BRENO OLIVEIRA SIMONASSI
(orientador)
RESUMO: O presente estudo visa demonstrar práticas sociais do mercado de trabalho e de certames públicos que afastam da inserção social plena reeducandos e egressos do sistema penitenciário, impossibilitando-os de obter colocações profissionais e por conseqüência dificultando ou impedindo sua ressocialização. Tais práticas são contraditórias aos princípios da ressocialização, da dignidade da pessoa humana e da igualdade, resultando no agravamento de problemas sociais, aumento dos índices de reincidência criminal, e acentuando a marginalidade social, o que impacta diretamente não só o próprio egresso, mas também toda sua família e a sociedade em geral. Serão obtidas informações através de editais públicos, exigências curriculares para contratações em grandes empresas e dados estatísticos de órgãos nacionais, demonstrando o quanto tais praticas são nocivas e opostas ao que se busca na lei de execuções penais, evidenciando ainda que o estado, mais uma vez, se esquiva de suas responsabilidades.
Palavras-chave: Ressocialização; reincidência; exclusão social; Lei de execuções penais.
ABSTRACT: This study aims to demonstrate social practices in the labor market and edicts public that exclude re-educated and egress from the penitentiary system from full social insertion, making it impossible for them to obtain professional placements and consequently hindering or preventing their re-socialization. Such practices are contradictory to the principles of resocialization, the dignity of the human person and equality, resulting in the aggravation of social problems, an increase in the rates of criminal recidivism, and accentuating social marginality, which directly impacts not only the reeducation itself, but also whole family and consequently society in general. Information will be obtained through edicts public, curricular requirements for hiring in large companies and statistical data from national agencies, demonstrating how harmful these practices are and opposed to what is sought in the law of criminal executions, also showing that the state, again, evades your responsibilities.
Keywords: Resocialization; recurrence; social exclusion; Criminal executions law.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Metodologia. 3.Política Criminal Penitenciária. 4. Lei de Execuções Penais(LEP). 5.Exclusão Estatal. 6. Exclusão social. 7. Considerações Finais. 8. Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÂO
As condutas criminosas são atos inerentes do homem, tendo o crime acompanhado toda história da raça humana, de tal forma que a sociedade se organizou e criou o Direito Penal, que tem como finalidade precípua, retirar do seio social indivíduos inaptos para convivência harmônica, reeducar e devolvê-los regenerados.
Esta regeneração, é primordial para o funcionamento da justiça, uma vez que os apenados retornarão ao convívio em sociedade, sendo necessário criar possibilidades de melhoras e a esperança de mudança de sua realidade socioeconômica, conforme brilhantemente escrito por FOUCAULT:
“[...] Se alguma coisa há que possa despertar no espírito dos condenados a idéia de bem e de mal, levá-los a considerações morais e elevá-los um pouco a seus próprios olhos, é a possibilidade de conseguir alguma recompensa” (FOUCAULT, 2012, pág. 233).
O direito penal é executado pelo estado, a cada dia mais intensamente, aumentando o número de encarcerados no sistema prisional brasileiro de forma exponencial. Na última década o acréscimo foi de aproximadamente cento e sessenta por cento (160%) 1. Estes números demonstrariam a eficiência estatal, se não trouxessem também o triste índice de reincidência que chega a setenta por cento (70%)2, em alguns estados brasileiros. Fica evidente, que as ferramentas e políticas estatais utilizadas atualmente têm provocado um efeito oposto ao que se almeja.
Diversos juristas, sociólogos e filósofos já debateram sobre esta temática, onde o estado prende o individuo, não o ressocializa, e o solta sem qualquer reeducação e grande parte das vezes o exclui do mercado de trabalho, para em seguida o prender novamente por cometer novos delitos, e assim se alimenta esse perverso ciclo vicioso do encarceramento.
A punição aplicada aos encarcerados, deve ser vista como forma de reeducação e não de vingança, a ressocialização só será possível caso o apenado vislumbre mudanças em sua realidade, ao receber o que lhe falta, seja através da religião, do trabalho, da educação, da dignidade ou de seus valores sociais, vejamos novamente o que diz FOUCAULT:
[...] O sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta é uma das causas que mais podem tornar indomável seu caráter. Quando se vê assim exposto a sofrimentos que a lei não ordenou nem mesmo previu, ele entra em um estado habitual de cólera contra tudo que o cerca; só vê carrascos em todos os agentes da autoridade: não pensa mais ter sido culpado; acusa a própria justiça. (FOUCAULT, 2012 pág.252)
Ou seja, submeter o apenado ou egresso a condições que vão além das punições previstas em lei fragilizam ainda mais suas íntimas convicções, inclinando-o para a vida delituosa. A maior prova de que o punitivismo fracassou é que a aplicação dos suplícios no passado, pouco serviu para a repressão dos delitos.
A Lei de Execuções Penais, atribui claramente ao estado a função de orientar e ressocializar, descrevendo em seu artigo 10º:
Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. (LEP, Lei nº 7.210/8)
Diante desta grande problemática, inúmeros programas sociais foram iniciados tais como: Volta por Cima - GO, Projetos Agentes da Liberdade - RJ, Projeto Recomeçar - RS, Fundação Amparo ao Egresso do Sistema Penitenciário – SP, Projeto Clareou – SP, Projeto Esperança Viva – PB. entre tantos outros, que trabalham principalmente com apoio psicossocial, jurídico e inserção laboral, entretanto estes programas são locais, em micro-escala, tomados como exemplos a serem seguidos, quando na verdade deveriam ser parte de uma política publica nacional duradoura e obrigatória, capaz de atender os egressos em sua totalidade.
Todavia apesar já demonstrado o quanto estes programas impactam positivamente diminuindo os índices de reincidência, as políticas nacionais não são implementadas no sentido de multiplicá-los. Presente na sociedade há décadas este complexo panorama, serão debatidas medidas que prejudicam a ressocialização buscando alcançar formas de minimizá-las.
2.METODOLOGIA
Para realização do presente estudo, foi feita uma revisão de literatura, resultando em uma revisão bibliográfica documental. Tal pesquisa foi realizada por meio da análise e interpretação da Constituição Federal de 1988, leis penais, doutrinas relacionadas, certames públicos, além da análise de dados do sistema penitenciário, principalmente os relacionadas aos fatores de reincidência criminal, por intermédio de informações de domínio público disponibilizadas por entes da administração (SENASP, INFOPEN, CNJ entre outros).
3. POLÍTICA CRIMINAL PENITENCIÁRIA
A Política Criminal Penitenciária é estabelecida pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), sediado em Brasília e subordinado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). Cabendo ao CNPCP propor diretrizes, elaborar planos nacionais de desenvolvimento a cada quatro anos, avaliar periodicamente o sistema criminal entre outras funções elencadas no artigo 64 da Lei de Execuções penais (LEP), Lei nº 7.210/84.
Sendo estabelecido como diretrizes do Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária (PNPCP) 2020-2023: prevenção, repressão, investigação, processo, execução e reintegração. Já constando desde o ano de 2015, no PNPCP, diretrizes que visam à reintegração social, para garantir apoio ao egresso do sistema penitenciário em seu retorno à sociedade. Entretanto tais diretrizes tem se mostrado extremamente teóricas, consistindo em sua maioria, de políticas de combate a criminalidade no seu aspecto repressivo (pós-crime), pouco fazendo pela prevenção de novos delitos e a reincidência.
Fica evidente que a reincidência, é de extrema relevância, pois reiteradamente é colocada nas diretrizes do plano nacional como podemos observar:
Segundo o atual PNPCP deve ser construído um tripé: onde o condenado deverá perceber que o crime não compensa; construção de um sistema penitenciário eficiente para preparar o encarcerado para retornar à sociedade; e o desenvolvimento da participação social na reintegração.
Principalmente em nível estadual, os governantes não foram capazes de administrar o sistema penitenciário, construindo novas unidades para acompanhar a demanda por vagas, segundo informações do INFOPEN em 2017, a taxa de ocupação média no país era de cento e noventa e sete por cento (197%), perfazendo um déficit de 358.663 vagas.
Estão previstas também a adoção de medidas que propiciem o trabalho, a educação e a intensificação das práticas religiosas, buscando o fortalecimento das travas morais que fazem com que a pessoa se abstenha de cometer crimes. Para isso tais medidas devem estar em concordância com a Regras de Mandela:
4. LEI DE EXECUÇÕES PENAIS (LEP)
Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.
Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. (LEP, Lei nº 7.210/8)
Art. 26. Considera-se egresso para os efeitos desta Lei:
I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do estabelecimento;
II - o liberado condicional, durante o período de prova. (LEP, Lei nº 7.210/8)
As obrigações da administração são de orientação, apoio, alojamento, alimentação por um período de até quatro meses. Ainda devendo a assistência social contribuir para que o obtenham trabalho. São bem claras e diretas as obrigações estabelecidas em lei, e se colocadas em prática mudariam muito o panorama da segurança pública nacional.
As possibilidades de ensino a distância previstas na LEP são ainda mais notáveis após a pandemia do Covid 19, in verbis:
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.[...]
§ 2o As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos freqüentados.(LEP, Lei nº 7.210/8)(grifamos).
Embora a previsão da modalidade de ensino a distância tenha sido incluída na LEP no ano de 2011, até os dias atuais, está bem distante de ser aplicada. Pois a falta de estrutura das prisões impede a utilização desta magnífica ferramenta de qualificação profissional e educacional, seria bastante benéfico utilizar o ensino a distância em parceria com instituições de ensino públicas, para a formação técnico-profissional de apenados, possibilitando a estes quiçá a conclusão de cursos superiores.
Apesar das belas intenções propostas na LEP, o que ocorre de fato é o despejo dos egressos nas ruas após o cumprimento de suas condenações, sem ter recebido reeducação alguma, pelo contrário, é sabido que as péssimas condições do cárcere desenvolvem ainda mais os instintos criminosos dos indivíduos.
Sendo assim, com a liberdade do condenado, “nasce” o egresso, que enfrentará um mundo novo, muito mais difícil, marcado pelo estigma social da palavra “preso”, sendo quase sempre visto como um potencial delinquente, que verá o fechamento de mais algumas dezenas de oportunidades, mesmo tendo cumprido toda a pena a ele imposta.
Este que na maioria das vezes, antes do cárcere já se via em dificuldades sociais, agora enfrentará a vida sem nenhum preparo fornecido pelo estado, marginalizado, excluído e sofrendo imenso preconceito, temos aí a “receita” potencializadora para fabricação de reincidentes. Pois onde este indivíduo encontrará oportunidades para se reinserir, conseguir trabalho, se sustentar e sustentar sua família?
Encontramos aqui um verdadeiro paradoxo, onde as falhas estatais (segurança pública / justiça / sistema penitenciário) trabalham contra a própria sociedade, pois desta forma se agravam as condições de marginalização social, aumenta-se a criminalidade, diminui-se a sensação de segurança e em conseqüência demandam-se aumentos de gastos e investimentos com o a segurança pública.
5.EXCLUSÃO ESTATAL
Há uma série de princípios que regem nosso sistema normativo e servem como balizadores da aplicação das leis, que deveriam ser considerados incontestavelmente primordiais em todo sistema jurídico nacional, princípios constitucionais como: Da Dignidade da pessoa humana3; Da Igualdade4; Da vedação de penas de caráter perpétuo5.
Tais princípios, em certas ocasiões quando confrontados com outros, de menor grandeza, são subestimados, como quando em oposição ao princípio da moralidade administrativa6, que é utilizado para justificar a exclusão de apenados e egressos na concorrência por vagas de trabalho no setor público por meio de concursos.
É o que se observa diariamente com a publicação de editais e certames de concursos públicos, onde de forma objetiva, nos requisitos para investidura do cargo, e de forma subjetiva, durante a investigação social, indivíduos que já tiveram alguma condenação criminal são excluídos do certame em nome da moralidade administrativa.
Em diversos casos estas exclusões são completamente ilegais e abusivas, cabendo ao candidato injustiçado, caso tenha condições, recorrer ao poder judiciário, não sendo esta uma batalha fácil, pois tendo em vista a morosidade do judiciário e o elevado custo financeiro para propositura de tais ações, o que resulta na inviabilização da correção das injustiças.
Tornando assim utópicas as diretrizes da ressocialização e de inclusão social previstas na LEP e no Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária, uma vez que o idealizador das diretrizes, o Estado, é o primeiro a se eximir delas.
O exemplo abaixo é apenas um dentre dezenas de editais de concursos públicos publicados rotineiramente, que trazem expressamente as vedações impostas ao ex-condenado, impedindo arbitrariamente que alcancem as carreiras públicas por meio de concurso.
CONCURSO PÚBLICO PREFEITURA MUNICIPAL DE XINGUARA/PA Edital nº 001/2020, de 02 de março de 2020.
2. DAS CONDIÇÕES PARA INVESTIDURA NO CARGO
2.1. Para investidura no cargo escolhido, o candidato deverá ter na data da posse as condições especificadas a seguir:[...]
m) Não ter sido condenado a pena privativa de liberdade transitada em julgado ou qualquer outra condenação incompatível com a função pública;[...]
p) Não registrar antecedentes criminais; e q) Cumprir as determinações deste Edital.[...]7 (grifamos).
Desta forma que não basta que o apenado cumpra toda a sua pena, pois na prática, fica evidente que suas penalidades, se estenderão muito além dos limites legais da condenação, beirando o caráter perpétuo, tendo em vista que uma vez que seja preso e condenado jamais poderá ocupar as fileiras públicas.
Destarte, não há qualquer argumento legal ou razoável para impedir a posse de um ex-condenado ou ex-preso, por crimes como: falso testemunho, dano, lesão corporal culposa, apropriação indevida, omissão de socorro, difamação, violação de correspondência, usurpação de águas, concorrência desleal, perturbação, entre outros, não tão graves, mesmo após ter cumprido na integralidade sua pena. Por que estes ex-condenados não poderiam ocupar cargos de: mecânico, secretário, auxiliar de limpeza, técnico em informática, assistente administrativo, professor ou qualquer outro?
Percebe-se o quanto tais impedimentos em carreiras públicas são desnecessários e prejudiciais, pois milhares de egressos do sistema penitenciário poderiam alcançar condições dignas de vida e de trabalho nestas colocações e estariam assim mais distantes da criminalidade e da reincidência.
Permitir que o egresso seja nomeado em uma carreira pública não seria um prêmio ou privilégio concedido, seria apenas permitir que ele após ter cumprido toda a sanção imposta, participe de certames públicos e caso aprovado tenha condições de levar uma vida normal, com os mesmos direitos de qualquer outro cidadão.
Desta maneira a moralidade administrativa em nada estaria ameaçada, pois além dos meios de controle normais (policial, judicial), o egresso como funcionário público estaria submetido ao controle da administração, através de estágio probatório, avaliações periódicas de desempenho, fiscalização de chefias imediatas e mediatas, ou seja ele estaria sendo ainda mais fiscalizado, quando é parte dos quadros da administração pública.
6.EXCLUSÂO SOCIAL
Igualmente danosa aos egressos é a exigência da pesquisa de antecedentes criminais nos exames de admissão de empresas privadas, como transportadoras, multinacionais e comércio em geral. Prática comum de mercado, não obstante estar em desacordo com a orientação do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que decidiu quais condições esta consulta criminal será permitida (empregados domésticos, cuidadores de menores, idosos ou deficientes, bancários, pessoas que atuam com substâncias tóxicas, armas ou com informações sigilosas, etc) 8, contudo tornou-se regra de mercado sua exigência para a admissão no emprego, mesmo que de forma velada, em que o candidato a vaga jamais saberá o motivo de sua rejeição.
A marginalização social se inicia com o preconceito, uma vez que a sociedade não quer receber o egresso, por duvidar da reabilitação daquele individuo que é enjaulado em péssimas condições, isolado do convívio social, incluído em grupos criminosos para sobreviver ao cárcere, onde a prática de crimes graves é o que o torna respeitado dentro do “sistema”.
Mais uma vez, são colocados obstáculos intransponíveis para a vida do egresso, onde seu passado criminoso e sua estadia no cárcere impedem de ser visto como uma pessoa comum, o resultado será o aguçamento de suas vulnerabilidades desembocando na reincidência de ilicitudes ou ocupações em atividades informais e clandestinas que o conduzirão para dentro do sistema penitenciário novamente.
Quando o individuo é preso, perde-se o direito de ir e vir, porém outros direitos devem ser preservados como a educação, saúde e trabalho, que juntos irão garantir a dignidade humana, assim definida por SARLET:
A qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da Comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra toda e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável (parâmetros da Organização Mundial da Saúde), além e propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.(SARLET 2008, pág.62)
Nota-se claramente que tanto o tratamento degradante recebido dentro do cárcere como as condições de vida que são colocados após a soltura, afetam seu direito mais grandioso, a dignidade humana, pois não participarão ativamente nos destinos de suas vidas ao serem subjugados, e tão pouco receberão respeito de uma sociedade que lhe observa com os olhos do medo e da desconfiança.
São necessários investimentos estruturais que garantam condições adequadas de sobrevivência nas prisões, assistência psicossocial, saúde, educação e a aplicação laborterapia, buscando a reabilitação, pois somente assim o sistema penitenciário estará apto a ressocializar e por conseqüência permitir que o egresso ser aceito pela sociedade.
7.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora seja um tema bastante polêmico, é urgente que seja debatido, para que haja mudanças no panorama da ressocialização dos egressos, a fim de diminuir os índices de reincidência criminal e conseqüentemente da violência em geral.
Primeiramente é preciso normalizar o fato de que o apenado retornará ao convívio social, devendo ser-lhe oferecidas chances como a qualquer outro cidadão, e a idéia de privá-lo de oportunidades de trabalho, só trará maiores transtornos. Fato é que ele precisará sustentar-se, seja como trabalhador ou reincidindo no crime. O que definirá a diferença entre esses caminhos dependerá da forma com que a sociedade o receberá após o término de sua condenação.
O egresso, como qualquer pessoa, almeja uma vida melhor, e caso não encontre oportunidades lícitas, como a colocação formal no mercado de trabalho ou a capacitação para o exercício de uma profissão, na maioria das vezes incorrerá novamente na prática de crimes, ainda mais pelo facilitador de já guardar certa familiaridade com tal caminho.
O cenário atual em nada os desestimula a auferir renda com a prática de ilícitos, pois os serviços que lhes são ofertados, predominantemente são trabalhos árduos, mal remunerados e sem contratação formal. Não propiciando uma ocupação regular, de fato.
Segundo balanço do sistema penitenciário nacional divulgado pelo Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária(PNPCP) de 2019, aproximadamente sessenta e um por cento (61%)9, dos presos foram condenados por crimes ligados a questões patrimoniais e de usura, como furto, roubo e tráfico de entorpecentes, e são na maioria pessoas pobres que vêem na criminalidade o meio mais rápido de melhorar sua dura realidade, fazendo com que o sistema penitenciário seja mais uma engrenagem no conjunto de fatores que perpetuam os altos índices de práticas criminosas.
No tocante as leis penais, há de se ter especial atenção com a Lei de Drogas, pois em média vinte e quatro por cento (24%)10 dos presos atualmente são por condenações por tráfico de entorpecentes, maior parte destes são de pequenos traficantes muitas vezes primários, dados que denotam a necessidade de encarcerar com mais qualidade, visando os chefes do tráfico e integrantes das facções criminosas. Além de adotar sempre que possível o Acordo de Não Persecução Penal e as penas alternativas, para evitar ao máximo a entrada de presos de baixa periculosidade dentro do sistema penitenciário dominando pelas organizações criminosas, evitando assim o seu recrutamento.
Ao pensar nas políticas públicas de reinserção de egressos, não devemos ter em mente apenas os estigmas sociais dos crimes bárbaros (latrocínio, estupro, seqüestro) pois estes são minoria, e atrapalham a reinserção social de uma maior parte que sequer praticou um delito de tamanha gravidade. Em hipótese alguma esta pesquisa visa apresentar situações que beneficiem criminosos, mas sim soluções para amenizar a grave mazela social da reincidência criminal.
Como com a criação de programas e parcerias de emprego na esfera privada, não apenas a cargo das distantes políticas públicas nacionais, mas, sobretudo no âmbito regional, por meio das varas criminais de cada comarca, promovendo campanhas de conscientização social que incentivem a inclusão profissional dos egressos, demonstrando os benefícios desta inclusão a população, através de uma política de estado consistente e duradora que alcance bons resultados no futuro.
Além de permitir e promover a entrada de egressos no mercado de trabalho, seja ele público ou privado, é preciso criar condições para que estejam aptos para desempenhar tal ofício, com a criação de presídios escolas, com centros profissionalizantes e salas de aula, que possibilitarão a qualificação destas pessoas, para que possam ter oportunidades lícitas de transformar sua realidade econômico- social para melhor. Uma das medidas de implementação, seria viabilizar a inserção de ex-presidiários em cargos públicos, mediante concurso, o que de imediato impactaria positivamente essa classe tão fragilizada.
Seria de grande valia, a rápida aprovação dos projetos de lei (PL1506/15 e PL1348/15) que tramitam na câmara dos deputados, que visam desenvolver programas de incentivos fiscais que beneficiariam empresas que promovam a contratação e profissionalização de egressos e apenados, efetivando assim o que se prevê nos planos de políticas criminais, promovendo um mútuo benefício, aos empresários com os abatimentos fiscais e ao egressos pela confiança, o salário e a oportunidade de recomeçar uma vida melhor.
De outro lado, e não menos importante, seria também o desenvolvimento de ações preventivas, focado na educação e profissionalização de jovens, sobretudo os de baixa renda, favorecendo com que estes tenham ocupações profissionais o mais cedo possível. Enfraquecendo assim o alcance das facções criminosas que recrutam seus integrantes cada dia mais prematuramente.
Por fim, faz-se necessário a atuação intensa das Defensorias Públicas e Ministério Público, no sentido de impugnar editais de concursos que vedem a aprovação de egressos, sob a justificativa da supremacia dos princípios da ressocialização, dignidade e da igualdade. Além de ampliar as ações do Ministério do Trabalho, no sentido de fiscalizar empresas que descumprem as normas trabalhistas inclusivas, preterindo os ex-condenados.
Somente com a mudança de paradigmas, a conscientização dos operadores do direito e da sociedade, e a atuação estratégica de órgãos públicos com a prevenção e educação dos mais vulneráveis, poderemos alterar nossas calamitosas taxas de violência. Persistir nos anseios punitivistas, ignorando a inclusão social e a reeducação dos apenados, só nos trará “mais do mesmo”, um sistema penitenciário péssimo e obsoleto responsável por um cotidiano marcado pelo ciclo da violência sistematizada.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BRASIL. Constituição (2002). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
BRASIL, Comissão do plano nacional de política criminal e penitenciária, disponível em: < http://depen.gov.br/DEPEN/cnpcp-divulga-de-consulta-publica-do-plano-nacional-de-politica-criminal-e-penitenciaria/PNPCP220919.pdf >. Acesso em: 10 de maio de 2020.
BRASIL, DEPEN, Levantamento Nacional de Informações Penitenciarias Dezembro de 2019, disponível em: < https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiZTlkZGJjODQtNmJlMi00OTJhLWFlMDktNzRlNmFkNTM0MWI3IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9 >. Acesso em 11 de maio de 2020.
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CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Regras de Mandela: Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos/Conselho Nacional de Justiça, Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas. 1. Ed. Brasília: CNJ, 2016. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/05/39ae8bd2085fdbc4a1b 02fa6e3944ba 2.pdf>. Acesso em: 01 jul. 2019.
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Bacharel em Direito pela Universidade de Gurupi - UNIRG
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Eduardo Belloti dos. Exclusão social e estatal de egressos do sistema penitenciário em oposição ao princípio da ressocialização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2020, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55759/excluso-social-e-estatal-de-egressos-do-sistema-penitencirio-em-oposio-ao-princpio-da-ressocializao. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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