RESUMO: O presente trabalho apresenta sobre a realidade no sistema prisional brasileiro, num comparativo com a legislação penal e a aplicabilidade para o convívio nos presídios, se de fato contribui para a diminuição da superlotação e possibilidade de assegurar a dignidade da pessoa humana. Foram abordados aspectos doutrinários e a Lei de Execução Penal, e ainda, a respeito da dignidade da pessoa humana, o preso.
Palavras-chave: Direito Penal. Execução Penal. Dignidade da Pessoa Humana.
ABSTRACT: This paper presents the reality in the Brazilian prison system, in a comparison with the penal legislation and the applicability for living in prisons, if in fact it contributes to the reduction of overcrowding and the possibility of ensuring the dignity of the human person. Doctrinal aspects and the Law of Penal Execution were addressed, as well as, regarding the dignity of the human person, the prisoner.
Keywords: Criminal Law. Penal execution. Dignity of human person.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Aspectos do Sistema Prisional Brasileiro; 3. Da dignidade da pessoa humana; 4. Conclusão; Referências Bibliográficas.
1. Introdução
Quando trazemos para o direito a preocupação com a ressocialização, o que temos é uma visão de sistema carcerário falido e que não ressocializa, porém, será verificado que além do Estado, fundamental na ressocialização, também está a sociedade, que com oportunidades, possibilitará a continuidade do aprendizado do egresso. A ressocialização nos dias atuais é a mais esperada pela sociedade que acredita que o Estado deva efetivar a pena de forma que não haja reincidência, individualizando a mesma e possibilitando ao infrator que cumpra conforme previsão legal a sua pena, sem ser a mesma degradante e humilhante. O presente trabalho irá trazer as acepções da ressocialização e dignidade da pessoa humana, assim como brevemente abordar seu respaldo legal, assim como, o papel ressocializador do Estado e sociedade.
2. ASPECTOS DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO.
O presente título trará noções breves acerca do sistema prisional na legislação que o regulamenta, assim como os comentários doutrinários acerca do que se vive na realidade nos presídios.
Quando falamos em sistema punitivo, logo vêm em mente as aulas iniciais de direito, onde se discorria acerca da forma em que se regulamentou sobre a punição, de quando o cidadão se submeteu as leis do Estado, para que pudesse viver em sociedade com o outro em eterna harmonia.
No ordenamento jurídico brasileiro, tem se a destacar um Código Penal, que demonstra as condutas que tipificamos como crime, assim como possui um Código de Processo Penal, onde discorre como se dará o processo de quem descumpriu a lei, até chegar ao sistema punitivo se for o caso, é nessa fase então, que o Estado aplica as normatizações da Lei de Execução Penal, a LEP, ou deveria aplicá-la em sua integralidade.
A lei em si, traz inúmeras disposições, orientando e regulando o cumprimento da pena, porém, muito se tem discutido a respeito disso nas universidades, e ainda, a preocupação com a reforma, que Michel Foucault destaca como:
[...] a reforma propriamente dita, tal como ela se formula as teorias do direito ou que se esquematiza nos projetos, é a retomada da política ou filosófica estratégia, com seus objetivos primeiros: fazer da punição e da repressão das ilegalidades uma função regular, extensiva à sociedade; não punir menos, mas punir melhor; punir talvez, com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade; inserir mais profundamente no corpo social o poder punir.
Entende-se aqui, que a ressocialização, como num todo, depende também da sociedade, para que após o cumprimento da pena, não seja rotulado e consiga se reinserir no mercado de trabalho.
A realidade que resta demonstrada do sistema prisional brasileiro é da diferenciação preconceituosa dos detentos, da seletividade dos que são punidos, e nesse sentido, Rafael Damasceno de Assis aborda que,
O sistema penal e, consequentemente o sistema prisional não obstante sejam apresentados como sendo de natureza igualitária, visando atingir indistintamente as pessoas em função de suas condutas, têm na verdade um caráter eminentemente seletivo, estando estatística e estruturalmente direcionado às camadas menos favorecida da sociedade.
A realidade que resta demonstrada do sistema prisional brasileiro é da diferenciação preconceituosa dos detentos, da seletividade dos que são punidos, e nesse sentido, as palavras acima, denota, que apenas o menos favorecido que estará sujeito as normas penais, não só pela falta de assistência de um bom advogado, mas também, por estar, desde sempre, distante do ensino escolar e demais atividades de retorno produtivo.
A Lei de Execução Penal de nº 7.210 de 11 de julho de 1984, regulamenta, já em seu primeiro artigo trata acerca dos objetivos da execução penal, quais sejam a efetivação das disposições em sentença, e também proporcionar ao preso, condições harmônicas para o cumprimento das medidas impostas.
A respeito disso, Luiz Flávio Borges D’Urso, discorre sobre os anseios da população em relação a punição com efetividade do estado.
A nação reclama reformas profundas no sistema; portanto, caberá às autoridades observar os reclamos da população e com esta dividir a responsabilidade do ônus social do homem preso e do sucesso de sua recuperação, o que, até hoje, lamentavelmente, se tem mostrado como uma grande utopia.
Não é nenhuma novidade que muito se clama a respeito do trabalho do preso, tem-se a crença que somente com o trabalho ele conseguirá se reestabelecer em sociedade, o que ocorre é que grande parte dos empresários esquecem-se disso, o “ex presidiário” é sempre rotulado, logo, não encontra facilidade em retornar ao meio social. Nesse sentido, a população clama pela ocupação do mesmo, ainda no presídio, João Carlos Casella, aponta sobre o trabalho do presidiário e suas funções, como sendo:
Múltiplas são as funções do trabalho do presidiário, reconhecidas como verdadeiras necessidades: favorecem o estado psicológico para que o condenado aceite sua pena; impedem a degeneração decorrente do ócio; disciplinam a conduta; contribuem para a manutenção da disciplina interna; prepará-lo para a reintegração na sociedade após a liberação; permitem que os presidiários vivam por si próprios.
De fato, se denota a necessidade do trabalho do preso, seja como ocupação mental, seja como forma de ordenar a convivência no presídio, e a respeito disso, a Lei de Execução Penal, em seu Capítulo III, artigo 28, traz que “o trabalho do condenado, além de trazer dignidade e ser um dever social, sua finalidade é a educativa e produtiva”, dessa forma, entendemos aqui, o trabalho do condenado, como fundamental na ressocialização, em razão de seu aspecto educativo e produtivo.
Além das disposições acerca do trabalho do preso, a Lei de Execução Penal, em seu artigo 10, discorre que a assistência seja ela ao preso, ou ao internado, é dever do Estado, com isso, objetivando prevenir o crime, orientando para um bom retorno na convivência em sociedade, estendendo-se também, essa assistência ao egresso.
3. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
Quando colocamos a punição e ressocialização a encargo do Estado, espera-se uma legislação eficaz, seja para manter a sociedade organizada e segura, seja para punir de forma eficaz, quem comete os ilícitos da lei.
Primeiramente resta destacar, que o papel do Estado é punir o crime por meios legais, sem ferir a dignidade humana, respaldando-se no inciso XLIX do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, apresentando que é assegurado aos presos, o respeito a integridade física e moral, porém, na realidade dos presídios, não temos aplicabilidade deste artigo. Quando se adentra no cárcere, não se vislumbra o homem a ser ressocializado, mas sim o crime, dessa forma, a convivência se torna perigosa, podendo muitas vezes ser até impossível, ocasionando a morte daquele que deveria ter apenas a liberdade cerceada.
No sentido de respaldar a proteção do apenado, Rafael Damasceno de Assis discorre que:
As garantias legais previstas durante a execução da pena, assim como os direitos humanos do preso estão previstos em diversos estatutos legais. Em nível mundial existem várias convenções como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a Resolução da ONU que prevê as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso. Já em nível nacional, nossa Carta Magna reservou 32 incisos do artigo 5º, que trata das garantias fundamentais do cidadão, destinados à proteção das garantias do homem preso. Existe ainda, em legislação específica – a Lei de Execução Penal – os incisos de I a XV do artigo 41, que dispõe sobre os direitos infraconstitucionais garantidos ao sentenciado no decorrer na execução penal.
Logo, se destaca que a proteção não esta só na Constituição brasileira, tampouco somente na Lei de Execução Penal, mas sim, em um emaranhado de legislações, que ampliam a proteção ao apenado, sendo norteadoras para o tratamento com dignidade do mesmo.
Ocorre que a realidade nos presídios diverge da proteção legislativa, Rafael Damasceno de Assis, traz ainda que,
Dentro da prisão, dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre principalmente com a prática de torturas e de agressões físicas. Essas agressões geralmente partem tanto dos outros presos como dos próprios agentes da administração prisional. O despreparo e a desqualificação desses agentes fazem com que eles consigam conter os motins e rebeliões carcerárias somente por meio da violência, cometendo vários abusos e impondo os presos uma espécie de disciplina carcerária que não está prevista em lei, sendo que na maioria das vezes esses agentes acabam não sendo responsabilizados por seus atos e permanecem impunes.
A situação se demonstra preocupante há tempos, mas efetivamente, nada se nota acerca da mudança, o que só piora com a superlotação dos presídios, com presos que deveriam há muito ter sido liberados, ou de presos provisórios que não dispõe de recursos para arcar com advogados que possibilitem a resposta ao processo em liberdade.
Para Jair Aparecido Ribeiro,
A crise vivenciada, pelos mais diversos países, na atualidade, quanto ao aparelho carcerário, não permite cumprir com os objetivos esculpidos pela Legislação, contudo precisam de restabelecimento e efetivação imediata, quão unicamente acontecerá se tiver vontade política e coragem para que seja dado o pontapé inicial.
Dessa feita, muito se fala em falência do sistema carcerário, porém não se vislumbra atitudes de chefes de Estado em relação a isso, tampouco a disponibilidade para formar políticas de efetivação da legislação, o que se tem é um esquecimento do infrator, sem interesse na sua ressocialização. E ainda Jair Aparecido Ribeiro, destaca que,
O Estado deslocou seu foco, para uma simples manutenção da ordem, esquecendo-se dos princípios orientadores, seus fundamentos, isto leva a mudança de visão acerca do preso, pois quando o próprio Estado esquece que o indivíduo preso é um cidadão que faz parte do mesmo, isto se reflete em toda a sociedade, a qual passa a tratar o preso, mesmo depois de ter cumprido apena, como não mais sendo este um cidadão.
O que resta notório é o fato de “enjaular” o criminoso, como se apenas isso tivesse eficácia para sua punição. Dessa forma, fica o questionamento acerca da Lei de Execução Penal, no caso do Brasil, para quê serve tal legislação? Por que ainda ficamos com a ilusão de que quando mais “enjaular” melhor será? Será que apenas pelo fato de perder o direito ao voto, perde-se também a cidadania e a dignidade do preso? N ão há soluções fáceis para o sistema carcerário, mas isso não significa que devemos ignorá-lo, o Estado visivelmente lucraria mais com um egresso que teve acesso ao trabalho interno, ao ensino regular e que posterior ao cumprimento de sua pena, retorne a vida em sociedade, com anseio de mudança, com a crença de que conseguirá se reinserir no mercado de trabalho, possibilitando assim o seu sustento e o de sua família.
Como fundamento e no mesmo sentido o doutrinador Paulo Queiroz aborda que:
O fim da pena era a prevenção eficaz da prática de novos delitos, baseado na individualização de cada infrator, sendo que a missão da pena para os ocasionais, não seria a penalização, mas sim advertência, para os que necessitem de correção, seria a ressocialização com a educação durante a execução penal, e para os incorrigíveis seria a penalização por tempo indeterminado, ou seja, até que não reste dúvida da recuperação do infrator.
Verifica-se que ao final do cumprimento da pena, a ideia é a de advertência como cita o doutrinador acima, e em outros casos a de penalização, individualizando-se os que necessitam de cada tipo, sendo justa e cumprida com dignidade pelo preso.
Ainda nesse sentido e quanto ao sistema carcerário, Virdal Senna, aponta que:
O sistema carcerário brasileiro, na quase totalidade, é formado por unidades pertencentes à esfera estadual de governo, a imensa maioria com excesso populacional carcerário, não possibilitando aos administradores, por falta de espaço físico, a individualização da pena, muitas vezes não havendo condições para a separação entre s presos provisórios e os condenados, descumprindo uma norma da Lei de Execução Penal, que estabelece a custódia separada entre processados e sentenciados, e estes, pelos respectivos regimes.
Diante da superlotação dos presídios, é utópico se verificar a separação dos apenados, e mais ainda, a ordenação de acordo com o regime de cumprimento, acarretando na ineficácia da ressocialização.
4. CONCLUSÃO
O trabalho em questão teve por objetivo tratar sobre os aspectos da execução penal, em relação à dignidade do preso, a aplicabilidade da Lei de Execução Penal e seu papel ressocializatório. As funções do Estado e sociedade, as garantias que deveriam estar sendo visualizadas pelos agentes disciplinadores e norteadores do cumprimento da pena. Traz a maneira e os fundamentos legais de aplicação da dignidade da pessoa humana, pouco aplicada na realidade. A falta de efetivação das políticas descritas na Lei de Execução Penal, trazendo resultados positivos para a ressocialização do apenado, não acarretando em novas condutas ilícitas. Quanto a dignidade da pessoa humana, não é surpresa abordar que a realidade dentro dos presídios é humilhante, que acarreta em motins e rebelião, por solicitações de melhorias. Não deveria ser o preso, punido em caráter desumano, em condições nocivas a sua saúde e a seu bem estar, não devendo o Estado se esquecer de que está recebendo um ser humano, um cidadão que necessita de correção, para que pague pela sua conduta. Sabe-se que o assunto é de grande pesquisa e mesma não resta esgotada no presente artigo, servindo este de norte para a continuidade das pesquisas acerca do assunto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSIS, Rafael Damasceno de. As prisões e o direito penitenciário no Brasil. 2007.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
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CASELLA, Joao Carlos. O presidiário e a previdência social no Brasil. Revista de Legislação do Trabalho e Previdência Social, 1980.
D’URSO, Luiz Flávio Borges. Direito criminal na atualidade. São Paulo: Atlas, 1999.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: Nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete.39.ed.Petrópolis:Vozes, 2011.
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal: Parte Geral.4.ed.Rio de Janeiro: Lumen Juris.p.93, 2008.
RIBEIRO, Jair Aparecido. Liberdade e cumprimento de pena de presos no sistema carcerário Paranaense, 2009.
SENNA, Virdal. Sistema Penitenciário brasileiro, 2008.
Cursando Graduação em Direito Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MIGLIORANZA, Micheli. Aspectos do sistema prisional brasileiro e a dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2020, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54791/aspectos-do-sistema-prisional-brasileiro-e-a-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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