RESUMO: O presente artigo objetiva analisar a necessidade de obediência da intimação da Fazenda Pública nos processos judiciais tombados em autos físicos perante os Juizados Especiais Fazendários, levando-se em consideração à análise bibliográfica e jurisprudencial mais recente sobre a matéria.
PALAVRAS-CHAVES: Fazenda pública. Prerrogativa processual. Intimação pessoal. Processos físicos.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. A FAZENDA PÚBLICA; 3. PRERROGATIVAS PROCESSUAIS DA FAZENDA PÚBLICA; 4. A INTIMAÇÃO PESSOAL COM REMESSA DOS AUTOS FÍSICOS EM PROL DA FAZENDA PÚBLICA; 5. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. INTRODUÇÃO
A celeridade processual e o combate à conhecida morosidade dos processos judiciais perante o Judiciário brasileiro como um todo não é tema novo. Há muito se fala da implementação de mecanismos que possibilitem o transcurso dos feitos judiciais em prazo razoável, justamente para concretizar o princípio constitucional da duração razoável do processo, capitulado no art. 5°, LXXVIII, da Constituição Federal de 1988.
E um destes mecanismos é a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, tanto em nível federal, pela Lei n° 10.259/2001, quanto a nível estadual, nos termos da Lei n° 12.153/2009, ambos com assento constitucional no art. 98, I, e parágrafo primeiro, da Lei Magna.
Se a celeridade processual é vetor que anima toda a estruturação desta sistemática processual especial, do mesmo modo não se pode obnubilar o princípio da segurança jurídica e do devido processo legal no simples afã de atingir aquela finalidade.
Sob este último aspecto é que reside a problemática da observância, ou não, da prerrogativa processual da Fazenda Pública de intimação pessoal nos autos físicos no rito dos Juizados Especiais Fazendários. Isto é: é válida a intimação da Fazenda Pública por meio de publicação em diário eletrônico do Tribunal, e não por meio de remessa dos autos físicos?
Para responder a este questionamento, passa-se a abordar brevemente o conceito de Fazenda Pública e as suas prerrogativas processuais, à luz dos apontamentos doutrinários e da jurisprudência mais recentes.
2. A FAZENDA PÚBLICA
O conceito de Fazenda Pública diz respeito à definição de quem pode assim ser qualificado, ou seja, quais os entes que ostentam este perfil de materialização de interesses públicos e, por isso, gozam de prerrogativas processuais necessárias para a defesa destes interesses administrados.
Sobre este conceito, precisas são as palavras de Leonardo Carneiro da Cunha:
A expressão Fazenda Pública identifica-se tradicionalmente como a área da Administração Pública que trata da gestão das finanças, bem como da fixação e implementação de políticas econômicas. Em outras palavras, Fazenda Pública é expressão que se relaciona com as finanças estatais, estando imbricada com o termo Erário, representando o aspecto financeiro do ente público. Não é por acaso a utilização, com frequência, da terminologia Ministério da Fazenda ou Secretaria da Fazenda para designar, respectivamente, o órgão despersonalizado da União ou do Estado responsável pela política econômica desenvolvida pelo Governo. O uso frequente do termo Fazenda Pública fez com que se passasse a adotá-lo num sentido mais lato, traduzindo a atuação do Estado em juízo; em Direito Processual, quando se alude à Fazenda Pública em juízo, a expressão apresenta-se como sinônimo do Poder Público em juízo, ou do Estado em juízo, ou do ente público em juízo, ou, ainda, da pessoa jurídica de direito público em juízo[1].
No mesmo ínterim, Helton Kramer assim a conceitua:
Tradicionalmente o conceito "Fazenda Pública" é utilizado para designar a presença de pessoas jurídicas de direito público interno, como a União, Estados, DF e Municípios. Pelo teor do art. 41 do Código Civil, é possível perceber que dentro deste conceito estará também englobada a Autarquia, Fundação e Agência Reguladora, que fazem parte da Administração Pública indireta. Estarão, a princípio, excluídas do conceito de Fazenda Pública a Empresa Pública e a Sociedade de Economia Mista, uma vez que possuem personalidade jurídica de direito privado (art. 173 CF). A exceção seria da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), pois o Supremo Tribunal Federal que reconheceu sua equiparação ao status de Fazenda Pública, em razão de serviço público exclusivo (RE 225011). Quando a Administração Pública, ou qualquer uma de suas entidades, que possuam personalidade jurídica, ingressar em juízo, receberá a designação de Fazenda Pública. Isso legitimará, com base no princípio da supremacia do interesse público, a aplicação de certas prerrogativas processuais que não são aplicáveis aos particulares[2].
Ambos os conceitos doutrinários inferem que se deve entender por Fazenda Pública a presença do Poder Público em um dos polos, ou em ambos os polos, da relação jurídica processual.
Assim, estão abrangidos por este conceito as pessoas políticas (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios), suas autarquias e fundações públicas e, à luz do entendimento jurisprudencial acima consignado, podem vir a ser qualificadas assim também empresas estatais prestadoras de serviço público.
As Fazendas Públicas são representadas em juízo por suas respectivas Procuradorias, a nível federal, estadual, distrital ou municipal, a teor do arts. 131 e 132 da Constituição Federal de 1988[3]. Nesse sentido, eis o Enunciado de Súmula n° 01, da Comissão Nacional da Advocacia Pública da Ordem dos Advogados do Brasil:
Súmula 1 - O exercício das funções da Advocacia Pública, na União, nos Estados, nos Municípios e no Distrito Federal, constitui atividade exclusiva dos advogados públicos efetivos a teor dos artigos 131 e 132 da Constituição Federal de 1988[4].
Corroborando este entendimento de uniformidade de representação, o Supremo Tribunal Federal já foi facejado com esta temática e, no julgamento do Recurso Extraordinário n° 663696/MG, julgado em 28.02.20019 (que tratou da vinculação dos procuradores municipais ao teto constitucional de noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos ministros da Corte Suprema) foram externadas importantes considerações quanto à uniformidade de representação pela Advocacia Pública dos entes federados. Diante da sua relevância, transcreve-se o teor do Informativo n° 932, do Supremo Tribunal Federal, no particular:
A expressão "Procuradores", contida na parte final do inciso XI (1) do art. 37 da Constituição da República, compreende os procuradores municipais, uma vez que estes se inserem nas funções essenciais à Justiça, estando, portanto, submetidos ao teto de noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria e em conclusão de julgamento, ao apreciar o Tema 510 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de considerar-se como teto remuneratório dos procuradores municipais o subsídio dos desembargadores de tribunal de justiça (vide Informativo 821).O colegiado entendeu que o cerne da controvérsia está no alcance dado à expressão “procuradores”, contida na parte final do inciso XI do art. 37 da CF. O termo “Procuradores”, na axiologia do Supremo Tribunal Federal (STF), compreende os procuradores autárquicos, além dos procuradores da Administração Direta, o que conduz à compreensão de que os procuradores municipais também estão abrangidos pela referida locução. Assim, é inconstitucional a hermenêutica que exclua da categoria “Procuradores” os defensores dos municípios, que desempenhariam idênticas atribuições dos procuradores congêneres no âmbito da União, dos estados e do Distrito Federal. Desse modo, não haveria fundamento para referido discrímen entre os procuradores, o que resultaria em uma advocacia pública municipal cujo subteto fosse o subsídio do prefeito. Ao assim proceder, os procuradores municipais estariam sujeitos às mais diversas contingências políticas, distantes do subteto de noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos ministros do STF. Indubitável, portanto, que os procuradores municipais integram a categoria da advocacia pública a que a Constituição denomina de “funções essenciais à Justiça” e, quanto ao teto remuneratório, devem estar sujeitos ao subsídio dos desembargadores dos tribunais de justiça estaduais. Por fim, o Plenário assentou que o constituinte não obriga os prefeitos a assegurarem ao seu corpo de procuradores um subsídio que supere o do chefe do Executivo municipal. Nos termos do art. 61, §1º, II, “c” (2), da CF, compete ao chefe do Poder Executivo municipal a iniciativa privativa de lei que discipline o regime de subsídio de seus procuradores. Dessa forma, cabe ao prefeito avaliar politicamente, diante das circunstâncias orçamentárias e da sua política de recursos humanos, a conveniência de permitir que um procurador de município receba mais do que o chefe do Poder Executivo municipal. Vencidos o ministro Teori Zavascki e a ministra Rosa Weber, que negaram provimento ao recurso, por entenderem não ser compatível com o princípio federativo submeter o teto de servidores municipais à fixação de remuneração do estado-membro[5].
3. PRERROGATIVAS PROCESSUAIS DA FAZENDA PÚBLICA
Como dito, a característica de que a Fazenda Pública administra interesses públicos demanda que lhe sejam garantidos mecanismos e instrumentos processuais que bem permitam o exercício da defesa daqueles interesses.
Diga-se que não se resume a interesses da própria Administração Pública, mas da coletividade. É a célebre diferenciação entre interesse público primário e secundário, ambos aptos, entretanto, a subsidiar as prerrogativas processuais em tela:
O interesse público primário é aquele relacionado à satisfação das necessidades coletivas (justiça, segurança, bem comum do grupo social etc.), perseguido pelo exercício das atividades-fim do Poder Público, enquanto o interesse público secundário corresponde ao interesse individual do próprio Estado, estando relacionado à manutenção das receitas públicas e à defesa do patrimônio público, operacionalizadas mediante exercício de atividades-meio do Poder Público[6].
De efeito, o art. 183 do Código de Processo Civil assevera que:
Art. 183. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da intimação pessoal.
§ 1º A intimação pessoal far-se-á por carga, remessa ou meio eletrônico.
§ 2º Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para o ente público[7].
Esta prerrogativa prevista no caput do dispositivo acima é a chamada dobra legal, que garante à Fazenda Pública a contagem dos prazos em dobro em todas as suas manifestações, sejam em reações defensivas, como contestações e impugnações, quanto para a interposição de recursos.
Não se olvide que os detentores desta prerrogativa processual têm o termo inicial prazal com o ingresso dos autos no setor administrativo do órgão[8].
Ainda, o próprio parágrafo segundo do dispositivo expressamente assevera que esta dobra de prazo não terá aplicação quando a lei estipular explicitamente um prazo próprio para o ente público. Por exemplo: o prazo para ajuizamento de embargos à execução em face da Fazenda é de 30 (trinta) dias úteis, nos termos do art. 910, caput, do Código de Processo Civil. Não há nesta hipótese a dobra do prazo para 60 (sessenta) dias.
Avançando, outra importantíssima prerrogativa processual disposta ao ente público é a intimação pessoal, nos termos do art. 183, parágrafo primeiro, do Código de Processo Civil.
Em tempos de processo judicial eletrônico, a intimação destes feitos virtuais dá-se no próprio portal do sistema eletrônico do respectivo Tribunal, consoante o art. 5° da Lei n° 11.419/2006.
Quanto aos efeitos eletrônicos inexistem dificuldades práticas a respeito, já que os autos estão (salvante as intercorrências do sistema) integral e constantemente à disposição para consulta das partes.
Situação diferente acontece com relação aos processos tramitantes em autos físicos, cujo acesso é naturalmente diferente do que ocorre com os processos eletrônicos.
Daí porque é necessária a intimação por carga ou remessa dos autos, para que a Procuradoria responsável pelo patrocínio dos interesses da respectiva Fazenda Pública tenha plenas condições de apreensão atos processuais praticados e do próprio feito como um todo.
4. A INTIMAÇÃO PESSOAL COM REMESSA DOS AUTOS FÍSICOS EM PROL DA FAZENDA PÚBLICA NOS JUIZADOS ESPECIAIS FAZENDÁRIOS
Sobre este tema, existem duas correntes em sentidos opostos.
A primeira defende a inaplicabilidade da prerrogativa processual fazendária sob o argumento de que não se compatibiliza com o espírito das Leis dos Juizados Especiais Fazendários, haja vista que sua adoção, na prática, terminaria por arrefecer o princípio da celeridade processual. Esta corrente já foi dantes acolhida por precedente do Supremo Tribunal Federal:
Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. RITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. PRERROGATIVA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DOS OCUPANTES DE CARGO DE PROCURADOR FEDERAL (ART. 17 DA LEI Nº 10.910/2004). INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIO DA PARIDADE DE ARMAS. CONTRADITÓRIO (ART. 5º, LV, DA CRFB). ACESSO À JUSTIÇA (ART. 5º, XXXV, DA CRFB). SIMPLICIDADE DO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO (ART. 98, I, DA CRFB). ART. 9º DA LEI Nº 10.259/01. AGRAVO CONHECIDO E RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. (...) 3. O rito dos Juizados Especiais é talhado para ampliar o acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CRFB) mediante redução das formalidades e aceleração da marcha processual, não sendo outra a exegese do art. 98, I, da Carta Magna, que determina sejam adotados nos aludidos Juizados “os procedimentos oral e sumariíssimo”, devendo, portanto, ser apreciadas cum grano salis as interpretações que pugnem pela aplicação “subsidiária” de normas alheias ao microssistema dos Juizados Especiais que importem delongas ou incremento de solenidades. 4. O espírito da Lei nº 10.259/01, que rege o procedimento dos Juizados Especiais Federais, é inequivocamente o de afastar a incidência de normas que alberguem prerrogativas processuais para a Fazenda Pública, máxime em razão do que dispõe o seu art. 9º, verbis: “Não haverá prazo diferenciado para a prática de qualquer ato processual pelas pessoas jurídicas de direito público, inclusive a interposição de recursos”. 5. Não se aplica aos Juizados Especiais Federais a prerrogativa de intimação pessoal dos ocupantes de cargo de Procurador Federal, prevista no art. 17 da Lei n.º 10.910/2004, na medida em que neste rito especial, ante a simplicidade das causas nele julgadas, particular e Fazenda Pública apresentam semelhante, se não idêntica, dificuldade para o adequado exercício do direito de informação dos atos do processo, de modo que não se revela razoável a incidência de norma que restringe a paridade de armas, além de comprometer a informalidade e a celeridade do procedimento. 6. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário[9].
Lado outro, a doutrina majoritária entende em sentido oposto, defendendo a aplicação desta prerrogativa processual do art.183 do Código de Processo Civil, sim, basicamente por dois motivos: respeito ao devido processo legal e porque este dispositivo do Código de Processo Civil se aplica normalmente aos Juizados Especiais Fazendários e suas Turmas Recursais por expressa previsão do art. 6º da Lei n°12.153/2009 (Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios), por força do art. 1.046, §4º, do atual Código de Processo Civil, verbis:
Art. 6º Quanto às citações e intimações, aplicam-se as disposições contidas na Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil[10].
Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
(...)
§ 4º As remissões a disposições do Código de Processo Civil revogado, existentes em outras leis, passam a referir-se às que lhes são correspondentes neste Código[11].
Este é, inclusive, o teor do Enunciado n° 29, do II Fórum nacional do Poder Público – Vitória/ES:
Aplica-se a intimação pessoal nos processos que tramitam sob o procedimento dos juizados especiais, conforme o art. 183, § 1º, do CPC.
O próprio Conselho Nacional de Justiça, no julgamento do pedido de providências nº 0008069-55.2017.2.00.0000, de relatoria do Excelentíssimo Conselheiro Rogério Soares do Nascimento, de 02.03.2018, decidiu que esta prerrogativa processual fazendária deve, sim, ser observada no orbe dos Juizados Especiais Fazendários. Ante a sua colocação pedagógica, colaciona-se trecho do voto:
(...) Como se vê, o artigo é claro ao determinar que “a contagem terá início a partir da intimação pessoal”. Intimação pessoal essa que dependerá da forma dos autos do processo. Quando físico o processo a intimação se dará por carga ou remessa, e quando digital, por meio eletrônico. Reconheço que a Justiça Especial é regida pelos princípios da celeridade, economia processual e simplicidade, tal como ponderou o requerido, todavia, a leitura harmônica dos princípios regentes não pode afastar a aplicação da regra que é clara no sentido da imposição da intimação pessoal por carga à Procuradoria do Estado. Foi a vontade do legislador diferenciar o tratamento para atender às especificidades da defesa da Fazenda em Juízo, não há nenhuma ambiguidade. Interpretar de modo diverso significaria violar o princípio da separação dos poderes. (...) Ora, o princípio da especialidade impõe que não se aplique normas gerais ou de outras leis, tais como a Lei 9.099/95 e a Lei 10.259/01, quando há normativo específico tratando do funcionamento dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Por fim, transcrevo o acórdão da decisão do próprio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que em sede correcional, ao se debruçar sobre o tema, entendeu, de igual forma, que a intimação pessoal por meio de carga aos procuradores do Estado em processos de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é medida que se impõe:
EMENTA: CORREIÇÃO PARCIAL – CITAÇÕES E INTIMAÇÕES NO ÂMBITO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA – ART. 6º, DA LEI N. 12.153/09 – EXPRESSA REMISSÃO AO MODELO DE CIENTIFICAÇÃO ESTABELECIDO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – ART. 183, DO ATUAL CPC – INTIMAÇÃO PESSOAL DAS FAZENDAS PÚBLICAS – IMPRESCINDIBILIDADE DE RESPEITO NO ÂMBITO DO JUIZADO ESPECIAL – QUEBRA DA ISONOMIA PROCESSUAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO – MODELO DE CIENTIFICAÇÃO QUE NÃO REPERCUTE NOS PRAZOS ESTIPULADOS – CELERIDADE E SIMPLICIDADE – VALORES CONSTITUCIONAIS SALVAGUARDADOS – CORREIÇÃO PROVIDA.
- Nos estritos termos do artigo 6º, da Lei n. 12.153/09, “quanto às citações e intimações, aplicam-se as disposições contidas na Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil”.
- Na medida em que a atual codificação processual civil expressamente estabelece a necessidade de intimação pessoal da Fazenda Pública acerca de todos os atos do processo (art. 183), o respeito ao comentado modelo procedimental de cientificação também no âmbito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é medida que se impõe.
- Expressamente positivada pela aplicação conjunta das normas acima referidas, a intimação pessoal da Fazenda Pública não representa benefício odioso contrário os escopos constitucionais vigorantes (celeridade e simplicidade), pois somente implementa maior grau de certeza na cientificação das manifestações e tramitações judiciárias, sem alterar os equivalentes prazos processuais indistintamente estipulados às partes.
- Em consequência, não se afigura vislumbrada qualquer incompatibilidade formal ou material do disposto no artigo 6º, da Lei n. 12.153/09, com a realidade normativa constitucionalmente estabelecida, mesmo com a incidência conjunta com o novel artigo 183, do CPC. - Correição parcial provida. Assim é que, julgo procedente o pedido para, com fundamento no artigo 6º da Lei 12.153/09 c/c artigo 183 do CPC, determinar que o Juizado Especial e à Turma Recursal de Teófilo Otoni passe a fazer as citações e intimações da Fazenda pública por meio de cargo ou remessa dos autos, quando físicos. Intime-se. À Secretaria Processual para as providências cabíveis. Brasília, DF, data registrada em sistema.
CONSELHEIRO ROGÉRIO SOARES DO NASCIMENTO
Relator[12]
Com razão esta decisão.
A interpretação sistemática das normas de regência não permite conclusão distinta.
Negar esta prerrogativa processual, sob a alegação genérica de que não se compatibiliza com o a celeridade própria do rito dos Juizados, nada mais é do que negar a vigência de uma norma com conteúdo definidor expresso através de procedimento de acrobacia hermenêutica.
4. CONCLUSÃO
O cotejo dos elementos componentes deste cenário revela que a Fazenda Pública faz jus, sim, às intimações pessoais, por meio de carga ou remessa, nos autos dos processos físicos que tramitarem nos Juizados Especiais Fazendários, tendo em vista a prerrogativa processual de que dispõe, por força do art. 183 do Código de Processo Civil.
Uma interpretação isolada e estanque das Leis n° 10.259/2001 e n° 12.153/2009, afastada da própria noção de que esta prerrogativa processual é sobremaneira relevante para a própria administração do interesse público, é medida que não se compatibiliza com o devido processo legal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXANDRE, Ricardo; DE DEUS, João de. Direito Administrativo. 3° Ed. São Paulo: Método, 2017.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências nº 0008069-55.2017.2.00.0000. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pjecnj/Processo/ConsultaProcesso . Acesso em: 20 dez. 2019.
_____. Lei nº 12.153, de 22 de dezembro de 2009. Disponível em: planalto.gov.br. Acesso em 24 de dez. de 2019.
_____. Lei nº 13.015, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: planalto.gov.br. Acesso em 24 de dez. de 2019.
_____. CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Súmula nº 01 da Comissão de Nacional da Advocacia Pública. Disponível em: http://www.oabsp.org.br/noticias/2012/11/13/8350. Acesso em 23 de dez. de 2019.
______. Supremo Tribunal Federal. Informativo n° 932. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/. Acesso em: 20 de dez. de 2019.
CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 15° Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
KRAMER, Helton. Advocacia Pública em Ação. 4° Ed. Salvador: JusPodvm, 2017.
MEDINA, José Miguel Garcia Medina. Curso de Direito Processual Civil Moderno. 3° Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2017.
NEVES, Daniel Amorim. Manual de Direito Processual Civil. 9° Ed. Salvador: JusPodivm, 2017.
[1] CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 15° Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 31.
[2] KRAMER, Helton. Advocacia Pública em Ação. 4° Ed. Salvador: JusPodvm, 2017, p. 21.
[3] MEDINA, José Miguel Garcia Medina. Curso de Direito Processual Civil Moderno. 3° Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2017, p. 77.
[4] CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Súmula nº 01 da Comissão de Nacional da Advocacia Pública. Disponível em: http://www.oabsp.org.br/noticias/2012/11/13/8350. Acesso em 23 de dez. de 2019.
[5] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo n° 932. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/. Acesso em: 20 de dez. de 2019.
[6] ALEXANDRE, Ricardo; DE DEUS, João de. Direito Administrativo. 3° Ed. São Paulo: Método, 2017, p. 98.
[7] BRASIL. Lei nº 13.015, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: planalto.gov.br. Acesso em 24 de dez. de 2019.
[8] NEVES, Daniel Amorim. Manual de Direito Processual Civil. 9° Ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 442.
[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 648629, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 24/04/2013. Disponível em: stf.jus.br. Acesso em 23 de dez. 2019.
[10] BRASIL. Lei nº 12.153, de 22 de dezembro de 2009. Disponível em: planalto.gov.br. Acesso em 24 de dez. de 2019.
[11] BRASIL. Lei nº 13.015, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: planalto.gov.br. Acesso em 24 de dez. de 2019.
[12] BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências nº 0008069-55.2017.2.00.0000. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pjecnj/Processo/ConsultaProcesso . Acesso em: 20 dez. 2019.
Juiz de Direito - TJBA. Especialista em Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Danillo Augusto Gomes de Moura e. Da necessidade de intimação pessoal da Fazenda Pública nos processos de autos físicos no âmbito do Juizado Especial Fazendário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 dez 2019, 04:39. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54059/da-necessidade-de-intimao-pessoal-da-fazenda-pblica-nos-processos-de-autos-fsicos-no-mbito-do-juizado-especial-fazendrio. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
Precisa estar logado para fazer comentários.