RESUMO: Este é um trabalho pautado na sociedade atual e no sistema jurídico brasileiro. Aqui há a apresentação da ilicitude da prova de uma forma geral, apontando o que é uma prova de forma abrangente, o que é uma prova ilícita, quais são suas aplicabilidades e quando ela pode ser usada no ordenamento penal brasileiro, como uma exceção, já que a regra é a não utilização. Apesar do art. 5º, no inciso LVI, da Constituição Federal, dizer expressamente que não é admitido o uso da prova ilícita, a maioria dos doutrinadores nacionais tem um pensamento contrário, dizendo que se deve utilizar, de forma excepcional. Utilizando do princípio da proporcionalidade, para valer-se da prova ilícita, pois é intolerável que um indivíduo perca sua liberdade por falta de provas a seu favor, quando se tem uma ilícita que pode fazer a diferença. Nesses casos, se sacrifica alguns direitos individuais, como da privacidade e etc., em detrimento à liberdade do ser humano. Além dessa teoria, tem também a que nem os doutrinadores e nem a jurisprudência aceitam a admissibilidade de provas ilícitas em pro societate, sendo aceita apenas em pro reo.
Palavra Chave: Prova; Provas ilícitas; Princípio da Inadmissibilidade das provas ilícitas; Princípio da Proporcionalidade.
ABSTRACT: This is a work based on current society and the Brazilian legal system. Here is a presentation of the illegality of the evidence in general, pointing out what is a comprehensive test, or what is an illegal test, what are its applicabilities and when it can be used in the Brazilian criminal law, as an exception, since the rule is non-use. Despite art. 5, LVI, of the Federal Constitution, expressly say that the use of illicit evidence is not allowed, the majority of national indoctrinators have a contrary thought, saying that they should use it, exceptionally. Using the principle of proportionality, to assess whether evidence is illicit, as it is intolerable for an individual to lose his freedom due to lack of evidence in his favor, when an illicit one can make a difference. In these cases, some individual rights are sacrificed, such as privacy and etc., in detriment to the freedom of the human being. In addition to this theory, there is also, there is that neither the indoctrinators nor the jurisprudence that accept the admissibility of illicit evidence in a pro societate, being accepted only pro reo
Key Word: Proof; Illegal evidence; Principle of the Inadmissibility of Illegal Evidence; Proportionality principle.
Sumário: 1. Introdução. 2. Breve Histórico Da Ilicitude Da Prova. 3. Natureza Jurídica. 4. Classificação Das Provas. 4.1. Princípios Inerentes A Prova. 5. Sistema De Apreciação Da Prova. 5.1. Meios De Prova. 5.2. Onus De Prova. 6. Prova Proibida. 6.1 Conceito. 6.2. Prova Ilegitima X Prova Ilicita. 6.3. Prova Ilícita Por Derivação E A Teoria Dos Frutos Da Arvore Envenenada. 6.3.1. Teoria Dos Frutos Da Arvore Envenenada. 7. A Admissibilidade Da Prova Ilicita. 8. Conclusão. 9. Referências.
1.INTRODUÇÃO
O presente artigo científico trata se do estudo do tema da admissibilidade das provas ilícitas no processo penal, pois em regra, isso não é permitido pela legislação atual.
A prova em si, é o modo de se elucidar um caso concreto, trazer à luz a verdade real, a verdade dos fatos.
Acontece que, em determinados casos, tal prova é obtida através de meios ilícitos, não podendo ser admitidos perante a Justiça, pois violaria diversos direitos e garantias estabelecidos na Carta Magna, como o princípio da dignidade da pessoa humana, aonde também é possível encontrar a proibição expressa de admissão de tais provas.
Entretanto, em determinadas situações, essa prova ilícita é a única forma de salvar uma pessoa de uma condenação injusta. Nesse ponto, entra o princípio da proporcionalidade, para ponderar o que seria mais razoável para poder ser aplicado ao caso, pois há a violação de direitos e garantias dos dois lados da moeda.
O presente artigo ilustra essa situação e outras que decorrem desse tema, como a admissibilidade em benefício pro societate, trazendo a visão de vários doutrinadores com suas observações e críticas a esse tema.
2.BREVE HISTÓRICO DA ILICITUDE DA PROVA
Em primeiro lugar, deve-se ilustrar qual o objetivo da prova, que conforme o ensinamento de Eugênio Pacelli, é comprovar a verdade dos fatos, encontrar a maior verossimilhança possível, in verbis:
A prova judiciária tem um objetivo claramente definido: a reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a maior coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a verdade dos fatos, tal como efetivamente ocorridos no espaço e no tempo. A tarefa, portanto, é das mais difíceis, quando não impossível: a reconstrução da verdade. 1[1]
No decorrer da sua história, o Direito tentou de várias formas a demonstração da verdade através das provas, Pacelli nos ensina:
(...) desde as ordálias e juízos de deus (ou dos deuses), na Idade Média, em que o acusado submetia-se a determinada provação física (ou suplício), de cuja superação, quando vitorioso, se lhe reconhecia a veracidade de sua pretensão, até a introdução da racionalidade nos meios de prova. [2]
Com a evolução da humanidade, o direito foi a acompanhando e assim o seu processo, forma de julgamento e meio de provar aquele fato também evoluíram. Dos deuses as provas físicas para provar a inocência, o processo penal tende a se comportar de modo mais evoluído e organizado, onde há todo um rol de possíveis provas, e principalmente legais, repudiando as formas ilegais de aquisição de provas. Pacelli, nos fala que:
Para a consecução de tão gigantesca tarefa, são disponibilizados diversos meios ou métodos de prova, com os quais (e mediante os quais) se espera chegar o mais próximo possível da realidade dos fatos investigados, submetidos, porém, a um limite previamente definido na Constituição Federal: o respeito aos direitos e às garantias individuais, do acusado e de terceiros, protegidos pelo imenso manto da inadmissibilidade das provas obtidas ilicitamente. O exame acerca dos meios de prova disponíveis, bem como da idoneidade e da capacidade de produção de certeza que cada um deles pode oferecer, deve ser precedido da identificação dos princípios e das regras gerais a eles aplicáveis.[3]
Assim, nós podemos verificar que a prova está desde sempre nos confins da do Direito, e é muito importante, pois sem as provas de nada adianta os debates pois não haverá o objeto para se provar a teoria em si!
3.NATUREZA JURÍDICA
O direito de se provar algo está intensamente ligado ao direito subjetivo com flanco constitucional, já a prova em si tem natureza processual e quaisquer mudanças feitas abarcam crimes cometidos antes da vigência dessa mudança e tais mudanças tem aproveitamento imediata, Nestor Távora nos demonstra:
A prova está intimamente ligada a demonstração dos fatos, sendo inerente ao desempenho da ação e de defesa. É verdadeiro direito subjetivo com vertente constitucional para demonstração da realidade dos fatos. Já as normas atinentes as provas são de natureza processual, tendo aplicação imediata. Se o legislador disciplina um novo meio de provas, ou altera as normas já existentes, tais alterações terão incidência instantânea, abarcando os processos já em curso. Os crimes ocorridos antes da vigência da lei poderão ser demonstrados pelos novos meios de prova.[4]
4.CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS
As provas têm diversas classificações, segundo Fernando Capez[5], elas são dividas quanto ao objeto, quanto ao efeito ou valor, quanto ao sujeito ou causa e quanto à forma ou aparência.
QUANTO AO OBJETO
Significa dizer que é a relação com o fato que quer ser provado, podendo ser direta, quando ela demonstra o fato por si, exemplo da testemunha visual, ou indireta, quando nos induz ao fato principal, como no álibi.
QUANTO AO EFEITO OU VALOR
Quer dizer quanta certeza aquela prova passou podendo ser plena, que é a prova necessária para a condenação, para Nestor Távora “é o grau de certeza gerado pela apreciação da prova”[6], e a não plena, que é quando não há essa certeza e a prova é tratada como indicio.
Outrossim, é importante salientar que, para a pronúncia, se aceita a prova não plena, o que não acontece na condenação, onde é necessário ter a prova plena, sobre isso Capez informa que ‘’ trata-se de prova que traz consigo um juízo de mera probabilidade, vigorando nas fases processuais em que não se exige um juízo de certeza, como na sentença de pronúncia, em que vigora o princípio do in dubio pro societate.’’[7]
QUANTO AO SUJEITO OU A CAUSA
É o tipo de prova em si considerada, que são relativas ao sujeito e a causa, sendo ela real, que resulta do próprio fato, exemplo a arma, o cadáver ou pessoal, que vem do conhecimento de alguém, de afirmações pessoais, como testemunha e etc.
QUANTO A FORMA OU APARENCIA
Aqui é a forma aparente que a prova vai ser apresentada ao processo, seja como testemunhal (afirmação de uma pessoa), documental (os documentos em si) ou material (algum meio de demonstrar materialmente o crime, exemplo do exame de corpo de delito).
4.1 PRINCÍPIOS INERENTES A PROVA
Um princípio é o alicerce do direito que não está positivado em nenhum diploma legal e serve para preencher as lacunas da lei, Miguel Reale aduz:
Princípios são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordemprática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis.[8]
No nosso ordenamento jurídico temos seis princípios que regem as Provas no Processo Penal (além de todos os que regem o Processo Penal em si). O princípio da autorresponsabilidade, da audiência contraditória, da aquisição ou comunhão das provas, da oralidade, publicidade e do livre convencimento motivado.
PRINCÍPIO DA AUTORRESPONSABILIDADE
As partes tomam a responsabilidade. Tanto pelas ações como pelas omissões, Capez fala que “as partes assumem as consequências de sua inatividade, erro ou atos intencionais.
PRINCÍPIO DA AUDIÊNCIA CONTRADITÓRIA
Significa dizer, de forma simples, que toda prova admite contraditório. Nestor Távora[9] diz que “Toda prova produzida deve ser submetida ao crivo do contraditório, com oportunidade de manifestação da parte contrária”. O que também é um direito assegurado no art. 5º, LV, da Constituição Federal de 1988, a seguir: “Art. 5º, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”[10]
PRINCÍPIO DA AQUISIÇÃO OU DA COMUNHÃO DAS PROVAS
Tal princípio diz que a prova não pertence a nenhuma das partes que a tenham a produzido e sim ao processo em si. Por isso, se diz que, depois de adentrada ao processo a prova pode ser usada tanto pela defesa quanto pela acusação.
Se a parte deseja desistir de prova que tenha proposto, a parte contrária deve obrigatoriamente ser ouvida. Em havendo aquiescência, ainda assim o magistrado poderá determinar de ofício a realização da prova. Deve ser analisada com cautela a previsão do art. 401, § 2°, do CPP, autorizando que a parte desista de qualquer das testemunhas arroladas, ressalvando apenas a possibilidade do magistrado determinar a oitiva de ofício. Apesar da omissão legal, se a parte contrária insistir na oitiva, a testemunha deve ser ouvida, em atenção ao princípio da comunhão.
PRINCÍPIO DA ORALIDADE
Aqui se fala que da predominância dos atos processuais no modo oral, sem o impedimento deles serem reduzidosa termo. Desse princípio advémdois subprincípios: o da concentração, que fala sobre a produção de provas se dar em uma única audiência o da imediatidade que fala sobre o juiz ter uma proximidade das partes e das provas para poder julgar, que é também a base do princípio da identidade física do juiz, que fala sobre o juiz que presidiu a instrução ser o mesmo que vai julgar o caso, pois afinal se o mesmo juiz não acompanhar todo o procedimento, como ele irá formar seu convencimento?
Sobre o assunto, Nestor Távora, fala:
Deve haver a predominância da palavra falada. Ex.: testemunhos, interrogatório, etc. A oralidade ganhou destaque pela previsão do art. 62, da Lei no 9.099/1995, tomando-a expressamente como critério reitor nos Juizados Especiais Criminais. Foi também o desejo da reforma, assegurando-se, como regra, a realização dos debates orais, ao invés de alegações finais escritas, que só excepcionalmente terão cabimento (art. 403, CPP). Do princípio da oralidade, decorre o princípio da concentração, buscando-se centralizar a produção probatória em audiência única, ou no menor número delas (art. 400,
§ 1°, CPP), e o princípio da imediatidade, aproximando o magistrado do contexto probatório, com as provas produzidas perante a autoridade. Além deles, averbou-se no ordenamento o princípio da identidade física do julgador, de sorte que o magistrado que preside a instrução é necessariamente aquele que irá julgar o processo, salvo as exceções legalmente contempladas, como promoção, aposentadoria, dentre outras (art. 399, § 2°, CPP).[11]
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE
Em regra, todo ato processual é púbico, só podendo ser restringindo em algumas exceções, em casos previamente expressos, como o art. 5º LX, da Constituição Federal[12] fala: ”A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”;[13] quando pra evitar escândalos desnecessários e proteger a intimidade das partes.
Ademais, em fase de inquérito policial, que tem o sigilo de forma necessária para a elucidação do fato em si, conforme explica o art. 20 do Código de Processo Penal: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.” [14][15], o defensor pode sim, verificar os autos, conforme enunciado da súmula vinculante nº14 do STF, vide: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.” [16]
PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO
Como no nosso ordenamento jurídico não figura o sistema de prova tarifada, onde cada prova tem seu valor fixado em lei, o princípio do livre convencimento garante ao juiz uma liberdade para valorar e apreciar as provas, contanto que seja fundamentado tal decisão, Fernando Capez fala que “as provas não são valoradas previamente pela legislação; logo, o julgador tem liberdade de apreciação, limitado apenas aos fatos e circunstâncias constantes nos autos. ”[17]
PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE.
Esse princípio é de suma importância para entendermos o próximo tópico, que irá falar da possibilidade de se admitir provas ilícitas.
Seu surgimento se deu na Alemanha, Verhaltnismassigkeitsprinzip. Em linhas gerais, essa teoria fala que se houver um conflito de interesses pelo ordenamento, aquele de maior relevância deveria prevalecer. No ordenamento onde a prova ilícita é proibida no processo penal, esse pode ser um caminho alternativo.
Como explica Capez “ Para essa teoria, a proibição das provas obtidas por meios ilícitos é um princípio relativo, que, excepcionalmente, pode ser violado sempre que estiver em jogo um interesse de maior relevância ou outro direito fundamental com ele contrastante. ”[18]
Humberto Ávila, fala:
A proporcionalidade é aplicável quando há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, impondo ao intérprete três exames essenciais: o da adequação (o meio promove o fim?), o da necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do direito fundamental afetado?) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio?).[19]
Nestor Távora, fala sobre o uso deste princípio “Entendemos que o princípio da proporcionalidade deve ser invocado, na sua essência, para preservar os interesses do acusado. Nesse sentido, não há discrepância doutrinária ou jurisprudencial (concepção da prova ilícita utilizada pro reo)[20]
Nesse mesmo sentido, Capez fala: “A aceitação do princípio da proporcionalidade pro reo não apresenta maiores dificuldades, pois o princípio que veda as provas obtidas por meios ilícitos não pode ser usado como um escudo destinado a perpetuar condenações injustas. ”[21]
Já no que tange em relação ao princípio da proporcionalidade pro societate, a doutrina não tem sido favorável a aceitar. Capez fala:
No que tange ao princípio da proporcionalidade pro societate, consistente na admissibilidade das provas ilícitas, quando demonstrada a prevalência do interesse público na persecução penal, a tendência atual da jurisprudência dos Tribunais Superiores é a da sua não adoção. De acordo com esse entendimento, a não admissão de mecanismos de flexibilização das garantias constitucionais tem o objetivo de preservar o núcleo irredutível de direitos individuais inerentes ao devido processo legal, mantendo a atuação do poder público dentro dos limites legais. As medidas excepcionais de constrição de direitos não podem, assim, ser transformadas em práticas comuns de investigação.[22]
Por fim, segundo o entendimento doutrinário, o princípio da proporcionalidade em relação ao pro reo, pode ser aplicado quando tiver como objetivo garantir os direitos do acusado, como quando, por exemplo, a liberdade de um indivíduo estiver em detrimento e esta puder ser salva através dessa prova ilícita. Já no sentindo pro societati, a doutrina e a jurisprudência não são a favores da sua aplicação.
5.SISTEMA DE APRECIAÇÃO DA PROVA.
Távora aduz “As regras de valoração da prova mostram a transparência no ato de julgar, revelando o porquê do convencimento que deu ensejo ao provimento jurisdicional, funcionando como fator de conformação das partes e de fiscalização do órgão judicante. ” [23]
Em primeiro momento tínhamos apenas a total subjetividade do juiz, tendo que aceitar a sua decisão sem que ele precisasse expor seus motivos e fundamentos, o chamado sistema da íntima convicção, que hoje, é usado apenas como exceção no Tribunal do Júri, acerca desse último, Fernando Capez fala:
A lei concede ao juiz ilimitada liberdade para decidir como quiser, não fixando qualquer regra de valoração das provas. Sua convicção íntima, formada não importa por quais critérios, é o que basta, não havendo critérios balizadores para o julgamento. Esse sistema vigora entre nós, como exceção, nas decisões proferidas pelo júri popular, nas quais o jurado profere seu voto, sem necessidade de fundamentação.[24]
Em outro, temos o oposto, um sistema de hierarquia das provas, com pesos e valores em cada prova, o chamado sistema da prova legal. Nele, a lei estipula a importância e o juiz, deve obedecer a essa hierarquia. Capez nos ensina que “a lei impõe ao juiz o rigoroso acatamento a regras preestabelecidas, as quais atribuem, de antemão, o valor de cada prova, não deixando para o julgador qualquer margem de discricionariedade para emprestar-lhe maior ou menor importância. ”[25]
Temos ainda, um terceiro sistema, que é um equilíbrio dos dois anteriores, o sistema da verdade real ou livre convencimento. Nesse, o juiz tem a liberdade para valorar as provas, formar a sua convicção, entretanto, apesar da livre valoração, ele deve fundamentar a sua decisão. Além disso, o juiz não pode usar como fundamentação, algum elemento estranho aos autos: quod neon est in actis non est in mundo (o que não está nos autos não está no mundo), sobre o terceiro sistema que também é o usado pelo nosso CPP, Fernando Capez explica:
Trata-se, na realidade, do sistema que conduz ao princípio da sociabilidade do convencimento, pois a convicção do juiz em relação aos fatos e às provas não pode ser diferente da de qualquer pessoa que, desinteressadamente, examine e analise tais elementos. Vale dizer, o convencimento do juiz deve ser tal que produza o mesmo resultado na maior parte das pessoas que, porventura, examinem o conteúdo probatório.[26]
5.1 MEIOS DE PROVA
Os meios de prova é a forma como se leva aos autos e ao conhecimento do Juiz as provas que pretende usar para corroborar seu fato. Nas palavras de Fernando Capez, ele diz que:
Em primeiro lugar, a título de esclarecimento, convém salientar que o meio de prova compreende tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, à demonstração da verdade que se busca no processo. Assim, temos: a prova documental, a pericial, a testemunhal etc.[27]
Já Nestor Távora, fala que “os meios de prova são os recursos de percepção da verdade e formação do convencimento. É tudo aquilo que pode ser utilizado, direta ou indiretamente, para demonstrar o que se alega no processo. ”
O nosso CPP, nos traz um rol de provas que podem ser produzidas, esse rol, entretanto, não é taxativo, pois devemos notar aqui a liberdade de se produzir as provas, garantida pelo princípio da liberdade probatória, que não é absoluto e sofre restrições em relação a, basicamente, dignidade da pessoa humana.
Como dito, sobre a liberdade probatória, ela não é absoluta, pois há casos onde a prova é conseguida mediante violação de norma material ou processual, nascendo assim as provas proibidas. Nestor Távora fala:
A prova é taxada de proibida ou vedada toda vez que sua produção implique violação da lei ou de princípios de direito material ou processual. Por afrontar a disciplina normativa, não seria admitida ao processo. Temos assim, por classificação amplamente aceita, as provas vedadas, proibidas ou inadmissíveis, que é o gênero.[28]
A prova proibida se subdivide em: provas ilícitas, provas ilegítimas e provas irregulares.
Sobre as espécies da prova proibida, como a prova ilícita, que é o tema central deste trabalho, veremos de forma mais adequada em breve.
5.2 ONUS DE PROVA
A palavra ônus vem do latim onus e quer dizer encargo, sobrecarga, peso.
Renato Brasileiro define o ônus da prova como:
Transportando-se o conceito de ônus para o âmbito da prova, pode-se dizer que ônus da prova é o encargo que as partes têm de provar, pelos meios legal e moralmente admissíveis, a veracidade das afirmações por elas formuladas ao longo do processo, resultando de sua inação uma situação de desvantagem perante o direito.[29]
Há uma diferença entre o ônus e a obrigação, o primeiro é facultativo, já a segunda, a parte tem o dever de fazer tal ato. Fernando Capez alude tal diferença:
Registre-se, de início, que a prova não constitui uma obrigação processual e sim um ônus, ou seja, a posição jurídica cujo exercício conduz seu titular a uma condição mais favorável. A principal diferença entre obrigação e ônus reside na obrigatoriedade. Enquanto na obrigação a parte tem o dever de praticar o ato, sob pena de violar a lei, no ônus o adimplemento é facultativo, de modo que o seu não cumprimento não significa atuação contrária ao direito. Neste último caso, contudo, embora não tendo afrontado o ordenamento legal, a parte arcará com o prejuízo decorrente de sua inação ou deixará de obter a vantagem que adviria de sua atuação.[30]
Conforme nos ensina o art. 156 do CPP[31], o ônus de incube a quem alega o fato, logo como ordinariamente o Ministério Público é o autor da Ação e representante do Estado, cabe a ele mesmo provar o que alega. O art. 156, incisos I e II, diz:
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.
Entretanto, existe exceção a essa regra geral e Capez fala que “em contrapartida, cabe ao acusado provar as causas excludentes da antijuridicidade, da culpabilidade e da punibilidade, bem como circunstâncias atenuantes da pena ou concessão de benefícios legais. ”
Uma outra exceção à regra, se dá quando no art.156, I e II, o juiz pode determinar que sejam feitas diligências para suprimir dúvidas sobre determinado ponto relevante. Capez nos ensina que:
Note-se, finalmente, que ao art. 156 foi acrescida uma nova hipótese, pois faculta ao juiz “ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida” (cf. inciso I). Tal previsão legal é bastante discutível em face do processo penal acusatório, pois admite a figura de um juiz investigador e, portanto, de um processo inquisitivo.[32]
6.PROVA PROIBIDA
6.1 CONCEITO
Antes de falar da prova proibida em si, é importante salientar o conceito de ilicitude, conferido por Rogério Greco:
Ilicitude ou antijuridicidade, é a relação de antagonismo, de contrariedade entre a conduta do agente e o ordenamento jurídico. Quando nos referimos ao ordenamento jurídico de forma ampla, estamos querendo dizer que a ilicitude não se resume à matéria penal, mas sim que pode ter natureza civil, administrativa, tributária etc. Se a conduta típica do agente colidir com o ordenamento jurídico penal, diremos ser ela penalmente ilícita.[33]
A prova obtida através de ofensa a uma norma material ou processual, Nestor Távora fala que “a prova é taxada de proibida ou vedada toda vez que sua produção implique violação da lei ou de princípios de direito material ou processual. Por afrontar a disciplina normativa não seria admitida ao processo. ’’[34] Capez a conceitua como ‘’entendendo-se como tal toda aquela evidência que não pode ser admitida nem valorada no processo. Prova vedada ou proibida é, portanto, a produzida por meios ilícitos, em contrariedade a uma norma legal específica. “ [35]
6.2 PROVA ILEGITIMA X PROVA ILICITA
Dentro do tema prova proibida, temos duas espécies: a prova ilícita e a prova ilegítima.
A prova vai ser ilícita quando ela for adquirida por meio de violação do direito material. Fernando Capez explica que “Desse modo, serão ilícitas todas as provas produzidas mediante a prática de crime ou contravenção, as que violem normas de Direito Civil, Comercial ou Administrativo, bem como aquelas que afrontem princípios constitucionais. Tais provas não serão admitidas no processo penal”.
Assim, quando houver uma prova que, para ela ser obtida, teve que acontecer a quebra de um direito material, vai ser considerada ilícita. A nossa Constituição contém várias previsões de inviolabilidades, que se forem feitas caracterizariam a ilicitude da prova, como por exemplo a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem, consoante o art. 5º, X.[36]: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Renato Brasileiro nos mostra um exemplo clássico muito utilizado pela doutrina: “Exemplificando, se determinado indivíduo for constrangido a confessar a prática do delito mediante tortura ou maus- tratos, tem-se que a prova aí obtida será considerada ilícita, pois violado o disposto no art. 5°, inciso III, da Constituição Federal.”[37]
Essa inadmissibilidade da prova ilícita no processo penal está expressa, tanto no artigo 5º, LVI da CF: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos” [38], quanto no art. 157 do CPP: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”[39], mas toda regra tem exceção, e veremos mais adiante a possibilidade de se admitir provas ilícitas.
Uma característica bem importante da prova ilícita é que, em geral, a violação da norma se dá no momento da colheita da prova, no momento em que ela se produziu, costuma se dizer que, a prova ilícita ela é externa ao processo, pois sempre se dará em momento anterior a ele.
Depois da reforma feira pela lei n. 11.690/2008, o art. 157 do CPP, passou a não fazer distinção entre as provas ilegítimas e ilícitas, trazendo a prova ilícita como aquela que viola norma material e processual, cabendo a doutrina ressaltar essa diferença.
Já a prova ilegítima é aquela que é concebida mediante a violação de norma processual. Fernando Capez dá exemplos: “Quando a norma afrontada tiver natureza processual, a prova vedada será chamada de ilegítima. Assim, será considerada prova ilegítima: o documento exibido em plenário do Júri, com desobediência ao disposto no art. 479, caput (CPP); o depoimento prestado com violação à regra proibitiva do art. 207 (CPP) (sigilo profissional) etc.”[40]
A principal característica da prova ilegítima e a forma de se diferenciar da prova ilícita, é o momento da produção da prova. Aqui, em regra, a prova ilegítima se dá dentro do processo, intraprocessual, a prova então tem que ter sua ilegitimidade reconhecida e deve ser desentranhado dos autos.
Ainda temos um terceiro tipo descrito pela doutrina majoritária, a prova ilícita por derivação, mas sobre isso iremos falar posteriormente com as devidas explicações.
6.3 PROVA ILÍCITA POR DERIVAÇÃO E A TEORIA DOS FRUTOS DA ARVORE ENVENENADA.
As provas ilícitas por derivação são aquelas que, mesmo produzidas de forma lícita em momento posterior, foram afetadas pela ilicitude, que foi transmitida a elas pela prova originária. Na palavra, Fernando Capez assim as define:
A doutrina e a jurisprudência, em regra, tendem também a repelir as chamadas provas ilícitas por derivação, que são aquelas em si mesmas lícitas, mas produzidas a partir de outra ilegalmente obtida. É o caso da confissão extorquida mediante tortura, que venha a fornecer informações corretas a respeito do lugar onde se encontra o produto do crime, propiciando a sua regular apreensão.[41]
Já no ensinamento de Renato Brasileiro, ele conceitua dizendo que ‘’ de nada adianta dizer que são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos se essa ilicitude também não se estender às provas que dela derivam. “
O próprio CPP, traz em seu art. 157[42], no §1º, a proibição expressa da não utilização desse tipo de prova. Entretanto, o próprio parágrafo 1º faz uma ressalva em relação a derivação, aceitando tal prova se não for demonstrado um nexo de causalidade entre as duas ou quando a derivada puder ser conseguida de outra fonte independente. Vide o Art. 157 e seu primeiro parágrafo:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
§ 2o .Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.
Assim, fica claro que, se não for demonstrado um nexo de causalidade, não há que se falar de contaminação, e na mesma intenção, se uma prova licita for obtida da prova ilícita, mas ficar demonstrado que ela poderia ser obtida através de meios legais, ou seja de forma independente, não se fala também de ilicitude por derivação.
6.4TEORIA DOS FRUTOS DA ARVORE ENVENENADA
Desde seu surgimento, a teoria já era direcionada a respeito da nulidade de todas as provas obtidas mediante uma outra prova ilícita, falando sobre como é prejudicial a ilicitude de uma prova, pois de acordo com essa teoria, uma prova ilícita, contamina todas as outras que venham a derivar dela.
A teoria dos frutos da árvore envenenada nasceu na Suprema Corte Americana, nos anos 1920, quando em um julgado uma intimação feita com base em uma informação obtida de forma ilegal, foi considerado inválida, sobre esse caso, Renato Brasileiro fala:
O precedente que originou a construção c do conceito de prova ilícita por derivação está ligado ao caso SILVERTHORNE LUMBER CO v. US, de 1920, em que a Suprema Corte norte-americana reputou inválida uma intimação que tinha sido expedida com base numa informação obtida por meio de uma busca ilegal. A acusação não poderia usar no processo a prova obtida diretamente da busca ilegal, nem a prova obtida indiretamente por meio da intimação baseada nessa busca. Posteriormente, no julgamento do caso NARDONE v. US (1939), foi cunhada a teoria dos frutos da árvore envenenada (em inglês, fruits of the poisonous tree, segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos). [43]
Mas tal teoria teve seu ponto alto em 1966, como veremos na explicação de Renato Brasileiro adiante, nesse julgado, no processo de Miranda x Arizona, foi declarada a nulidade de todas as suas declarações, confissões e possíveis provas, pois não foi feito o procedimento de informar a pessoa quais eram seus direitos.
O ápice dessa teoria foi atingido no famoso julgamento MIRANDA v. ARIZONA, de 1966, em que a Suprema Corte Americana firmou o entendimento de que nenhuma validade pode ser conferida às declarações feitas pela pessoa à polícia, a não ser que antes ela tenha sido claramente informada de: 1) que tem o direito de não responder; 2) que tudo o que disser pode vir a ser utilizado contra ele; 3) que tem o direito à assistência do defensor escolhido ou nomeado. Nesse caso, a Suprema Corte Americana adotou a posição de que a mera ausência dessa formalidade- denominada de aviso de Miranda (Miranda Rights ou Miranda-warnings) -era o bastante para inquinar de nulidade as declarações da pessoa, notadamente a confissão e as provas conseguidas a partir dela. [44]
Aqui no Brasil, a teoria não foi aceita de imediato, explica Renato Brasileiro:
No Brasil, pode-se dizer que, em um primeiro momento, o Supremo Tribunal Federal rechaçou a aplicação da referida teoria. Inicialmente, prevaleceu a posição do Min. Moreira Alves, segundo o qual a dicção normativa empregada pelo constituinte no art. 5°, LVl, claramente sufragou a tese de que somente devem ser consideradas inadmissíveis no processo as provas ilícitas em si mesmas, e não aquelas a que se chegou por meio daquelas consideradas não como provas, mas apenas como pistas, e que foram produzidas licitamente. Restaram vencidos no referido julgamento o Min. Celso de Mello e, em menor extensão, os Ministros Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira.[45]
Porém, o STF voltou a se pronunciar novamente sobre a teoria no julgamento do HC 73.351/SP[46]. Nesse julgado aceitando a ilicitude de uma prova que veio contaminada de outra, foi inserida, como jurisprudência, na nossa legislação, a teoria dos frutos da árvore envenenada. Mais uma vez, explica Renato Brasileiro:
No entanto, já no ano de 1996, o Pleno do Supremo Tribunal Federal voltou a se manifestar sobre o assunto, tendo-se posicionado favoravelmente à adoção da teoria dos frutos da árvore envenenada, in verbis: “Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, assentou entendimento no sentido de que, sem a edição de lei definidora das hipóteses e da forma indicada no art. SO, inc. XII, da Constituição, não pode o Juiz autorizar a interceptação de comunicação telefônica para fins de investigação criminal. Assentou, ainda, que a ilicitude da interceptação telefônica - à falta da lei que, nos termos do referido dispositivo, venha a discipliná-la e viabilizá-la - contamina outros elementos probatórios eventualmente coligidos, oriundos, direta ou indiretamente, das informações obtidas na escuta. Habeas corpus concedido".[47]
E então, com o advento da lei nº 11.690, ficou evidenciado no CPP a adoção da teoria dos frutos da arvore envenenada, solidificando expressamente a não aceitação desse tipo de prova no nosso ordenamento jurídico.
De forma rápida, vamos esclarecer que, a teoria aqui descrita, não é absoluta. Dela deriva mais nove teorias que falam de exceções sobre a árvore envenenada, nós não vamos entrar no mérito delas pois elas não são o foco do presente trabalho. Porém, a título de alusão, são elas: prova absolutamente independente, a descoberta inevitável, contaminação expurgada, exceção de boa-fé, limitação da mancha purgada, teoria do risco, limitação da destruição da mentira do imputado, doutrina da visão aberta, teoria do encontro fortuito de provas (serendipidade).
7.A ADMISSIBILIDADE DA PROVA ILICITA
A partir desse ponto, se entra no mérito do presente artigo cientifico. Pois já foi visto no tópico anterior, que a legislação pátria não admite, em regra, a admissibilidade da prova ilícita no processo penal, por ela violar norma de direito material e constitucional, então iremos falar com mais riqueza de conteúdo, se é possível, e se for, em quais situações nossa legislação admite que a prova ilícita seja usada em benéfico pro reo. Com o advento da lei 11.690/2008, ficou claro no CPP a não admissibilidade da prova ilícita bem como desentranhamento destas, consagrando em seus parágrafos a teoria dos frutos da arvore envenenada.
Tal vedação, poderá ser posta de lado, utilizando se o princípio da proporcionalidade, toda vez que estiver em evidência que, admitir a prova ilícita é a única forma de garantir o direito do acusado que está em risco.
Capez nos ensina:
A questão que se coloca é a de saber até que ponto as garantias constitucionais inerentes ao devido processo legal e à preservação da intimidade do acusado podem ser flexibilizadas, diante da ponderação dos valores contrastantes entre indivíduo e sociedade. Em outras palavras: como proceder diante de um eventual conflito entre as garantias constitucionais protetivas do cidadão, derivadas do devido processo legal, e o interesse da sociedade no combate à criminalidade?[48]
Sendo assim, não é correta a postura de nunca se aceitar a prova, conforme enumera o CPP, sendo ela ilícita. Devendo então, fazer a conferição dos dois princípios em choque, para que um deles prevaleça no caso concreto. Capez exemplifica:
Em outras palavras, o direito à liberdade (no caso da defesa) e o direito à segurança, à proteção da vida, do patrimônio etc. (no caso da acusação) muitas vezes não podem ser restringidos pela prevalência do direito à intimidade (no caso das interceptações telefônicas e das gravações clandestinas) e pelo princípio da proibição das demais provas ilícitas.[49]
Eugênio Pacelli, nos explica, que a inadmissibilidade das provas tem um caráter, além de tudo, educador para se inibir a prática das provas ilícitas, vejamos:
A vedação das provas ilícitas atua no controle da regularidade da atividade estatal persecutória, inibindo e desestimulando a adoção de práticas probatórias ilegais por parte de quem é o grande responsável pela sua produção. Nesse sentido, cumpre função eminentemente pedagógica, ao mesmo tempo que tutela determinados valores reconhecidos pela ordem jurídica.[50]
Acredito que já tenha ficado claro que nossa doutrina já está bem pacificada quanto a aceitação de se utilizar a prova ilícita, quando devidamente utilizado o princípio da proporcionalidade junto com um justo motivo, no processo penal em benefício pro reo, ou seja, por exemplo, quando aquela prova ilícita for a única forma, o único meio de se inocentar uma pessoa acusada. Nesse caso, o princípio da proporcionalidade entraria aqui para ponderar o que vale mais. O direito a intimidade, que foi violado ao ser conseguida a prova ilícita ou o direito à liberdade que estaria sendo violado, ao se deixar que uma pessoa inocente tivesse seu direito de ir e vir cessado em razão da prova que demonstra sua inocência?
Nesse sentido é um caso de se ponderar até que momento as garantias dadas pela nossa Carta Magna, como a preservação da intimidade pode ser levada em favor do direito constitucional a liberdade de um indivíduo.
Outrossim, a depender da razoabilidade do caso concreto, o juiz poderá acolher uma prova ilícita ou sua derivação, para que seja evitado uma quebra grave de direito constitucional.
Eugênio Pacelli, usa desses exemplos:
Em relação aos direitos individuais, a vedação das provas ilícitas tem por destinatário imediato a proteção do direito à intimidade, à privacidade, à imagem (art. 5º, X), à inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI), normalmente os mais atingidos durante as diligências investigatórias. No que se refere à questão da qualidade da prova, o reconhecimento da ilicitude do meio de obtenção da prova já impede o aproveitamento de métodos cuja idoneidade probatória seja previamente questionada, como ocorre, por exemplo, na confissão obtida mediante tortura, ou mediante hipnose, ou, ainda, pela ministração de substâncias químicas (soro da verdade etc.). [51]
Assim, admitir ou não a prova ilícita no processo penal, é um mérito que só o juiz da causa poderá resolver, usando o princípio da proporcionalidade e se utilizando de análise dentro do caso em si. Já que o objetivo final do processo penal, é de se provar a verdade real, lembrando que, a jurisprudência admite tal feito diante de casos graves aonde não há outra forma de se provar a inocência do acusado, não podendo assim, deixar que ele saia prejudicado, quando se tem a prova que o ajuda. Além disso, é uma questão que o magistrado deve se tomar cuidado para não incentivar o comportamento de agentes, para conseguir provas ilícitas e sim fazer dentro dos conformes da lei, para que tudo corra bem, afinal como já falado acima, a não aceitação também tem esse caráter de tentar evitar um comportamento inadequado.
8.CONCLUSÃO
Como foi extensamente falado acima, no mundo jurídico há diversas formas de se provar algo. A prova, no ordenamento brasileiro, pode ser através de depoimento pessoal, exibição de documento ou coisa, prova pericial e etc. Além disso, o ônus de se provar é de quem alega a coisa.
A prova é o meio pelo qual há o convencimento do juiz sobre determinado caso concreto. Através das provas juntadas nos autos, o magistrado vai ter a certeza sobre a inocência ou culpabilidade de determinado agente em relação a determinado fato.
A Constituição Federal fala que são inadmissíveis as provas obtidas por meios ilícitos, e o Art 157 do CPP, com sua nova redação dada pela lei 11.690/2008, traz o princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas no processo penal de forma explicita. Ou seja, a regra aplicável ao ordenamento jurídico é a não aceitação das provas obtidas por meios escusos. Porém, essa não é uma regra de aplicação absoluta.
A maioria esmagadora dos doutrinadores entendem como aceitável a possibilidade, usando o princípio da proporcionalidade, de usar a prova obtida de meio ilícito ou ilegítimo a favor do acusado, sob a égide de que o direito da liberdade prevalece ao direito que foi violado para a obtenção daquela prova, já que a condenação de um inocente que poderia ter sido evitada mediante aquela prova é um absurdo, pois na Constituição predomina o princípio da presunção de inocência.
Apenas diante da possibilidade de comprovar a inocência do acusado é que a regra geral deve ser quebrada e a ilicitude deve ser usada a favor do acusado. A possibilidade de se usar a prova ilícita pro societate não é bem vista pelos doutrinadores, que admitem a prova ilícita de forma restrita apenas em benefício do acusado. Em suma, o princípio da proporcionalidade deve ser aplicado com cuidado mediante cada caso concreto.
Assim, a busca pela verdade real não deve ser feita de modo a macular direitos fundamentais, esse não é um comportamento a ser incentivado, mas em alguns casos deve se aplicar a proporcionalidade, de forma que deve valer se o direito à liberdade e da dignidade da pessoa humana, para preservar a liberdade do indivíduo.
9 REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da República, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da República, Brasília, 3 de outubro de 1941. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm.
BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2017.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016,
GRECO,Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I - 19. ed. – Niterói: Ed. Impetus, 2017
Pacelli, Eugênio. Curso de Processo Penal – 21. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2017.
TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2010.
TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 12ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm.
[1] PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017. p. 174
[2] PACELLI, Eugênio. Op., Cit., p. 174.
[3] PACELLI, Eugênio. Op., Cit., p. 175.
[4] TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 4. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Ed. JusPodivm, 2010. p. 346.
[5] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 432
[6] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2010, pág. 348.
[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 433.
[8] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p 37.
[9] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 12ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2017, pág. 657.
[10] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da República, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 04 de abril de 2018.
[11] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 12ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2017, p. 657.
[12] Para efeito de praticidade, a partir desde momento iremos nos referir a Constituição Federal pela abreviatura ‘’CF/88’’
[13] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da
República, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 04 de abril de 2018.
[14] Para efeito de praticidade, a partir desde momento iremos nos referir ao Código de Processo Penal pela abreviatura ‘’CPP’’
[15] BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da República, Brasília, 3 de outubro de 1941. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689Compilado.htm. > Acesso em 04 de abril de 2018.
[16] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante nº14. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1230> Acesso em 04 de abril de 2018.
[17] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 439.
[18] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 405.
[19] ÁVILA, Humberto, Teoria dos Princípios. 7. Ed. São Paulo: Malheiros, 2007. P. 161.
[20] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2010, p. 360.
[21] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 405.
[22] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 406.
[23] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2010, p. 367.
[24] CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 438.
[25] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 437.
[26] Capez, Fernando. Curso de processo penal. – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 438.
[27] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 434.
[28] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 12ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2017, p. 629.
[29] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 598.
[30] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 435
[31] BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da República, Brasília, 3 de outubro de 1941. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689Compilado.htm.. > Acesso em 04 de abril de 2018.
[32] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, pág. 4
[33] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I - 19. ed. – Niterói: Ed. Impetus, 2017, p. 451.
[34] TÁVORA. Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm. 2010, p. 350.
[35] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 400.
[36] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da República, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 04 de abril de 2018.
[37] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 621.
[38] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da República, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 04 de abril de 2018.
[39] BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da República, Brasília, 3 de outubro de 1941. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689Compilado.htm. > Acesso em 04 de abril de 2018.
[40] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 401.
[41] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 402.
[42] BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da República, Brasília, 3 de outubro de 1941. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689Compilado.htm. > Acesso em 04 de abril de 2018.
[43] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 626.
[44] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 626.
[45] BRASILEIRO, Renato. Op., Cit., p. 626.
[46] BRASIL. HC 73.351/SP. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, São Paulo, publicado em 09.05.1996> Acesso em 04 de abril de 2018.
[47] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal: volume único - 5. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. P. 626.
[48] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 403.
[49] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 404.
Advogada formada pela Universidade Estácio de Sá em 2018 e atualmente Pós Graduada em Direito Público pela Faculdade Legale em 2020.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Débora Rodrigues Peixoto da. A Admissibilidade de Provas Ilícitas no Processo Penal. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 ago 2020, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55117/a-admissibilidade-de-provas-ilcitas-no-processo-penal. Acesso em: 22 nov 2024.
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