Resumo: Este artigo analisa o contexto de surgimento e as implicações do “Direito sistêmico”. Em um primeiro momento verifica-se o estabelecimento, a partir da Resolução nº 125 do CNJ e Código de Processo Civil de 2015, de uma política pública voltada à implementação de métodos alternativos ou adequados de solução de conflitos e o estímulo a uma postura processual consensual. Esse contexto corresponderia à terceira onda renovatória de acesso à justiça mencionada nos estudos por Bryan Garth e Mauro Cappelletti, como uma resposta às limitações inerentes ao sistema jurídico vigente. Nesse contexto começa a emergir o que foi denominado como “Direito Sistêmico”, expressão inicialmente e majoritariamente associada ao pensamento e métodos desenvolvidos pelo filósofo e terapeuta alemão Bert Hellinger, mas que, conforme analisamos, é uma expressão com sentido ainda equívoco, considerando que o pensamento sistêmico é mais abrangente que o pensamento hellingueriano. Assim, uma das contribuições do Direito Sistêmico pode ser o uso do método das constelações familiares, mas não ser vista ou reduzida a isso, já que o pensamento sistêmico representa uma mudança de paradigma e, como tal, possibilita uma abordagem do Direito e dos conflitos que o Direito tradicional, por se basear em outro paradigma, não é capaz a proporcionar. A perspectiva sistêmica aplicada ao direito tem ainda como contribuição permitir o aprofundamento participação do indivíduo na tomada de consciência do conflito em que está inserido.
Palavra-Chave: Direito Sistêmico; métodos alternativo de solução de conflitos; métodos adequados de solução de conflito; justiça multiportas; pensamento sistêmico; paradigma sistêmico.
Abstract: This essay analyses the emergence context and implications of the “Systemic Law”. At first it is verified that de CNJ’s 125º Resolution and the 2015 Civil Procedure code established a public policy to implement alternatives or adequate methods of conflict resolution and the incentive toward an consensual behavior at court. This context would correspond to the third renovatory wave of access to justice, mentioned at the studies developed by Bryan Garth and Mauro Capelletti, as an answer to justice system’s inherents limitations. In this context, begin to emerge what has been called as “Systemic Law”, expression at first e mostly associated to the thinking and methods developed by the german philosopher and therapist Bert Hellinger, but that, as we’ve seen, it’s an expression which meaning is still mistaken, considering that the systemic thinking is larger then the hellinger’s thinking. So, one of the Systemic Law’s contributions may be the use of family constellations, but it shall not be seen or reduce to that, since the systemic thinking represents a paradigm shift and, as such enable an approach to conflicts and Law itself that the traditional Law, because it is based in another paradigm cannot provide. The systemic perspective applied to law still presents, as a contribution, enabling a more deep participation from the person who is part of an conflict in the construction of it’s awareness.
Key-words: Systemic Law; alternative methods of conflict resolution; adequate methods of conflict resolution; multidoor courthouse; systemic thinking; systemic pradigm.
Sumário: Introdução. 1. Contexto Geral 1.1 Política pública de estímulo a métodos alternativos de solução de conflito; 2. Direito Sistêmico: terminologia, pensamento sistêmico e implicações; 2.1 Direito Sistêmico um termo equívoco; 2.2 Mudanças de paradigma e ampliação de foco: do indivíduo para os padrões e dinâmicas do sistema; 2.3 Direito Sistêmico para além do método alternativo de solução de conflito; Conclusão: Participação do indivíduo e valorização da autonomia as partes
Não é incomum que se ouça falar hoje em dia em “Direito Sistêmico”, o que vamos ver ao longo desse artigo são vários aspectos a seu respeito com a finalidade de organizar melhor o atendimento a seu respeito, passando pelo o contexto geral de sua emergência, considerações críticas a respeito do sentido que se têm atribuído a ele hodiernamente, o entendimento mais detido do pensamento sistêmico e da mudança de paradigmas paradigmas que ele importa. Sugerimos então as possíveis implicações que essa mudança de paradigma pode ter no âmbito do Direito, e enfim, como tudo isso pode dialogar com o anseio de se construir um direito mais consciencial e baseado na autonomia da vontade e tomada de consciência das pessoas envolvidas em um conflito.
1.Contexto geral
1.1 Política pública de estímulo a métodos alternativos de solução de conflito
O Código de Processo Civil consagrou uma “política pública de tratamento adequado dos conflitos jurídicos com o claro estímulo a soluções por autocomposição” (DIDIER, 2015, 273), que já havia sido estabelecida, segunda alguns pela RN 125/2010 do CNJ[1]. Em termos procedimentais o Código de Processo Civil previu diversos instrumentos nesse sentido[2], abriu-se a possibilidade de que o solução dos conflitos se dê em outros ambientes e por meio de outros métodos, sendo a solução tomada reconhecida e homologada pelo poder judiciário, instituindo-se, assim, o que veio a ser considerado sistema multiportas de solução de conflitos.
A idéia de uma corte multiportas (multidoor courthouse), qual seja, um Tribunal comprometido em apoiar e induzir a adoção de método mais adequados de resolução de disputas, tais como mediação, a conciliação, a negociação, a avaliação neutra, a arbitragem e outros, é atribuída ao prof Frank Sander, de Harvard, em palestra de 1976. Tal conceito e prática tiveram, inicialmente, maior difusão entre os países de common Law e vêm paulatinamente ganhando expressiva dimensão em outros sistemas de justiça. (VASCONCELOS, 2018, p. 71)
Para além da resposta a uma crise do sistema judiciário relativa às insuficiências inerentes ao modelo de solução heterocompositiva e estatal dos conflitos como única alternativa, o advento de referidos métodos de solução de conflitos, mediação e conciliação, “[...] passam a fazer parte de um sistema integrado de resolução de disputas em que o objetivo central não é (apenas) o julgamento do processo e evolui para a resolução do conflito e pacificação social.” (SIMÃO, 7)
As soluções negociais não são aquelas que se mostram apenas mais econômicas, elas se mostram mais eficazes, pois foram construídas pelas partes, ademais podem ser vistas como um
importante instrumento de desenvolvimento da cidadania, em que os interessados passam a ser protagonistas da construção da decisão jurídica que regula as suas relações. Neste sentido, o estímulo à autocomposição pode ser entendido como um reforço de participação popular no exercício do poder - no caso o poder de solução de litígios. Tem também um forte caráter democrático” (DIDIER, 2015, p. 273)
“[...] a administração cooperativa do conflito, inclusive no ambiente judicial, passa a ser questão central, num processo em que o juiz e demais operadores da justiça contribuem para que as parte e dos advogados dialoguem, no campo das suas contradições, tanto como o apoio de mediadores , com vistas ao atendimento de suas reais necessidades a serem contempladas pela decisão, que deve ser, sempre que possível, consensuada” (VASCONCELOS, 2018, 71)
O que se vê, em verdade, é uma mudança de paradigma, para além dos custos financeiros e temporais de um processo judicial, pois a submissão do conflito um determinado método na delimitação de um tipo de olhar sobre ele. O que a política instituída pelo CPC de 2015 e o modelo de solução multiportas traz é a abertura de um leque de possibilidades metodológicas e de abordagens dos conflitos, que não apenas aquelas utilizadas no modelo judicial.
É importante ressaltar que referida política pública foi instituída para o jurisdicionado e não como uma forma leviana de desafogar o Sistema Judiciário. (DIDIER, 2015, p. 280 e SIMÃO, p. 16) Assim, esses métodos são desejáveis quando se mostrem, por uma questão metodológica, mais condizentes com a solução do litígio pois são mais construtivos, contudo, nem sempre isso será assim, o que deve ser entendido e respeitado.
Além disso, o novo CPC estabelece princípios e valores que põem em xeque o modelo beligerante e agressivo, talvez concebido outrora, como a forma ideal do exercício de defesa de direitos. Os deveres de boa-fé processual (art. 5º do CPC), lealdade e cooperação[3] demonstram que o que se pretende, mesmo dentro do modelo judicial, não é que o processo se torne mais um lócus de perpetuação do conflito que é a ele submetido, a “briga” entre as partes não será reproduzia, necessariamente, na atuação processual, que, ao contrário, deve buscar um conduta cooperativa, uma comunidade de trabalho, para que a prestação jurisdicional possa ser efetiva e célere.
Disso tudo, o que se pode perceber é uma busca por outras formas de se lidar com os conflitos, outros métodos, como já dito, outros caminhos para se chegar a um mesmo lugar de pacificação social.
1.2. A terceira Onda renovatória e emergência de uma nova perspectiva
É possível estabelecer uma correlação desses movimentos com a terceira onda de acesso à justiça prevista no renomado e reconhecido estudo de acesso à Justiça desenvolvido por Bryan Garth e Mauro Capelleti, conhecidos como Projeto Florença. Por meio desse estudo foram identificadas três espécies de barreiras ao acesso à justiça e as respectivas respostas e soluções a essas barreira, que foram por eles denominadas como ondas renovatórias:
Diante dessas constatações, foram sistematizadas três ondas renovatórias de acesso à Justiça, isto é, três posicionamentos, relativos ao Ocidente, que emergiram em sequência cronológica. A primeira onda renovatória envolve a assistência jurídica, a segunda envolve a representação jurídica para os interesses difusos, especialmente nas áreas de proteção ambiental e de direito do consumidor, e a terceira, denominada “enfoque de acesso à justiça”, reflete a tentativa de atacar as barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo. (SILVA e MENDES, 2015, p. 5)
Esses estudos são úteis e trazem uma interessante perspectiva e importante contribuição para se analisar o que viemos analisando até então no presente artigo, como pode-se verificar a partir das características da terceira onda renovatória:
Por fim, a terceira onda renovatória se baseou na obtenção de reformas na assistência judiciária, com a disponibilização de advogados para os que não poderiam custear esse serviço, e com os progressos na reivindicação de direitos, tanto dos tradicionais como dos novos, com mecanismos para a tutela de direitos coletivos, especialmente dos consumidores, preservacionistas e sociais. A última onda de reformas incluiu o conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e prevenir disputas. Esse enfoque encorajou uma ampla variedade de reformas, incluindo alterações no procedimento, mudanças na estrutura dos tribunais, o uso de pessoas leigas ou paraprofissionais, modificações no direito substantivo a fim de prevenir litígios e a utilização de mecanismos extrajudiciais de solução de litígios. Reconheceu, ainda, a necessidade de adequar o processo civil ao tipo de litígio. (SILVA e MENDES, 2015, p. 6) (destacamos)
É possível entender que todos estes elementos: a política pública, o movimento espontâneo da sociedade que confere protagonismo aos métodos alternativos de solução de conflitos, a imposição de uma forma colaborativa de condução processual, enfim, a busca de solução consensual dos conflitos, são todos manifestações desta terceira onda renovatória de acesso à justiça previstas por Bryant Garth e Mauro Capelleti na década de 1970. (SILVA e MENDES, 2015, p. 24/25).
Analisando as propostas de Cappelletti e Garth, Vasconcelos destaca que um dos aspectos desse movimento de acesso à justiça consistiria na “assunção, pela sociedade, do papel de protagonista na solução amigável ou arbitral de questões (..) (2018, p. 72)
Essa busca por propiciar maior acesso à justiça levou à procura por outras formas de lidar com o litígio, outros procedimentos, princípios e métodos. Contudo, o anseio por alternativas, ou a perplexidade diante das limitações inerentes ao nosso sistema, pode ter nos levado a encontrar, além de outros procedimentos e métodos, também à outras formas de conhecer e conceber o conflito e a violação de direitos.
Essas novas formas de abordagem recaem sobre os fatos da vida que se manifestam como conflitos violadores de normas jurídicas, contudo, elas não conferem a eles essa roupagem que o pensamento jurídico as atribui, ou não os concebe unicamente por meio desta lente. Emergem de forma espontânea, em meio a profissionais da área jurídica, trata-se do pensamento sistêmico, ou o que se tem chamada de direito sistêmico. [4]
De acordo OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, “(...) o então denominado Direito sistêmico nos propõe a busca de uma solução, não mais apenas focada apenas na ótica competitiva, mas sim cooperativa e pacífica, o que vem perfeitamente ao encontro da necessidade de pacificação social e se distancia salutarmente da visão positiva, até então perpetrada pelos construtores do Direito.” (2018, p. 44)
2.Direito Sistêmico: terminologia, pensamento sistêmico e implicações
2.1 Direito Sistêmico um termo equívoco
A expressão “Direito sistêmico” foi cunhada inicialmente pelo Magistrado Sami Storch, na perspectiva então proposta por ele, “Direito sistêmico” estaria relacionado com analisar o direito a partir da perspectiva proposta pelo filósofo alemão Bert Hellinger que, ao desenvolver um método terapêutico, denominado constelações familiares, constatou a existência de padrões de repetição que se imporiam sobre os indivíduos como leis. (STORCH, 2019, p 177/178).
Assim, a expressão tem sido associada, tanto à uma forma ou perspectiva de análise das questões submetidas ao judiciário que vai além da perspectiva de que se vale Direito tradicionalmente, seja por incluir a perspectiva Heringeriana teórica, seja propor uso das constelações familiares como mais método alternativo de solução de conflitos, ao lado da mediação e da conciliação[5] . Veja-se, por exemplo, o que dizem OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI:
O Direito Sistêmico, entendido no contexto deste livro como aplicação das leis ou ordem do amor de Bert Hellinger ao campo do Direito, se constitui um novo paradigma para a ciência jurídica, trazendo uma nova forma de perceber os vínculos entre os indivíduos e grupos tutelados pelo Direito” As constelações familiares, porém, para além do uso do método em si, trouxeram, na verdade uma abertura para que o conflito fosse percebido sob uma perspectiva sistêmica. (2018, p. 43)
No entanto a visão sistêmica e visão sistêmica do Direito ou Direito sistêmico, não se limita à visão Hellingeriana:
Outra questão que merece destaque é a redução da perspectiva sistêmica à Hellingeriana, deixando de lado qualquer referência a Luhmann que Habermas, os quais analisam o Direito sob o prisma sistêmico, o que não se confunde com a visão sistêmica hellinguerina. Esse movimento, além de reducionista, exclui autores e perspectivas de análise do direito (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 46)
Sendo assim, no presente artigo consideramos que, no campo do saber, a expressão “Direito Sistêmico” é em certa medida, ainda equívoca[6]. Isso porque “o pensamento sistêmico”, na perspectiva epistemológica da ciência, não mantém correspondência exclusiva com as ideias desenvolvidas por Bert Hellinger.
Os autores Capra e Mattei, por exemplo, consideram que o Direito Sistêmico é decorrência de outro paradigma ciência. Tal paradigma abandona a concepção de mundo mecanicista para adotar a metáfora da rede em que prevalece a importância dos padrões e relações, isso seria, justamente, o pensamento sistêmico. Essa mudança de paradigma que ocorreu nos campos da ciência ainda não teria alcançado a teoria do direito. Eles sustentam que a mudança de paradigma deve orientar à uma “ecologia do direito” e como algo que emerja de comunidades auto-organizadas” (2018, p. 29)
O pensamento sistêmico, nessa perspectiva seria um novo paradigma científico, (VASCONCELLOS, 2018, p. 47) tendo em vista que “a ciência está de fato vendo muitos de seus conceitos, mas não chega a essa conclusão pelo abandono do procedimento científico, e sim pela descoberta das limitações intrínsecas aos conceitos e métodos que até então utilizava.” (VASCONCELLOS, 2018, p. 23). Assim a mudança de paradigma se daria da simplicidade para a complexidade, que, por sua vez, leva à contextualização e ao reconhecimento de causalidade recursiva. Também se daria da estabilidade para a instabilidade já “o mundo está em processo de tornar-se”; e pela mudança do pressuposto da objetividade para a intersubjetividade, (VASCONCELLOS, 2018, p. 102/103)
De acordo com Carlos Eduardo de Vasconcelos, essa nova perspectiva influencia a forma em que se dá a dialética, que não mais correria a partir da disjunção “ou-ou” o que, portanto, influencia o raciocínio jurídico de interpretação normativa, assim também como atua na perspectiva sobre o conflito, sem “maniqueísmos ontológicos”. No novo paradigma acolhe-se a dialética da contradição/antagonismos existenciais que se retroalimentam. A síntese não existe em si, pois corresponde a um contínuo processo de mudança, isso permite-se conceber que nos conflitos, “as contradições e os antagonismos expressam complementaridades dinâmica, que são compreendidas e facilitadas mediante processos construtivos, que acolhem o modo de problematizar, pensar e concretizar o entendimento de necessidades comuns e contraditórias do tipo “e-e” (...)”. (2018, p. 24/25)
Todos esses sentidos do pensamento sistêmico e sua possível reverberação no âmbito do Direito não guardam correspondência com a concepção de Direito Sistêmico proposta pela primeira vez o magistrado Sami Storch e como vem sendo feito hoje em dia. Com isso, não se quer dizer que o pensamento de Bert Hellinger, sua aplicação ao Direito, deixe de ser uma perspectiva sistêmica, mas apenas que é preciso que se saiba da existência dessas outras perspectivas sistêmicas, sob pena de se incorrer em um equivocado reducionismo.
O pensamento hellingueriano tem como uma de suas bases principais a teoria sistêmica familiar (VIERA, 2018, p. 73) que percebe a família com um sistema relacional que se move através do tempo, havendo a transmissão de padrão de relacionamento e funcionamento entre as gerações (VIEIRA, 2018, p. 72) (OLDONI e LIPPMANN, 2018 p 42).
Assim, a perspectiva mostra que pensamento/metodologia sistêmica se constrói sob pressupostos da interdependência, do que é relacional, se afastando de raciocínios disjuntivos que constroem maniqueísmos ontológicos. Bert percebe os sistemas familiares como sistemas fechados em que “cada indivíduo é visto, não de maneira individual, mas sim como parte de um sistema compreendido com sendo o grupo de pessoas ligadas entre si por um destino comum e relação recíprocas, onde cada membro do sistema impacta e exerce influência sobre os demais membros,” (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 30)
Dentre as múltiplas acepções que a expressão “Direito Sistêmico” essa última talvez tenha ganhado destaque e possua relevância no contexto atual já que está relacionada à criação de diversos projetos que visam a implementação da constelação familiar no judiciário (VIEIRA, 2018, p. 231-238 e OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 60-65) e ainda à existência de diversas comissões nas seccionais da OAB.
2.2 Mudanças de paradigma e ampliação de foco: do indivíduo para os padrões e dinâmicas do sistema
Na perspectiva sistêmica, coletividades organizadas de pessoas atuam de acordo com uma lógica sistêmica, que não é o mesmo que a soma de individualidades. Um sistema pode ser visto como “um conjunto de elementos inter-relacionados com um objetivo comum” (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 29).
De acordo com Maria José Esteves de Vasconcellos, uma das definições de sistema poderia ser o “complexo de elementos em interação” ou “conjunto de componentes em estado de interação”, esclarecendo que “a existência de interação ou de relações entre os componentes é então um aspecto central que identifica a existência do sistema como entidade, distinguindo-o de um simples aglomerado de partes independentes uma das outra” (2018, p.199).
Na mesma linha, Cappra e Mattei colocam que “os sistemas vivos são totalidades integradas cujas propriedade não podem ser reduzidas àquelas das partes menores. Suas propriedades essenciais provêm da interação e relações entre as partes” (2018, p. 144). Assim, um sistema, ainda que se tratando de uma coletividade humana[7], possui uma lógica própria, estrutura e padrões[8], que não se confunde com o conteúdo da subjetividade das partes que o compõem.
Quando inserido em um sistema, essa lógica ou força atua sobre os indivíduos, já que ele é parte de um todo. “Na visão sistêmica de Hellinger, o indivíduo não deve serv isto de forma isolada, mas como alguém que está a serviço e é orientado pelas forças de seu próprio sistema, todavia essas forças não são visíveis a olho nu [...] (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 30/31)
A perspectiva sistêmica agrega, assim, uma nova perspectiva sobre o conflito ou sobre as relações humanas que importam na violação de algum direito protegido pelo ordenamento jurídico. Essa visão sistêmica vai buscar, portanto, identificar o que, naquele conflito, é decorrente da atuação dessa lógica coletiva, qual a dinâmica sistêmica está atuando naquela situação.
“(...) o direito sistêmico vê as partes em conflito como membros de um mesmo sistema, ao mesmo tempo em que vê cada uma delas vinculada a outros sistemas dos quais simultaneamente façam parte (família, categoria profissional, etnia, religião, etc) e busca encontrar a solução que, considerando todo esse contexto, traga maior equilíbrio e paz para todo o sistema” (STORCH, 2016, p 179)
Tem-se portanto, que a perspectiva sistêmica parte de pressupostos diversos da perspectiva da lógica linear que compõem o paradigma mecanicista que rege nossa forma de pensar odierna.
Ao tratar do conceito de paradigma Maria José Esteves de Vasconcellos destaca que “o tempo todo estamos vendo o mundo por meio de nossos paradigmas. Eles funcionam como filtros que selecionam o que percebemos e reconhecemos e que nos levam a recusar e distorcer os dados que não combinam com as expectativas por eles criadas” (2018, p. 30).
O paradigma tradicional da ciência, baseado nas ideias desenvolvidas na modernidade por pensadores como Francis Bacon, Descartes, Isaac Newton, Comte (VASCONCELLOS,2018, 60/66; CAPPRA e MATTEI, 28 e 73/79), levou a uma determinada estrutura de pressupostos sintetizada por Vasconcellos como da:
● Simplicidade, que compreende as relações causais de forma linear.
● Estabilidade, entendido pela determinação, previsibilidade, reversibilidade e controlabilidade.
● Objetividade (2019, p. 69).
A linearidade causal, a previsibilidade e a crença na diferenciação entre observador e objeto regem nossa forma de ver o mundo. Por outro lado, a concepção sistêmica se baseia em outros pressupostos, conforme visto, como sendo complexidade, instabilidade e intersubjetividade (VASCONCELLOS, 2018, p. 145).
Considerando que o paradigma funciona como uma lente que usamos para concebermos a realidade, visão que se terá de um mesmo conflito submetido ao Direito, necessariamente será diferente a depender do paradigma que se adota. Segundo Cappra e Mattei o paradigma mecanicista e cartesiano influenciou a racionalidade do homem moderno chegando ao Direito[9], sendo assim, o Direito invariavelmente deitará seus olhos sobre os conflito a ele submetidos sob essa perspectiva.
Um dos pontos centrais da construção da teoria do Direito, e que decorre da concepção do mundo máquina, é a noção de indivíduo. Assim como a ciência entendia que “a realidade física é um agregado de elementos constitutivos individuais”, para o Direito “a realidade social é um agregado de indivíduos isolados” (CAPPRA e MATTEI, 2018, p. 42)
Para filósofos iluministas modernos “a sociedade é apenas uma união de indivíduos. Essa posição individualista tem por pressuposto a ficção de que, em princípio, havia seres humanos que viviam isolados, e que, em um momento posterior passam vivem em sociedade. Essa teoria para os filósofos modernos é a teoria do contrato social. (MASCARO, 2010, p. 149)
A visão sistêmica, por outro lado, compreende um indivíduo como parte de um sistema, que existe uma dimensão coletiva, uma consciência sistêmica, atuante em concomitância com a consciência individual[10]. Não que se exclua o livre arbítrio e a consciência individual ou que se pretende subordinar a consciência individual a uma consciência coletiva[11].
Ao tratar da autonomia e liberdade individual , por exemplo, Hellinger sugere que “têm validade em um determinado âmbito”, na medida em só é possível tê-las quando em algum outro lugar não sou autônomo [...]”. Ele pondera que oisso porque estamos envolvidos “nesses grandes movimentos, na fila dos ancestrais, na família, e esse envolvimento não depende de minha livre vontade.” Dessa forma, considera a interdependência e o aspecto relacional subjacente à autonomia individual, e prossegue: “Simplesmente estou dentro disso e também coloca algo em movimento. Em que medida posso atribuir isso a mim, parece-me irrelevante” (HELLINGER e HOVEL, 2006 , p. 53)
Assim, o que se torna possível, a partir da concepção sistêmica, é que essa dimensão supra individual, que se expressa por meio dos indivíduos nos conflitos, possa ser entendida como tal e não como mera expressão de uma individualidade cuja origem causal se encerra no indivíduo. O indivíduo seria o meio de reprodução e expressão de algo cuja causa ou origem ultrapassa sua subjetividade e aquela situação específica em que se manifesta.
A consideração das influências sistêmicas foge à apreciação do conflito feita pelo judiciário porque a teoria do direito moderno, ao se basear no conceito de indivíduo isolado cuja expressão no mundo não é outra se não a de sua individualidade, não concebe a atuação de uma dinâmica sistêmica subjacente.
Ademais, a perspectiva jurídica faz, a partir da subsunção do fato à norma, um recorte do fenômeno e da realidade para as normas, o que em si já implica em uma redução da sua complexidade o que faz com que o Direito tenha, per se, um distanciamento com relação à realidade ao qual se aplica. A visão que decorre do uso lentes do direito pode gerar distorções e inconsistências com relação aos fatos subjacentes.
2.3 Direito Sistêmico para além do método alternativo de solução de conflito
Vimos no início que o Direito Sistêmico se insere em contexto, em um movimento hoje consubstanciado em um política pública, em que se buscam “alternativas” ao uso do método jurisdicional de solução de conflitos. Por outro lado, vimos que o Direito Sistêmico possibilita uma mudança de paradigma, por permitir ultrapassar o indivíduo como e considerar a influência dos padrões que conforma aquela rede, as dinâmicas ocultas ou as forças do sistema.
Sendo assim, o que se verifica é que sua contribuição não se resume a ofertar as constelações familiares como mais um método de solução de conflitos, ao lado da mediação ou conciliação. O direito sistêmico pode ser considerado como o pensamento sistêmico aplicado à conflitos judicializados ou não, permitindo que se considere no processo elementos a ele relativos que não seriam “visíveis” com o uso dos velhos paradigmas mecanicistas.
Nesse contexto, as constelações seriam válidas, por serem um método ou técnica (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 23, e OLDONI, LIPPMANN, 2018, P. 17) que trazem à tona, necessariamente, a dimensão sistêmica dos conflitos, cujos demais métodos alternativos de apreciação de conflitos não necessariamente alcançam.
Isso porque, tratando-se de um método ou técnica que possibilita desvelar as dinâmicas sistêmicas ocultas que atuam sobre o conflito (HELLINGER, WEBER e BEAUMONT, 2006, p. 15/16) (SCHENEIDER, 2007, p. 10) , indo além do que se expressa no conflito judicializado, que é “a ponta do iceberg” de algo mais complexo, permite uma real tomada de consciência pelas partes envolvidas de todos os elementos envolvidos no conflito. (VIEIRA, 2017, p. 243). A constelação permite “identificar a causa real de cada problema que se apresenta, não lidando apenas com a causa aparente, superficial, mas com o que está oculto não aparente” (OLDONI e LIPPMAM, 2018, p.13).
Por outro lado, assim como o Direto Sistêmico não se reduz a perspectiva Hellingueria, muito menos ao uso do método das constelações no judiciário. Para Oldoni, Girardi e Lippman “a aplicação do Direito Sistêmico pode ocorrer de três formas distintas: mediante uma postura sistêmica fenomenológica; realizando intervenções com frases de solução, exercícios e dinâmicas sistêmicas e através da aplicação das constelações familiares.”(2018, p. 49)
Dessa adoção de um postura sistêmica não está vinculado nem à perspetiva hellingueriana nem à uso do método por ele desenvolvido. Já começam a se desenvolver propostas metodológicas, baseadas no pensamento sistêmico em sentido amplo e na neuro-semântica que prescindem do uso da constelação enquanto método para identificar os aspectos sistêmicos do conflito. Trata-se de uma modelo de percepção sistêmica que busca analisar o conflito a partir da identificação de seus contextos, das posições de cada elemento, da relação entre eles, dos processos e dos padrões existentes. [12]
Assim, ainda que a questão esteja judicializada e não se utilize uma constelação a seu respeito, é possível que os envolvidos naquele conflito, (as partes, o juiz, os advogados, os defensores públicos, ou o Ministério Público), adotem uma postura sistêmica diante da questão.
3.Conclusão: Participação do indivíduo e valorização da autonomia as partes
Conforme apresentado acima, a o método proposto ela concepção sistêmica terá relação com a “descoberta” de alguma dinâmica oculta, na nomenclatura hellingeriana, ou de algum elemento de ordem sistêmica que se manifesta naquela situação e que contribui para a existência daquele conflito. Porém, essa descoberta pressupõe, necessariamente, a participação do indivíduo inserido no sistema. Esta é a principal força do método sistêmico, já que descoberta da existência de uma “dinâmica oculta” existente no conflito se dá simultaneamente com a tomada de consciência pelo próprio indivíduo desse elemento sistêmico influenciador esse conflito.
Ademais, o Direito Sistêmico tem ainda essa particularidade, seja na vertente que o associa com o uso das constelações familiares, seja a concepção que não estabelece necessariamente essa associação, já que em ambas o conflito é devolvido à parte nele envolvida[13]. Ou seja, a concepção sistêmica não pode operar em uma solução de conflito de forma imposta por um terceiro às partes. A solução “alternativa” vem da tomada de consciência da parte envolvida sobre as dinâmicas que operaram naquele conflito, fazendo com que, a partir de uma nova perspectiva e visão sobre o conflito, a parte possa, espontaneamente, optar por modificar sua conduta naquela dinâmica.
Outro aspecto importante é que a perspectiva sistêmica permite compreender que a mudança de posicionamento, ainda que seja apenas de uma das partes, importa numa alteração da dinâmica de funcionamento de todo sistema.
Sendo assim, o direito sistêmico torna mais concreto, viável e efetivo, o exercício da autonomia da vontade. Deve ficar claro que, apesar de conceber a dimensão sistêmica dos comportamentos humanos como manifestações decorrentes não apenas de uma consciência individual, na perspectiva sistêmica o não há uma negação dessa dimensão do indivíduo, ao contrário, é a partir dela e do exercício da autonomia da vontade que é possível a tomada de consciência que levará à solução.
Dessa forma, o direito sistêmico também se insere no contexto de valorização da autonomia das partes, de redução de soluções heterônomas. Ganha relevo, assim, a existência da noção de facilitação na solução dos conflitos por meio da autocomposição que, muito embora não exclua necessariamente a atuação de um terceiro para tanto (heterocomposição), não tem nele a única figura responsável sobre isso.
O movimento consagrado pelo CPC de 2015 que abre as portas para diversas possibilidades de abordagem dos conflitos e a terceira onda renovatória de acesso à justiça não foram a origem ou razão para o surgimento do direito sistêmico. Contudo, são um indicador que demonstra a busca de alternativas ao meio jurisdicional diante de suas limitações inerentes, o direito sistêmico se insere nessa busca e contribui, não apenas com um método, mas com uma nova perspectiva sobre os conflitos, sendo eles levados pela porta do judiciário ou não, sendo que essa perspectiva pressupõe o envolvimento da parte e sua participação, a partir de um outro lugar, de uma questão que não diz respeito ao estado juiz, mas à sua própria vida.
BIBLIOGRAFIA
CAPRA, Frijotof. MATTEI, Ugo. A revolução ecojurídica: a direito sistêmico em sitonia com a natureza e a comunidade. Tradução de Jefer Luiz Camargo, São Paulo. Ed. Cultrix, 2018,
DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento, 17 ed. - Salvador, Editora, Juspodivm, 2015.
GIRARDI, Maria Fernanda Gulmenin, OLDONI, Fabiano, LIPPMANN, Márcia Sarubbi. Direito Sistêmico: aplicação das leis sistêmicas de Bert Hellinger ao Direito de Família e ao Direito Penal. 2. ed. Joinville, SC: Manuscritos Editora, 2018
HELLINGER, Bert WEBER, Gunthard e BEAUMONT, Webe. . A Simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo,.Tradução Gilson Cardoso de Sousa6. ed. São Paulo, Cultrix, 2006.
HELLINGER, Bert e HOLVE, Gabrielle Tem. Um lugar para os excluídos: conversas sobre o caminho de uma vida. Tradução de Newton A. Queiroz. Patos de Minas. Atman. 2006
MODELO GESTÃO DA ADVOCACIA SISTÊMICA ®, Curso Intermediário, Material Didático, 2019.
MENDES, Aluisio Gonçalves De Castro e SILVA, Larissa Clare Pochmann da Silva. Acesso à justiça: uma releitura da obra de mauro cappelletti e bryant garth, a partir do brasil, após 40 anoS, vol. 08, nº. 03, Rio de Janeiro, 2015. pp. 1827-1858
OLDONI, Everaldo Luiz, OLDONI, Fabiano, LIPPMANN, Márcia Sarubbi. Justiça Restaurativa Sistêmica. Joinville, SC: Manuscritos Editora, 2018
OLDONI, Fabiano, LIPPMANN, Márcia Sarubbi. Constelação Sistêmica na Execução Penal: Metodologia para sua implementação. Joinville, SC: Manuscritos Editora, 2018
SIMÃO, Lucas Pinto. Os meios alternativos de resolução de conflitos e o dever/poder de o juiz incentivar a conciliação e a mediação. Revista: Direito Processual Civil
Disponível em 02/04/2020 https://www.pucsp.br/tutelacoletiva/download/meios-alternativos.pdf
SCHNEIDER, Jacob Robert . Sobre a Teori, o Conteúdo e o Método das Constelações Familiares. Disponível em 02/04/2020 https://sistemicaconsultoria.com/biblioteca/jakob-schneider/#)
VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. 6 ed. Rio de Janeiro, ed. Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.
VASCONCELLOS, Maria José Esteves. Pensamento Sistêmico o novo paradigma da ciência. 11ª Edição, Campina, Ed. Papirus, 2018.
VIEIRA, Adhara Campos. A Constelação Sistêmica no Judiciário. Belo Horizonte. Editora Plácido. 2017.
[1] “Ao nosso ver, a partir da Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, o Brasil deu passo determinante para inserir o Direito Brasileiro no contexto da política dos Meios Alternativos de Resolução de Conflitos (Alternative Dispute Resolution – ADR, na doutrina estrangeira e de acordo com a construção clássica de Marc Galanter23). Tratam-se de métodos essenciais para a pacificação social, sendo poderosos instrumentos de composição de conflitos. Os Meios Alternativos de Resolução de Conflitos apresentam-se fundamentalmente como métodos paraestatais de solução de conflitos, através dos quais, como facilmente se intui, retira-se do Juiz a solução do conflito de interesses. “(SIMÃO, p. 6)
Em 2010, a Resolução nº 125 do CNJ se dedicou estritamente à solução de conflitos, instituindo a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses. Tal disposição objetivou assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade, trazendo a previsão de Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (artigo 7º), compostos por magistrados da ativa ou aposentados e servidores para atuarem, dentre outras funções listadas no dispositivo, na implementação da política de solução de conflitos. Além disso, previu a criação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (artigos 8º a 11 da resolução), para atender aos Juízos, Juizados ou Varas com competência nas áreas cível, fazendária, previdenciária, de família ou dos Juizados Especiais Cíveis e Fazendários. A resolução dispôs, ainda, a criação de um portal da conciliação, para disponibilizar dados estatísticos e capacitação aos mediadores e conciliadores.
Já em 2014, merece destaque a Recomendação nº 50 do CNJ, destinada aos Tribunais de Justiça, aos Tribunais Regionais do Trabalho e aos Tribunais Regionais Federais, para que realizem estudos e ações contínuas para darem continuidade ao movimento permanente de conciliação. (SILVA e MENDES, 2015, p. 24/25)
[2] “O poder legislativo tem reiteradamente incentivado a autocomposição, com a edição de diversas lei neste sentido. O CPC ratifica e reforça essa tendência: (a) dedica um capítulo inteiro para regular a mediação e a conciliação (arts. 165-175); (b) estrutura o procedimento de modo a pôr a tentativa de autocomposição como ato anterior ao oferecimento da despesa pelo réu (arts. 334 e 695); (c) permite a homologação judicial de acordo judicial de qualquer natureza (art. 515, III; art. 725, VIII); d) permite que, no acordo judicial, seja incluída matéria estranha ao objeto litigioso do processo (art. 515, § 2º); (e) permite acordos processuais (sobre o processo,, não sobre o litígio) atípicos (art. 190) (DIDIER, 2015, 273)
[3] “Repita-se: o princípio da cooperação torna devidos os comportamentos necessários para a obtenção de um processo leal e cooperativo. O mais difcil é, realmente, sistematizar, os deveres processuais que decorrem do princípio da cooperação. Para tanto, covém valer-se de tudo o que já construiu a respeito dos deveres decorrentes do princípio da boa-fé no âmbito do direito privado. O dever de cooperação é um deles. Os deveres de cooperação podem ser divididos em deveres de esclarecimento, lealdade e proteção. Essa sistematização pode ser aproveitada para a compreensão do conteúdo dogmático do princípio da cooperação processual. Vejamos algumas manifestações desses deveres em relação às partes: a) dever de esclarecimento: os demandantes devem redigir sua demanda com clareza e coerencia, sob pena de inépcia; b) dever de lealdade, as partes não podem litigar de má-fé (arts 79-81, do CPC), além de ter de observar os princípios da boa-fé processual (art. 5º do CPC); c) dever de proteção: a parte não pode causar danos à parte adversária (punição ao atentado, art. 77, VI, CPC; há a responsabilidade objetiva do exequente nos casos de execução injusta, arts. 520, I e 776, CPC) (DIDIER, 2015, p. 128)
[4]Adhara Campos em seu livro “A constelação Sistêmica no Judiciário” também estabelece uma correlação entre o que denomina ser uma “crise no sistema” de justiça e a possibilidade introdução do pensamento sistêmico, por meio do uso das constelações familiares enquanto método alternativo se solução de conflitos, como possibilidade de resposta a essa crise. (p. 23/45) Segundo a autora o movimento das constelações no judiciário “nascem da participação popular, de algo nascido na entranha social, oriundo de um mal estar hermenêutico crítico, ante a incapacidade do Estado de dirimir o conflito pelos autos” (p. 241)
[5] “(...) destacamos neste trabalho, entre os meios alternativos de resolução de conflitos, a conciliação e mediação. Ambas as práticas são amplamente incentivadas. [...] A constelação surge então com uma alternativa a mais para reordenar os sistemas familiares e institucionais. [...] (VIEIRA, 2017, P. 242)
[6] “Na medida em que os estudo sobre a possibilidade do surgimento de um Novo Direito (Direito Sistêmico), começaram a trilhar o caminho da Ciência Jurídica, vislumbrou-se alguns equívocos referente à nomenclatura e mais ainda, no tocante à natureza jurídica (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2018, p. 44)
[7] Para expandir a compreensão sistêmica da vida até a esfera social e, em particular, até as leis humanas, podemos postular um modelo teórico segundo o qual a vida tem uma unidade fundamental e os diferentes sistemas vivos exibem padrões semelhantes de organização. (...). O padrão em rede, em particular, e dos padrões básicos de organização em todos os sistemas vivos. As redes sociais são redes de comunicação. (..) Casa comunicação cria pensamentos e significados, o que dá origem à novas comunicações, de tal modo que a rede gera-se a si própria.”(CAPRA e MATTEI, p. 148/49)
[8] A teoria dos sistemas é desenvolvida por Fritjof Capra, se relaciona a organização de estruturas, com conexão entre os elementos de um sistema, padrões de organização, mecanismos, teias de relações, interconexão. Jan Jacob Stam ressalta o aspecto das dinâmicas relacionais de um sistema. Tarso Firace sugere um “ver” pelo sistema, que seria diverso de ver com os olhos. A existência de um padrão de rede psicossocial. Luhmann, por sua vez, entende que a sociedade é um marco sistema fechado e autopoiético auto referencial e que se modifica com base em suas próprias bases. (VIEIRA, 2017, p. 82/840)
[9] Os autores fazem essa análise da construção do pensamento jurídico da modernidade ao longo dos capítulos 3 e 4 de seu livro, mas sintetizam em um quadro comparativo (2018, p. 42), sendo que destacamos o seguinte trecho: “Hoje, a percepção coletiva de direito como uma estrutura ‘objetiva’ ou preexistente por meio da qual o comportamento dos átomos individuais podem ser classificados como legal ou ilegal, longe de ser “natural” nada mais é do que um constructo cultural da modernidade. Por conseguinte, o direito moderno incorpora a separação cartesiana de uma ordem jurídica objetificada - análoga à res extensa de Descartes (objeto de pensamento) - que é essencialmente distinta da esfera cotidiana da atuação humana, situada na esfera do res cogitans (o sujeito pensante) (2018, p. 115)
[10] Uma contribuição relevante da perspectiva hellingeriana diz respeito ao que ela entende por “Alma” de acordo com SCHNEIDER, “Podemos chamar de alma a força invisível que congrega num todo as experiências parciais, de forma que o todo é mais do que a soma das partes de suas funçõe. Ela não se identifica com nossa consciência, pois também, inclui o inconsciente. Não se identifica com os nossos processos fisiológicos e físicos em nosso corpo e nem nosso cérebro, por mais que esteja indissoluvelmente ligada a eles. Não se identifica com os nossos sentimentos, embora ele seja a sua forma de expressão sensível. Ela não é o “núcleo” ou a “substância” de um todo; é antes, um espaço que envolve uma totalidade vida e um “campo” que, abrangendo espaço e tempo, une e confere identidade de a tudo o que constitui uma pessoa ou um grupo” (SCHNEIDER, 2007, p. 26)
[11] Hellinger, por exemplo concebe a existência de três níveis de consciência, um individual, um de grupo e um universal (SCHNEIDER, 207, p. 28)
[12] Modelo de percepção sistêmica in “Bases da Negociação Sistêmica uma ferramenta para Gestão de Conflitos”. Material didático - Curso Intermediário Ferramentas de Gestão da Advocacia Sistêmica. Gestão da Advocacia Sistêmica ®
[13] “A solução não parte de um terceiro e sim do próprio indivíduo que é levado a sair da posição de vítima ou algoz, na qual se encontra, e responsabilizar-se pela transformação do conflito em que está envolvido” (OLDONI e LIPPMAM, 2018, p.14)
“Atendimento humanizado é aquele que no encontro com o humano equilibra competências relacionais do advogado (como valorização do cliente como alguém único, dedicando a ele apoio, escuta, empatia, atenção, confiança, parceria, facilitação de ampliação de consciência diante do conflito) [..] O cliente precisa se sentir valorizado e inserido nos processos de escolha e tomada de decisão, assumindo corresponsabilidade pela gestão dos seus conflito. In Relacionamento com o Cliente.” (destacamos) Atendimento Humanizado”Material didático - Curso Intermediário Ferramentas de Gestão da Advocacia Sistêmica. Gestão da Advocacia Sistêmica ®
Advogada, graduada em Direito pela USP, cursando Pós-graduação em advocacia empresarial pela PUC-MG, Formação Jurídica Sistêmica - Constelação. Escola da Magistratura do Distrito Federal, 2018. Membro da comissão de direito sistêmico da OAB/DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, thais diniz coelho de. Método alternativo de solução de conflitos e mudança paradigmática: a que veio o direito sistêmico? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2020, 04:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54792/mtodo-alternativo-de-soluo-de-conflitos-e-mudana-paradigmtica-a-que-veio-o-direito-sistmico. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
Precisa estar logado para fazer comentários.