RESUMO: Partindo da concepção de processo civil como instrumento da tutela jurisdicional de direitos e da existência de um direito fundamental à tutela efetiva, e identificando no efeito suspensivo automático da apelação um entrave à efetividade, o artigo trata da retirada deste efeito pela sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória (Código de Processo Civil, art. 1.012, §1º, V). O mecanismo é abordado sob o prisma do conflito entre a efetividade, ferida pela demora no esgotamento dos recursos com efeito suspensivo, e a segurança jurídica, ameaçada pela exequibilidade imediata de decisões judiciais de primeiro grau que poderão ser revertidas. Indica-se uma proposta de sistematização para aplicação da técnica da tutela provisória na sentença com o objetivo de conciliar as garantias em comento, melhorando a prestação jurisdicional e reduzindo os prejuízos de sua natural demora.
Palavras-chave: Efetividade. Segurança jurídica. Efeito suspensivo da apelação. Tutela provisória.
SUMÁRIO. 1. INTRODUÇÃO 2. O EFEITO SUSPENSIVO DA APELAÇÃO COMO ÓBICE À TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA 3. AS TUTELAS PROVISÓRIAS NO CPC/2015 4. A CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA NA SENTENÇA COMO TÉCNICA DE RETIRADA DO EFEITO SUSPENSIVO DA APELAÇÃO (ART. 1.012, §1º, V, DO CPC) 5. UMA PROPOSTA DE SISTEMATIZAÇÃO PARA A ADEQUADA UTILIZAÇÃO DA TUTELA PROVISÓRIA NA SENTENÇA COMO INCREMENTO DA EFETIVIDADE DO PROCESSO5. 5.1. Condições para a concessão da tutela provisória na sentença. 5.2 A precariedade das tutelas provisórias concedidas na sentença e o dever ético dos advogados de informar o exequente de sua responsabilidade objetiva. 5.3 O dever dos tribunais de manter a jurisprudência estável e seu impacto na antecipação de tutela na sentença. 6. Considerações finais. 7. Referências.
1.INTRODUÇÃO
A tempestividade na entrega do bem da vida ao detentor do direito é preocupação central da busca pelo processo justo. O peso dessa atividade estatal, por outro lado, impõe a adoção de cautelas que inevitavelmente estendem sua duração. Trata-se de um exercício dialético permanente de conciliação entre o direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional (MARINONI, 2012) e a garantia de segurança jurídica, ambos pilares do Estado de Direito.
Cabe à Ciência Processual a descoberta e estudo de mecanismos que possibilitem essa harmonização, tarefa que passa não só pela formulação de propostas ao legislador, mas também pela incessante reflexão sobre os preceitos postos pela lei vigente, impulsionando o seu melhor emprego possível na prática.
Um dos domínios em que o embate entre os princípios da efetividade e da segurança jurídica mais claramente se manifesta é o do sistema recursal, porque o efeito suspensivo de que alguns recursos são dotados impede que a decisão recorrida tenha eficácia antes do julgamento da impugnação.
A despeito de forte crítica doutrinária, o Código de Processo Civil de 2015 não eliminou o efeito suspensivo automático da apelação. O objeto desse trabalho, entretanto, deteve-se na hipótese excepcional de retirada deste efeito pela concessão de tutela provisória na sentença, conforme art. 1.012, §1º, V, do CPC (BRASL, 2015).
A técnica do art. 1.012, §1º, V do CPC, embora expressamente prevista em lei, encontra grandes desafios de aplicação prática que resultam, por exemplo: (i) em sua utilização parca ou repleta de atecnias quando cabível, perdendo-se oportunidades de aumentar significativamente a efetividade do processo; (ii) na aplicação indevida e indiscriminada a casos que não a recomendam, ocasionando graves prejuízos a ambas as partes; (iii) na subversão de seu sentido quando, embora corretamente adotada em primeiro grau de jurisdição, a tutela provisória é revogada pelos órgãos recursais em virtude de alteração superveniente do entendimento jurídico sobre a matéria, especialmente no contexto de aplicação de precedentes.
O presente artigo tem por objetivo a abordagem sistemática da utilização da tutela provisória na sentença, enfrentando suas dificuldades práticas a fim de descrever o modo adequado de sua aplicação como técnica de incremento da efetividade processual, com base no dever de cooperação entre todos os sujeitos processuais para o alcance de decisão de mérito justa e efetiva (art. 6º do CPC/2015). Espera-se delimitar parâmetros firmes para a aplicação deste profícuo mecanismo, conciliando-se os fundamentais valores da segurança e da efetividade.
A escolha do tema partiu da observação diária da prática forense do ponto de vista do magistrado, o que nos foi possibilitado pela realização de estágio, por dois anos, no gabinete da Juíza Federal Substituta da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Juiz de Fora - MG. O contato com inúmeros processos na fase de sentença fez surgir inquietação quanto à utilização da tutela provisória neste momento, muitas vezes eivada dos vícios acima apontados de forma a reclamar melhor apuro técnico, fundamentação e sistematização. Esse refinamento foi buscado na doutrina de processualistas atentos à importância e aplicabilidade da técnica, sem descuidar de aprofundado olhar para suas bases constitucionais.
A análise do conteúdo é do tipo qualitativa e se valeu de fontes secundárias (livros e artigos doutrinários e acórdãos de tribunais), promovendo-se revisão bibliográfica e análise jurisprudencial. O marco teórico tem por fundamento as lições de Marinoni, Arenhardt e Mitidiero (2017), que compreendem a jurisdição a partir do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, o que abrange as medidas antecipatórias.
2.O EFEITO SUSPENSIVO DA APELAÇÃO COMO ÓBICE À TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA
A Constituição Federal prescreve a inafastabilidade da jurisdição como direito fundamental no art. 5º, XXXV (BRASIL, 1988). Não se trata, porém, de garantia de mera resposta jurisdicional, mas de verdadeiro acesso à justiça que proporcione a quem tem um direito sua total satisfação, para a qual o processo é mero instrumento[1]. Em outras palavras, direito fundamental de ação é direito à tutela jurisdicional efetiva, ou seja, “direito de fazer valer os próprios direitos” (MARINONI, 2012, p. 12).
No entanto, o longo tempo necessário à obtenção de uma decisão definitiva sobre a lide é prejudicial à parte autora que tem um direito material violado, mas que, diante da vedação à autotutela, não pode se utilizar de meios próprios para fazê-la valer, sendo obrigada a recorrer ao Estado-juiz e esperar sua resposta. Por isso, o tempo do processo é um ônus, e sua justa distribuição entre as partes também integra o direito à tutela efetiva (MARINONI, 2012, p. 24)
No ordenamento processual brasileiro, o impedimento da produção imediata dos efeitos da sentença causado pelo efeito suspensivo automático da apelação é nítido obstáculo à prestação jurisdicional tempestiva, condicionando a entrega do bem da vida ao julgamento do recurso, que pode demorar anos[2]. Por outro lado, tratando-se de mecanismo de imposição da vontade estatal ao particular, o processo é preenchido por prerrogativas de proteção de quem se encontra no polo passivo, as quais inevitavelmente prologam sua duração.
Essas garantias do réu, que são corolários do princípio da segurança jurídica, servem para promover o equilíbrio processual, ainda que possam negativamente afetar sua efetividade. Diz-se que o sacrifício é da efetividade, e não da razoável duração do processo, porque sua demora não é sinônimo de afronta à razoabilidade, como aponta Fredie Didier Junior ao criticar a busca desenfreada pelo suposto direito à “celeridade” em detrimento do devido processo:
Não existe um princípio da celeridade. O processo não tem de ser rápido/célere: o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional. Bem pensadas as coisas, conquistou-se, ao longo da história, um direito à demora na solução dos conflitos. A partir do momento em que se reconhece a existência de um direito fundamental ao devido processo, está-se reconhecendo, implicitamente, o direito de que a solução do caso deve cumprir, necessariamente, uma série de atos obrigatórios, que compõem o conteúdo mínimo desse direito. A exigência do contraditório, os direitos à produção de provas e aos recursos certamente atravancam a celeridade, mas são garantias que não podem ser desconsideradas ou minimizadas. É preciso fazer o alerta, para evitar discursos autoritários, que pregam a celeridade como valor. Os processos da Inquisição poderiam ser rápidos. Não parece, porém, que se sinta saudade deles. (DIDER JUNIOR, 2017, p. 110)
A regra geral é que os recursos não tenham efeito suspensivo, conforme o art. 995 do CPC (BRASL, 2015). O Código de Processo Civil o atribui automaticamente a apenas três: a apelação e os recursos especial ou extraordinário interpostos contra decisão que julga incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 987, §1º) (BRASL, 2015). Autoriza, no entanto, que o relator o conceda, nos casos em que a lei não o faz, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso (art. 995, parágrafo único do CPC/2015).
Este efeito recursal pode-se classificar como uma das garantias de que trata Didier. Protege-se com ele o vencido, que tem interesse em impedir que o ato decisório potencialmente injusto produza efeitos antes de confirmado em grau de recurso. Trata-se, na verdade, de remédio contra a falibilidade das decisões judiciais: o ordenamento processual, prevendo que determinado provimento pode ser reformado, prefere mantê-lo em estado de ineficácia, evitando que dê ensejo a situação jurídica indevida.
Muito se discutiu, entretanto, a respeito da manutenção do efeito suspensivo automático da apelação pelo novo Código de Processo Civil. Grande parte da doutrina defendia seu abandono, elevando à regra geral a exequibilidade provisória da sentença. Destacavam os defensores da alteração[3] que disposições semelhantes já são adotadas em vários microssistemas processuais, como o recurso ordinário da Justiça do Trabalho, conforme art. 899 da Consolidação das Leis de Trabalho (BRASIL, 1943), a apelação nos processos regidos pela Lei de Locações, art. 58, V, da Lei n. 8.245/91 (BRASIL, 1991), e pela Lei de Ação Civil Pública, art. 14 da Lei n. 7.347/85 (BRASIL, 1985), além do recurso inominado nos Juizados Especiais Cíveis, Federais e da Fazenda Pública, art. 43 da Lei n. 9.099/95 (BRASIL, 1995).
Contrariamente à expectativa destes doutrinadores, no entanto, e ao projeto de código inicialmente aprovado pelo Senado, o texto foi alterado na versão aprovada pela Câmara dos Deputados, mantendo-se a regra do art. 520 do CPC/73 que consagra o efeito suspensivo automático da apelação (art. 1.012 do CPC/15).
Em que pese a manutenção da regra, o CPC/15, preservando a tradição da lei anterior, consagra um extenso rol de exceções ao efeito suspensivo automático da apelação, ou seja, casos em que o recurso é recebido apenas no efeito devolutivo, autorizando a execução imediata da sentença, ainda que provisória, conforme art. 1.012, §1º e art. 520, caput do CPC. Entre essas hipóteses figura a sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória (art. 1.012, §1º, V). Tem-se neste mecanismo, portanto, o que se pode chamar de uma técnica de retirada do efeito suspensivo da apelação, cuja análise requer, inicialmente, uma breve abordagem do tratamento dado pelo CPC/2015 ao gênero das tutelas provisórias.
A busca da tempestividade da tutela dos direitos tem como valiosa aliada a técnica antecipatória, que o Código de Processo Civil de 2015 denominou de “tutela provisória”. Fundamentada em urgência ou evidência (art. 294 do CPC/2015), chama-se “provisória” porque pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada (art. 296 do CPC/2015), diferentemente da tutela definitiva, que é capaz de se tornar imutável pelo alcance da coisa julgada (art. 502 do CPC/2015).
A tutela de urgência pode ter natureza cautelar ou antecipada, conforme se preste, respectivamente, a preservar um direito ou a antecipar sua fruição. Contudo, a distinção entre as espécies perde importância prática na medida em que o parágrafo único do art. 305 do CPC (BRASIL, 2015) as considera fungíveis[4], sendo certo que, na perspectiva de tutela dos direitos, a tutela cautelar serve igualmente para protegê-los, e não o processo. Ademais, a tutela de urgência tem como requisitos, além da probabilidade do direito, o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do art. 300 do CPC (BRASIL, 2015).
As expressões utilizadas pela lei não são as melhores porque, a uma, não é só o perigo de dano que pode ser afastado pela antecipação de tutela, mas também o perigo de ilícito, que prescinde da ocorrência daquele e é rechaçado autonomamente pelo ordenamento (art. 497, parágrafo único do CPC/2015). A duas, porque é mais precisa a compreensão de que o risco não é ao processo, mas ao direito material que com ele se quer tutelar. Por isso, mais adequado é dizer que a tutela de urgência tem por requisito, a par da probabilidade do direito, simplesmente o perigo na demora, nome que contempla satisfatoriamente todos esses aspectos (MARINONI, ARENHART e MITIDIERO, 2017a, p. 136).
Já a tutela da evidência depende da ocorrência de uma das hipóteses legalmente arroladas no art. 311 do CPC (BRASIL, 2015), cujo denominador comum é a noção de defesa inconsistente do réu (MARINONI, ARENHART e MITIDIERO, 2017a, p. 136). Não se trata de inteira novidade do CPC/2015 porque, embora espalhada pelo código anterior e sem tal nomenclatura, já existia no antigo diploma[5]. O art. 273, II do CPC/73, por exemplo, continha disposição semelhante ao art. 311, I do CPC/2015, que autoriza a concessão da antecipação quando fica caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório da parte. Também são exemplos a liminar na ação possessória, a concessão do mandado monitório e da liminar nos embargos de terceiro. Cite-se igualmente o §6º do art. 273 do CPC/73, que permitia a concessão da tutela antecipada quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, se mostrasse incontroverso.
No entanto, o acréscimo de hipóteses de cabimento, sua concentração em um artigo específico, bem como o tratamento em conjunto com a tutela de urgência sob o gênero “tutela provisória” demonstram a intenção do CPC/2015 de conferir à tutela de evidência maior aplicabilidade prática.
Sua essencial diferença em relação à tutela de urgência é a desnecessidade da demonstração de periculum in mora, conforme ensina Humberto Theodoro Júnior (2018):
A essas tutelas de urgência agregou-se, mais modernamente, a tutela da evidência, que tem com o objetivo não propriamente afastar o risco de um dano econômico ou jurídico, mas, sim, o de combater a injustiça suportada pela parte que, mesmo tendo a evidência de seu direito material, se vê sujeita a privar-se da respectiva usufruição, diante da resistência abusiva do adversário. Se o processo democrático deve ser justo, haverá de contar com remédios adequados a uma gestão mais equitativa dos efeitos da duração da marcha procedimental. É o que se alcança por meio da tutela sumária da evidência: favorece-se a parte que à evidência tem o direito material a favor de sua pretensão, deferindo-lhe tutela satisfativa imediata, e imputando o ônus de aguardar os efeitos definitivos da tutela jurisdicional àquele que se acha em situação incerta quanto à problemática juridicidade da resistência manifestada. (THEODORO JÚNIOR, 2018, p. 648)
O art. 311, II do CPC permite a concessão de tutela provisória da evidência quando “as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante” (BRASIL, 2015). A doutrina, comentando o inciso, sugere interpretação ampliativa para incluir todas as hipóteses de precedente formalmente vinculantes (art. 927), independentemente de se tratar de casos repetitivos ou súmula vinculante (MARINONI, ARENHART, MITIDIERO, 2017b, p. 401). Com a ampliação, também autorizariam a tutela da evidência as decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade (art. 927, I do CPC), os enunciados de súmulas (não vinculantes) do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional (inciso IV) e a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais os juízes e tribunais estiverem vinculados (inciso V).
Outra hipótese de cabimento que se destaca pela ampla aplicabilidade, em virtude da utilização de conceitos abertos, é a tutela da evidência concedida quando "a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável” (art. 311, IV do CPC) (BRASIL, 2015). A leitura em conjunto com as disposições legais relativas ao julgamento antecipado do mérito (art. 355 do CPC) revela a possibilidade de obtenção de uma sentença de mérito imediatamente exequível com muita rapidez, porque o juiz, nesse caso, dispensará até mesmo a fase instrutória do processo. Essa constatação, no entanto, impõe cautelas específicas que serão analisadas mais à frente.
Assim como o efeito suspensivo da apelação, as tutelas provisórias não têm relação necessária com a duração do processo como um todo, já que o tempo de tramitação de demanda em que a antecipação tenha sido concedida continua inalterado. Em outras palavras, o que se pretende com sua utilização é a abreviação do tempo necessário para fruição do direito por aquele que muito provavelmente o obterá em tutela definitiva, aumentando-se, com isso, a efetividade da prestação jurisdicional, o que nada tem a ver com acelerar o deslinde de todo o processo, ou seja, encurtar o período entre a propositura da ação e seu trânsito em julgado. Por isso, apostar que elas são capazes de resolver o problema da demora excessiva do processo, o que pode levar ao atropelamento de seus requisitos de cabimento, é desconsiderar seu caráter intrínseco de precariedade e lhes atribuir força que não têm. Neste sentido, alerta Humberto Theodoro Júnior (2008):
É preciso ter em mente que as tutelas de urgência, ao contrário do que à primeira vista possa parecer, não têm a função de acelerar a marcha do processo e abreviar a solução dos litígios. Com ou sem as medidas de urgência, a composição da lide, em caráter definitivo, passará por todos os estágios normais do procedimento comum. O que se obtém por via da tutela emergencial são apenas providências de afastamento do perigo de dano iminente (periculum in mora). Sem elas, a tutela jurisdicional seria inútil, quando, após a duração normal do processo, se chegasse ao provimento correspondente à definitiva solução do litígio. É de todo inaceitável e imprópria a tentativa de ampliar a tutela de urgência até fazer crer que exista uma “jurisdição de urgência”, equiparável de certa forma, a uma “tutela interdital” distinta daquela alcançável através da “jurisdição comum”, como se existissem paralelamente duas jurisdições distintas. (THEODORO JÚNIOR, 2008, p. 3)
Quanto ao momento em que pode ser concedida, o cabimento da tutela provisória se estende por toda a relação processual, enquanto pendente a decisão definitiva. É possível deferi-la liminarmente ou após a oitiva da parte contrária, como prevê o art. 300, §2º do CPC/2015. Admite-se a tutela provisória, ainda, na sentença (art. 1.012, §1º, V do CPC) e em sede recursal (art. 932, II do CPC). Em qualquer caso, justamente por ser anterior à decisão definitiva, tem sempre por pressuposto uma análise de probabilidade do direito, e por isso diz-se que está atrelada à cognição sumária (MARINONI, ARENHART, MITIDIERO, 2017, p. 139).
A fragilidade da tutela provisória decorre principalmente de que, como visto, é concedida em regra a partir de um juízo de probabilidade fundado em cognição sumária. Essa característica, no entanto, decorre do momento prematuro em que geralmente é requerida, quando o réu sequer foi citado para o processo. Mesmo se empregada após justificativa prévia, a concessão costuma se dar antes da produção das provas.
Não se trata, contudo, de atributo necessário da tutela provisória, porque se um dos requisitos para sua concessão é a probabilidade do direito, nada impede que seja deferida também quando o juiz dele já tem certeza, após o transcurso de todas as fases do processo, com integração do contraditório, produção de provas etc., ou seja, na sentença.
A concessão da tutela provisória na sentença pode, a princípio, causar estranhamento, já que se a profundidade da cognição alcançada neste momento autoriza o julgamento final de procedência do pedido, não haveria razão para que o juiz concedesse, ao mesmo tempo, provimento precário, para o qual é suficiente a cognição sumária. Tradicionalmente, na sentença apenas se confirma ou revoga tutela provisória anteriormente concedida, a partir da análise de novas provas que permitem ao julgador transformá-la em tutela definitiva ou reconsiderar a decisão interlocutória em que a havia admitido.
No entanto, além da confirmação ou revogação da tutela provisória na sentença, nada impede que este momento seja o mais oportuno para que o juiz pela primeira vez a conceda, seja porque só então seus requisitos foram atingidos ou demonstrados, seja porque só com cognição exauriente ficou o julgador convencido de seu cabimento.
Além de tecnicamente correta, a concessão da tutela provisória na sentença tem a excepcional utilidade de retirar o efeito suspensivo da apelação, conferindo à decisão exequibilidade imediata. O mecanismo é precisamente explicado por Daniel Neves:
Se o autor já obteve a tutela definitiva, como entender que ao mesmo tempo receba também a tutela antecipada? A dúvida só tem alguma justificativa para aqueles que desconsideram que o instituto processual chamado comumente de tutela antecipada na realidade não antecipa a tutela, mas seus efeitos executivos, ou seja, a tutela só pode ser concedida definitivamente, sendo objeto da antecipação somente os efeitos práticos dessa tutela. Dessa forma, sempre que o recurso contra a sentença de procedência tiver efeito suspensivo, o autor, apesar de ter obtido a tutela definitiva em sentença, não terá recebido os efeitos executivos de tal tutela, porque o recurso impedira a geração de efeitos da sentença, obstando a satisfação imediata de seu direito. A utilidade da tutela antecipada nesse caso mostra-se evidente, entregando ao autor algo que ele não ganhou com a sentença de procedência: os efeitos práticos da tutela obtida. (NEVES, 2018, p. 534)
Vale destacar que a regra se aplica apenas ao capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória, e não ao decisum inteiro (DIDER JUNIOR, CUNHA, 2016, p. 186). É possível, portanto, que haja julgamento de procedência de vários pedidos, mas concessão de tutela provisória somente para parte deles. Essa pode ser medida de prudência tanto do magistrado, ao verificar que os requisitos da tutela não estão preenchidos em relação a todos os pedidos, quanto do advogado, na hipótese de uma avaliação de riscos demonstrar não ser vantajosa a obtenção provisória de algum dos bens da vida pleiteados, tendo em vista a possibilidade de modificação da sentença pelos tribunais.
A advertência também é importante, como se verá adiante, para delimitar o exato regime jurídico da retirada de efeito suspensivo, submetido aos requisitos específicos das tutelas provisórias comuns, sem que se cogite a existência de uma faculdade genérica do juiz de “declarar os efeitos com que recebe da apelação”, conforme parecia prever o art. 518 do CPC/73, a partir da mera avaliação in concreto de interesses envolvidos.
O tema já recebe atenção da doutrina muito antes das possibilidades trazidas pelo novo tratamento das tutelas provisórias no CPC/15. Marinoni, ainda em 1994, destacava a importância da utilização das tutelas de urgência como modo mais adequado de realização do direito material em certos casos, mesmo que se tornasse necessário o “sacrifício, ainda que de forma irreversível, de um direito que pareça improvável em benefício de outro que pareça provável” (MARINONI, 1994, p. 61).
Compreende-se assim que o instrumento em análise é um método de gestão de tempo no processo, concedendo-se à parte que ostenta altíssima probabilidade do direito a vantagem de não ter que esperar o provimento final para dele fruir. A análise aprofundada da ferramenta revela tratar-se de uma engenhosa ponderação entre os princípios da segurança jurídica e da efetividade levada a efeito já pelo próprio legislador.
Primeiramente, reforça a hipótese de que a opção legislativa do art. 1.012, §1º, V do CPC/2015 foi acertada a constatação de que a probabilidade de provimento do recurso de apelação é relativamente baixa, porque o ganho em efetividade em muito se sobrepõe, estatisticamente, ao gravame eventualmente imposto à segurança jurídica.
Duas pesquisas empíricas nestes termos podem ser citadas, com interessantes conclusões. Uma, apresentada por Fernando Gajardoni, demonstrou que a porcentagem de apelações a que o Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento, de julho de 2012 a junho de 2013, gira em torno de 65%, enquanto 20% é a proporção aproximada de apelações a que foi dado parcial provimento. Em menos de 20% dos casos o tribunal deu integral provimento à apelação (GAJARDONI, 2013)[6].
Semelhantes números foram apurados por Jorge Passarelli em relação aos julgamentos proferidos pela 1ª a 20ª Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro de 2003 a 2010, em tese na qual defendia, antes do advento do CPC/15, a supressão do efeito suspensivo automático da apelação (PASSARELLI, 2011, p. 49). Enquanto 61,5% dos recursos de apelação foram improvidos, 22,18% das sentenças foram reformadas parcialmente e apenas 16,37% foram integralmente reformadas pelo tribunal[7].
Em que pese a baixa representatividade dos dados em relação a todos os processos que tramitam em território nacional, a indicação é clara de que o número de apelações providas é diminuto em comparação ao de sentenças confirmadas pelos tribunais, o que sinaliza que a retirada do efeito suspensivo da apelação não tem, quantitativamente, impacto negativo alarmante na segurança jurídica.
Além disso, a concessão de tutela provisória na sentença tem a vantagem de que, neste momento processual, o julgador já auferiu cognição exauriente da demanda – que não se confunde, é claro, com coisa julgada, porque a decisão ainda está sujeita a recurso, e nem impede que os órgãos recursais prossigam na atividade cognitiva. Apenas não se nega que, nesta etapa, o nível de certeza jurídica alcançado é muito maior, já que se tem o pronunciamento final do juiz de primeiro grau, o qual, se não recorrido, pode até se tornar definitivo.
Com isso, a tutela provisória na sentença escapa do tradicional problema da possível ofensa à segurança jurídica causada pelo provimento judicial baseado em cognição sumária, na qual costumam ser sacrificadas, ainda que temporariamente, as garantias do contraditório e ampla defesa. No caso da concessão de uma liminar, por exemplo, o réu pode ser surpreendido por ordens judiciais bastante invasivas antes mesmo de ter conhecimento de que estava sendo processado, como na hipótese de sofrer uma constrição patrimonial em sede de tutela cautelar.
Não é o que ocorre na antecipação de tutela na sentença, momento em que já terá sido ofertada ao réu a necessária dilação probatória, bem como realizada ampla discussão e valoração dos seus resultados pelo juiz, instrumentos basilares do princípio da segurança jurídica.
O cumprimento da sentença impugnada por apelação desprovida de efeito suspensivo dá-se em caráter provisório, conforme autoriza o art. 1.012, §2º do CPC/2015. Deve-se observar regime jurídico especial em relação ao cumprimento definitivo, delineado pelos arts. 520 a 522 do CPC (BRASIL, 2015), exatamente com o objetivo de evitar dano irreparável ao executado.
Entre as peculiaridades estão: a responsabilidade do exequente pela reparação de danos que o executado haja sofrido (art. 520, I do CPC), a restituição das partes ao status quo ante, com liquidação de prejuízos nos mesmos autos, caso a sentença seja modificada ou anulada (art. 520, II, do CPC), e a necessidade de prestação de caução idônea, pelo exequente, para o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado (art. 520, IV, do CPC) (BRASIL, 2015).
Não se descuida, porém que o art. 521 do CPC (BRASIL, 2015) lista uma série de situações nas quais a caução é dispensada. Entre elas, a do inciso II traz conceito aberto que abrange os casos em que o credor demonstrar “situação de necessidade”[8]. Por isso, além de a caução ser devida apenas para a prática dos atos descritos no art. 520, IV, do CPC a medida não é exigível nas hipóteses em que o próprio legislador, reforçando a ponderação entre os princípios da efetividade e da segurança jurídica, permitiu que o cumprimento provisório independa da prestação de garantia, evitando que a utilização do mecanismo fosse obstada aos mais pobres.
Vale ainda destacar mais uma vantagem da retirada ope legis do efeito suspensivo da apelação nas hipóteses do art. 1.012 do CPC: a possibilidade de o apelante requerer sua concessão ope judicis ao tribunal ad quem ou ao relator do recurso (art. 1.012, §§3º e 4º). Nesse caso, a eficácia da sentença poderá ser suspensa se demonstrada i) a probabilidade de provimento do recurso ou ii) risco de dano grave ou de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação (§4º). Com isso, tem o vencido mais um meio de impedir que a eficácia imediata da sentença seja medida precipitada.
O presente trabalho pretende delinear, sinteticamente e sem a ambição de esgotar o tema, um modelo de boa utilização da tutela provisória na sentença com vistas a retirar o efeito suspensivo da apelação, atividade que passa, necessariamente, pela observância dos requisitos e limites próprios do instituto.
Para isso, tratar-se-á de aspectos selecionados por sua maior relevância prática na busca dessa sistematização, passando-se pelas condições da concessão da tutela provisória na sentença, pelo dever ético dos advogados de informar o exequente de sua responsabilidade objetiva por danos causados ao executado, pela obrigação dos tribunais de manter sua jurisprudência estável e por exemplos de bom emprego da técnica.
5.1Condições para a concessão da tutela provisória na sentença
A primeira condição para a concessão de tutela provisória na sentença - a qual também contribui para prestigiar a efetividade do processo sem atingir desproporcionalmente a segurança jurídica - é a necessidade de prévio requerimento da parte.
Embora a lei processual não ofereça resposta definitiva, dando azo a grande divergência doutrinária, mesmo aqueles autores que atualmente admitem a antecipação sem requerimento da parte limitam-na a casos excepcionais nos quais, surgindo a necessidade de medida acautelatória imediata, a inércia do juiz possa comprometer gravemente a efetividade da prestação jurisdicional (THEODORO JUNIOR, 2018, p. 675).
A regra, porém, é que a antecipação dependa de requerimento, em respeito aos princípios da demanda e da congruência (arts. 2º, 141 e 492 do CPC) (BRASIL, 2015), e porque a redação do art. 299 do CPC pressupõe a iniciativa do interessado ao dispor que a tutela provisória será “requerida ao juízo da causa”.
Marinoni, Arenhart e Mitidiero, por compreenderem a tutela cautelar como uma proteção do direito material e não do processo, não admitem a concessão de ofício nem mesmo desta espécie, embora sugiram solução interessante para evitar que a vedação impeça o juiz de se agir em situações de evidente injustiça:
Uma maneira de conceder ao juiz a possibilidade de ter um papel mais participativo no emprego da técnica antecipatória no processo está, porém, em viabilizar ao juiz a consulta à parte que poderá se beneficiar pela “tutela provisória” a fim de que essa manifeste expressamente se deseja ou não a sua concessão. Em outras palavras, colaborando com a parte (art. 6.º), o juiz poderá consultá-la a respeito de seu interesse na concessão da tutela sumária. Com isso, equilibra-se a iniciativa judicial, inspirada na promoção da igualdade entre os litigantes e a na adequação da tutela jurisdicional, e o respeito à liberdade da parte, que pode não ter interesse em fruir de decisão provisória ao longo do procedimento, notadamente em face do regime de responsabilidade objetiva a ela inerente (art. 302). (MARINONI, ARENHART, MITIDIERO, 2017a, p. 140).
Com isso, as partes têm absoluta previsibilidade das medidas tomadas no processo que possam lhes gerar prejuízo, vedadas as “decisões surpresa” (art. 9º do CPC/2015). Não se desconhece que, para o réu, há casos em que o contraditório será postergado, como prevê o art. 9º, parágrafo único do CPC, mas jamais eliminado. Ainda que posteriormente à efetivação de uma liminar, a parte afetada terá sempre plenas condições de exercício da defesa, o que é reforçado pela garantia de que a tutela provisória terá invariavelmente sido requerida pela parte contrária em petição fundamentada. Por outro lado, também o autor não será surpreendido pela efetivação de um provimento que não pediu e que pode lhe ocasionar responsabilização objetiva.
A segunda condição para a utilização da técnica em comento é a demonstração dos requisitos de cabimento supracitados pela parte requerente. Sobre o ponto, é pertinente uma breve digressão histórica.
Ainda sob o Código anterior, Carreira Alvim compreendia que a técnica processual em estudo era possível, mas fazia crucial distinção entre os regimes da antecipação da tutela “antes da sentença” e “na sentença”. Para o jurista, a segunda era tão somente uma técnica para retirar o efeito suspensivo da apelação[9], autorizada pelo art. 518 do CPC/73[10], enquanto apenas a primeira seria “verdadeira tutela antecipada”, fundada no art. 273 do antigo Código (BRASIL, 1973). A diferenciação levava-o à seguinte conclusão:
O pedido de suspensão da eficácia da sentença, através da técnica de se dar apenas um efeito (devolutivo) ou dois efeitos (devolutivo e suspensivo) ao recurso, deve, ou não, ser deferido, conforme haja, entre os dois interesses em conflito-, o do requerente, em suspendê-la e o do requerido em não suspendê-la-, maior risco de dano para um do que para outro, tudo consoante também o juízo de probabilidade formado pelo juiz. (ALVIM, 2003, p. 132)
Note-se que a resistência em enxergar a tutela antecipada na sentença como “verdadeira tutela antecipada” acaba por transformar completamente o instituto, conferindo-lhe os moldes de “pedido de suspensão da eficácia da sentença”. Para sua concessão, bastaria um juízo de ponderação, caso a caso, entre o interesse das partes em postergar ou não a produção de efeitos do decisum.
A redação atual da lei processual, no entanto, não deixa dúvidas. A tutela provisória que o juiz pode conceder na sentença ou antes dela é a mesma (ou seja, a descrita pelos arts. 294 a 311 do CPC/2015), e deve sempre respeitar seus específicos requisitos de cabimento. Não se trata, portanto, de retirada do efeito suspensivo apenas mediante um juízo de ponderação casuístico, porque a lei não o autoriza, Trata-se, isto sim, da utilização da tutela provisória com o objetivo de obter também uma repercussão reflexa neste efeito recursal.
A distinção tem relevância prática. Trata-se de uma garantia de segurança jurídica, porque o vencido não será surpreendido com a retirada do efeito suspensivo fora dos casos previstos em lei, cujos pressupostos deverão ser cabalmente demonstrados pelo requerente. Ao réu será dado contestar o preenchimento destes requisitos, comprovando, por exemplo, que não há perigo na demora, ou que o direito é improvável ou não evidente, e não somente que o seu “interesse” em suspender a eficácia da sentença é maior do que o do autor em executá-la desde logo. No caso de concessão na sentença, some-se a isso o fato de que ao requerido terá sido dada oportunidade de exercício do contraditório pleno, com produção de provas e discussão aprofundada do mérito.
Importa destacar que, de acordo com Marcelo Veiga Franco, o direito ao contraditório inclui não só a possibilidade de debater o caso com a parte contrária ao longo do processo, mas também a garantia de que os argumentos e teses trazidos aos autos pelas partes serão apreciados pelo magistrado quando da prolação da decisão. Trata-se do dever de fundamentação analítica das decisões judiciais, que é requisito de validade da sentença, conforme o art. 489 do CPC/2015 e art. 93, IX da Constituição Federal de 1988 (FRANCO, 2015).
Com isso, o preenchimento dos requisitos da tutela provisória deve ser evidenciado também pelo juiz, acompanhado de registro explícito de sua concessão na parte dispositiva da sentença. Desse modo, facilita-se a compreensão pelas partes dos efeitos práticos operados pelo pronunciamento, favorecendo-se, inclusive, o manejo ágil pelo réu do pedido de efeito suspensivo dirigido ao tribunal, conforme art. 1.012, §§3º e 4º do CPC (BRASIL, 2015).
O requisito da fundamentação analítica pelo juiz da decisão de concessão da tutela provisória tem especial relevância na hipótese de julgamento antecipado do mérito (art. 355 do CPC/2015). Esse mecanismo tem cabimento nos casos em que não houver necessidade de produção de provas (inciso I) ou em que operarem os efeitos da revelia e não houver requerimento de prova pelo réu (inciso II), situações que podem com a do art. 311, IV do CPC/2015, o qual permite a concessão de tutela da evidência “quando a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável” (BRASIL, 2015).
Para Didier e Cunha (2016, p. 187), a conclusão lógica da aplicação dos dispositivos é que todas as sentenças de julgamento antecipado do mérito em favor do autor, por corresponderem à tutela da evidência do art. 311, IV do CPC, podem produzir efeito imediato por força do art. 1.012, §1º, V da lei processual, não obstante a interposição de recurso de apelação, que será recebido apenas no efeito devolutivo.
Ainda que o raciocínio seja tentador, o respeito à segurança jurídica, calcado na melhor compreensão do princípio do contraditório, impõe que o efeito do art. 1.012, §1º, V do CPC/2015 sempre dependa de pronunciamento específico do juiz quanto à concessão da tutela da evidência do art. 311, IV do CPC (ou de qualquer outra espécie de tutela provisória), precedido de requerimento fundamentado da parte e tratado em capítulo próprio da sentença, no qual se analisem aprofundadamente seus requisitos de cabimento.
5.2 A precariedade das tutelas provisórias concedidas na sentença e o dever ético dos advogados de informar o exequente de sua responsabilidade objetiva
A previsão de restituição das partes ao status quo ante quando revogada a tutela provisória (arts. 302 e 520, II do CPC/2015) também deve ser levada a sério na adequada utilização da ferramenta em análise, compondo uma preocupação pertinente a seu estudo sistemático.
Exemplifica-se com a corriqueira situação da antecipação de tutela na sentença em ações previdenciárias, cujo efeito é a implementação imediata de benefício mensal pago ao autor pelo INSS. Grande discussão surge quando a sentença é reformada em grau de recurso e a tutela provisória, por consequência, é extirpada, vindo o INSS a cobrar da parte autora o que esta recebeu no curso do processo. O tema já sofreu mais de uma virada jurisprudencial, havendo tanto precedentes que afastam a possibilidade de cobrança, com fundamento na irrepetibilidade de verbas alimentares, quanto outros que a consideram legítima, diante da natureza sabidamente precária da antecipação de tutela.[11]
O exemplo é de especial interesse na medida em que demonstra o dever de cautela imposto aos advogados no trato da tutela provisória. Se o autor da demanda, no mais das vezes, anseia por receber logo o benefício, e se a estabilidade do ordenamento não é um dado no Brasil, cabe inarredavelmente ao advogado alertar seus clientes da real possibilidade de ter a vitória processual revertida em grau de recurso, com imediata cobrança do valor embolsado, o qual, quase sempre, já terá há muito sido gasto nas necessidades básicas do beneficiário.
Não se ignora que a urgência no recebimento de benefício alimentar costuma suplantar qualquer consideração de prudência que possa desaconselhar o requerimento de tutela provisória. Contudo, diversos fatores devem integrar a avaliação de risco a ser proposta pelo advogado: i) a probabilidade de provimento de eventual recurso naquele caso específico; ii) o tempo médio de julgamento das demandas pelo órgão recursal; iii) o grau de necessidade imediata enfrentada pelo cliente etc. Se, considerados os riscos, o requerimento da tutela ainda se mostrar recomendável, caberá ao advogado alertar muito claramente o autor sobre a precariedade seus efeitos, permitindo que este tome a decisão final sobre o pedido e se prepare, na medida do possível, para eventual reversão. A conclusão se estende, com as devidas adaptações, a todos os casos em que cabe a tutela provisória.
5.3 O dever dos tribunais de manter a jurisprudência estável e seu impacto na antecipação de tutela na sentença
Uma vez concedida em sentença, o principal momento em que a tutela provisória pode ser revogada é quando do julgamento da apelação, recurso que leva à reconsideração do tribunal toda a matéria de fato e de direito impugnada. No entanto, é de se esperar que a sentença bem fundamentada, e, especialmente, a que segue precedentes (muitas vezes até com ressalva do entendimento pessoal do magistrado de primeiro grau) tem baixíssimas chances de ser reformada. Nesses casos, o requerimento e concessão de tutela provisória são altamente recomendados e tendem a ser utilizados até pelos operadores mais cautelosos.
Situação que causa perplexidade, contudo, é a modificação do precedente no qual a sentença se baseou no período entre o julgamento em primeiro grau e em segundo, levando à reversão da tutela provisória não por erro do juiz de primeiro grau, nem por divergência ordinária de entendimento entre ele e o tribunal, mas simplesmente por alteração abrupta do entendimento pretoriano. Nesses casos, há uma subversão do sentido da técnica antecipatória na sentença, porque todas as considerações de segurança jurídica que a autorizavam, ainda que rigorosamente observadas, cedem diante da repentina mudança de um precedente, e o autor pode ser chamado a responder objetivamente pela efetivação da tutela que se tornou indevida.
Nesse ponto não se faz sequer distinção entre os “precedentes vinculantes” do art. 927 do CPC (BRASIL, 2015) e qualquer outro, porque toda decisão judicial pode se tornar precedente de uma posterior. Por isso é recomendável, em um sistema que se pretende juridicamente seguro, que os juízes se curvem não só às espécies de decisão elencadas no art. 927, mas a toda a “jurisprudência” que é dever dos tribunais manter estável, íntegra e coerente, conforme art. 926 do CPC (BRASIL, 2015). Assim, os precedentes podem (e devem) servir para fundamentar não só a tutela da evidência, mas também a de urgência, subsidiando a análise da probabilidade do direito.
A resolução desse problema já está prevista no próprio CPC, que preconiza em seu art. 927, §3º que “na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica” (BRASIL, 2015).
Trata-se da modulação temporal dos efeitos da decisão, que o Código faculta a todos os tribunais superiores quando da alteração de jurisprudência dominante, o que afasta a ideia de cabimento restrito ao rol do caput do art. 927 do CPC (BRASIL, 2015), bem como a qualquer outro tribunal que julgar casos repetitivos. Neste sentido também o art. 23 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, Decreto-Lei nº 4.657/42 (BRASIL, 1942), recentemente incluído pela Lei nº 13.655/2018[12] (BRASIL, 2018).
É certo que o alcance da estabilidade jurisprudencial é tarefa árdua que requer dos julgadores verdadeira preocupação com a estabilidade do ordenamento no tempo. Por outro lado, também não se ignora que o Direito, por ser móvel do progresso social, não se pode engessar, de modo que muitas mudanças de entendimento pelos tribunais são esperadas e necessárias[13]. No entanto, o processo justo, que é aquele capaz de realizar direitos fundamentais, exige um sistema minimamente previsível, porque é a previsibilidade que, constituindo um aspecto essencial da segurança jurídica, possibilita a utilização prudente de técnicas de aumento da efetividade como a do art. 1.012, §1º, V do CPC.
Nesse contexto, como modo de atenuar o prejuízo causado pelas alterações de entendimento dos tribunais, sugere-se que, em nome da segurança jurídica, a modulação dos efeitos dessas decisões deve ser a regra no ordenamento brasileiro. Significa dizer que, modificada uma tese, a nova orientação deve ser aplicada apenas a ações ajuizadas a partir deste julgamento, não alcançando, com isso, processos em tramitação, nos quais eventualmente já terá sido concedida tutela provisória. Esse é mais um parâmetro para a aplicação segura da técnica de antecipação na sentença.
Ressalve-se que a possibilidade de modulação das decisões, por certo, não deve servir para a banalização dos precedentes, incentivando-se continuadas inversões de entendimento sobre uma mesma matéria que, moduladas, criam uma série de situações jurídicas desiguais ao longo do tempo chanceladas pelos tribunais. A estabilidade da jurisprudência é a regra. Apenas nos casos em que ela for insustentável deve-se lançar mão de ferramentas de apaziguamento como a modulação e, ainda assim, buscando-se a proteção da isonomia e rechaçando-se o acobertamento de quadros de manifesta injustiça.
5.4 Exemplos do adequado emprego da técnica
Com o objetivo de ilustrar a adequada aplicação da ferramenta, trazem-se alguns exemplos, respaldados em decisões de tribunais, que conseguiram harmonizar as garantias em confronto. Cuida-se de buscar previsibilidade e segurança jurídica a ambas as partes e também o incremento da efetividade do processo, permitindo-se a execução provisória da sentença.
a) Pedidos de fornecimento de medicamento ou tratamento médico pelo Estado em casos em que, inexistindo risco iminente de morte, abrem-se discussões sobre a indispensabilidade do fármaco para aquela doença, ineficácia dos oferecidos pelo SUS, capacidade financeira do requerente etc., com produção de prova pericial e debate aprofundado sobre aspectos técnicos[14];
b) Demandas relativas à inscrição do nome de devedor em cadastro de inadimplentes ou protesto de títulos (inclusive de Certidão de Dívida Ativa), em que não é possível decidir com segurança sobre a existência ou não do débito e a regularidade dos meios de cobrança até o momento da sentença, mas a tutela provisória passa a ser recomendável nessa fase porque a permanência de negativação indevida até o trânsito em julgado pode gerar grave prejuízo ao autor[15];
c) Casos em que o autor pretende obter quantia em dinheiro e demonstra situação de necessidade, autorizando a ordem de entrega de quantia sem a necessidade de caução (art. 521, II do CPC/2015). A concessão da antecipação seria temerária em sede de cognição sumária ante sua provável irreversibilidade, mas a constatação da alta probabilidade do direito pode permiti-la na sentença[16];
d) Ações em que se pretende a nomeação e posse de candidato aprovado em concurso público, a reintegração de servidor público ao cargo e matérias correlatas que impliquem aumento de despesa para a Administração, nas quais o significativo impacto aos cofres públicos e a presunção de legitimidade da atuação administrativa desaconselham a concessão de provimentos liminares, mas o grande prejuízo ao autor na espera do julgamento da apelação autoriza sua utilização na sentença[17];
e) Ações previdenciárias nas quais apenas a cognição exauriente pode revelar que o autor tem direito a um benefício mensal de caráter alimentar devido pelo INSS, de modo que, com a antecipação da tutela na sentença, pode começar a receber uma aposentadoria, pensão ou outra prestação necessária à sua subsistência desde a vitória em primeiro grau[18].
O processo civil é instrumento de tutela jurisdicional dos direitos. A garantia constitucional da inafastabilidade de jurisdição, conforme art. 5º, XXXV da CF/1988, por isso, não pode deixar de abranger um direito fundamental à efetividade do processo, sob pena de, cindido dos meios de realização adequada e tempestiva do direito material, tornar-se ferramenta inútil.
À manutenção do efeito suspensivo automático da apelação o CPC/15 opôs um extenso rol de exceções (art. 1.012, §1º do CPC/2015), das quais a concessão de tutela provisória na sentença (inciso V) se destaca pela vasta aplicabilidade. Trata-se de um método de distribuição justa do ônus do tempo no processo civil, que, em última análise, pode se mostrar até melhor que a simples extinção da regra geral de atribuição de efeito suspensivo à apelação, porque permite o deslinde da demanda com rigoroso respeito à segurança jurídica, sem que com isso se sacrifique demasiadamente a parte detentora de direito provável.
A análise do conjunto de critérios que permeiam o mecanismo do art. 1.012, §1º, V do CPC demonstra seu imenso potencial de incremento da efetividade do processo, desde que corretamente utilizado. Na ponderação entre efetividade e segurança jurídica, destacam-se como argumentos favoráveis à utilização da técnica em estudo a baixa probabilidade de provimento da apelação, a cognição exauriente atingida pelo juiz de primeiro grau, as garantias do réu no regime de cumprimento provisório de sentença e a possibilidade de pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação ao juízo ad quem.
Além disso, a concessão da tutela provisória na sentença deve atender a condições específicas que também garantem sua utilização adequada, quais sejam: o requerimento prévio da parte, a comprovação de seus requisitos legais de cabimento e o dever judicial de fundamentação analítica das decisões, tudo em respeito ao princípio do contraditório.
Por outro lado, e tendo em vista o dever de todos os sujeitos do processo de cooperarem entre si para que se obtenha decisão justa e efetiva (art. 6º do CPC/2015), é dever dos advogados alertarem seus clientes dos ônus da antecipação, enfatizando seu caráter precário, a fim de evitar que o alcance do bem da vida seja dado como definitivo antes do tempo. Com isso, eventual reversão de seus efeitos tende a ser muito menos problemática, colaborando para o aumento na confiança no sistema pelos jurisdicionados e na segurança jurídica para os demais atores do processo, o que pode levar os juízes a aplicarem mais frequentemente o instituto.
Finalmente, a valorização dos precedentes pelo CPC/2015, que irradiou efeitos por todo o ordenamento processual, precisa ser levada a sério por seus operadores. O mecanismo da concessão de tutela provisória na sentença, cuja segurança é em grande parte fundada na estabilidade da jurisprudência, só pode funcionar adequadamente com a colaboração dos tribunais, que devem modular os efeitos das alterações de seus entendimentos, não as aplicando aos processos pendentes. Essa prática contribui para maior utilização da citada ferramenta e impede que ela cause às partes prejuízos inesperados.
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[1] Para a defesa da ideia do processo como instrumento, ainda amplamente aceita na doutrina, vide Dinamarco (2009). Em contraposição, a doutrina já discute certa insuficiência do instrumentalismo, sugerindo a inauguração de uma nova fase metodológica designada de formalismo-valorativo, que propõe que o processo, e não a jurisdição, ocupe o centro da Teoria do Processo, vide Madureira (2015).
[2] O relatório Justiça em Números de 2018, do Conselho Nacional de Justiça, revela que o tempo médio de tramitação do processo em 2º grau até o julgamento é de 10 meses. Destaque-se, no entanto, que na Justiça Federal o intervalo sobe para 1 ano e 11 meses (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2018, p. 147).
[3] Dentre as defesas, destaca-se a de Leonardo Greco (2010), na qual lê-se: “A maioria das apelações tem efeito suspensivo. Já se tentou, por meio de alguns projetos de lei não aprovados, acabar-se com o efeito suspensivo automático da apelação, o que é contrário ao interesse dos governantes. Isso porque o maior beneficiário do efeito suspensivo da apelação é o Estado procrastinador; na verdade, a Justiça, hoje, está servindo para administrar a moratória do Estado, e não para satisfazer os direitos dos cidadãos. Há um completo desvirtuamento da função do Poder Judiciário”. Também neste sentido, vide Fernando Gajardoni (2013).
[4] Embora a literalidade do artigo indique a existência de uma fungibilidade apenas progressiva (da tutela antecedente cautelar, que apenas assegura o direito, para a antecipada, que permite sua fruição), a doutrina pacificou o entendimento de que a fungibilidade é de mão dupla, ou seja, permite também a concessão de tutela antecedente de natureza cautelar embora o pedido mencione apenas a tutela antecipada, conforme o Enunciado 502 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Caso o juiz entenda que o pedido de tutela antecipada em caráter antecedente tenha natureza cautelar, observará o disposto no art. 305 e seguintes.”
[5] À égide do CPC/73, em 1996, o hoje Ministro do STF Luiz Fux já adotava a distinção entre as tutelas de urgência e de evidência (FUX, 1996). Pode-se dizer que seu trabalho influenciou a nomenclatura prevista no atual Código.
[6] O autor destaca que o TJSP, sozinho, responde por praticamente metade do movimento judiciário da Justiça Estadual Nacional.
[7] Em sentido diverso, números apresentados por Nunes (2014), a partir de relatório do CNJ relativo a 2012, contemplando mais estados da federação, com índice geral de reforma de 37,3%. O valor apurado, no entanto, considera indistintamente o provimento parcial e integral dos recursos pelos tribunais, além de abranger também os agravos de instrumento.
[8] Art. 521. A caução prevista no inciso IV do art. 520 poderá ser dispensada nos casos em que: (...) II - o credor demonstrar situação de necessidade.
[9] Nisso concordava com Calmon de Passos, cujo posicionamento foi citado por Didier e Cunha (2016, p. 187) ao comentarem exatamente a adição da tutela da evidência como hipótese de supressão do efeito suspensivo da apelação.
[10] Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao apelado para responder.
[11] O STJ, em 2014, julgou tema repetitivo nº 692 e decidiu que a “reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”. No entanto, o STF, mesmo após essa decisão, e tendo rejeitado a repercussão geral da matéria ante sua natureza infraconstitucional, tem decisões isoladas no sentido da desnecessidade de devolução das parcelas. Em 2018, no julgamento da Questão de Ordem no Recurso Especial nº 1.734.698/SP, o STJ decidiu rever a tese fixada no tema nº 692, com fundamento na “variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva, bem como a jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário”. Em 2019, a Medida Provisória nº 871, convertida na Lei 13.846, deu nova redação ao art. 115 da Lei 8.213/91, prevendo expressamente a possibilidade de desconto pelo INSS, em outros benefícios pagos ao mesmo segurado, do débito decorrente da cessação de benefício pela revogação de decisão judicial (art. 115, II), além da inscrição em dívida ativa dos créditos constituídos pelo INSS em consequência destes fatos (art. 115, §3º).
[12] “A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.” O dispositivo foi utilizado pelo STJ no julgamento, em 05/12/2018, dos recursos especiais repetitivos 1.704.520/MT e 1.696.396/MT, rel. min. Nancy Andrighi, em que se fixou a tese da taxatividade mitigada do rol de cabimento do agravo de instrumento (art. 1.015 do CPC/2015).
[13] Não se olvide, entretanto, que a superação dos precedentes também exige técnicas próprias. Há necessidade de se observar o distinguishing, demonstrando que o precedente existente não se amolda à situação fática, o overruling (superação total do precedente) ou o overriding (superação parcial do precedente), caso o precedente não mais se adeque ao estágio de desenvolvimento da sociedade. Em todo e qualquer caso, impõe-se um ônus argumentativo aos tribunais, que não pode ser banalizado.
[14] “Trata-se de pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação interposta contra sentença que julgou procedente a ação, reconhecendo o direito do autor ao fornecimento de medicamento FIRAZYR (ICATIBANTO), para o tratamento de Angioedema Hereditário (AEH). [...] Com efeito, após ampla dilação probatória e cognição exauriente, restaram demonstradas a necessidade e a urgência do medicamento pleiteado pelo autor, o que autoriza a manutenção da tutela de urgência. De outra parte, não vislumbro urgência ou perigo de lesão grave e de difícil ou incerta reparação que poderá ser ocasionado à apelante com a manutenção da tutela antecipada, na medida em que dano expressivamente maior poderia ser experimentado pelo apelado em caso de indeferimento da medida. Ante o exposto, indefiro o pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação, nos termos da fundamentação.” (TRF4 – Pedido de efeito suspensivo à apelação nº 5064342-87.2017.4.04.0000/PR, rel. Vivian Josete Pantaleão Caminha, data de julgamento: 15/01/2018, 4ª turma)
[15] EFEITO SUSPENSIVO. APELAÇÃO. Pretensão do réu apelante de concessão de efeito suspensivo à apelação. Inadmissibilidade. A apelação interposta contra sentença que confirma a antecipação dos efeitos da tutela deve ser recebida, na parte compreendida na antecipação da tutela, no efeito devolutivo, a teor do artigo 1.012, § 1º, inciso V, do novo Código de Processo Civil. Hipótese, ademais, que o apelante não demonstrou a ocorrência de qualquer circunstância processual excepcional que justificasse a atribuição de efeito suspensivo a esta apelação. CANCELAMENTO DE PROTESTO E INDENIZAÇÃO. PROTESTO IRREGULAR DANO MORAL E MATERIAL. A rescisão do contrato que originou o protesto foi rescindida por sentença, e neste caso caberia à ré a retirada do protesto. A manutenção do protesto indevido de título de crédito acarretou ofensa à honra do autor, que foi submetido a notório e presumido constrangimento e vexame. Dano moral presumido. Recurso improvido, neste aspecto. (TJ-SP – AI: 1029214-57.2016.8.26.0002, rel. Plinio Novaes de Andrade Júnior, data de julgamento: 26/09/2019, 24ª Câmara de Direito Privado)
[16]AGRAVO DE INSTUMENTO. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA. ASTREINTES. DISPENSA DE CAUÇÃO PARA O LEVANTAMENTODE VALORES. Nos termos do art. 521, II, do CPC/15, poderá ser dispensada a prestação de caução idônea para o levantamento de numerário judicialmente constrito quando demonstrada a situação de necessidade do credor. Agravante que é idosa de 77 anos, portadora de artrite reumatóide e percebe benefício previdenciário módico, encontrando-se alijada de plano de saúde em virtude da recalcitrância da agravada, que se nega ao cumprimento das decisões judiciais. O levantamento auxiliará a agravada a custear despesas médicas, enquanto perdurar a vacilância da devedora, ora agravante. Deferimento da dispensa de caução em relação a parcela dos valores penhorados, limitados a R$20.000,00, com o escopo de se evitar manifesto risco de dano de difícil reparação. Inteligência do art. 521, parágrafo único do NCPC. (TJ-SP 2006038-67.2018.7.26.0000, Rel. Rosangela Telles, data de julgamento: 11/06/2018, 2ª Câmara de Direito Privado)
[17]AGRAVO INTERNO EM PETIÇÃO. PRETENSÃO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO DE APELAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE TAQUARI. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA EM SENTENÇA. REINTEGRAÇÃO DO SERVIDOR AO CARGO DO QUAL FORA EXONERADO EM RAZÃO DE APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA PELO INSS.1. Agravo interno conhecido, por maioria.2. Entendimento corrente atual das Câmaras que compõem o 2º Grupo Cível deste Tribunal, ilustrado na sentença, no sentido de que a aposentadoria voluntária pelo INSS não provoca a automática vacância do cargo público, quando o ente municipal não possui regime próprio de previdência. Periculum in mora que milita, na hipótese, em favor do servidor. (TJ-RS 70075707646, Rel. Eduardo Uhlein, data de julgamento: 28/03/2019, 4ª Câmara Cível)
[18] REMESSA NECESSÁRIA – DIREITO PREVIDENCIÁRIO – COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE COMPANHEIRA ATÉ A OCASIÃO DO ÓBITO - DIREITO À PENSÃO POR MORTE – MANTIDA A TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA NA SENTENÇA. I – Tendo em vista que restaram demonstrados os requisitos legais, a autora tem direito à pensão por morte, na qualidade de companheira, com data de início do benefício coincidente com a data do requerimento administrativo, nos termos do art. 74, II, da Lei nº 8.213/91.II - Comprovados, não apenas a probabilidade, mas o próprio direito da autora, e o perigo de dano, por tratar-se de verba de caráter alimentar, requisitos do art. 300 do CPC de 2015, deve ser mantida a tutela de urgência concedida anteriormente. (TRF2 – REOAC 0001223-10.2016.4.02.9999/RJ, Relator: Antônio Ivan Athié, data de julgamento: 23/02/2017, 1ª turma especializada)
Advogado inscrito na OAB/MG. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FIORINDO, Vitor Paiva. Tutela provisória na sentença e retirada do efeito suspensivo da apelação: técnica de incremento da efetividade do processo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 set 2020, 04:53. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55258/tutela-provisria-na-sentena-e-retirada-do-efeito-suspensivo-da-apelao-tcnica-de-incremento-da-efetividade-do-processo. Acesso em: 22 nov 2024.
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