RESUMO: Este artigo aborda os reflexos da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas nos anos de 2015 a 2020. O objetivo geral deste trabalho é analisar as consequências da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas, sendo assegurado pelo seguintes objetivos específicos: 1) compreender a previsão legal da audiência de custódia por meio do ordenamento jurídico brasileiro; 2) mostrar os procedimentos realizados pelo TJAM para a melhoria das audiências de custódia no estado do Amazonas; 3) avaliar se as audiências de custódia tem reduzido os índices de superlotação no sistema prisional do estado do Amazonas. Esta pesquisa implica em uma abordagem quantitativa, através das informações fornecidas pelo TJAM e CNJ para a coleta dos dados, também teve como suporte as fontes secundárias que implicam na pesquisa bibliográfica e documental. Através deste estudo se chegou à conclusão que de fato as audiências de custódia contribuem para a redução da superlotação do sistema carcerário do estado do Amazonas.
Palavras-Chave: Audiência de Custódia. Direitos Humanos. Direito Processual Penal. Sistema Prisional.
ABSTRACT: This article addresses the reflections of the custody hearing in the prison system of the state of Amazonas in the years 2015 to 2020. The general objective of this work is to analyze the consequences of the custody hearing in the prison system of the state of Amazonas, being ensured by the following specific objectives: 1) understand the legal provision of the custody hearing through the Brazilian legal system; 2) show the procedures performed by TJAM for the improvement of custody hearings in the state of Amazonas; 3) to assess whether custody hearings have reduced overcrowding rates in the prison system of the state of Amazonas. This research implies a quantitative approach, through the information provided by the TJAM and CNJ for data collection, also supported the secondary sources that imply in bibliographic and documentary research. This study concludes that in fact custody hearings contribute to the reduction of overcrowding of the prison system of the state of Amazonas.
Keywords: Custody Hearing. Human Rights. Criminal Procedural Law. Prison system.
Sumário: Introdução. 1 Materiais e Métodos. 2 Resultados. 3 Conceito e avanço do instituto da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro. 3.1 Conceito. 3.2 O avanço do instituto da audiência de custódia. 4 Procedimentos realizados pelo Tribunal de Justiça para a melhoria da audiência de custódia no estado do Amazonas. 4.1 Apresentação do projeto audiência de custódia no estado do Amazonas. 4.2 Capacitação de agentes públicos para audiência de custódia. 4.3 A primeira audiência de custódia no estado do Amazonas. 4.4 Articulação da audiência de custódia no AM com projeto de reinserção social. 4.5 Implantação de secretaria de audiência de custódia. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
A discussão concernente à audiência de custódia é uma questão que requer uma análise profunda, tendo em vista que este instituto é uma configuração clara na cultura de encarceramento do sistema prisional estadual. Assim, este artigo tem como temática os reflexos da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas nos anos de 2015 a 2020 e tem como objetivo geral analisar as consequências da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas. Outrossim ele visa compreender quais os fundamentos normativos que amparam a realização da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro.
O presente, também tem a finalidade de mostrar os procedimentos realizados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM) para a melhoria da audiência de custódia no estado. Por conseguinte, um dos eixos norteadores deste trabalho é de avaliar se as audiências de custódia reduziram a superlotação do sistema carcerário do estado do Amazonas.
Este trabalho se funda em uma abordagem quantitativa, uma vez que por meio desse método se pôde quantificar as informações numéricas obtidas referentes a quantidade de audiências de custódia realizadas entre os anos de 2015 a 2020. Neste trabalho foi adotado a pesquisa bibliográfica e documental partindo-se das premissas inseridas nas doutrinas, na legislação vigente e informações fornecidas pelo TJAM e CNJ.
Isto posto, este artigo mostra de forma embasada os resultados da pesquisa com os informes inerentes às audiências de custódia e seu reflexo na redução do sistema de encarceramento do Amazonas, bem como enfatiza a discussão que mostra o conceito e avanço do instituto da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro. Também destaca a respeito dos procedimentos realizados pelo TJAM para a melhoria das realizações das audiências de custódia no âmbito estadual.
O presente trabalho científico tem a principal finalidade de fornecer as informações para que se possa compreender o panorama do reflexo das audiências de custódia dentro do estado do Amazonas desde a sua implantação até o presente momento.
1 MATERIAIS E MÉTODOS
Para se alcançar os objetivos da referida pesquisa foi utilizada a abordagem quantitativa, visto que esse método é conclusivo, e tem como finalidade quantificar um problema e entender a dimensão dele. Esse tipo de pesquisa fornece informações numéricas sobre o fenômeno investigado. Segundo, Filho e Gamboa:
Na pesquisa quantitativa, utiliza-se o método dedutivo, as definições predeterminadas e operacionalizadas, a postura racionalista, a precisão por meio da medida e da manipulação estatística, a medida de variáveis, a análise de componentes e uma amostra grande com randomização. (FILHO e GAMBOA, 2002, p. 44).
Os dados fornecidos pelo TJAM subsidiaram a pesquisa quantitativa e mostraram os dados relativos às audiências de custódia entre os anos de 2015 a 2020 e nortearam a visão do reflexo deste instituto no sistema carcerário do estado do Amazonas.
Desta feita, esta pesquisa teve como suporte, os procedimentos relacionados às fontes secundárias que implicam no levantamento bibliográfico, através de doutrinas e legislação que possibilitaram um conhecimento mais aprofundando a cerca da temática. Conforme Gonsalves (2003, p. 32), “a pesquisa bibliográfica remete as contribuições de diferentes autores sobre um assunto, atestando para fontes secundárias”.
A pesquisa bibliográfica mostra diferentes pontos de vistas que poderão contribuir para o enriquecimento e entendimento da pesquisa, através de um levantamento no que tange ao conhecimento disponível, identificando as teorias produzidas, analisando-as e avaliando suas contribuições para auxiliar a compreender ou explicar o problema objeto da investigação. Outra fonte utilizada no presente trabalho foi a pesquisa documental que baseia-se em documentos oficiais fornecidos por meio dos sites do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas e Conselho Nacional de Justiça.
2 RESULTADOS
Por meio dos dados fornecidos pelo TJAM a pesquisa apontou que no final de 2015 dos nove mil presos, 6.024 estavam na capital, sendo que desse total 4.242 eram provisórios o equivalente a 70%. As informações levantadas apontaram que no interior haviam 2.987 presos, sendo que 1.463 também eram provisórios o equivalente a 48,9% do total.
Segundo estatísticas do próprio TJAM através da presidente da época, desembargadora Graça Figueiredo, desde a implantação do instituto no estado, de agosto de 2015 a fevereiro de 2016, ou seja, em um um período de seis meses, o estado realizou 857 audiências nas quais foram concedidas 412 liberdades (47,9%) e decretadas 445 prisões preventivas (51,86%). Registrados no total 348 atos de violência no momento da prisão. Destaca-se que segundo os levantamentos, apenas em dezembro de 2015 foram conduzidas 73 sessões com 51 liberdades concedidas, 22 prisões preventivas e 31 atos de violência durante a prisão. Os crimes mais comuns foram roubo, furto, tráfico de drogas, furto qualificado, roubo majorado e falsidade ideológica.
Ainda conforme os dados, em janeiro de 2016 foram realizadas 153 audiências de custódia, sendo 77 liberdades concedidas, 76 prisões preventivas e 66 atos de violência no ato da prisão. Os delitos mais comuns foram roubo, furto, tráfico de drogas e porte ilegal de armas. No mês seguinte, foram 168 audiências, com 74 liberdades concedidas, 94 prisões preventivas e 80 atos de violências constatados no ato das prisões. Entre os delitos estiveram roubos, furtos e condução de veículo em estado de embriaguez.
Em um levantamento preliminar da coordenação do Projeto Justiça Presente, os dados apontaram que no mês de junho de 2016 e junho de 2017, houve no Amazonas uma redução de mais de 20% da taxa de presos provisórios, pesquisa realizada pelo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias - INFOPEN.
O INFOPEN do Ministério da Justiça, apontou que em junho de 2016 e no mesmo período de 2017 o Amazonas era um dos estados brasileiros com o maior índice de presos provisórios no sistema carcerário. A taxa de presos provisórios no estado era de 64% e 53,9%, respectivamente. No início de 2018 a taxa encontrava-se em torno de 40%, resultados ligado à Vara de Execução Penal (VEP), somado a gestão executada pelo Tribunal de Justiça do Amazonas. Entre junho de 2018 a maio de 2019, segundo dados do TJAM foram realizadas 6.798 audiências, assim, deste total 3.041 firmaram em prisão preventiva, 3.093 foram liberados para responder o processo em liberdade, 443 foram liberados, porém monitorados por tornozeleira eletrônica, 76 foram liberados mediante pagamento de fiança, 75 tiveram relaxamento de prisão e 70 tiveram prisão domiciliar decretada.
No início de 2020 o Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas decidiu pela suspensão, pelo prazo de 15 dias, das audiências de custódia. Os magistrados plantonistas passaram a analisar nos autos a legalidade das prisões em flagrante, decidiram suas respectivas homologações ou relaxamentos, julgaram a aplicação de medidas cautelares, entre outros procedimentos, depois que o Ministério Público se manifestava de eventual pedido da defesa, no entanto, sem a presença do preso e a realização de audiência.
A Portaria n.º 2/2020, assinada ainda em março de 2020 pela direção do Tribunal e que dispõe sobre medidas preventivas para a redução dos riscos de contaminação com o novo coronavírus no âmbito das unidades judiciárias do TJAM, já havia determinado a suspensão das audiências cíveis e criminais, mas mantido a realização das audiências de custódia por meio de videoconferência.
3.CONCEITO E AVANÇO DO INSTITUTO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
3.1 Conceito
O dicionário jurídico: academia brasileira de letras jurídicas conceitua os termos audiência e custódia. Para o aludido dicionário, audiência significa reunião solene presidida pelo juiz para a realização de atos processuais e custódia implica na ação de guardar alguma coisa alheia; ou de manter detida alguma pessoa, empregando a segurança necessária.
Baseado nesses preceitos, conforme o entendimento de Oliveira et al, o termo audiência de custódia, tem por definição:
A denominada audiência de apresentação ou de custodia é um instrumento de natureza pré-prossesual, embora sujeito ao contraditório, que pode ser definido como um ato destinado a concretizar o direito reconhecido a todo indivíduo preso, a ser conduzido, sem demora, à presença de uma autoridade judiciária (juiz, desembargador, ou ministro, a depender da incidência ou não de foro por prerrogativa) (OLIVEIRA, et al, 2019, p. 99).
Audiência de custódia ou de apresentação é o instrumento pré-processual que estabelece que todo preso em flagrante deve ser conduzido à presença de um juiz, no prazo de 24 horas, para que seja avaliado a legalidade e necessidade de manutenção da prisão. Assim se define que a audiência de custódia é um instrumento, tendo em vista a observância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, tendo em vista que ela realiza o encontro do preso com o magistrado, valendo-se aquele do seu direito de defesa, com base em uma defesa técnica e pessoal, por meio da oralidade.
Na concepção de Nucce (2016, p. 560), o termo audiência de custódia, “é o ato realizado, após a prisão em flagrante do agente, no prazo máximo de 24 horas, para que o juiz, pessoalmente, avalie a sua legalidade e promova as medidas cabíveis: manter a prisão, relaxar o flagrante ou conceder liberdade provisória”.
O referido instituto, também denominado de audiência de apresentação do autuado, preso em flagrante delito. Neste ato é conduzido perante o juiz, no prazo de vinte e quatro horas, permitindo-lhe o contato pessoal, devendo o magistrado analisar a prisão sob o aspecto da legalidade, da adequação e da necessidade da sua continuidade ou concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares.
3.2 O avanço do instituto da audiência de custódia
O ordenamento jurídico brasileiro não previa a audiência de custódia, entretanto o referido instituto adentrou no ordenamento interno através do Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, por meio do decreto nº 592 de 06 de julho de 1992. Seguindo esse mesmo panorama foi assinada pelo Brasil em 06 de novembro do mesmo ano a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, denominada como Pacto de São José da Costa Rica, através do decreto 678 de 1992. Conforme menciona, Silva (2018, p.45), “o Brasil aprovou, por meio do Decreto 678/1992, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, bem como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, ratificado pelo Decreto 592/1992”.
Desta feita, essas normas ganharam eficácia interna e força de lei através do processo constitucional de incorporação por meio da Suprema Corte.
Tendo em vista a efetivação e o fortalecimento do referido instituto, destaca-se a Lei 12.403/2011 que passou a vigorar no dia 04 de julho de 2011 que alterou dispositivos do código penal brasileiro, conforme Oliveira et al:
No dia 05 de maio de 2011 foi publicado no Diário Oficial da União a Lei 12.403 que, na expressão de sua ementa: “Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providencias” (OLIVEIRA, et al, 2019, p. 96).
A referida alteração é oriunda do Projeto de Lei 4.208, de 2001, o qual fazia parte de um conjunto de reformas elaboradas e veio a ser elencado às medidas pontuais para minimizar os graves problemas enfrentados pelo sistema prisional brasileiro.
Outro ponto relevante no que tange ao instituto da audiência de custódia foi a implantação pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) da Resolução 213/2015, a qual dispõe acerca da necessidade de apresentação de toda pessoa presa perante a autoridade judicial no prazo de 24 horas. Segundo Silva (2018, p. 52), “o Conselho Nacional de Justiça aprovou no dia 15 de dezembro de 2015, a Resolução 213/2015 que regulamenta a realização da audiência de custódia em todo o território nacional, tornando-a obrigatória no prazo de 90 dias”.
A resolução em voga disciplinou procedimentos a serem seguidos pelos tribunais que implicou na execução em todos os estados brasileiros. Neste sentido, enfatiza-se que a audiência de custódia foi positivada em âmbito nacional, pela resolução acima mencionada, mas finalmente prevista pela Lei 13.964/2019 que instituiu o Pacote Anticrime, ao alterar o Código de Processo Penal, atribuindo a seguinte redação, no art. 287, “Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandato, para a realização de audiência de custódia”. Mudança de igual modo no art. 310 do mesmo dispositivo:
Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente... (CÉSPEDES e ROCHA, 2020, p. 462).
Deste modo, a audiência de custódia é procedimento obrigatório, pela qual todo indivíduo preso em flagrante deverá ser apresentado em um prazo de até 24 horas da prisão à autoridade judicial e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADPF 347, antes ainda da vigência do Pacote Anticrime, já entendia pela obrigatoriedade por parte dos juízes e tribunais em realizar a audiência de custódia.
Com o advento do Pacote Anticrime o dispositivo da audiência de custódia adentra o Código de Processo Penal brasileiro, que serve de norte para embasar o instituto tratado. De todo modo, a inserção, como mencionado acima, da audiência de custódia no Código de Processo Penal é um ponto positivo em favor dos direitos humanos a ser destacado na lei 13.964/19.
Destaca-se que muitos são os princípios que fundamentam o instituto em questão, como o princípio da dignidade da pessoa humana, pois o mesmo defende as condições mínimas de existência, saúde física e moral, em aplicação da aludida audiência, como o fato de o preso ser apresentado em vinte e quatro horas ao juízo competente, inibindo-se a prática de atos que ferem tal princípio, como: torturas, maus-tratos e agressões. Na visão de Gonçalves (2020, p 17), “não há dúvida de que a audiência de custódia constitui ferramenta jurídica ímpar na proteção dos direitos humanos”.
Ela permite que o preso sinta-se mais próximo do processo, tendo como direito de mencionar o contraditório pleno e efetivo antes da tomada das medidas cabíveis, evitando assim, prisões desnecessárias, atenuando-se a superlotação carcerária e os gastos que decorrem da manutenção de presos provisórios. Permite ainda conhecer e tomar providências necessárias e adequadas. Garante-se um controle judicial célere e eficaz sobre a legalidade, necessidade e adequação da prisão cautelar. Távora e Alencar citam:
Audiência de custódia retrata o permeio do princípio da dignidade da pessoa humana no direito processual penal. Trata-se de um modo de humanização da persecução penal estatal, apta à sua democratização tendente tanto a coibir a tortura, quanto a promover o debate sobre a necessidade da prisão. (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 914).
O instituto da audiência de custódia tem o intuito de promover uma evolução civilizatória no processo penal e funcionar como um instrumento importante de garantia dos direitos fundamentais, tendo em vista o combate à prisões ilegais, feitas de maneiras arbitrárias ou desnecessárias, e ainda analisar a integridade física do preso.
4 PROCEDIMENTOS REALIZADOS PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA A MELHORIA DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO ESTADO DO AMAZONAS
4.1 Apresentação do Projeto Audiência de Custódia no Estado do Amazonas
Em março de 2015 a coordenação do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apresentou detalhes do Projeto Audiência de Custódia a membros do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas e do governo local, bem como à cúpula da segurança pública, Ministério Público (MP) e à Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/AM), na ocasião foram apresentadas dúvidas operacionais com os esclarecimentos sobre o funcionamento do projeto, seus objetivos e as expectativas de resultados que, por meio dele, seriam alcançado. Conforme Oliveira et al:
Driblando a longa espera pela regulamentação, por parte do Poder Legislativo, de um procedimento que garanta a concretização do direito reconhecido a todo indivíduo preso, a ser conduzido, sem demora, à presença de uma autoridade judiciária, o Conselho Nacional de Justiça optou por criar uma regulamentação geral (Resolução nº 213, de 15/12/2015) e a orientar os Tribunais a regulamentarem, de forma mais específica, administrativamente, o procedimento a ser adotado na audiência destinada ao cumprimento do comando emanado do Pacto de São José da Costa Rica e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (OLIVEIRA et al, 2019, p.111).
Além da apresentação do preso em flagrante ao juiz, onde é feita uma primeira avaliação sobre o cabimento e a necessidade de manutenção da prisão, o projeto preverá a estruturação ou o fortalecimento de centrais de alternativas penais, centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação penal. Essas centrais são responsáveis por apresentar ao juiz opções ao encarceramento provisório.
Desta feita, as informações fornecidas contribuíram para a avaliação da viabilidade do projeto para a realidade amazonense. Assim sendo, foi apresentado suas diretrizes, voltadas para garantir a rápida apresentação dos presos a um juiz nos casos de prisões em flagrante.
4.2 Capacitação de agentes públicos para audiência de custódia
Em agosto de 2015 houve a implantação do Projeto Audiência de Custódia idealizado pelo CNJ como mencionado, o programa implicara em que presos em flagrante fossem ouvidos em 24 horas por juízes, de maneira presencial com a participação de defensores e de membros do MP.
O objetivo da implementação do referido programa no estado visara combater a superlotação carcerária, inibir a execução de atos de tortura, tratamento cruel e desumano aos presos, bem como viabilizar o respeito às garantias constitucionais e reforçar o compromisso do TJAM na proteção dos direitos humanos.
Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.(BOBBIO,2004, p.25)
Os direitos fundamentais implicam em superar a discriminação, a intolerância, a exclusão social e a violência. Tem vínculo direto com a liberdade e valores do espírito e com as condições materiais de subsistência da pessoa. Somente a previsão legal não é suficiente para a mudança de comportamento, é preciso uma maneira mais efetiva para que esses direitos possam ser resguardados.
4.3 A primeira audiência de custódia no estado do Amazonas
Em agosto de 2015 a juíza Andrea Jane Silva de Medeiros conduziu, em Manaus, a primeira audiência de custódia do estado do Amazonas, onde concedeu a liberdade provisória a um estudante de 18 anos que havia sido preso em flagrante por furto. O caso do estudante marcou o lançamento do Projeto Audiência de Custódia, que prever a apresentação da pessoa presa em flagrante ao juiz em um prazo de 24 horas. De acordo com Mougenot:
Prisão em flagrante, portanto, é aquela realizada nas hipóteses legalmente previstas como tal. De acordo com o art. 302 do CPP, pode ser preso em flagrante não só quem está cometendo a infração penal ou acaba de cometê-la, como aquele que já a praticou, nas circunstâncias ali especificadas. (MOUGENOT, 2019, p. 590)
A prisão em flagrante deve ser ato de formalidades legais, isto é, eventual inviolabilidade do auto de prisão em flagrante invalida apenas a prisão, não implicando a posterior ação penal, desde que a prova do delito tenha sido obtida licitamente.
A primeira audiência de custódia contou com a presença do ministro Ricardo Lewandowski, então presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), e pela então presidente do TJAM, desembargadora Graça Figueiredo.
4.4 Articulação da audiência de custódia no Amazonas com projeto de reinserção social
O Projeto Audiência de Custódia, desenvolvido pelo CNJ, em parceria com os Tribunais de Justiça, teve um diferencial no Amazonas, visto que as obrigações impostas às pessoas autorizadas a responder a processo em liberdade foram além do cumprimento de medidas cabíveis, uma vez que houve articulação com projeto reinserção social, a saber: Projeto Reeducar (Reduzindo o Retorno ao Cárcere), executado pelo TJAM e que promove ações de reinserção social. Dentro desse contexto, se configura a consolidação de princípios fundamentais. Segundo Oliveira:
A dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88) impõe que o indivíduo seja reconhecido como membro da sociedade dotado de valor intrínseco, em condições de igualdade e com direitos iguais, resguardando-o em sua “individualidade” e, como sujeito de direito, sendo vedado tratá-lo como mero objeto nas suas diversas relações com o Estado, inclusive, e, principalmente, na relação processual penal (OLIVEIRA, 2019, p. 7 e 8).
A dignidade da pessoa humana é um dos princípios mais relevantes e que se faz de base para todo o sistema jurídico brasileiro. Assim, o atendimento ao assistido por parte das articulações do TJAM e CNJ, teve a finalidade de envolver os indivíduos em ciclos de palestras, aconselhamentos e, quando necessário, o encaminhamento a instituições parceiras que atendem pessoas com dependência química, isto é, proporcionar a criação de alternativas em relação à reincidência e à reinserção social daqueles que, por algum motivo, tenham praticado um ou mais delitos constantes do Código Penal.
Criado em 2009, tendo como público-alvo egressos do sistema prisional ou de audiências de custódia que respondem ao processo em liberdade provisória, mediante o cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão.
As atividades do projeto do TJAM, implicam em oferecer assistência sociopsicopedagógica, por meio de palestras, cursos de capacitação, encaminhamento para cursos profissionalizantes para acompanhamento por programas, como o Alcoólicos Anônimos e/ou Narcóticos Anônimos, entre outras ações.
Em setembro de 2019 o TJAM assinou, acordos de cooperação técnica com a Secretaria de Educação e Qualidade de Ensino do Estado (SEDUC), com o Centro de Educação Tecnológica do Amazonas (CETAM) e com a Defensoria Pública do Estado (DPE-AM), para reforçar as ações de responsabilidade social executadas no âmbito do referido projeto.
Os cursos do programa ocorrera no Fórum Henoch Reis e no Instituto Maria Avelino por meio dos seguintes cursos: repositor de mercadorias, decoração com balões, técnicas de atendimento ao cliente, inspetor de qualidade, noções de empreendedorismo, artesanato com pintura em tecido, artesanato com patchwork, técnicas de almoxarifado, relojoaria, técnicas de vendas e confecção e enfeites natalinos. Durante uma década (2009-2019) o projeto alcançou resultados significativos que implicam 13.431 reeducandos, com um índice de reincidência na faixa dos 3%.
4.5 Implantação de secretaria de audiência de custódia
No ano de 2018 foi implantada pelo TJAM uma secretaria de apoio à audiência de custódia que passou a dar suporte aos magistrados plantonistas das audiências criminais de custódia ocorridas na Comarca de Manaus. A unidade tem a finalidade de dar suporte aos magistrados e concentra, por exemplo, informações estatísticas.
A referida secretaria foi criada pela Portaria 1.981/2018-PTJ, assinada pelo então presidente desembargador Yedo Simões e tem como finalidade providenciar a confecção de expedientes relacionados à fiscalização do cumprimento de medidas cautelares eventualmente impostas durante as audiências, além de elaborar, atos de praxe relativos à soltura do autuado, à conversão da prisão em flagrante em preventiva ou domiciliar, dentre outros procedimentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos durante a pesquisa são oriundos de uma soma de esforços que deixam claro a veracidade e qualidade deste trabalho científico, pesquisa essa que possibilitou analisar as consequências da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas. Assim sendo, se pode afirmar que a audiência de custódia é um dispositivo que veio para contribuir com a redução da superlotação do sistema carcerário amazonense, visto que sua implantação no ordenamento jurídico brasileiro foi significativa e mostra dados claros sobre a sua relevância.
O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas em parceria com o Conselho Nacional de Justiça estruturaram no âmbito estadual todos os pressupostos para a realização das audiências de custódia. Neste sentido, o TJAM seguindo as determinações do CNJ, iniciou no estado no ano de 2015 a apresentação do Projeto Audiência de Custódia que foi o marco do referido instituto no Amazonas. Ocorreu no mesmo ano a capacitação dos agentes públicos, onde na oportunidade foram esclarecidos os objetivos do projeto. Desta feita a primeira audiência de custódia foi realizada em agosto de 2015.
Destaca-se ainda que o TJAM articulou um projeto de reinserção social com a audiência de custódia, fator bastante positivo para a consolidação deste dispositivo no âmbito local, pois as obrigações impostas às pessoas autorizadas a responder a processo em liberdade foram além do cumprimento de medidas cabíveis. Outro ponto destacado foi a implantação da secretaria de audiência de custódia no ano de 2018, com a finalidade de apoiar o instituto em voga, tendo em vista em dar suporte aos magistrados plantonista das audiências criminais de custódia ocorridas na Comarca de Manaus.
O instituto em si é um meio normativo que garante os direitos inerentes a pessoa presa em flagrante. Assim os resultados possíveis, de uma audiência de custódia, conforme o próprio CNJ, são: o relaxamento de eventual prisão ilegal (art. 310, I, do Código de Processo Penal); a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 310, III, do Código de Processo Penal); a substituição da prisão em flagrante por medidas cautelares diversas (arts. 310, II, parte final e 319 do Código de Processo Penal); a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva (art. 310, II, parte inicial); a análise da consideração do cabimento da mediação penal, evitando a judicialização do conflito, corroborando para a instituição de práticas restaurativas outros encaminhamentos de natureza assistencial.
Portanto através desta pesquisa se chegou a conclusão que desde a sua implantação as audiências de custódia tem reduzido os índices de superlotação no sistema prisional do estado do Amazonas de forma considerável o que implica para a redução da cultura do encarceramento em massa e, consequentemente, para a superlotação dos presídios. É necessário que se compreenda que a audiência de custódia é um direito do preso e tem como base os direitos fundamentais da pessoa humana, para isso basta a entendermos em sua plenitude e totalidade
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS. Audiência de Custódia, Manaus, 23 set. 2020. Disponível em https://www.tjam.jus.br. Acesso em: 26 set. 2020.
Acadêmico de Direito da Universidade Luterana do Brasil - CEULM/ULBRA, Manaus, AM.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARQUES, AYLESON RAMOS. Os reflexos da audiência de custódia no sistema prisional do estado do Amazonas desde a sua implantação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 nov 2020, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55639/os-reflexos-da-audincia-de-custdia-no-sistema-prisional-do-estado-do-amazonas-desde-a-sua-implantao. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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