ÊNIO WALCACER DE OLIVEIRA FILHO[1]
(Orientador)
RESUMO: O presente trabalho objetiva apresentar discussões e reflexões acerca da técnica do retrato falado, elaborado com base em depoimentos de vítimas e/ou de testemunhas relacionadas a crimes considerados graves, a exemplo do homicídio, latrocínio, estupro, dentre outros. Através da análise da técnica utilizada para a elaboração do Retrato Falado no Brasil, busca-se compreender se o método adotado consiste em um meio confiável para se chegar à autoria delituosa, no curso de uma investigação criminal. O principal propósito desta pesquisa é avaliar a efetividade e a confiabilidade do Retrato Falado feito a partir de relatos de vítimas e/ou de testemunhas, haja vista que, por diversas vezes, estas se encontram abaladas e psicologicamente fragilizadas pela situação traumatizante que vivenciaram. Para tanto, será feita uma abordagem sobre o conceito de investigação criminal, de inquérito policial e os tipos de provas admissíveis no Processo Penal Brasileiro, bem como sobre as teorias atuais da psicologia forense e os aspectos envolvendo os diversos tipos de memórias, inclusive as falsas memórias. O método utilizado para a pesquisa possui natureza dedutiva, sendo que e a produção textual está pautada em legislações relacionadas ao objeto deste estudo, doutrinas jurídicas de vários autores, artigos científicos e outras fontes bibliográficas correspondentes.
PALAVRA CHAVE: Retrato Falado; Falsas Memórias; Indícios de Autoria Delituosa.
ABSTRACT: The present work aims to present discussions and reflections about the technique of the spoken portrait, elaborated based on the testimony of victims and / or witnesses related to crimes considered serious, such as murder, murder, rape, among others. Through the analysis of the technique used for the elaboration of the Spoken Portrait in Brazil, we seek to understand if the adopted method is a reliable way to reach the criminal offense in the course of a criminal investigation. The main purpose of this research is to evaluate the effectiveness and reliability of the Spoken Portrait made from reports of victims and / or witnesses, since they are often shaken and psychologically weakened by the traumatizing situation they experienced. To this end, an approach will be made to the concept of criminal investigation, police investigation and the types of evidence admissible in the Brazilian Criminal Procedure, as well as the current theories of forensic psychology and the aspects involving the various types of memories, including false ones. memoirs. The method used for research has a deductive nature, and the textual production is based on legislation related to the object of this study, legal doctrines of various authors, scientific articles and other corresponding bibliographic sources.
KEYWORDS: Sketch; False Memories; Signs of Criminal Authorship.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Investigação Criminal. 3. O Inquérito Policial e os meios de Prova. 3.1. Da Prova Pericial. 3.2. Do Interrogatório do Acusado, da Confissão e do Ofendido. 3.3. Das Testemunhas, da Acareação e dos Indícios. 3.4. Dos Documentos, da Busca e Apreensão e do Reconhecimento de Pessoas e Coisas. 4. O Retrato Falado. 5. A Memória e a Confiabilidade do Retrato Falado. 6. Conclusão. 7. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo decorre da instigação quanto à confiabilidade na técnica do retrato falado, o qual consiste em um instrumento utilizado no curso de inquéritos Policiais e processos judiciais, principalmente quando ocorrem fatos que envolvam crimes contra a vida, como homicídio, tentativa de homicídio e também nos crimes contra a liberdade sexual como estupro, tentativa de estupro.
Embora se reconheça nos dias atuais, que existem muitos avanços tecnológicos voltados para a identificação de possíveis infratores, como os modernos programas de reconstituição facial usado pelos investigadores no âmbito das polícias judiciárias, sabe-se que as primeiras e talvez as principais “informações” apresentadas à equipe de investigação criminal para a construção de um retrato falado, são narradas pelas vítimas ou por pessoas que presenciaram o fato delituoso.
Dependendo da forma como o crime foi cometido, sê de maneira brutal e cruel, isso pode causar reações traumáticas de ordem psicológica na vítima ou em quem tenha presenciado o fato, que podem fazer com que estas pessoas não consigam reproduzir com clareza a situação vivenciada e a fisionomia do algoz.
Há diversos estudos na área da Psicologia Forense e da Neurociência acerca das chamadas “falsas memórias”, que evidenciam o caráter de fragilidade dos relatos transmitidos aos investigadores no processo de elaboração e/ou construção de um retrato falado, tendo em vista o estado emocional das vítimas ou das testemunhas que pode ser afetado de forma muito grave e, consequentemente, essas pessoas não teriam condições psicológicas de retratar da forma mais fidedigna possível a cena do crime, o que pode influenciar diretamente na identificação do criminoso e ter como consequência, a imputação do fato à uma pessoa inocente.
Existem ainda outros fatores e circunstâncias que podem influenciar no processo de identificação de uma pessoa, tais como, o local do crime, o horário, pois caso seja praticado no período noturno, dependendo das condições de luminosidade, reduz-se drasticamente a possibilidade de reconhecimento do agressor.
Ante o exposto, surge a questão problema desta pesquisa: o retrato falado com base em relato de vítima ou de testemunha de crime grave consiste em um meio confiável de identificação de autoria de crime?
O presente trabalho tem com objetivo geral pesquisar sobre o retrato falado feito com base em relatos de vítimas de vítimas de crimes contra a pessoa, tentando identificar se esses relatos de vítimas de crimes são fontes confiáveis e seguras para elaboração de retrato falado com vistas a chegar à autoria delituosa.
2. A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
A convivência pacífica e harmônica em sociedade pressupõe o cumprimento de regras e de respeito mútuo entre as pessoas. No Brasil, a lei máxima que estabelece os direitos e garantias individuais é a Constituição Federal de 1988.
Um dos pilares da Constituição Federal é preservar e garantir o direito à vida e à inviolabilidade física de seus cidadãos. Quando há o descumprimento desta regra, o Estado intervém e atua penalizando o respectivo infrator.
Para se apurar a autoria e comprovar que o fato delituoso efetivamente ocorreu é necessário o cumprimento de um procedimento apuratório denominado Investigação Criminal.
As funções e as competências de uma Investigação Criminal estão delineadas nos artigos iniciais da Lei nº 12.830 de 20 de junho de 2013, e, assim dispõe:
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia.
Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.
§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.
§ 3º (VETADO).
§ 4º O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da investigação.
§ 5º A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato fundamentado.
§ 6º O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.
Art. 3º O cargo de delegado de polícia é privativo de bacharel em Direito, devendo-lhe ser dispensado o mesmo tratamento protocolar que recebem os magistrados, os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público e os advogados.
A lei traz de forma clara que a investigação é conduzida por delegado de polícia, entretanto, outras normas de nosso ordenamento atribuem a figuras diversas, funções de investigação, a exemplo do art. 33, parágrafo único da Lei Complementar 35/79, que estabelece: “quando, no curso de investigação, houver indício da prática de crime por parte do magistrado, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá os respectivos autos ao Tribunal ou Órgão Especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga na investigação.”.
Insta citar ainda outras investigações legalmente previstas, como as realizadas por Comissões Parlamentares de Inquérito – CPI, por agentes da Administração (sindicâncias e processos administrativos), por autoridades florestais, pelo Promotor de Justiça presidindo o inquérito civil, etc. (NUCCI, 2016, p.144).
Um dos aspectos controversos no âmbito do Processo Penal consiste na competência de o Ministério Público conduzir Investigação Criminal, o que segundo Nucci (2016, p. 145):
A Constituição Federal foi clara ao estabelecer as funções da polícia – federal e civil – para investigar e servir de órgão auxiliar do Poder Judiciário – daí o nome polícia judiciária – na atribuição de apurar a ocorrência e a autoria de crimes e contravenções penais (art. 144, CF). Ao Ministério Público foi reservada a titularidade da ação penal, ou seja, a exclusividade no seu ajuizamento, salvo o excepcional caso reservado à vítima, quando a ação penal não for intentada no prazo legal (art. 5.º, LIX, CF). Note-se, ainda, que o art. 129, inciso III, da Constituição Federal, prevê a possibilidade de o promotor elaborar inquérito civil, mas não inquérito criminal. Entretanto, para aparelhar convenientemente o órgão acusatório oficial do Estado, atribuiu-se ao Ministério Público o poder de expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos (o que ocorre no inquérito civil ou em algum processo administrativo que apure infração funcional de membro ou funcionário da instituição, por exemplo), a possibilidade de exercer o controle externo da atividade policial (o que não significa a substituição da presidência da investigação, conferida ao delegado de carreira), o poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (o que demonstra não ter atribuição para instaurar o inquérito e, sim, para requisitar a sua formação pelo órgão competente). Enfim, ao Ministério Público cabe, tomando ciência da prática de um delito, requisitar a instauração da investigação pela polícia judiciária, controlar todo o desenvolvimento da persecução investigatória, requisitar diligências e, ao final, formar a sua opinião, optando por denunciar ou não eventual pessoa apontada como autora. O que não lhe é constitucionalmente assegurado é produzir, sozinho, a investigação, denunciando a seguir quem considerar autor de infração penal, excluindo, integralmente, a polícia judiciária e, consequentemente, a fiscalização salutar do juiz.
Ocorrendo o fato criminoso, compete ao Delegado de Polícia a condução de uma Investigação Criminal. Nas palavras de Sannini Neto (2019, p. 01), a Investigação Criminal compreende:
O objeto de uma investigação criminal é sempre a notitia criminis. Isso significa que é a possibilidade de ocorrência de uma infração penal que justifica a deflagração de um procedimento investigativo cuja finalidade seja, entre outras, a de viabilizar o perfeito esclarecimento dos fatos, suas circunstâncias e motivações.
Com a adoção do Sistema Acusatório pelo nosso ordenamento jurídico, não cabe ao Estado-Juiz dar início a um processo. Essa pretensão acusatória deve ser exercida, em regra, pelo Ministério Público, titular da ação penal pública, ou excepcionalmente pelo ofendido, nos crimes de ação penal privada.
Mas como exercer essa atividade acusatória sem dispor dos elementos mínimos sobre autoria e materialidade?! É esta, pois, a primeira função da investigação criminal: reunir elementos indiciários sobre a autoria e materialidade delituosa, preparando, assim, o exercício da ação penal pelo seu titular.
A investigação criminal, portanto, é gênero do qual o Inquérito Policial é espécie. O Inquérito se apresenta como procedimento/instrumento para apurar os elementos de autoria e materialidade reunindo para tanto, todas as provas necessárias para elucidação do crime.
Para melhor detalhamento, o Inquérito Policial será tratado no tópico seguinte.
3. O INQUÉRITO POLICIAL E OS MEIOS DE PROVA
O Inquérito Policial está previsto no Título II do Código de Processo Penal - CPP (Decreto-Lei nº 3.689 de 3 de outubro de 1941) e corresponde à uma fase pré-processual, com a finalidade de apurar as infrações penais e sua respectiva autoria (art. 4º do CPP).
Detalhando melhor o conceito de Inquérito Policial, Lopes Júnior (2016, p. 65) diz que: “constitui o conjunto de atividades desenvolvidas concatenadamente por órgãos do Estado, a partir de uma notícia-crime, com caráter prévio e de natureza preparatória com relação ao processo penal, e que pretende averiguar a autoria e as circunstâncias de um fato aparentemente delituoso, com o fim de justificar o processo ou o não processo”.
Conforme disposto no art. 5º do Código de Processo Penal (1941), o Inquérito Policial será iniciado de Ofício; mediante requisição judiciária ou do Ministério Público; pelo deferimento de requerimento do Ofendido ou por lavratura de auto de prisão em flagrante delito.
Lopes Júnior (2016, p. 65) elenca em sua obra a importância do Inquérito Policial, nos seguintes termos:
a) Busca do fato oculto: o crime, na maior parte dos casos, é total ou parcialmente oculto e precisa ser investigado para atingir-se elementos suficientes de autoria e materialidade (fumus commissi delicti) para oferecimento da acusação ou justificação do pedido de arquivamento.
b) Função simbólica: a visibilidade da atuação estatal investigatória contribui, no plano simbólico, para o restabelecimento da normalidade social abalada pelo crime, afastando o sentimento de impunidade.
c) Filtro processual: a investigação preliminar serve como filtro processual para evitar acusações infundadas, seja porque despidas de lastro probatório suficiente, seja porque a conduta não é aparentemente criminosa. O processo penal é uma pena em si mesmo, pois não é possível processar sem punir e tampouco punir sem processar, pois é gerador de estigmatização social e jurídica (etiquetamento) e sofrimento psíquico. Daí a necessidade de uma investigação preliminar para evitar processos sem suficiente fumus commissi delicti.
A investigação feita na fase do inquérito policial, é meio que o Estado busca identificar o autor da infração, mediante análise objetiva e científica dos fatos, de modo a garantir que o fato delituoso seja punido e que a pena imposta a quem de fato o cometeu.
O art. 6º do Código de Processo Penal (1941), para tanto, elencou um rol de atividades que devem observadas pela autoridade policial visando à elucidação dos fatos:
Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais;
II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;
VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.
X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa.
Tais medidas objetivam a produção de provas científicas que garantam a continuidade do Inquérito Policial e a comprovação da autoria e materialidade delitiva.
Para que estas provas tenham efeito durante a fase judicial é necessário que sejam consideradas lícitas, ou seja, que tenham sido coletadas de acordo com os meios juridicamente permitidos.
As provas estão elencadas no Título VII do Código de Processo Penal, e serão tratadas nos próximos tópicos desta pesquisa.
3.1. DA PROVA PERICIAL
O exame pericial é cabível quando a infração deixar vestígios, sendo nestes casos, indispensável a realização do exame de corpo de delito direto ou indireto, e sua ausência gera a nulidade da ação (art. 158 e 564, III, b CPP/1941).
Exemplificativamente as perícias são necessárias nas autópsias nos crimes de homicídio, ao exame documentoscópico para aferição de falsidade documental, à perícia no chassi dos automóveis nos crimes de receptação ou adulteração de identificador, ao exame químico-toxicológico nos crimes relacionados ao tráfico ou porte de droga para consumo, dentre outros. (REIS; GONÇALVES, 2012, p. 64).
A perícia poderá ser feita em qualquer dia e horário, seja na fase de inquérito policial ou no curso do processo (art. 161, CPP/41), e os peritos deverão elaborar o laudo no prazo de 10 dias, prorrogáveis em casos excepcionais, podendo as partes oferecer quesitos até a formalização do ato. (art. 160, parágrafo único, CPP/41).
Consoante previsto no art. 159, § 5º, I do CPP/41, durante o curso do processo judicial as partes poderão requerer a oitiva dos peritos, visando o esclarecimento de provas ou para respostas de quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos tenham sido encaminhados previamente com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo os peritos, responderem por meio de laudo complementar.
As partes (MP, ofendido, querelante e acusado) indicarem assistente técnico, que deverá ser admitido pelo juiz, que atuará após a conclusão dos exames e laudo pelo perito oficial (art. 159, § 4º, CPP/41).
Havendo divergência entre dois peritos o juiz nomeará um terceiro, se este também divergir dos demais, será determinada a realização de nova perícia (art. 180, CPP).
O juiz poderá julgar contrariamente às conclusões consignadas no laudo pericial, desde que o faça de maneira fundamentada (art. 182 do CPP).
3.2. DO ITERROGATÓRIO DO ACUSADO, DA CONFISSÃO E DO OFENDIDO.
O interrogatório é o momento em que o acusado é inquirido por autoridade competente acerca dos fatos que lhe foram imputados. Considerando que o modelo brasileiro de interrogatório é pautado na presunção de inocência e o direito ao silêncio (art. 5º, LXIII CRF/88), este somente servirá como parâmetro para definir se existem ou não motivos suficientes para a abertura do processo criminal, e conforme Lopes Jr. (2016, p. 245) deverá ser submetido a toda uma série de regras de lealdade processual, a saber:
a) deve ser realizado de forma imediata, ou, ao menos, num prazo razoável após a prisão;
b) presença de defensor, sendo-lhe permitido entrevistar-se prévia e reservadamente com o sujeito passivo;
c) comunicação verbal não só das imputações, mas também dos argumentos e resultados da investigação e que se oponham aos argumentos defensivos;
d) proibição de qualquer promessa ou pressão direta ou indireta sobre o imputado para induzi-lo ao arrependimento ou a colaborar com a investigação;
e) respeito ao direito de silêncio, livre de pressões ou coações;
f) tolerância com as interrupções que o sujeito passivo solicite fazer no curso do interrogatório, especialmente para instruir-se com o defensor;
g) permitir-lhe que indique elementos de prova que comprovem sua versão e diligenciar para sua apuração;
h) negação de valor decisivo à confissão.
Em linhas gerais, o interrogatório não é um meio de prova em si, tanto é que não se pode imputar a prática de um crime a quem invocou o direito de permanecer em silêncio. Ainda quanto ao interrogatório, insta reforçar que o Direito Brasileiro proíbe a utilização de práticas de tortura ou tratamento desumano ou degradante (art. 5º, II, CRF/88).
A Confissão muitas vezes ocorre no momento do interrogatório, e conceito nas palavras de Nucci (2016) é: “é admitir contra si, por quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente, em ato solene e público, reduzido a termo, a prática de algum fato criminoso.”
Ainda segundo o autor, a confissão compreende “o ato voluntário (produzido livremente pelo agente, sem nenhuma coação), expresso (manifestado, sem sombra de dúvida, nos autos) e pessoal (inexiste confissão, no processo penal, feita por preposto ou mandatário, o que atentaria contra a segurança do princípio da presunção de inocência)”.
Nos termos do art. 197 do Código de Processo Penal, a confissão será avaliada em conjunto com os demais elementos de prova do processo, verificando-se sua compatibilidade ou concordância com eles.
A declaração do ofendido está estampada no art. 201 do Código de Processo Penal e corresponde à oitiva da vítima do crime, que se mostra uma rica fonte para a identificação da autoria e esclarecimentos dos fatos, desde que cumpridos os ditames do dispositivo retro mencionado. (LOPES JR., 2016 p. 79)
3.3. DAS TESTEMUNHAS, DA ACAREAÇÃO E DOS INDÍCIOS.
Qualquer pessoa poderá ser testemunha em um processo penal (art. 202, CPP/41), entretanto, estão dispensados o cônjuge (ainda que desquitado), o ascendente, o descendente e os afins em linha reta, ou filho adotivo do réu. Neste caso, estas figuras apenas estarão obrigadas a depor caso não seja possível por outro modo, obter-se a prova (art. 206 do CPP).
São proibidas de depor, nos termos do art. 207 do CCP/41 “as pessoas que em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.”
Conceituando Testemunha, Nucci (2016) discorre que:
Testemunhas são pessoas que depõem sobre fatos, sejam eles quais forem. Se viram ou ouviram dizer, não deixam de ser testemunhas, dando declarações sobre a ocorrência de alguma coisa. A pessoa que presencia um acidente automobilístico, por exemplo, narra ao juiz os fatos, tais como se deram na sua visão. Lembremos, sempre, que qualquer depoimento implica uma dose de interpretação indissociável da avaliação de quem o faz, significando, pois, que, apesar de ter visto, não significa que irá contar, exatamente, o que e como tudo ocorreu.
A pessoa que presenciou o fato, ou seja, a testemunha será inquirida cada uma de per si, de modo que uma não saiba nem ouça o depoimento das outras, advertindo-as o juiz das penas cominadas ao falso testemunho. (art. 210, CPP/41)
O depoimento da testemunha ao final será reduzido a termo, sendo assinado por ela, pelo juiz e pelas partes (art. 216, CPP/41).
A acareação é utilizada quando para dirimir depoimentos divergentes, para Nucci (2016) a acareação é: “É o ato processual, presidido pelo juiz, que coloca frente a frente os depoentes, confrontando e comparando declarações contraditórias ou divergentes, no processo, visando à busca da verdade real.”
Nota-se conceito acima, que é por meio da acareação que o juiz confronta os fatos narrados nos vários depoimentos, para se estabelecer a verdade dos fatos, e poderá ser realizada entre acusados, entre acusado e testemunha, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, e entre as pessoas ofendidas (art. 229, CPP/41).
Por indício, têm-se, nos termos do art. 239 do CPP/41: “a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.”, ou seja, é o episódio conhecido e provado, no qual, por meio de raciocínio lógico, chega-se à conclusão da existência de outro fato.
3.4. DOS DOCUMENTOS, DA BUSCA E APREENSÃO E DO RECONHECIMENTO DE PESSOAS E COISAS.
As partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo, assim considerados; os escritos, instrumentos ou papéis públicos ou particulares, bem como a fotografia destes, desde que devidamente autenticados (arts. 231, 232, parágrafo único do CPP/41).
A exceção à apresentação de documentos em qualquer fase processual está estampada no art. 479 do CPP, quando estabelece: “durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte.”
Enquanto as demais provas são produzidas desde o início, em contraditório, com a participação de ambas as partes, a busca e apreensão segue procedimento diverso, possuindo natureza eminentemente cautelar, para acautelar material probatório de coisa, de animais e até de pessoas (PACELLI, 2014, p. 440).
Ainda conforme o autor (2014, p. 441), a busca e apreensão poderá ser domiciliar ou pessoal, consoante se depreende abaixo:
Por busca domiciliar entende-se aquela realizada em residência, bem como em qualquer compartimento habitado, ou aposento ocupado de habitação coletiva ou em compartimento não aberto ao público, no qual alguém exerce profissão ou atividade, nos termos do art. 246 do CPP. Todos esses locais, bem como os quartos de hotéis, motéis ou equivalentes, quando habitados, encontram-se incluídos e protegidos pela cláusula constitucional da inviolabilidade de domicílio. A seu turno, o automóvel não se inclui na definição legal de domicílio, a não ser quando estiver no interior deste.
(...)
Já a busca pessoal, a nosso aviso, não depende de autorização judicial, ainda que se possa constatar, em certa medida, uma violação à intangibilidade do direito à intimidade e à privacidade, previstos no art. 5°, X, da CF.
A busca e apreensão se mostram, portanto, como um procedimento para obtenção/apreensão de provas.
Considerando que o Retrato Falado, objeto do presente estudo, está atrelado ao meio de prova denominado Reconhecimento de Pessoas e Coisas, trataremos deste assunto no próximo capítulo.
4. O RETRATO FALADO
Além dos tipos de provas retro abordados, têm-se ainda no Direito Processual brasileiro o Reconhecimento de Pessoas e Coisas, inserto no art. 226 do CPP (1941), que assim dispõe:
Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma:
I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;
Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;
III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;
IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.
Parágrafo único. O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento.
O reconhecimento referenciado no excerto supra, trata-se de procedimento tendente a identificação de pessoas envolvidas no crime ou de coisas (objetos) decorrentes deste, necessários à apuração das responsabilidades (PACELLI, 2014, p. 436)
É neste contexto de reconhecimento de pessoas que cometeram o crime, que se apresenta o popularmente conhecido Retrato Falado.
Tecendo considerações acerca do conceito de Retrato Falado, Reis apud Papiloscopistas.Org (2008, p. 16), discorre que:
Retrato falado ou Representação Facial Humana é: A representação de uma pessoa, por meio do trabalho de um desenhista, da utilização de artifícios técnicos ou da combinação de ambos, segundo a descrição de seus aspectos físicos gerais, específicos e de seus caracteres distintivos (PAPILOSCOPISTAS.ORG, 2008).
(...)
O Retrato Falado é usado e aceito como meio de prova, desde que, esteja em consonância com o conjunto probante. É um processo científico, uma vez que obedecendo uma metodologia e técnicas próprias visa atingir sempre o resultado esperado (PAPILOSCOPISTAS.ORG, 2008).
Do conceito posto à lume, verifica-se que o Retrato Falado não é um tipo de prova, e sim um instrumento para se chegar à autoria, que somente será ratificada pelo conjunto probante coletado.
É uma técnica de desenho e de reprodução daquilo que é narrado pela vítima ou testemunha do fato delituoso em questão.
França (2017, p. 228) detalha em sua obra como são feitos os retratos falados:
As testemunhas relatam uma série de pormenores até formar uma fisionomia que, em certas ocasiões, coincide quase precisamente com o real. Estes pormenores são de ordem cromática (cor da íris, do cabelo e da pele); morfológica (altura, inclinação e proeminência da fronte; forma, dimensões e particularidades do nariz; forma, separação e particularidades das orelhas); complementar (configuração do crânio; forma dos lábios e do queixo; configuração do cabelo e do penteado; destaque dos lábios, da barba, das sobrancelhas e bigodes). Embora não inserido como um meio de prova, este método pode ser útil no sentido de apontar no conjunto dos elementos investigados indivíduos suspeitos. O retrato dessas pessoas procuradas pode ser feito por meio artístico, do ident-kit e do photo-kit. O método artístico é feito por desenhistas que tentam reproduzir os aspectos físicos do procurado. O segundo é realizado por meio de películas transparentes que recebem partes do rosto, como o formato do nariz, dos olhos, da boca etc. O terceiro, melhor que o anterior, é feito por recortes de fotografias que se encaixam como peças de um quebra-cabeças. Esses processos são baseados na memória humana e, por isso, aconselha-se que sejam procedidos logo após a testemunha ter visto a pessoa procurada. As mulheres em geral são mais precisas em face de sua memória detalhista.
Neste mesmo contexto, mas de modo mais sucinto, Magrani (2017) esclarece que:
Apesar de todos os avanços na área, a metodologia aplicada em muitos Estados ainda é feita de forma artesanal. O “quebra-cabeça” é montado manualmente, com os retoques de lápis e borracha, cujo desenho será baseado na compreensão que o perito teve sobre as características do criminoso apontadas pela vítima ou testemunha. O mesmo acontece quando se emprega a tecnologia, com a diferença de que o desenho será feito no computador.
Na verdade, os retratos são confeccionados através de uma técnica mista segundo a qual a vítima ou a testemunha faz uma comparação entre a imagem de olhos, nariz e boca de um acervo fotográfico com a imagem que tem formada em sua mente por decorrência do contato visual com o criminoso, e o desenhista, por sua vez, reproduzirá a descrição.
Com o avanço tecnológico o Retrato Falado já é feito por meio de modernos programas de computador, entretanto, considerando a falta de estrutura de muitos Estados brasileiros, a técnica empregada ainda é a realizada por meio de desenho manual feita por perito forense, mediante descrições físicas ditadas pela vítima ou testemunha.
Como as informações obtidas pelo perito/desenhista consiste em relatos vinculados à memória da testemunha e/ou da vítima do crime, muitas são as controversas apresentadas acerca da confiabilidade e da assertividade do Retrato Falado, eis que em muitos casos, o narrador em questão, encontra-se em situação traumática e psicologicamente questionável, como veremos adiante.
5. A MEMÓRIA E A CONFIABILIDADE DO RETRATO FALADO
Para a elaboração da técnica de Representação Facial Humana, comumente denominada de Retrato Falado, a memória se torna o esteio do testemunho, haja vista que, na sua essência, é nas lembranças que a pessoa consegue registrar os fatos vividos e os personagens presenciados.
Ocorre que um dos problemas estudados na Psicologia e amplamente discutidos no meio jurídico são as Falsas Memórias.
Analisando pesquisa realizada sobre as falsas memórias, Oliveira (2019), traz as seguintes considerações:
Elizabeth Loftus estudou o tema fazendo pesquisas sob inúmeras perspectivas.
Suas pesquisas consistiam em inserir uma falsa informação na mente da pessoa em meio a uma situação real vivenciada pelo indivíduo, e este passava a acreditar fielmente que vivenciou tal situação. Loftus pondera que a memória humana pode ser altamente manipulada, tanto com a inserção de fatos que nunca foram vivenciados, como também, modificando outros realmente vividos.
O surgimento das falsas memórias se dá quando há uma falha na recuperação da informação e o indivíduo contamina a informação não recuperada, seja pela própria falha de reprodução, seja pela indução de fatores externos.
A pesquisa revela que as falsas memórias podem ser por indução de fatores externos ou falha da própria reprodução. Isto é muito comum em pessoas que encontram em situações traumáticas e que estejam psicologicamente abaladas.
Exemplificando o efeito que um trauma traz à capacidade de se fazer um reconhecimento facial, Lopes Jr; Rosa. (2014) em seu artigo científico, narram o seguinte fato concreto:
É o caso de Jennifer Thompson. Por volta das três da madrugada teve a casa invadida e foi estuprada com uma faca no pescoço, tendo a vítima se focado no rosto do agressor para identifica-lo posteriormente, caso sobrevivesse. Saindo correndo pela porta conseguiu se livrar do estuprador e foi ao hospital, bem assim à polícia, elaborando um retrato falado. No dia seguinte Ronald Cotton, que tinha ficha policial (por invasão e agressão sexual) foi localizado, reconhecido por foto e depois pessoalmente. Em julgamento o reconhecimento foi confirmado. Cotton foi condenado ao cumprimento de prisão perpétua e mais cinquenta anos. Já na prisão, Cotton conheceu um homem parecido com sua descrição chamado Bobby Pool, também condenado por estupro e invasão. Ciente de sua inocência, Cotton pediu um novo reconhecimento, também na presença de Pool, tendo Jennifer, com a falsa memória fixada, novamente, afirmado ser Cotton o autor da agressão. Após Cotton estar sete anos preso, com os avanços do exame de DNA, foram feitos exames e se verificou que o verdadeiro autor do crime era Pool.
Por mais que a vítima tenha se concentrado na fisionomia do agressor, como visto na transcrição supra, não foi o suficiente para comprovar cabalmente que a pessoa por ela identificada, fora de fato o criminoso. A memória da vítima, no caso em questão, trouxe aspectos físicos de pessoa com aparência similar, mas que não era o culpado.
Lopes Jr. (2016, p. 268) apud Martinez; Rivera; Fernandes e Loftus elencam outras variáveis que incidem na qualidade de identificação do criminoso:
deve-se considerar a existência de diversas variáveis que modulam a qualidade da identificação, tais como o tempo de exposição da vítima ao crime e de contato com o agressor; a gravidade do fato (a questão da memória está intimamente relacionada com a emoção experimentada); o intervalo de tempo entre o contato e a realização do reconhecimento; as condições ambientais (visibilidade, aspectos geográficos etc.); as características físicas do agressor (mais ou menos marcantes); as condições psíquicas da vítima (memória, estresse, nervosismo etc.); a natureza do delito (com ou sem violência física; grau de violência psicológica etc.), enfim, todo um feixe de fatores que não podem ser desconsiderados.
A presença de arma também distrai a capacidade de reconhecimento, no chamado foco na arma, uma vez que a vítima não se fixa nas feições do algoz, vez que está concentrada na arma. Do mesmo modo, tem-se que considerar as expectativas da testemunha ou vítima, pois as pessoas tendem a ver e ouvir aquilo que querem. (LOPES JR., 2016, p. 268)
Ainda segundo o autor, a luminosidade do local do crime incide na qualidade da memória, pois em local muito escuro, torna-se difícil tecer detalhes sobre a fisionomia e demais aspectos físicos de uma pessoa. Vê-se que todos estes fatores, refletem na ocorrência da Falsa Memória.
Em busca da verdade real e da fidedignidade das informações prestadas para o Retrato Falado, os pesquisadores modernos recomendam que seja utilizado a Entrevista Cognitiva às testemunhas ou vítimas de crimes. Este método, de acordo com Oliveira (2019) apud Seger, consiste em:
Sabe-se que é no momento em que se questiona a vítima, ou a testemunha, que se dá a maior incidência das falsas memórias, sendo, portanto, voltada para este momento uma das maiores soluções apresentadas até agora pelos teóricos. Esta solução, é a entrevista cognitiva, a arma mais potente a ser empregada contra as falsas memórias, descoberta até o momento.
A entrevista cognitiva nasceu nos Estados Unidos foi desenvolvida por Edward Geiselman e Ronald Fisher, eles se basearam em conhecimentos da Psicologia Social e da Psicologia Cognitiva. Esta espécie de entrevista busca qualidade nos depoimentos e tem como foco aumentar a performance da memória de quem está sendo inquirido, diminuindo a incidência de erros, ela vale-se de novas estratégias que visam a redução da ocorrência das falsas memórias.
A entrevista cognitiva se organiza em cinco etapas: a) construção do rapport, b) a recriação do contexto original, c) a narrativa livre, d) o questionamento e d) o fechamento. Nas duas primeiras fases da entrevista constrói-se um ambiente confortável ao depoente, onde ele recria mentalmente a cena do crime em todos os seus aspectos. Na reconstrução do contexto espera-se que o depoente tenha várias pistas à sua disposição, com foco no máximo de quantidade e qualidade das informações possíveis. Na narrativa livre o depoente é convidado a falar livremente sobre tudo o que recordar, sem interrupção. Na etapa seguinte são feitos questionamentos somente com base no que foi descrito na narrativa livre. Como fechamento a testemunha é estimulada a lembrar dos fatos em diferentes ordens – ex. do fim para o início. (SEGER, p. 17)
Esta entrevista se mostra um excelente aliado no combate às falsas memórias e deve ser corretamente aplicado para que surta os efeitos esperados, mas, como a medida é adotada em países desenvolvidos com bons resultados, o Brasil vem se mostrando interessado nestas novas técnicas, voltadas a aperfeiçoar o Retrato Falado e consequentemente apenar o verdadeiro criminoso.
6. CONCLUSÃO
Uma sociedade organizada é aquela que cumpre as regras estabelecidas pelo Estado e respeita os direitos fundamentais de seus semelhantes, notadamente os que lhes são mais caros, como a vida e a liberdade.
Quando estes direitos são violados, o Estado tem o dever de apurar os fatos e imputar a respectiva sanção ao infrator, com intuito de se fazer justiça e reestabelecer a ordem e a satisfação social.
Neste esteio, em linhas superficiais, o Direito Penal e o Processo Penal se apresentam como os instrumentos de fixação da conduta delituosa e da pena, bem como o procedimento em que se darão a obtenção das provas e a ação penal correspondente.
Alinhado à premissa constitucional de que todos são inocentes até que se prove o contrário, o Estado se utiliza da Investigação Criminal e do consequente Inquérito Policial para se apurar a autoria e materialidade da conduta criminosa.
Visando auxiliar nesta busca pela autoria e materialidade, o Processo Penal estabelece os meios lícitos que as provas podem ser produzidas, a exemplo da Perícia, Interrogatório, Confissão, Declaração do Ofendido, Reconhecimento de Pessoas e Coisas, dentre outros.
Inserto na modalidade de prova denominado Reconhecimento de Pessoas e Coisas, o Retrato Falado corresponde a uma técnica de desenho (manual ou eletrônica) da face do autor do crime, com base em declarações da vítima ou das testemunhas do ocorrido.
Esta técnica é feita por um perito criminal e é muito discutida no meio acadêmico e jurídico pela sua confiabilidade nos casos de vítimas ou de testemunhas de crimes graves, como homicídios e estupros, uma vez que nestas situações, as mesmas se encontram traumatizadas e fragilizadas psicologicamente.
Pelo estudo apresentado, verifica-se que o Retrato Falado se mostra uma técnica viável e que auxilia o trabalho da Polícia Civil, no entanto, carece de ser manejado, com as atuais técnicas da Psicologia, notadamente a Entrevista Cognitiva, que desenvolve estratégias com o intuito de afastar as falsas memórias da narrativa da vítima/testemunha.
6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 11 nov. 2019.
________. Lei nº 12.830, de 20 de junho de 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12830.htm>. Acesso em: 11 nov. 2019.
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LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
LOPES JR., Aury; MORAIS DA ROSA, Alexandre. Memória não é Polaroid: Precisamos falar sobre Reconhecimentos Criminais. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2014-nov-07/limite-penal-memoria-nao-polarid-precisamos-falar-reconhecimentos-criminais?imprimir=1> Acesso em: 12 nov. 2019.
MAGRANI, Maria Tereza Couto. A Natureza jurídica do Trabalho do Perito Forense. 2017. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/55034/a-natureza-juridica-do-trabalho-do-perito-forense > Acesso em: 12 nov. 2019.
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OLIVEIRA, Keila Araújo de. Falsas Memórias no Processo Penal e a Entrevista Cognitiva. 2019. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/74636/falsas-memorias-no-processo-penal-e-a-entrevista-cognitiva> Acesso em 12 nov. 2019.
REIS, Alexandre Cebrian Araújo; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Processual Penal Esquematizado. Coordenador LANZA, Pedro. São Paulo: Saraiva, 2012.
REIS, Sérgio Lopes. A Natureza Mista do Retrato Falado: Método de Investigação e Meio de Prova. 2008. Disponível em: <file:///C:/Users/raphaelacsb/Desktop/ARTIGOS%20-%20GRADUA%C3%87%C3%83O/PAULO%20ROBSON/A%20natureza%20mista%20do%20retrato%20falado.pdf> Acesso em 12 nov. 2019.
SANNINI NETO, Francisco. Funcionalismo da Investigação Criminal. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 24. jul 2019. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/75452/funcionalismo-da-investigacao-criminal> Acesso em 09 nov. 2019.
SEGER, Mariana da Fonseca; LOPES JR. Aury. Prova Testemunhal e Processo Penal: A fragilidade do relato a partir da análise da subjetividade perceptiva e do fenômeno das falsas memórias. Disponível em: < http://www.pucrs.br//wp-content/uploads/sites/11/2018/09/mariana_seger.pdf> Acesso em 14 nov. 2019.
[1] OLIVEIRA FILHO, Ênio Walcacer, Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins. Professor de Direito da Faculdade Serra do Carmo. E-mail:
Acadêmico de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: REIS, PAULO ROBSON BEZERRA. Confiabilidade do retrato falado construído com base em relatos de vítimas e/ou de testemunhas de crime como meio de identificação de autoria delituosa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 dez 2019, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53941/confiabilidade-do-retrato-falado-construdo-com-base-em-relatos-de-vtimas-e-ou-de-testemunhas-de-crime-como-meio-de-identificao-de-autoria-delituosa. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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