RESUMO: O objetivo deste artigo é investigar em que medida se dá a atuação da Fazenda Nacional, no âmbito administrativo, para arrecadar valores oriundos de multas trabalhistas inscritas na Dívida Ativa da União. Para isto, aplicou-se o método dedutivo, com as técnicas de pesquisa documental e bibliográfica, através da análise das multas lavradas por infração a dispositivos da CLT e como se dará sua cobrança na via administrativa. Primeiramente, foi demonstrado os dados da arrecadação da Fazenda Nacional, demonstrando, em valores, a importância desta atuação; posteriormente, verificou-se o arcabouço jurídico que envolve a lavratura das multas por infração a legislação celetista; e, ao final, restou demonstrada a importância da inscrição em dívida ativa da União e da cobrança pelos meios e vias administrativas. A partir dos dados vistos, é possível mensurar a grande importância da atuação da Fazenda Nacional na cobrança administrativa de valores provenientes das violações a dispositivos da CLT.
Palavras-chave: Fazenda Nacional. Multa trabalhista. Receita pública. Dívida Ativa da União. Cobrança administrativa.
SUMÁRIO: 1) INTRODUÇÃO. 2) CRÉDITOS INSCRITOS EM DAU RELACIONADOS A MULTAS TRABALHISTAS. 3) MECANISMOS ADMINISTRATIVOS DE COBRANÇA DE DÍVIDAS INSCRITAS EM DAU. 4) CONCLUSÕES. 5) REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO.
Este artigo trata a respeito da atuação da Fazenda Nacional na efetiva arrecadação das multas impostas por infração a legislação da CLT. As multas são lavradas pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, através da atividade de fiscalização dos Auditores Fiscais do Trabalho, respeitado os princípios e regras do processo administrativo para a constituição da multa trabalhista.
Atualmente, está inscrito em Dívida Ativa da União um total de aproximadamente R$ 2 trilhões[1]. Estes valores incluem débitos tributários e não tributários. No estoque dos créditos de natureza não tributária, excluindo os valores do FGTS, existem aproximadamente R$ 138 bilhões, aqui incluídas as multas a legislação trabalhista não pagas no âmbito administrativo de cobrança junto a SRTE.
No primeiro semestre de 2019[2], a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional anunciou a recuperação de R$ 116,7 milhões em débitos de FGTS, beneficiando 522 mil trabalhadores. No total, a PGFN recuperou R$ 11,4 bilhões relativos à dívida ativa da União no primeiro semestre de 2019, acumulando superávit de R$ 2 bilhões em relação a previsão da Lei Orçamentária Anual de 2019, referente aos primeiros seis meses do ano.
Os números apresentados reforçam a importância do tema posto em debate, já que servem para financiar as políticas públicas da União, além do valor pedagógico atribuído a cobrança das multas a legislação da CLT, por desestimular as violações a legislação trabalhista.
De tal modo, este artigo foi estruturado em duas seções, iniciando pela análise da competência constitucional e daquilo que pode ser inscrito em Dívida Ativa da União; para, em seguida, desenvolver sobre como é realizada esta cobrança na via administrativa e judicial, para concluir como é realizado o procedimento arrecadatório.
2. CRÉDITOS INSCRITOS EM DAU RELACIONADOS A MULTAS TRABALHISTAS.
Caso a multa não seja paga na via administrativa, no âmbito da SRTE, com o decurso do procedimento de constituição da exação, está será encaminhada para inscrição na Dívida Ativa da União. Não obstante, a inscrição em DAU demanda análise quanto a sua legalidade, pela autoridade responsável pela inscrição, nos termos do art. 2°, § 3º da LEF[3].
Este controle de legalidade foi direcionado, constitucionalmente para a Procuradoria da Fazenda Nacional, órgão competente pelo gerenciamento da Dívida Ativa da União, pelo art. 131, § 3º da CRFB/88, conforme entendimento do STJ:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. AUSÊNCIA DE NULIDADE DA CDA. PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL. REPARTIÇÃO ADMINISTRATIVA COMPETENTE PARA INSCRIÇÃO DE CRÉDITO EM DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO. AGRAVO REGIMENTAL DA EMPRESA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O Procurador da Fazenda Nacional é a autoridade administrativa competente para apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União, tributária ou não tributária, mandar inscrevê-la para fins de cobrança, amigável ou judicial e, após a Constituição Federal de 1988, representar judicialmente a União na cobrança dos créditos de qualquer natureza inscritos em Dívida Ativa da União, nos termos da legislação de referência. Precedentes: REsp. 1.307.984/RS, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 28.8.2012; REsp. 658.779/PR, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ 27.6.2005. 2. Agravo Regimental da Empresa a que se nega provimento. (STJ – AgRg no AREsp 757.393/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2019, DJe 06/09/2019)
Pode ser inscrito em Dívida ativa toda receita da União que puder ser cobrada diretamente na via administrativa, independente de controle jurisdicional prévio. Neste caso, o início da discussão judicial pelo contribuinte faz com que haja renúncia na via administrativa, já que o modelo Brasileiro adotou a jurisdição única (MEIRELLES, 2013, p. 56-57), segundo a qual a matéria administrativa poderá ser submetida ao Judiciário, a qualquer tempo, que prevalece sobre o âmbito administrativo. Inclusive, isto é refletido no art. 38 da LEF, considerado constitucional por entendimento do STF:
O direito constitucional de petição e o princípio da legalidade não implicam a necessidade de esgotamento da via administrativa para discussão judicial da validade de crédito inscrito em dívida ativa da Fazenda Pública. É constitucional o art. 38, parágrafo único, da Lei 6.830/1980 (Lei da Execução Fiscal – LEF), que dispõe que "a propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo (ações destinadas à discussão judicial da validade de crédito inscrito em dívida ativa) importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto". (STF – RE 233.582, rel. p/ o ac. min. Joaquim Barbosa, j. 16-8-2007, P, DJE de 16-5-2008) e (STF – RE 469.600 AgR, rel. min. Cármen Lúcia, j. 8-2-2011, 1ª T, DJE de 3-3-2011)
Dessa forma, há exercício do contraditório e da ampla defesa na via administrativa, antes da inscrição em DAU, ainda na fase do lançamento do crédito. Cabe a SRTE instituir e autuar o procedimento administrativo de constituição da multa por cometimento de violação a dispositivo da CLT, possibilitando a defesa na via administrativa, possibilidade recursal e de pagamento antes da inscrição em Dívida Ativa da União.
Assim, o procurador da Fazenda Nacional deve exercer o controle de legalidade em relação ao procedimento administrativo de constituição da multa trabalhista, devendo retornar a SRTE caso esteja com alguma inconsistência legal.
3. MECANISMOS ADMINISTRATIVOS DE COBRANÇA DE DÍVIDAS INSCRITAS EM DAU.
A utilização, pela Fazenda Nacional, de meios alternativos, extrajudiciais, para a recuperação do crédito é prática interessante, efetiva e que está se tornando importante ativo na recuperação de capitais. Como vantagens a serem expostas, temos a recuperação do crédito no já no âmbito administrativo e redução do número de execuções fiscais ajuizadas, diminuindo os custos da recuperação do crédito e possibilitando um maior planejamento do gasto público.
Com dados extraídos do PGFN em números 2019[4], 9% da arrecadação do ano de 2018 foi realizada através do protesto da dívida e da inscrição do devedor com negativação do seu nome em cadastros como o CADIN.
Julgando o tema, o STJ decidiu, em sede de recurso repetitivo, o Tema Repetitivo 777/STJ, segundo o qual: “A Fazenda Pública possui interesse e pode efetivar o protesto da CDA, documento de dívida, na forma do art. 1º, parágrafo único, da Lei 9.492/1997, com a redação dada pela Lei 12.767/2012”.
Além do protesto da CDA, o art. 20-B do Lei n° 10.522/2002, estabelece o rito e as possibilidades de cobrança na via administrativa. A partir da inscrição em dívida ativa da União: i) devedor é notificado para pagamento em cinco dias; ii) não pago o débito, a Fazenda Nacional poderá comunicar a inscrição em DAU aos órgãos que operam bancos de dados relativos a consumidores e serviços de proteção ao crédito; iii) poderá averbar a CDA nos registros de bens e direitos, deixando-os indisponíveis. O STJ tem julgado sobre este rito diferenciado:
30. Por outro lado, o art. 25 da Lei 13.606/2018 acrescentou o art. 20-B à Lei 10.522/2002, instituindo rito administrativo para a cobrança dos créditos fiscais, segundo o qual, em caso de não pagamento da quantia devida, no prazo de cinco dias, contados da notificação da inscrição em dívida ativa, faculta-se à Fazenda Nacional (i) o registro dessa pendência nos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção de créditos e congêneres, e b) a averbação, inclusive por meio eletrônico, da CDA nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis. (STJ – REsp 1686659/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/11/2018, DJe 11/03/2019)
Na forma exposta, cabe destacar a existência de vários mecanismos, como o protesto, a notificação para pagamento, o registro em bancos de dados de restrição de crédito e a averbação nos órgãos de registro de bens, como mecanismos de garantia da recuperação do crédito público e o respeito a legalidade.
4. CONCLUSÃO.
Com a explanação realizada, é possível perceber a importância da cobrança e recuperação dos créditos inscritos em DAU ainda na via administrativa, seja para aumentar a recuperação de ativos ou para reduzir o grande número de execuções fiscais que abarrotam e são fiadoras de grande parte da morosidade do Judiciário Brasileiro.
Assim, concluímos pela legalidade da cobrança administrativa, nos termos estabelecidos pelas leis n° 9.492/1997 e 10.522/2002. Nessa medida, o protesto, a notificação para pagamento, o registro em bancos de dados de restrição de crédito e a averbação pré-executória nos órgãos de registro de bens são eficazes no incremento da recuperação do crédito público, redução dos custos de cobrança e desafogo do Poder Judiciário.
REFERÊNCIAS.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em 18 de novembro de 2019.
________. Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 24 set. 1980.
________. Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997. Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 11 set. 1997.
________. Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002. Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 22 jul. 2002.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 39. ed. São Paulo: Malheiros,
2013.
PGFN em números 2019. Disponível em: http://www.pgfn.fazenda.gov.br/acesso-ainformacao /institucional/pgfn-em-numeros-2014/pgfn_em_numeros_2019.pdf/view. Acessado em: 13 de fevereiro de 2020.
[1] PGFN em números 2019. Disponível em: http://www.pgfn.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/institucional/pgfn-em-numeros-2014/pgfn_em_numeros_2019.pdf/view. Acessado em: 13 de fevereiro de 2020.
[2] Arrecadação da PGFN no 1º semestre de 2019. Disponível em: http://www.pgfn.fazenda.gov.br/ noticias/2019/pgfn-recupera-r-11-4-bilhoes-relativos-a-divida-ativa-da-uniao-no-primeiro-semestre-de-2019. Acessado em: 13 de fevereiro de 2020.
[3] LEF: Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
§ 3º - A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.
[4] PGFN em números 2019. Disponível em: http://www.pgfn.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/institucional/ pgfn-em-numeros-2014/pgfn_em_numeros_2019.pdf/view. Acessado em: 14 de fevereiro de 2020.
Procurador da Fazenda Nacional. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito Processual Civil. Bacharel em direito pela Universidade Católica de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VICENTE FéRRER DE ALBUQUERQUE JúNIOR, . A atuação Administrativa da Fazenda Nacional na cobrança das multas trabalhistas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 mar 2020, 04:46. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54295/a-atuao-administrativa-da-fazenda-nacional-na-cobrana-das-multas-trabalhistas. Acesso em: 22 nov 2024.
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