1988).
Essa ação pode ocorrer de várias maneiras, podendo ser através de palavras ou gestos, utilizando-se da força coercitiva ou não, fazendo até mesmo promessas de vantagens a outra parte para que ceda as investidas. As ações do assediador podem consistir em ligações, perseguição, ameaças, usando de força física, elogios provocativos, olhar malicioso, apalpadas, convites incessantes para jantares, entre outros, essas condutas estão presentes frequentemente no trabalho.
3 As Consequências do Assédio Sexual
O assédio sexual expõe os trabalhadores vitimados, particularmente as mulheres, a situações vexatórias, constrangedoras e humilhantes durante o exercício de sua função, caracterizando uma atitude desumana, violenta e antiética nas relações de trabalho.
Quanto às consequências do assédio sexual para a vítima há muitos fatores sociais e psicológicos a considerar, tais como o rendimento profissional reduzido, o que pode prejudicá-la no emprego; ela levará consigo os temores e dúvidas em todos os ambientes sociais; psicologicamente ela estará abalada e seu relacionamento com as outras pessoas será prejudicado; crises de depressão também são parte de um estado clínico comum, proporcionando enormes prejuízos pessoais, profissionais e familiares.
Nas palavras de Freitas (2001, p. 14), assédio sexual não é “cantada”, é chantagem e ocorre em uma situação dispare e embaraçosa:
O aspecto mais visível ou óbvio nas situações de assédio sexual é que, geralmente, não se trata de relações entre iguais, entre pares, nas quais a negativa pode ocorrer sem maiores consequências para quem está fazendo a recusa. Verificamos, ainda, que o assédio sexual é entre desiguais, não pela questão de gênero masculino versus feminino, mas porque um dos elementos da relação dispõe de formas de penalizar o outro lado. Constitui não apenas um convite constrangedor, que produz embaraço e vexame, pois um convite, por mais indelicado que seja, pode ser recusado, mas também explicita a diferença entre convite e intimação, entre convite e intimidação, entre convidar e acuar o outro. Se uma proposta não aceita uma negativa, ela é qualquer outra coisa, exceto um convite. É como se estivéssemos diante de uma situação que só apresenta duas alternativas: a cruz ou a espada. O que está sendo sugerido não é um prazer, nem uma relação gratificante, mas um preço que deve ser pago por B para que A não o prejudique, como em uma chantagem, só que nessa situação o preço é sexo. O que de fato é proposto no assédio é uma relação sexual para evitar inconvenientes na relação de trabalho.
As consequências do assédio sexual podem ser tanto em relação ao empregado, quanto ao empregador, a depender de qual posição o assediado e o assediador ocupam na esfera trabalhista. Por exemplo, em um caso de assédio de um empregado em relação á outro colega poderá ocorrer dispensa por justa causa. Por outro lado, se o empregador assediar um empregado, poderá este pedir rescisão indireta do contrato e indenização por danos morais.
As mulheres que trabalham e sustentam a própria casa de maneira independente, acreditam que há igualdade entre ambos os sexos, por isso quando ocorre tal delito, esses grupos de mulheres sentem-se mais corrompidas do que aquelas outras que vivem baseadas nos costumes e valores passados pela família tradicional, porque para estas, humilhações e ofensas praticadas por homens que se consideravam superiores era algo comum e rotineiro. É importante ressaltar que quando existe uma dependência física ou emocional da vítima ao agressor, ocorre uma quebra na relação de confiança e afeto entre eles, ocasionando uma traição mais traumática do que aquela que não possui uma relação com o agressor.
Conclui-se então que a ofendida sofre danos gravíssimos, principalmente em conseguir voltar a acreditar e confiar novamente nas pessoas, mas também prejudica a saúde psíquica, tanto mentalmente quanto fisicamente da vítima, além disso, diminui a sua capacidade no trabalho, porque com toda a situação elas passam a ficar desmotivadas, podendo acarretar até mesmo em uma depressão.
3.1 Responsabilidade do empregador
O empregador deve ser responsabilizado pela prática de assédio sexual em decorrência de sua omissão no dever de fiscalizar o ambiente de trabalho, prevenindo a ocorrência de fatos ou atos que possam lesar um empregado.
Necessária à realização pelo empregador no ambiente de trabalho, fazendo com que as normas de boa conduta sejam cumpridas, podendo utilizar prepostos de confiança para esta atividade.
O agente da conduta pode ser um superior hierárquico, um colega ou o próprio subordinado, sendo em regra o chefe do assediado.
Por força da lei os empregadores são responsáveis por ato de seus empregados, nos termos do art. 932, III C.C, sendo garantido o ajuizamento de Ação de Regresso, com base no art. 934 C.C e S. 341 do STF, in verbis:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.
Conforme SÚMULA 341: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.
Aviste-se que os principais danos provocados nas vítimas do assédio, além da ofensa à dignidade da pessoa do trabalhador, são de ordem psíquica, como os distúrbios de comportamento, a depressão, a agressividade acentuada e a desestabilização emocional, os quais provocam o surgimento de doenças diversas, tais quais as doenças gastrointestinais e a hipertensão, que ao serem constatadas, em muitos casos, o empregado pede demissão por não mais suportar a pressão do agressor, sofrendo prejuízos de ordem material.
O assédio moral difere do assédio sexual, uma vez que neste último caso o agente tem como meta obter favores sexuais da vítima, utilizando-se das prerrogativas do seu cargo dentro da empresa, sendo tal comportamento já tipificado como crime, no artigo 216-A do Código Penal.
Nesse sentido, a tipificação do assédio sexual, no âmbito trabalhista, pode ser considerada mais ampla do que no âmbito penal, uma vez que neste há a previsão do assédio sexual decorrente de chantagem como conduta criminosa, mas é excluída a ação feita por intimidação. Além disso, o Código Penal quão somente tipificou a hipótese de o assédio sexual ser praticado por um superior hierárquico, excluindo da ilicitude o assédio sexual ascendente.
3.2 Elementos caracterizadores
No Brasil, para que se dê a concretização do crime de assédio sexual, é necessário:
a) que haja assediador (sujeito ativo) e assediado (sujeito passivo);
b) que a conduta do assediador seja de cunho sexual;
c) que haja rejeição desta conduta pela vítima,
d) que exista uma reiteração dos atos praticados pelo agente, não sendo estes simples galanteios ou elogios.
Segundo Ernesto Lipmann, (2001, p. 16), o que caracteriza o assédio sexual seria:
O pedido de favores sexuais pelo superior hierárquico, com promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou de ameaças, ou atitudes concretas de represálias no caso de recusa, como a perda de emprego, ou de benefícios.
Em relação ao sujeito ativo/assediador, este é sujeito comum, podendo ser mulher ou homem, desde que haja uma relação de superioridade entre o mesmo e o sujeito passivo/assediado, que por sua vez também é sujeito comum. Pode-se, aliás, ocorrer assédio entre pessoas do mesmo sexo, realizar-se de forma coletiva ou, até mesmo, ser praticado por terceiros não vinculados à relação de emprego, como é o caso do cliente do estabelecimento ou prestadores de serviço.
De qualquer forma, a maior vítima de assédio sexual ainda é a classe feminina, hoje com cada vez maior participação no mercado de trabalho. Sendo que grande parte delas deixa de denunciar o assédio, por medo, vergonha, descrença na punição dos agressores ou falta de informação sobre a quem pode recorrer em busca de reparação e punição da pessoa que cometeu o crime..
Frise-se que, conforme a OIT, a caracterização do assédio sexual pode ocorrer por meio de comentários sexuais, tais como piadas, insinuações, propostas de atividades sexuais de qualquer espécie, tais como, convites íntimos, passeios a lugares ermos, elogios ostensivos (detalha o corpo da mulher), ou com aproximações inoportunas (roçada, beliscões ousados), exibição de fotos, filmes sugerindo atividades sexuais, carícias, ou até mesmo, o que é mais grave, com ameaças, desde que tenham a intenção de conseguir vantagem sexual. Observe-se que não é necessário o contato físico.
4 Tipos de Assédio Sexual
A doutrina classifica o assédio sexual em dois tipos dotados de diferenciação marcante entre eles: o assédio sexual por chantagem e o assédio sexual por intimidação.
O assédio sexual por chantagem ou assédio quid pro quo, ocorre quando há a exigência de uma conduta sexual, em troca benefícios ou para evitar prejuízos na relação de trabalho; sendo aquele no qual o assediador detém o poder em alterar o percurso do contrato de trabalho do assediado, podendo atravancar transferências, promoções e quaisquer outros benefícios que esteja desejando a vítima. Por uso de investidas sexuais, o sujeito ativo faz com que o assediado não consiga estas promoções, caso não ceda à instigação.
Já o assédio sexual por intimidação ou ambiental, ocorre quando há provocações sexuais inoportunas no ambiente de trabalho, com o efeito de prejudicar a atuação de uma pessoa ou de criar uma situação ofensiva, de intimidação ou humilhação. Caracteriza-se pela insistência, impertinência, hostilidade praticada individualmente ou em grupo, manifestando relações de poder ou de força não necessariamente de hierarquia. Por vezes confundido com assédio moral, como ensina a OIT em sua cartilha sobre o tema.
Resumidamente, enquanto no assédio sexual por chantagem a finalidade do assediador é obter um favor sexual, no assédio sexual por intimidação o objetivo do agressor é tornar o ambiente de trabalho hostil para o assediado, podendo também visar uma vantagem sexual.
Nessa seara, Barros (1995, p. 177-178), ensina que:
O assédio por intimidação é aquele que surge com a importunação do sexo oposto: incitações sexuais importunas, de uma solicitação sexual ou de outras manifestações da mesma índole, verbais ou físicas, que têm como finalidade prejudicar a atuação laboral de uma pessoa ou de criar uma situação ofensiva, hostil, de intimidação ou abuso no trabalho.
Já o assédio por chantagem, é definido pela autora como a exigência formulada por superior hierárquico a um subordinado, para que se preste à atividade sexual, sob pena de perder o emprego ou benefícios advindos da relação de emprego.
Esta modalidade caracteriza-se por insinuações e solicitações sexuais inoportunas com o único objetivo de prejudicar o assediado, gerando para este, receio e temor no ambiente de trabalho. Embora não seja um tipo de assédio criminalizado, visto que o Código Penal tipificou somente o assédio sexual por chantagem, pode gerar como o outro a rescisão indireta ou a dispensa por justa causa do assediador.
Este tipo de assédio tem o objetivo de interferir o desempenho do assediado, prejudicando-o em suas funções, não necessitando que o assediado perca o emprego ou promoção no trabalho. Cria um ambiente de trabalho tenso e hostil. O assediante faz insinuações sexuais, assediando a vítima, mas sem que ela se sinta prejudicada, e, por exemplo, perder o emprego.
Segundo Nascimento (2005, p. 136-139), o assédio sexual pode ocorrer nas quatro hipóteses distintas:
a) do empregador contra o subordinado, que é o mais grave, porque envolve uma relação de poder, como a de emprego, na qual aquele se situa na posição dominante e este na de dominado;
b) do preposto do empregador sobre o empregado, podendo configurar a dispensa indireta por justa causa do empregador por ato lesivo à honra e boa fama do empregado, além de reparações civis, as mesmas previstas para o dano moral;
c) do empregado contra colega, o que mostra que o assédio sexual não tem como única situação uma relação de poder, podendo sujeita-lo a punição disciplinar ou dispensa por justa causa de incontinência de conduta, ou clientes, oque põe em discussão o problema da responsabilidade civil da pessoa jurídica pelos atos praticados por seus prepostos, prevista no Código Civil, aspecto que exige da empresa cuidados especiais, medidas preventivas e rigor na seleção e fiscalização dos empregados para não ser acusada por atos dos mesmos;
d) embora mais difícil a de empregado sobre superior hierárquico, punível também como justa causa e as mesmas reparações civis.
Cabe ressaltar que o assédio sexual tem fortes condicionantes culturais. O que é assédio em uma cultura pode ser galanteio em outra e vice-versa, e embora haja variações nas concepções de assédio sexual e estas tenham sofrido muitas modificações ao longo do tempo, busca-se uma definição internacional básica que possa ser aplicada na maioria dos países e das regiões, respeitadas as características locais.
Verifica-se que não existe, propriamente, divergência sobre os conceitos de assédio sexual, mas, sim, modos diversos de enunciá-lo, dependendo tal definição da linha doutrinária que os legisladores assumem no tratamento desta prática, em seus respectivos países. Reforçando o elemento gênero e sua natureza não consentida, após várias tentativas de definição, pelas Convenções e Recomendações de organismos internacionais, o assédio sexual encontra-se definido na Recomendação Geral nº 19/1992 da ONU, como:
Comportamento voltado para o sexo, sem mútuo consentimento, incluindo contato e abordagem física, observações de colorido sexual, exibição de pornografia e exigência de natureza sexual, por palavras ou atos. Tal conduta pode ser humilhante e consistir e um problema de saúde e segurança.
Outra definição importante de assédio sexual é a adotada pela OIT e pela Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres, quando expende que: Um ato deve ser tomado como assédio sexual quando a vítima tem razoável motivo para crer que sua recusa resultaria em desvantagens em relação ao seu emprego, inclusive na admissão ou promoção, ou quando isto resulta em um ambiente de trabalho hostil.
Nesse sentido, a OIT definiu o assédio sexual como sendo:
Atos de insinuações, contatos físicos forçados, convites impertinentes, desde que apresentem umas das características a seguir: a) ser claramente uma condição para dar ou manter o emprego; b) influir nas promoções ou carreira do assediado; c) prejudicar o rendimento profissional, humilhar, insultar ou intimidar a vítima.
Bezerra Diniz (1999. p. 194), define o assédio sexual “como uma forma de discriminação e de abuso do poder, sobretudo uma violência contra mulheres, embora não apenas as mulheres sofram este tipo de problema”.
Nas palavras de Oliveira (2002. p. 11), o assédio sexual é toda e qualquer conduta de natureza sexual, ou outros comportamentos dirigidos ao sexo, que causam situação de constrangimento ou que afetam a dignidade do assediado, homem ou mulher.
Com base nos conceitos descritos acima verifica-se que o assédio surge sempre que houver uma violação à liberdade sexual (direito de dispor do próprio corpo), à intimidade e à vida privada da pessoa assediada.
Nesta seara, mesmo com tamanha a dificuldade para a comprovação do assédio sexual, já há julgados dos tribunais trabalhistas pátrios sobre a indenização por danos morais, qual seja:
Ementa: "DANO MORAL. ASSEDIO SEXUAL. CONVITE REJEITADO SEGUIDO DE DESPEDIDA. Comprovado nos autos o assédio sexual por testemunha conduzida pela reclamante sem contraprova que pudesse ter produzido a reclamada, ter sido convidada para sair à noite, no posto de trabalho, por preposto da empresa, responsável por conduzi-la ao local em que prestaria seus serviços e fiscalizar lhe as tarefas realizadas, sob alegação de que se recusando seria dispensada, tendo se negado e, no dia seguinte, após esse preposto ter brigado com a autora, sido dispensada pelo supervisor. Faz jus à indenização por danos morais em razão do assédio perpetrado por superior hierárquico, constrangendo a autora porque detinha o poder de manter íntegro o pacto laboral, o poder de lhe possibilitar prosseguir trabalhando e percebendo salários, dos quais necessitava para fazer frente às suas despesas. Recurso provido." (Número: 20100502843 10ª TURMA 07/06/2010 TRT-2 - RECURSO ORDINÁRIO RECORD 1715200504702005 SP 01715-2005-047-02-00-5 Data de publicação: 07/06/2010) (Grifei)
Ementa: ASSÉDIO SEXUAL POR CHANTAGEM E POR INTIMIDAÇÃO OU AMBIENTAL. Configura-se assédio sexual por chantagem aquele praticado por superior hierárquico consubstanciado na troca de vantagens advindas do vínculo empregatício por favores de cunho sexual. O assédio ambiental ou por intimidação dá-se por uma atuação generalizada violando o direito a um meio ambiente de trabalho sexualmente sadio e concretiza-se por frases ofensivas de cunho sexista, apalpadas, gestos, criando situações humilhantes ou embaraçosas, sempre de cunho libidinoso no ambiente de trabalho. No caso sub oculi, as ações do gerente administrativo e financeiro da reclamada se caracterizam nas duas modalidades acima apontadas. Além de chantagear a obreira condicionando a percepção de aumento salarial e vantagens fornecidas pela empregadora a seus empregados, ao cumprimento de favores de natureza sexual, valendo-se da sua condição de superioridade hierárquica, tornou o ambiente de trabalho envenenado na medida em que não se acanhava em postar-se na porta para se esfregar nas trabalhadoras que ali passassem, fazendo questão de demonstrar sua devassidão perante as colegas de trabalho da obreira, quando as convocava para sua sala e em seu computador passava filmes de conteúdo pornográfico, mediante os quais exibia cenas de sexo explícito e ainda as submetia à humilhação de ter que ouvir "que era para elas aprenderem a fazer direitinho". Ditas condutas produziram constrangimento no ambiente de trabalho da obreira e transtorno em sua vida pessoal, gerando dano moral que deve ser indenizado. (PRIMEIRA TURMA TRT14 n.222, de 01/12/2011 RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA RO 1063 RO 0001063 (TRT-14) DESEMBARGADOR ILSON ALVES PEQUENO JUNIOR. Data de publicação: 01/12/2011).
Seguindo esse raciocínio, a configuração do dano moral cabe ao autor a demonstração do prejuízo que sofreu, pois essa noção é um dos pressupostos de toda a responsabilidade civil - só haverá a responsabilidade civil se houver um dano a reparar -. Assim, para que haja um dano indenizável, são necessários os seguintes requisitos, como afirma DINIZ (1988, p. 53-54):
a) diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral pertencente a uma pessoa; b) efetividade ou certeza do dano; c) causalidade; d) subsistência do dano no momento da reclamação/legitimidade; f) ausência de causas excludentes da responsabilidade.
No Direito do Trabalho, a reparação dos danos morais está coadunada, diante das limitações de competência, às controvérsias derivadas da relação laboral. Existe, pois, um comedimento objetivo da matéria a ser apreciada pelo magistrado. A lesão, por sua vez, deverá ter ser oriunda da relação de trabalho, ou seja, dos fatos pertinentes às obrigações manifestas pelas partes em função do vínculo jurídico entre elas presente.
Em análise ao artigo 483 da CLT em suas alíneas “a” e “e” da, nota-se que não há necessidade de intervenção penal quando o assédio se faz de maneira não tão notória, in letteris:
Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; (...)
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.
O Código Civil em seu artigo 186 prevê que:
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Já o artigo 927 do referido diploma legal, por seu turno, dispõe que aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
4.1 Consequências para o Assediador:
As formas de se punir um assediador seriam: no aspecto trabalhista, a rescisão por justa causa do contrato, no civil, a responsabilidade patrimonial e no criminal, a representação por ação penal privada, pelo delito de assédio sexual (referente ao artigo 216-A do CPP), com penal de detenção, de um a dois anos, podendo ser aumentada em até um terço se a vítima for menor de dezoito anos.
A repreensão á conduta do assediador encontra amparo também na constituição de 1988 em seu artigo 3º e 5º que assim mencionam:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
“I-homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.
O assédio praticado dentro de uma empresa torna a convivência insuportável, tendo assim uma falta grave, no qual impede a continuidade normal no ambiente de trabalho. Existe um nexo de causalidade entre a atitude praticada e a rescisão contratual, e a demissão por justa causa do empregado será amparada pelo artigo 482 da CLT, em sua alínea “b”.
Direito Penal: No âmbito do Direito Penal o cometimento do assédio sexual configura um tipo de delito, no qual existe uma punição, sujeitando o assediador á pena de 1 (um) á 2 (dois) anos de detenção, conforme artigo 216-A da Lei 10.224/2001.
O sujeito que cometer algum ato que indique o cometimento do assédio sexual será enquadrado no artigo acima referido, com pena de detenção.
Responsabilidade Civil: A Responsabilidade Civil do assediador contra o assediado será discutida no âmbito civil, na qual se analisará os efetivos danos causados pelo cometimento do assédio sexual.
4.2 Consequências para o Assediado
Para quem é vitima de assédio sexual é extremamente prejudicada, seja em relação ao desempenho da própria função que exercia, seja em relação á vida íntima e privada, que ficaram para sempre marcadas.
Os efeitos sofridos pelos assediados têm sido bastante discutidos entre os psicólogos, que pelo fato de terem sofrido o assédio sexual, acarretaram outras consequências nos assediado, tais como ansiedade, depressão, estresse, dores de cabeça, cansaço excessivo, tudo isso decorrente do assédio sexual no trabalho, fazendo com que diminua o bom andamento e a produtividade e interesse no trabalho.
O empregado que por ventura sofreu o assédio sexual tem amparos na lei no qual poderá ser transferido de local ou de setor de trabalho, após a comunicação ao empregador, deixando de ficar sobre a hierarquia e subordinação de quem cometeu o assédio sexual.
Além do direito de transferência e de mudança de setor, o empregado também poderá pleitear á rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme o artigo 483 da CLT e da indenização amparada pela constituição Federal em seu artigo 5º inciso X, tendo o direito de receber todas as verbas rescisórias como se tivesse sido despedido sem justa causa.
A rescisão indireta se dá pelo descumprimento das cláusulas do contrato firmado pelo empregado e empregador, no qual o empregador descumpre umas das cláusulas, gerando a rescisão indireta por parte do empregador. A iniciativa de romper o vínculo empregatício é do empregado, mas na qual o seu empregador, não respeitou as cláusulas, configurando assim uma dispensa sem justa causa, afastando a hipótese de abandono de emprego.
O afastamento de imediato do empregado é exigido por lei, de modo que a relação de emprego se finda a partir da comunicação do empregado ao empregador da rescisão indireta.
O assédio sexual como causa de rescisão indireta tem gerado vários conflitos doutrinários e jurisprudenciais no tocante, a saber, qual alínea do artigo 483 da CLT, se encaixaria a prática de assédio sexual para rescisão indireta do contrato de trabalho.
A corrente majoritária entende que a prática do assédio sexual na rescisão indireta de trabalho encontra-se amparada na aliena “e” do artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho. Há também outra corrente que a prática do assédio sexual enquadra-se na alínea “d” do art. 483 da CLT, que autoriza a rescisão indireta no momento em que o empregador não cumpriu suas obrigações contratuais, pois o empregado é contratado para trabalhar e não para satisfazer sexualmente seu empregador, além do que o empregador tem o dever de zelar por um ambiente de trabalho seguro, digno e decente.
O empregado que sofreu o assédio sexual também poderá pleitear a ação de indenização por danos morais, por ter sofrido constrangimentos em seu trabalho. A prática do assédio sexual seja pelo empregador ou qualquer pessoa que detenha o poder hierárquico não está violando somente ás cláusulas do contrato com o assédio sexual, mas também uma garantia constitucional, ensejando assim um respectivo ressarcimento pelo dano sofrido moralmente.
A jurisprudência trabalhista é pacífica no sentido de que a competência para julgar os pedidos de indenização por danos morais é a Justiça do Trabalho, desde que estejam relacionados com o contrato de trabalho e com a causa da ação, conforme podemos constatar:
DANO MORAL - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - Após o advento da Constituição da República de 1988, a matéria referente aos direitos de personalidade e a consequente questão do dano moral, que a violação àqueles direitos pode ensejar tem enquadramento constitucional. E, como tal, pode ser alvo quer de reparação civil, quer penal, quer trabalhista. O aspecto diferenciador dirá respeito à distinção, em cada caso, da origem da lesão, da relação em face da qual possa ser esboçado o fundamento do pedido. Tendo sido demonstrado que os Reclamantes, em dependências do estabelecimento do empregador, sofreram agressão moral, vexatória, humilhante e constrangedora por parte de superior hierárquico perante os colegas, exsurge a competência da Justiça do Trabalho para apreciar a demanda. Recurso conhecido e não provido. 2. DANO MORAL - PROVA - APLICAÇÃO DO ART. 10, I, DO ADCT - A alegação de que não restou demonstrado o dano moral está desfundamentada, visto que não embasada em qualquer das hipóteses de admissibilidade previstas no art. 896 da CLT. Por outro lado, o egrégio TRT não manifestou qualquer tese explícita acerca da alegação de que o pleito esbarra na ausência de previsão legal, pois, enquanto não regulamentado o art. 7º, I, da Carta Magna, aplica-se a norma de indenização prevista no art. 10, I, do ADCT, nem foi arguido neste sentido por meio de embargos declaratórios, pelo que ausente o devido pré-questionamento, sob este fundamento. Óbice no Enunciado nº 297 do TST. Revista não conhecida. (TST - RR 666843 - 3ª T. - Relª Min. Conv. Eneida Melo - DJU 16.08.2002).
Em síntese, firma-se o entendimento jurisprudencial da vitalidade das provas trazidas pela vítima a fim de corroborar com as acusações feitas pela mesma, o que dificulta a comprovação do dano.
CONCLUSÃO
Das ponderações feitas ao longo deste texto, fundadas em pesquisas bibliográficas, no ordenamento jurídico e na jurisprudência, várias postulações podem ser elencadas. A primeira delas, aponta que desde os primórdios a relação do homem com a mulher sempre foi de um nível desigual, tendo mais ênfase, quando a mulher começou a concorrer com o homem no mercado de trabalho, aproximando-os mais no ambiente de trabalho, surgindo assim à figura do assédio sexual no trabalho.
As consequências decorrentes do assédio sexual nas empresas são os fatores principais para á queda da produtividade e a rotatividade da mão de obra. Constatou-se que o assédio sexual degrada o ambiente de trabalho e provoca enorme constrangimento ao assediado, sendo causa de rescisão contratual indireta do contrato de trabalho, pelo descumprimento, pelo empregador das suas obrigações contratuais.
O assédio sexual pode ser considerado toda e qualquer conduta de natureza sexual não desejada que, embora repelida, é continuamente reiterada, cerceando a liberdade sexual de outrem. Constituindo-se em uma violação ao princípio da boa-fé, à dignidade da pessoa humana, princípio da razoabilidade, princípio da proteção entre outros.
O assediador nem sempre está obrigado a posicionar-se em nível hierárquico superior, já que, por forma diversa poderia influenciar, mesmo que indiretamente, na carreira, ou nas condições de trabalho do assediado, que, em caso de recusa, passa a sofrer ameaças em relação ao seu emprego e ao cargo que ocupa.
O assédio sexual viola a intimidade do trabalhador em decorrência do uso abusivo do poder hierárquico que detêm o empregador, cuja finalidade é humilhar a vítima, afastá-la do mundo do trabalho e de violenta psicologicamente dominar a vítima sexualmente.
Este tipo de ocorrência dentro do ambiente de trabalho responsabiliza o empregador pelos atos de seus empregados, podendo, inclusive acarretar rescisão indireta e justa causa. Certo que a indenização moral tem um caráter punitivo incidente sobre a pessoa do causador do dano, cujo objetivo não é outro senão o de coibir e desestimular novas ações com a mesma carga de ofensividade. O processo do assédio sexual na área trabalhista tem peculiaridades como o do segredo de justiça, no qual o processo corre em sigilo para não mais, constranger o empregado que tenha sofrido o assédio sexual.
Vislumbramos de modo geral o assédio sexual na realidade brasileira, que poder mais frequente pelo fato do brasileiro ser um povo mais de contato físico do que visual, pelo fato da nossa cultura estimular muito o contato físico, como cumprimentar com abraços, fazendo com que assim a incidência do assédio sexual seja mais visualizada no Brasil.
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Bacharelando pelo Centro Universitário FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JOãO LUCAS SILVA BRANDãO, . Assédio sexual à mulher no ambiente de trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2019, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53867/assdio-sexual-mulher-no-ambiente-de-trabalho. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
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