Resumo: A pesquisa bibliográfica ‘’A ressocialização do preso nos presídios brasileiros’’ sob o foco da lei de execuções penais tem o objetivo de explorar a concretização deste mecanismo nas unidades prisionais do país e as medidas criadas pelo poder judiciário. A pesquisa é relevante, pois este tema não é tão discutido atualmente porque o senso comum tem á acepção que somente a lei tem força para combater a violência, suscitando a investigação de como os mecanismos diversos da prisão são importantes para combater os problemas enfrentados pelas penitenciarias e diminuir a reincidência. Princípio defendido pela LEP e consolidado com a adoção do sistema progressista, que visa não somente punir o indivíduo, mas reintegrar aos poucos ao convívio social.
Palavras – Chave: Ressocialização; LEP; Semiaberto.
Sumário:1. Introdução; 2. Sistema Progressivo: 2.1 Pena; 2.2 Sistemas Penitenciários; 2.3 Origem e Conceito do Sistema Progressivo; 2.4 Sistema Progressivo Brasileiro; 3. Situação dos Presídios Brasileiros: 3.1 Superlotação dos Presídios; 3.2 Rebeliões e massacres nos presídios; 4. Ressocialização; 4.1 Conceito de Ressocialização; 4.2 Ressocialização na legislação brasileira; 4.3 Ressocialização através do trabalho; 5. Alterações feitas pelo pacote anticrime na progressão de pena e ressocialização; 6. Medidas Alternativas a crise no sistema carcerário; 7. Considerações Finais; 8. Referências
1.Introdução
O objetivo deste artigo é compreender a importância da ressocialização do preso para o ordenamento jurídico brasileiro, bem como, as medidas adotadas pelo Poder judiciário para sua efetivação. Nesse sentido é importante salientar brevemente acerca da evolução histórica da pena e das formas de cumprimento.
Inicialmente na antiguidade a pena era aplicada pela vítima ou seus familiares como forma de vingança privada. Posteriormente, o Estado assumiu o monopólio da Justiça e do magistério punitivo, tornando-a pública. Neste contexto a pena de morte estava no centro do sistema punitivo, tendo assim a pena como finalidade punitiva ou vingativa e utilizando-se da Lei de Talião que tinha a seguinte norma “Olho por Olho e Dente por dente”.
No século XVII houve uma pequena mudança no sistema punitivo, passando a existir a pena de prisão como somente instrumento processual e cumulativo a pena de morte, na qual o sujeito ficava preso aguardando sua pena de morte. Como o passar dos séculos as penas corporais e desumanas foram perdendo espaço, como advento das penas privativas de liberdade, tendo os primeiros estabelecimentos prisionais surgindo no século XVIII, às denominadas casas de correição e trabalho. Inspiradas no direito canônico onde os monges se recolhiam às suas celas (quartos), para cumprirem as suas penitências para se purificarem e for perdoado. As penas começaram a ganhar os moldes atuais, os positivistas deram a pena a finalidade de ressocialização, onde conceituavam a pena não somente como uma forma de castigo, mas como também um instrumento da coletividade e um meio de reintegração a vida em sociedade.
2. Sistema Progressivo
2.1. Pena
Pena em stricto senso significa sanção aplicada como punição ou como reparação por uma ação julgada repreensível, castigo, condenação, penitência. Para Damásio (Direito Penal, 2015) pena é “a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração, como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos”.
O agente que praticar ato ilícito, culpável e ato típico será punido com pena compatível com dano causado mediante ao devido processo legal, cabendo ao Estado dever de punir. Porém, nem sempre o Estado teve a totalidade sobre o direito de punir.
A pena teve origem desde dos primórdios onde o homem começou a proteger a si mesmo, sua sobrevivência e suas posses. Na bíblia no livro de gênesis, há relatos da primeira pena imposta na história da humanidade, onde Deus expulsou e condenou Adão e Eva, por terem descumprido a ordem de não comer o fruto proibido.
A partir deste marco inicial, ocorreu a evolução histórica da pena. Iniciando com os clãs onde a pena era uma punição para o comportamento indevido e perigoso, tendo como sanção penas físicas cruéis e desumanas. Muitas vezes os infratores sofriam punições físicas, onde eram expostos ao público, eram feitas decapitações, mutilações, amputações tendo um caráter desumano. Sendo este período denominado como período de vingança privada e posteriormente como vingança divina, onde os indivíduos eram punidos com base em preceitos divinos, surgindo como fruto da própria religião, representado pelos reis e imperadores que possuíam o monopólio para condenar.
Com Estado se estabelecendo e ganhando soberania, vingança individual perdeu seu espaço e a pena de morte foi extinta e as demais penas brutais foram abrandadas. Como crescimento do cristianismo, a pena brutal foi deixada de lado, pois, a vida tinha mais valor para sociedade. Surgiu então, como forma de castigar o clero as prisões, como punição o infrator era recolhido para cela individual e recebia visitas apenas de seu diretor espiritual ou do seu confessor.
Com o passar dos séculos, as penas cruéis e brutais começaram a ser extintas, ganhando espaço a privação da liberdade ou melhor as penas restritivas de direito. No final do século XVIII e inicio do XIX, foi que ocorreram as primeiras mudanças no sistema punitivo, que foi chamado de período humanitário. Neste período, foi que a prisão começou a ganhar os moldes atuais, com o surgimento dos estabelecimentos prisionais.
2.2. Sistemas Penitenciários
Por volta do século XVIII, surgiram os primeiros os primeiros sistemas prisionais que atenderam os anseios dos filósofos e Estado, que buscavam o maior caráter humanitário para a sanção penal.
O primeiro a surgi foi o sistema Pensilvânico ou Filadéfico, inaugurado em 1790 na prisão de Wanut Street, o conceito deste sistema era baseado em nas convicções religiosas ou no direito canônico, tendo como percursores Benjamin Franklin e Willian Bradford. Segundo o sistema, o condenado era isolado em cela individual, vedado de qualquer tipo de contato com o mundo exterior, era autorizado somente e caráter excepcional passeios ao pátio da prisão e a leitura da bíblia, parra que o condenado se arrepende-se de sua conduta e alcançar o perdão divino. Para Cezar Roberto Bittencourt o sistema Filadéfico, era “o início definido do sistema filadélfico surgi com influências das sociedades integradas pelos mais respeitáveis cidadãos daquela região e tinha como objetivo reformar as prisões”.
Após críticas severas ao sistema pensilvânico, surgiu no ano de 1818 na cidade de Auburn em Nova York, o sistema Auburianio, deixando de lado o isolamento absoluto do preso e permitindo o trabalho em grupo, sob o silêncio absoluto e confinamento solitário durante a noite. Acreditava-se que impedindo a comunicação entre os presos, estaria buscando a reflexão e o arrependimento pessoal, bem como, impedindo a contaminação moral entre os presos.
O sistema Auburiniano tinham a preocupação em auferir renda para a manutenção das prisões, ganhos estes advindos do trabalho dos presos. Porém, este sistema sofreu pesadas críticas em virtude da pressão das associações sindicais que se opuseram ao desenvolvimento de um trabalho penitenciário, pois a produção nas prisões representava um custo menor e geraria uma competição de mercado.
Na Inglaterra surgiu o sistema progressivo de pena, onde tem como essência distribuir o tempo de duração de pena em períodos, onde o recluso ao adimplir em cada um período terá direito a privilégios de acordo com sua boa conduta, possibilitando até seu retorno gradual a sociedade.
Por fim, o ultimo sistema penitenciário são os reformatórios, que são destinados a um grupo específicos de custodiados, que são adolescentes e jovens adultos, que visa suas reinserções ao convívio social e a educação.
2.3. Origem e conceito do sistema progressivo.
O foco principal ou conceito deste sistema está baseado na possibilidade do custodiado, de forma gradual voltar para o convívio social e busca incentivar o senso de responsabilidade dos mesmos, através da progressão de regime com o adimplemento de boa conduta e do trabalho por parte do preso. Tendo como preocupação proporcionar uma gradual e nova adaptação do recluso a sociedade, introduzindo o trabalho como forma de qualificação profissional para o condenado utilizar após a prisão, garantindo uma vida honesta e a responsabilidade sobre o dano causado.
O sistema progressivo de pena teve duas vertentes ou melhor origens, inglesa e irlandesa. Na vertente inglesa, chamada de sistema inglês ou Mark System, idealizado por Alexander Maconochie,a pena era dividida em três períodos.
O primeiro período era denominado como 1 fase: isolamento celular diurno e noturno, chamado também de período de prova. O custodiado deveria refletir sobre a sua conduta, era submetido a trabalho obrigatório e a escassez de alimento. Na segunda fase, o sentenciado era recolhido na denominada Public Worhouse, onde era realizado o trabalho em comum entre os presos, porém havia regras de silêncio absoluto e segregação social durante o período noturno. Durante este período, surgiu o sistema de classes, onde que medida que detento obtivesse bom comportamento, evoluía dentro das classes, até ao final fosse concedida a liberdade condicional.
O último período do sistema progressivo inglês, era a liberdade condicional, na era inicialmente concedida uma liberdade limitada com restrições por determinado tempo, se nada o indivíduo fizesse para desonrar sua conduta, era concedida a liberdade definitiva.
No que tange o sistema irlandês, este foi criado por Walter Crofton, criando a chamada fase intermediaria, que estava entre prisão e a liberdade condicional, sendo chamada de prova de aptidão para averiguar se o custodiado está apto a retornar ao convívio social. Na fase intermediaria os detentos eram recolhidos em penitenciarias especiais, eram realizados trabalhos agrícolas ou industriais na parte externa das penitenciarias.
Os presos muitas vezes viviam em barracas dispostas pela área externa da prisão, eram concedidos alguns benefícios tais como: a não utilização de uniformes, dispor de parte da remuneração auferida pelo seu trabalho e conversar com a população em geral.
O sistema progressivo irlandês foi o que mais se difundiu pelo mundo, sendo utilizado até hoje por alguns países, com pequenas modificações.
2.4. Sistema progressivo no Brasil
A prisão no Brasil, surgiu no ano de 1551, em Salvador- Bahia, onde era a sede e capital do país, as prisões eram em locais com boa estrutura com casas de audiência e câmaras. Com o passar do tempo problemas foram surgindo e cadeia eram cada vez mais em locais insalubres.
Com advento da proclamação da república nasce preocupação dos governantes com a situação das cadeias. Nesse período Dom Pedro II, principie regente, sanciona um decreto que dispõe que ninguém será lançado em masmorras escuras ou infecta, pois, a prisão não serve para adoecer ou flagelar ninguém.
No ano de 1830, entrou vigor o código penal do período do império, onde a pena era vista como forma de punição, aos escravos eram dadas as penas mais severas como a pena de morte e os acoites em praça pública. Posteriormente, em meados do ano de 1890, foi elaborado o código penal republicano, no qual trazia a prisão disciplinar, o trabalho obrigatório, criação de estabelecimentos agrícolas, reclusão em fortalezas e prisão celular, o qual começou a declinar em pouco tempo devido a superlotação e o retorno a delinquência.
Somente com a outorga da constituição federal de 1891, que dispunha em seu texto a função ressocializadora da pena e passou a vigora este conceito no código penal de 1940, o qual tem como objetivo central ressocializar o preso.
No código foram adotados dois sistemas: o panóptico e o progressivo, com influencias do sistema irlandês, onde era adotado uma forma de progressão de pena, na qual os detentos eram transferidos para prisões intermediarias, com regime de vigilância mais suave, com permissão para conversar e trabalhar no campo. Várias alterações deram os moldes atuais do sistema progressivo de pena no país, bem como, o nascimento do Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84), com a finalidade de concretizar os fins da pena, ou seja, punir o condenado pelo ato ilícito praticado, impedir a pratica da conduta punida, impedir a reincidência e ressocializar o agente.
Para isso os crimes são punidos conforme o total de pena imposta, nos regimes fechado, semiaberto ou Aberto. Crimes com pena maior de 08 anos será aplicado o regime inicial fechado; para crimes com pena maior que 04 anos e menor ou igual a 08 anos será aplicado o regime semiaberto, caso não seja reincidente; penas menores ou igual a 04 anos será aplicado o regime aberto.
As penas são cumpridas em locais e condições diversas. O regime fechado é cumprindo em estabelecimento penitenciário com cela individual, devendo ser afastando dos centros urbanos. O estabelecimento destinado ao regime semiaberto são as colônias agrícolas, industrial ou estabelecimento similar, ficando o condenado sujeito ao trabalho diurno comum. Por fim, no regime aberto os apenados ficam fora do estabelecimento prisional, permanecendo recolhidos durante o período noturno e dias de folga, possibilitando o acesso ao trabalho e escola. Após, o cumprimento integral de sua pena em um destes regimes, a pena será extinta e o condenado ficara sob liberdade.
A reintegração ao convívio social pelo sistema progressivo é dada após aplicação do regime inicial de pena. Compreendendo critérios de tempo (objetivo) e comportamento (subjetivo) com admiplemento desses requisitos o apenado poderá ser transferido para regime penal menos gravoso ao incialmente imposto.
O critério objetivo ou temporal compreende a fração de 1/6 para crimes comuns aplicado sob o total de pena imposta, em crimes hediondos a fração é de 2/5 para réu primário e para reincidentes 3/5. Aliado ao critério objetivo tem-se o critério subjetivo que corresponde a disciplina carcerária e ausência de falta disciplinar. Por outro lado, com a presença de falta grave após anuência do ministério público tem -se a regressão de regime para o mais gravoso.
3.Situação dos presídios brasileiros
Desde dos primórdios as civilizações utilizam de diversos sistemas punitivos para reprimir os danos ou ameaça de danos sofridos. O primeiro sistema utilizado foi denominado período de vingança onde a justiça era exercida por quem sofreu o dano, baseando - se na famosa Lei de Talião, onde o mal provocado era punido de modo igual.
Com o advento da evolução história e do iluminismo, passou a se ter uma nova ideia sobre a pena, saindo da esfera simplesmente punitiva e repressiva, passando ao caráter humanitário voltado para dignidade dos indivíduos, assim começaram a existir sistemas penais que agregavam o punir e o de ressocializar.
No Brasil com a elaboraram novo código penal e com advento da constituição federal que previa a função ressocializadora da pena, foi adotado o sistema progressivo de pena. Sistema este advindo do aplicado na penitenciaria de Norfolk- Irlanda, visando a reintegração gradativa do preso ao convívio social.
Com base nos dados do Banco de Monitoramento de Prisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no ano de 2017, o país possua aproximadamente 812 mil presos, sendo 41,5% presos provisórios que ainda aguardam julgamento. Vale salientar que a capacidade máxima das penitenciárias espalhadas pelo país é de 415 mil presos, tendo assim um número inferior de vagas para o total de custodiados. Sendo considerada a quarta maior população carcerária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia.
Com um número tão alto de custodiado para um número inferior de vagas, o sistema brasileiro sofre com constantes colapsos devido a superlotação, insalubridade e insegurança dos presídios. Com base no relatório divulgado pela ong Human Right Wath em 2015, foi constatado que no Estado de Pernambuco é onde se encontram as celas mais superlotadas do país, a taxa de ocupação prisional chega a 165%, por isso parte do controle das prisões ficam sobre as mãos dos condenados. No Estado do Pernambuco, é nítido o alto índice populacional carcerário, pois, na cidade de Itamaracá, o presidio tem capacidade para 630 presos, mas abriga um total de 2,3 mil presos.
Aliados a estes fatores tem- se alta taxa de criminalidade, pôr conta da onda crescente reincidência dos ex presídios que voltam a delinquir por aliar-se a facções criminosas ou em busca de sua sobrevivência. No livro a questão penitenciaria de Augusto Thompson (1991) o autor previa que a solução para os problemas no sistema carcerário não iria ser facilmente encontrada.
No momento, esposo o ponto de vista de que a questão penitenciária não tem solução em “si”, porque não se trata de um problema “em si”, mas parte integrante de outro maior: a questão criminal, com referência ao qual não desfruta de qualquer autonomia. A seu turno, a questão criminal também nada mais e que mero elemento de outro problema mais amplo: o das estruturas socio políticas econômicas. Sem mexer nestas, coisa alguma vai alterar-se em sede criminal e, menos ainda, na área penitenciaria.
3.1. Superlotação nos presídios.
Sem dúvida o maior problema que assola as cadeias penitenciarias espalhadas pelo Brasil, por anos. Um dos maiores fatores para falência e decadência do sistema, pois afeta ou agrava outros problemas já existentes.
As soluções dadas por diversos Estados têm surtido efeito, porém ainda a situação nos presídios é crítica, pois, se tem cada vez mais um número maior de reincidência e custodiados que aguardam julgamento.
A realidade nos presídios é desumana, desrespeitando geralmente o princípio da dignidade da pessoa humana, princípio consagrado no art.1° da Constituição Federal. Devido a superlotação os apenados dormem no chão, em ambientes muito pequenos e com grande quantidade de pessoas, pouca iluminação e ventilação, ocasionando diversos problemas de saúde e favorecendo a proliferação de doenças contagiosas, gerando um novo problema que é a falta de assistência medica.
3.2. Rebeliões e massacres nos presídios
A mais de 27 anos, um dos maiores presídios do país entrava em colapso. A Casa de Detenção de São Paulo ou Carandiru teve sua história marcada por motins e rebeliões, a última rebelião teve o total de 111 mortos de acordo com dados oficiais, porém, os dados extraoficiais apontam um número maior de 250 mortos. Inaugurada em 1920, a Casa de Detenção de São Paulo, com capacidade para 1.200 presos, teve sua capacidade ampliada na década de 50, porém nas décadas seguintes o número de detentos já extrapolava a capacidade total, devido ao aumento da criminalidade e falta de investimento na estrutura.
Popularmente conhecido como massacre do Carandiru, no dia 02 de outubro de 1992, cadeia com capacidade para 3.300 presos, contava com 7.000 detentos, o que levou 111 mortes, 153 feridos. 515 tiros disparados e 120 policiais indiciados. O caso é cheio de controvérsias sobre o real motivo do atentado, de um lado a versão do policias que sustentam o estrito cumprimento do dever legal e do outra a versão dos direitos humanos, que alega houve a intensão por parte dos policiais em exterminar em massa os presos.
A penitenciaria do Carandiru era dividida em pavilhões, sendo que cada pavilhão abrigava detentos com características peculiares. Nos pavilhões 2 e 8 eram respectivamente onde se encontravam os recém chegados e os reincidentes, no qual tinham acesso as primeiras palestras sobre as regras da detenção. O pavilhão 9, o qual abrigava réus primários foi no qual justamente ocorreu o estopim do massacre, durante uma partida de futebol, na qual foi motiva por presos de facções rivais.
Na tentativa de conter a rebelião, cerca de 300 policiais adentram o local, tendo como resultado a morte de 111 presos. Em represaria ao massacre ocorrido na Casa de Detenção de São Paulo, surgi a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), criada em 31 de agosto de 1993 na casa de custódia de Taubaté. O grupo surgiu com o objetivo de combater a opressão no sistema prisional paulista, possuindo membros em 22 Estados da federação.
Anos após, o sistema carcerário brasileiro entrou em colapso e as rebeliões cada vez eram mais presentes no cotidiano das cadeias públicas espalhadas pelo país. Em 2017, o país viveu novamente triste realidade dos massacres em massa dos custodiados. No dia 01 de janeiro de 2017, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim- COMPAJ localizado em Manaus, foram mortos 56 detentos e 130 custodiados fugiram. Desencadeada pela guerra entre as facções rivais e em protesto a superlotação. O complexo abrigava presos do regime semiaberto e fechado, com um excedente de 1.235 presos.
A rebelião iniciou por volta a 16 h, quando alguns detentos da facção Família do Norte (FDN), invadiram o pavilhão 3, no qual se encontravam presos considerados vulneráveis e de outras facções criminosas, o denominado seguro, onde se encontravam 26 detentos. O principal objetivo era invadir as celas onde se encontravam os membros da facção do PCC, como não foi possível, os detentos atearam fogo em colchões, matando quem se encontrava nas celas de asfixia ou a tiros.
Durante ação, os detentos utilizaram um dos pavilhões como local para finalização das mortes, lá eram arrastados ainda vivos para o local, onde ocorria as decapitações e os esquartejamento.
Ao todo 86 pessoas foram feitas reféns, sendo 12 funcionários da empresa que presta serviço para o sistema penitenciário do Amazonas. A rebelião somente chegou ao fim no dia 02 de janeiro de 2017, quando os últimos reféns foram liberados.
Após 9 meses do massacre, o inquérito policial que investigou a autoria, mortes e fugas da rebelião foi concluído, indiciando um total de 210 por participação nas mortes. As investigações apontaram que ordem para todo o massacre, veio do líder da facção criminosa FDN por meio de uma carta. A carta revela que o motivo do massacre era uma medida disciplinar contra a facção rival.
Uma das medidas adotadas para diminuir as tensões, foi transferir parte dos detentos para presídios federais e implantar um efetivo da força nacional no ramal que dá acesso ao complexo.
Mesmo com as medidas adotadas o Estado do Amazonas, novamente foi algo de um novo massacre em suas cadeias. Em 2019, menos de 2 anos do massacre no COMPAJ, esta que teve como cenário as 4 cadeias principais cadeias da cidade Manaus, tento um total de 55 mortos em dois dias de rebelião, sendo a principal causa a disputa de território por facções rivais.
Diante das rebeliões e colapso no sistema prisional, é necessário pensar nas políticas públicas e implantar medidas alternativas eficazes.
4. Ressocialização
4.1. Conceito de Ressocialização
Ressocializar ou ressocialização tem como significado a inserção na sociedade, processo de ressocializar, de voltar a pertencer, a fazer parte de uma sociedade. Na área do Direito Penal a palavra seu sentido voltado para reeducação social do apenado durante e após o cumprimento de pena, abrangendo um conjunto de ações que tem como objetivo a readaptação do preso na sociedade, contribuindo para melhoria do custodiado nos aspectos psicossociais, profissionais e educacional, com finalidade de inibir qualquer ato de reincidência.
O processo de ressocialização demanda ações que integram o Estado, o preso e sua família para que desde a condenação e execução da pena, o apenado já possa iniciar seu processo de recuperação. A família surge como parte e suporte importante neste processo, pois, a ligação afetiva ajuda os presos a superar os desafios, de natureza emocional, assim sendo, não somente o cumprimento de pena garante a restituição de valores humanos ao apenada, é necessário que haja esforços para traçar medidas para reeducação social e que possam reestabelecer o stuo quo social.
Para o doutrinador Mirabete (2008, p.23),[...] o direito, o processo e execução penal constituem apenas um meio para a reintegração social, indispensável, mas nem por isso o de maior alcance, porque a melhor defesa da sociedade se obtém pela política social do Estado e pela ajuda pessoal.
A prisão é massacrante para o detento, por isso somente o cárcere não consegui cumprir a função reeducadora, pois lá não propicio para tal finalidade, gerando aspectos e influencias inadequadas para uma reabilitação satisfatória.
Molina (2008, p383) propõem que ressocialização deve ser vista e aplicada como uma intervenção positiva no condenado “...O habilite para integra-se e participar da sociedade, de forma digna e ativa, sem traumas, limitações ou condicionamentos especiais”.
É necessário que o sistema prisional busque meios que possam contribuir para não apenas a execução de pena unilateral, mas também que englobem a inserção na sociedade pós cumprimento ou extinção de pena.
4.2. Ressocialização na legislação brasileira
A Lei de Execuções Penais – LEP, é o principal instrumento para adoção de políticas públicas voltas para ressocialização do preso em face ao cumprimento de sentença. O art.1° da referida Lei traz logo de início que a função da execução penal é dar efetividade a sentença e proporcionar condições para uma harmônica interação social do condenado. É nítido que a lei tenta proporcionar um ambiente adequado para o condenado, embora não sido empregada de maneira satisfatória e efetiva.
O sistema penal almeja com a pena privativa de liberdade proteger a sociedade e cuidar para que o condenado seja preparado para ressocialização. Mirabete (2002, p.24) afirma “A ressocialização não pode ser conseguida numa instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciarias, tendem a converte-se num microcosmo no qual se reproduzem e se agravam as grandes contradições que existem no sistema exterior”.
Além de dar efetividade a execução da pena, a Lei de Execução buscar zelar pelos direitos e deveres do preso. De acordo como o artigo 3° ao condenado ou internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença. Estão entre os direitos do preso consagrado no artigo 44 da Lei de Execução Penal, alimentação suficiente e vestuário, atribuição de trabalho e sua remuneração.
O direito do preso e assistência é uma das formas iniciais do processo de reabilitação, buscando resgatar os valores humanos, sociais e individuais, garantido assistência material, jurídica, a saúde, educacional, social e religiosa.
4.3 Ressocialização através do trabalho
Um dos métodos para buscar ressocializar o preso, é através da possibilidade de o condenado exercer alguma atividade durante o cumprimento de pena, preparando e qualificando o detento para reingresso ao mercado de trabalho. A LEP nos artigos 28,29 e 30, trata o trabalho do condenado como um dever social e condição digna humana, tendo finalidade educativa e produtiva.
Cada artigo traz a forma e como o trabalho será executado dentro das penitenciarias, respeitado as precauções de segurança e higiene, consagradas na Consolidação da Leis Trabalhista, embora o trabalho do preso não está sujeito ao regime celetista. O preso será remunerado pelo trabalho prestado, mediante a previa tabela, não devendo ser inferior a ¾ do salário mínimo.
O trabalho é a forma de mostrar para sociedade que preso pode se ressocializar e além disso tornar útil o tempo ocioso do preso, bem como, uma forma do poder público de diminuir os gastos, tendo em vista que os próprios apenados podem desenvolver atividades dentro das penitenciarias a fim de evitar serviços terceirizados.
Além do benefício de natureza salarial, o apenado pode conseguir a diminuição de sua pena através do trabalho prestado. A remissão de pena é o instituto que permite ou possibilita o condenado a reduzir o tempo de duração de sua pena, seja a pena privativa de liberdade em regime fechado ou semiaberto.
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias; (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)
II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.
§ 2o As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.
§ 3o Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 4o O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição
§ 5o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
§ 6o O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.
§ 7o O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar. .(§ 8o A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.
Com a atividade laboral, o preso diminui o tempo de duração de sua pena, pois, como menciona o artigo 126 da Lei de Execuções Penais- LEP, para cada três dias trabalhados será diminuído um dia de pena. O tempo remido é contado como de execução da pena privativa de liberdade, o tempo remedido não deverá ser computado ou abatido do total da sanção aplicada.
O trabalho poderá ser devolvido e remissão obtida pelo trabalho interno ou externo, manual ou intelectual, agrícola ou industrial desde que seja autorizado pelo estabelecimento prisional. O dia trabalhado, só será contado como remissão, se o preso desempenhar sua jornada completa de trabalho, ou seja, a jornada deverá ser em um período não inferior a 6 horas e nem superior a 8 horas.
Ao desempenhar a atividade deverá o apenado obedecer às normas e disciplinas do trabalho interno ou externo. Em caso de descumprimento, será sujeito a punições, tendo em vista que qualquer infração grave ou que trouxer prejuízos para empresa credenciada ou para administração pública, perderá o direito de trabalhar, voltando ao cumprimento normal de sua pena, sem qualquer tipo de benefício de trabalho, perdendo também os dias conquistados com a remissão.
5. Alterações feitas pelo pacote anticrime para progressão de pena e ressocialização
O pacote anticrime ou melhor Lei 13.964/19, sancionada em 24 de dezembro de 2019.Traz alterações no que tange o art. 112 da Lei de Execuções Penais, o qual se refere a progressão de regime.
Como já mencionado a progressão de regime antes da vigência da referida lei, era computada pelo cumprimento de 1/6 da pena para réu primário crime comum, 2/5 crime hediondo e 3/5 para reincidente de crime hediondo. Porém a lei trouxe uma série de novos critérios para conceder o benefício da progressão.
Com o advento da lei a progressão ocorrera da seguinte forma:
I – 16% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II – 20% da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
III – 25% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
IV – 30% da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V – 40% da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI – 50% da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, VEDADO O LIVRAMENTO CONDICIONAL;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII – 60% da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII – 70% da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, VEDADO O LIVRAMENTO CONDICIONAL.
Diante destes fatores, a progressão se tornou mais complexa e variado de caso para caso, admitindo a necessidade de reincidência específica para configurar réu reincidente.
6. Medidas Alternativas a crise no sistema penitenciário
É necessário adoção de medidas alternativas para diminuir os problemas enfrentados nas cadeias e além disso efetivar o caráter ressocializador da pena, estas medidas não são novidades, pois, algumas encontram-se dispostas no código de processo penal, LEP e no código penal, como a prisão domiciliar, uso de tornozeleira eletrônica e entre outras, que podem privar parcialmente a liberdade do condenado ou retirar alguns direitos.
Em fevereiro de 2015, o Conselho Nacional de Justiça-CNJ, lançou o projeto Audiência de Custódia, que visa garantir a apresentação do preso ao juiz de custódia no prazo máximo de 24 horas, com a participação do Ministério Público e Defensoria Pública nos casos de prisão em flagrante. O objetivo do projeto é analisar a legalidade da prisão, irregularidades e necessidade da aplicação de medida alternativa. Com a implementação do projeto foi reduzido 45% dos números de prisões provisórias no Estado de São Paulo, vindo o CNJ em 2016 editar regulamento ao Poder Judiciário para adoção nacional do projeto.
Como medida para reduzir o número de custodiados, o Estado do Amazonas no ano de 2018, com decisão dos juízes da Vara de Execuções Penais- VEP, decidiu fechar o sistema semiaberto e implementar o uso de tornozeleira eletrônica aos custodiados neste regime, tento reduzir a superlotação do sistema carcerário.
Não somente projetos voltados para liberdade e legalidade da prisão foram criados, mas também, programas que envolvem a ressocialização e reequação do preso no mercado de trabalho. Como exemplo se tem o Projeto Transformar, criado pelo governo do Estado do Amazonas, que visa oferecer qualificação técnica aos apenados em parceria com o Centro de Educação Tecnológica do Amazonas- CETAM, garantindo o certificado de qualificação e além disso requisito para participar do programa de fomento ao microempresário.
Além, há projetos que visam a redução de pena juntamente com a educação. O projeto Lendo para Liberdade criado em parceria com a FUNAP, atende 19 presídios do Estado de São Paulo, objetivando a produção de resenhas críticas após leitura de obras literárias, assim reduzindo alguns dias de pena.
7. Considerações Finais
Diante de tais questões, é notário a complexidade do tema e falta de políticas públicas eficazes. A dúvida ou pergunta que fica é qual é a solução para os problemas do sistema carcerário e quem são os culpados? A sociedade, O Estado, a família ou o próprio preso.
Embora não se saiba dizer ao certo quem ou quais os culpados, o problema só aumenta e não se encontra quaisquer soluções. A sociedade tem sua parcela de culpa, visto que cada dia aumenta o índice de pobreza, desemprego e da desigualdade social, refletindo no aumento de violência e crimes. O Estado em sua precariedade, deixa a desejar no que tange insta estrutura nos presídios, políticas públicas, poder coercitivo e ressocializador, E por fim o preso em seus padrões subjetivos e no tocante de não voltar a reincidência.
Há um embate político e doutrinário para saber qual seria a formula mágica para resolver os problemas enfrentados. A criação de mais presídios, pena mais cruéis, a implantação da pena de morte, o fim das prisões ou a adoção de penas alternativas, todas essas teorias são especuladas a anos e algumas ganharam força com a atual gestão de Governo. O senso comum tem lutado por anos para adoção da pena de morte no Brasil, contrariando uma das cláusulas pétreas e as experiencias vivenciadas por outros países, como por exemplo os Estados Unidos, quem vem buscando fim da pena de morte em alguns de seus Estados, tendo em vista a arbitrariedade do sistema.
Por fim, é necessário é a readequação e o estudo para reavaliação do Sistema Carcerário Brasileiro e a implantação de tratamento subjetivo ressocializador, englobando aos apenados novo conceitos de cumprimento, valores, conscientização e de reabilitação a sociedade.
8. Referências
MIRABETE, Júlio Fabbrine; FABBRINE, Renato N. Manual de Direito Penal. Parte Geral. Arts. 1º a 120 do CP. 24ª Edição. Revista e Atualizada. Editora Atlas. São Paulo - 2007.
GRECO, Rogério. Sistema Prisional: colapso atual e soluções alternativas. 2. ed. rev. ampl. e atual. Niterói, RJ: Impetus, 2015.
BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. p.26-27.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel MASSON,
Cleber Rogério. Direito penal esquematizado: Parte geral. 4. ed. rev„ atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 55. Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987.
Acadêmica no Curso de Graduação em Direito do Centro Luterano de Manaus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, bianca batista da. A ressocialização do preso nos presídios brasileiros Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 ago 2020, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55120/a-ressocializao-do-preso-nos-presdios-brasileiros. Acesso em: 25 nov 2024.
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