O incidente de assunção de competência é um incidente que permite a formação de precedentes, os quais terão eficácia vinculante.
Ele tem por finalidade uniformizar a jurisprudência do Tribunal, por meio da formação de precedentes vinculantes, os quais devem ser observados pelos juízes subordinados ao Tribunal.
Esse instituto processual, tal como previsto pelo Código de Processo Civil de 2015, apresenta uma série de particularidades que merecem uma análise detalhada, que será empreendida no presente artigo.
Incidente de assunção de competência
O incidente de assunção de competência - IAC foi previsto pelo CPC/15 para a criação de precedentes vinculantes. Ele é instaurado quando do julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária, quando envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, mas sem repetição em múltiplos processos.
É muito importante destacar que esse mecanismo não pode ser usado quando envolver questão de direito com repetição em múltiplos processos, pois ele é usado fora do âmbito dos casos repetitivos. Ele não integra a categoria dos julgamentos de casos repetitivos.
E em quais situações cabe esse incidente? A resposta está no próprio art. 947 do CPC/15, que dispõe ser cabível para questões – seja de direito material ou processual – que têm grande repercussão social e podem gerar divergência jurisprudencial, mas sem repetição em múltiplos processos.
Assim, para assegurar a estabilidade, a integridade e a coerência jurisprudencial, é possível que haja a assunção da competência, de modo que o processo será julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar.
Além disso, o §4º do art. 947 aumenta o campo de incidência do incidente de assunção de competência, ao dispor que ele pode ser utilizado quando houver relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas do tribunal. Desse modo, para evitar divergências entre câmaras ou turmas do mesmo tribunal (divergência interna), pode-se suscitar o incidente para que o órgão colegiado que o regimento indicar defina a interpretação de uma determinada questão de direito.
Prosseguindo. É importante também destacar que o incidente de assunção de competência pode ser suscitado de ofício ou por requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, conforme o §1º do art. 947 do CPC/15.
Admitido o incidente de assunção de competência, ele não será mais julgado pelo órgão que originariamente lhe cabia julgar e sim por um órgão colegiado, mais amplo, que será definido pelo Regimento Interno de cada Tribunal, conforme o §2º do art. 947 do CPC/15.
Neste caso, havendo a assunção, este órgão colegiado que assumirá a competência não julgará apenas a tese, mas deverá também assumir a competência para julgar o caso concreto.
Julgada a tese e o caso concreto, a decisão proferida pelo órgão terá eficácia de precedente vinculante. É o que determina o §3º do art. 947 do CPC/15:
“CPC/15
É admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos.
§ 1º Ocorrendo a hipótese de assunção de competência, o relator proporá, de ofício ou a requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, que seja o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar.
§ 2º O órgão colegiado julgará o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária se reconhecer interesse público na assunção de competência.
§ 3º O acórdão proferido em assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários, exceto se houver revisão de tese.
§ 4º Aplica-se o disposto neste artigo quando ocorrer relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas do tribunal.”
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça definiu importante questão importante de direito tributário, especificamente sobre execução fiscal no IAC no RMS 53720 SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2019, DJe 20/05/2019.
Cingia-se a questão em definir sobre ser adequado, ou não, o manejo de mandado de segurança para atacar decisão judicial proferida no contexto do art. 34 da Lei 6.830/80, tema reputado infraconstitucional pela Suprema Corte no ARE 963.889 RG, Relator Min. Teori Zavascki, DJe 27/05/2016.
Isso porque dispõe o artigo 34 da Lei 6.830/80 que "Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração".
Lado outro, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o ARE 637.975-RG/MG, na sistemática da repercussão geral, firmou a tese de que "É compatível com a Constituição o art. 34 da Lei 6.830/1980, que afirma incabível apelação em casos de execução fiscal cujo valor seja inferior a 50 ORTN" (Tema 408/STF).
Apreciando a questão, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que, das decisões judiciais proferidas no âmbito do art. 34 da Lei nº 6.830/80, são oponíveis somente embargos de declaração e embargos infringentes, entendimento excepcionado pelo eventual cabimento de recurso extraordinário, a teor do que dispõe a Súmula 640/STF:
“É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de Juizado Especial Cível ou Criminal".
Em reforço argumentativo, destacou o STJ que é incabível o emprego do mandado de segurança como sucedâneo recursal, nos termos da Súmula 267/STF.
Assim, a tese firmada no IAC no RMS 53720 pelo STJ foi a seguinte: “Não é cabível mandado de segurança contra decisão proferida em execução fiscal no contexto do art. 34 da Lei 6.830/80".
Procedimento do incidente de assunção de competência
Como supramencionado, com o incidente de assunção de competência, o julgamento do recurso, remessa necessária ou processo de competência originária passará a ser feito por um a órgão mais amplo do que o originariamente competente.
Este órgão mais amplo caberá, no início da sessão, decidir se estão ou não presentes os requisitos para a assunção de competência, isto é, se há “interesse público na assunção de competência”.
Caso se decida pela inadmissibilidade da assunção, deverá o feito ser restituído ao órgão de origem, que prosseguirá no julgamento.
Por outro lado, admitido o incidente, porém, o órgão mais amplo, indicado no regimento interno, julgará o caso concreto, produzindo decisão cujos fundamentos determinantes vincularão todos os magistrados e órgãos fracionários vinculados àquele tribunal.
Essa eficácia vinculante só cessará se e quando ocorrer revisão da tese (art. 947, § 3º do CPC/15), com a superação do precedente, o que exige a instauração de procedimento próprio, em que também deverá ser admitida a participação de amici curiae e a realização de audiência pública (art. 927, § 2º, do CPC/15 - aplicável em razão da existência do microssistema de formação de precedentes vinculantes).
E se o acórdão proferido em incidente de assunção de competência for desrespeitado, qual a medida processual cabível? Pois bem. Neste caso, o inciso IV, do art. 988 do CPC/15, dispõe que caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de assunção de competência.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: Acesso em: 10 Junho 2019.
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015.
DIDIER JR., Fredie. Novo Código de Processo Civil de 2015 - Comparativo com o Código de 1973. Salvador: Juspodivm, 2016.
GOUVEIA, Lúcio Grassi. A função legitimadora do princípio da cooperação intersubjetiva no Processo Civil Brasileiro. Revista de Processo, n. 172.
MACEDO, Rommel. Advocacia-Geral da União na Constituição de 1988. São Paulo: LTr, 2008.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação civil pública. Em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores: (Lei 7347 e legislação complementar). 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004
MARINONI, Luiz Guilherme. CPC Comentado. 3ª Edição. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2016.
MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2016.
Bacharel em Direito pela Universidade Paulista – UNIP. Bacharel em Letras-Português pela Universidade de Brasília –UnB. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá. Foi escriturária do Banco do Brasil no período de 2010 a 2011. Foi técnica judiciária do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios em 2013. Foi analista processual do Ministério Público da União no período de 2013 a 2017, ocasião em que atuou como analista processual na Procuradoria Regional do Trabalho da 10ª Região – PRT/MPT. Atualmente, é membro da Advocacia-Geral da União - AGU, instituição na qual atua como Advogada da União.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Erica Izabel da Rocha. O incidente de assunção de competência segundo o CPC/15 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 dez 2019, 04:34. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53989/o-incidente-de-assuno-de-competncia-segundo-o-cpc-15. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
Precisa estar logado para fazer comentários.