RESUMO: A promulgação da Constituição Federal de 1988 implicou em mudanças profundas no instituto da adoção, no país. Ao longo da história do ordenamento jurídico brasileiro, a configuração legal do instituto estava conectada a valores do direito canônico e, depois, do pensamento liberal. Dessa forma, primeiro, estavam presentes os valores relacionados à família como unidade social cuja função principal era a reprodução biológica, de forma que a legislação era parca e muito restritiva; depois, a família, no que diz respeito aos aspectos legislativo, tinha a função principal de manter os bens materiais, e a filiação por adoção sofria grandes limitações para preservar esse fim, de forma que, por exemplo, o filho adotado não participava da sucessão, em caso de haver filhos biológicos supervenientes. A Constituição Federal de 1988 vedou qualquer discriminação entre filhos; em relação à criança e ao adolescente, instituiu a doutrina da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente. O instituto da adoção passou a ser uma forma de proteção de direitos e garantias do adotando, e não mais uma possibilidade para os adotantes suprirem a ausência de filhos biológicos. O trabalho examina a legislação sobre o instituto e os valores a ela relacionados.
PALAVRAS-CHAVE: Criança. Adolescente. Adoção. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
ABSTRACT: The promulgation of the 1988 Federal Constitution implied profound changes in the adoption institute in the country. Throughout the history of the Brazilian legal system, the legal configuration of the institute was connected to values of canon law and, later, of liberal thought. Thus, first, the values related to the family were present as a social unit whose main function was biological reproduction, so that the legislation was sparse and very restrictive; afterwards, the family, with regard to the legislative aspects, had the main function of maintaining material goods, and the adoption affiliation suffered great limitations to preserve this purpose, so that, for example, the adopted son did not participate in the succession , in case of supervient biological children. The 1988 Federal Constitution prohibited any discrimination between children; in relation to children and adolescents, it instituted the doctrine of integral protection and the best interest of children and adolescents. The adoption institute has become a way of protecting the rights and guarantees of the adoptee, and no longer a possibility for adopters to make up for the absence of biological children. The paper examines the legislation on the institute and the related values.
KEYWORDS: Child. Teenager. Adoption. Statute for Children and Adolescents (ECA).
INTRODUÇÃO
Em 2017, foi sancionada pelo então presidente uma Lei que complementa o desenvolvimento que vem se verificando, no ordenamento jurídico brasileiro, do instituto da adoção: a Lei 13.509 consolidou, ainda mais, o novo paradigma prevalente no ordenamento jurídico atual, do país, diminuindo as diferenças entre os direitos trabalhistas entre pais biológicos e pais adotivos, e com medidas que visam à simplificação dos processos de adoção. (AGÊNCIA BRASIL)
Aos poucos, desaparecem da legislação brasileira os resquícios das influências do catolicismo e do liberalismo econômico na normativa sobre o tema, de forma que as disposições sobre o direito de família não versam mais.
O processo se iniciara com mitigações das exigências para a adoção e a mitigação da diferenciação entre filhos biológicos e adotivos, mas apenas a promulgação da Constituição Federal de 1988 elevou ao status de norma constitucional a vedação da discriminação entre os filhos, tanto entre si, como para fins de tratamento legal em geral (BRAUNER, ALDROVANDI, 2010).
O processo, contudo, não foi, e nem está encerrado, como mostra a própria Lei promulgada em 2017, supracitada. Se a Carta Maior determina que a dignidade humana é um dos fundamentos da República brasileira, veda o tratamento desigual entre as pessoas – em especial, entre a prole -, e aumenta o número de núcleos familiares a serem reconhecidos pelo ordenamento jurídico – em rol exemplificativo, de acordo com Brauner e Aldrovandi (2010) -, há ainda mais o que ser feito para que essas determinações sejam completamente cumpridas e tenham total efetividade.
No que concerne a crianças e adolescentes, a urgência que sempre deve ser constatada para o cumprimento das normas fundantes do país deve receber maior primazia, ainda: A própria Constituição Federal reconhece que as condições fáticas em que encontram os menores de 18 anos, a peculiar condição de seres em desenvolvimento, requer ainda mais celeridade para observância de direitos e garantias.
Atualmente, sujeitos de direitos, crianças e adolescentes não são, mais, o “objeto de direito” das relações jurídicas que os envolvem Souza (2017): são, eles próprios, titulares de direitos e garantias (idem, ibidem). Quando se trata de adoção, esses novos paradigmas têm efeitos ainda mais extremos – e, se não tem, presentemente, é obrigação do operador do direito, qualquer seja seu âmbito de atuação, cuidar para que tenha.
Nesse sentido, a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, detalhando a aplicação dos princípios e direitos mais gerais relativos à infância e à adolescência previstos pela Constituição Federal, também é de suma relevância para um exame acurado do tema.
Este trabalho aborda os principais aspectos do instituto da adoção, no ordenamento jurídico atual brasileiro, identificando as principais características do novo paradigma sobre a família, em geral, e sobre a adoção, em particular, e examinando a legislação infraconstitucional que aplica esse novo entendimento à realidade brasileira.
Para tanto, o trabalho identifica a legislação sobre crianças e adolescentes e sobre adoção, no ordenamento jurídico brasileiro atual, bem como demais disposições legais relevantes ao tema; e examina essa legislação tendo como parâmetro a Carta Maior do país.
Mesmo após 1988, foram diversos os diplomas legais que modificaram o ordenamento jurídico aplicável ao instituto, bem como da legislação referente a outros temas, mas que se aplicam, ainda que parcialmente, aos processos de adoção – como é o caso do Código Civil vigente, promulgado em 2002.
1 HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE O INSTITUTO DA ADOÇÃO
1.1 A adoção no ordenamento jurídico brasileiro anterior à Constituição Federal de 1988
Brauner e Aldrovandi (2010) expõem o desenvolvimento da legislação brasileira sobre a adoção desde a época do Brasil colônia até a Lei XX, pontuando as características de cada um dos diplomas legais que o relacionavam ao paradigma anterior sobre o instituto.
A primeira legislação aplicada em território brasileiro sobre a adoção estava nas Ordenações do Reino, em que se determinava a idade mínima de 50 anos para o adotante. Em seguida, vieram as Ordenações Filipinas, que pouco traziam sobre a adoção – à qual ser referia como “confirmação de perfilhamento”, embora essa previsão não coincida, completamente, com o instituto atual da adoção. (p. 10)
As autoras explicam que a parca normatização da adoção se devia, principalmente, ao substrato do direito canônico da legislação da época, que determina que o casamento e a família têm o único propósito de perpetração biológica. Nesse modelo, a inclusão da prole que não tenha conexões biológicas com os ascendentes não se coadunaria com a doutrina religiosa sobre o tema. (2010, p. 10)
Nem mesmo a laicização do Estado que decorreu da Proclamação da República foi suficiente para romper, conforme Brauner e Aldrovandi (2010, p.08), de vez, com esse paradigma, uma vez que apenas com a promulgação da Constituição Federal de 1988 deixou de haver, efetivamente, a possibilidade de discriminação, para quaisquer efeitos legais, entre os tipos de filhos.
Ainda que suaves as transformações trazidas pela Proclamação da República, às questões relativas à filiação por adoção, esse evento propiciou maior separação entre Igreja (Católica, no caso do Brasil) e Estado, ao menos oficialmente, de forma que os valores não deviam, mais, tornar-se conteúdo de normas jurídicas. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 08)
Em 1916, foi promulgado o Código Civil que vigeu até a substituição pela Lei 10.406, de 2002, o Código Civil ora vigente. A “ressignificação das relações familiares” (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 08) trazidas pelo antigo Código, porém, ainda não se assemelhavam com aquelas que vigoram, atualmente: desenvolvido em um contexto de ascensão da classe burguesa ao poder, e desde um ideal liberal de política, economia e sociedade, o Código versava, quase que exclusivamente, sobre os aspectos patrimoniais das relações familiares. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 08)
Se o Código não considerava, tão profundamente, o aspecto religioso de classificação do conceito de família e da sua função na sociedade, fazia-o em relação aos aspectos de transmissão de bens e da propriedade que se dava pela família.
A adoção era prevista no artigo 368, e se mantinha a idade mínima de 50 anos para o adotante – que devia, também, não ter nenhum descendente “legítimo ou legitimado” para adotar (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 10), de forma que os recursos materiais tendiam a pertencer na mesma unidade familiar biológica e reconhecida pelo ordenamento jurídico. Outro requisito era a idade mínima de 18 anos de diferença de idade entre adotante e adotado.
Como ressaltam as autoras, nota-se que o instituto, por todas essas características, ainda guardava como função primordial suprir a falta de herdeiros e sucessores de uma mesma família biológica (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 10), de forma que o instituo da adoção tinha como viés mais importante o do adotante, do que o do adotando.
Em 1957, a promulgação da Lei 3.133 trouxe “importantes inovações” (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 10) ao instituto da adoção, fomentando seu desenvolvimento na legislação brasileira para se aproximar do modelo, hoje, adotado: a idade mínima para adotar passou a ser de 30 anos, em vez dos 50 determinados pela legislação anterior; também diminuiu a diferença de idade necessária, entre adotante e adotando, que passou a ser de 16 anos, em contraposição aos 18 anteriormente exigidos; e os pais que já tivessem filhos biológicos passaram a ter a possibilidade de ter filhos, também, por adoção; e a exigência da anuência do adotando maior de idade, ou de seus representantes legais, para a realização da adoção. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 10)
Contudo, essa legislação ainda não trazia pontos importantíssimos ao instituto da adoção, já que o vínculo formado era passível de dissolução, e, mais importante, o direito sucessório fora parcamente modificado: os filhos adotivos só sucediam os adotantes na inexistência de filhos legítimos, de filhos legitimados e de filhos reconhecidos. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 10)
Em 1965, outro diploma legal (Lei nº 4.655) trouxe novas importantes previsões para a adoção, com a figura da “legitimação adotiva” que poderia ser utilizada nos casos de crianças abandonadas pelos pais biológicos, com até sete anos de idade. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p.11)
Inobstante o avanço dessa nova legislação sobre a impossibilidade de dissolução do vínculo formado por essa forma de adoção, e sobre a consequente inexistência de vínculos em relação à família biológica do adotado, permanecia a discriminação entre os tipos de filhos no direito sucessório, se à adoção sobreviesse um filho biológico. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 11)
A Lei nº 6.697/1979, denominada Código de Menores, regeu as relações jurídicas envolvendo crianças e adolescentes, no país, até a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Esse Código adotava um paradigma de tratamento legal à infância e à adolescência completamente do que o instituído pelo ECA, este, sim, devidamente adequado à presente normativo constitucional.
O Código de Menores previa a adoção plena, que substituiu a legitimação adotiva prevista na Lei de 1965, aplicando-se às crianças com menos de sete anos. Nos demais casos, aplicava-se a adoção simples, prevista pelo Código Civil de 1916, que não fora revogada nem por aquela Lei, nem pelo Código de Menores, e “que podia ser realizada por escritura pública, e gerava efeitos mais restritos no tocante ao vínculo estabelecido entre adotante e adotado”. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 11)
Em relação às modificações sobre a adoção determinadas pelas Constituições Federais, a Constituição da Promulgação da República foi o marco de mudanças significativas, até a promulgação da Carta ora vigente. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 08)
1.2 O novo paradigma para a legislação sobre a infância e a adolescência: a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente
A Carta de 1988 “consagrou a proteção à criança e o adolescente com a Doutrina da Proteção Integral fundada no Princípio da Prioridade Absoluta” (p.11), e essa consagração é fruto da adoção de um paradigma absolutamente diverso do antes adotado sobre o tema.
Crianças e adolescentes, a partir de então, são incluídos como “sujeitos de direito”, no ordenamento jurídico constitucional e infraconstitucional; como tais, são titulares dos direitos humanos concernentes a toda e qualquer pessoa humana, além de fazerem jus à expressão específica desses direitos à sua condição peculiar de seres em desenvolvimento. (SOUZA, 2016).
HIRONAKA (2007, p. 15) assim sumariza a produção científica de outras áreas do conhecimento sobre a infância e a adolescência:
Os psicanalistas, na investigação e interpretação da vida mental, revelaram no adulto a influência de sua infância; na criança, a influência de sua primeira infância; no bebê, a influência dos pais e, finalmente, revelaram que estas influências passam consciente e inconscientemente de geração em geração. Temos um passado de relacionamentos que se somam no presente da vida, moldando nossa forma de interpretar o mundo.
Neste contexto, destaca-se o chamado abandono afetivo, condição em que um dos pais deixa de ter o filho em convivência, não lhe prestando os devidos cuidados, e negando-lhe o afeto e o carinho. O abandono afetivo, certamente, viola a integridade da criança e do adolescente e causa prejuízos a sua personalidade.
Em reconhecimento às necessidades específicas derivadas dessa condição, é que o legislador institui um tratamento diferenciado aos menores de 18, ainda que busque, com essa discriminação, o tratamento isonômico.
Como explica (SOUZA, 2016), o grupo mais abrangente de direitos humanos homogêneos, previstos para todos, abrangem um subgrupo de direitos humanos heterogêneos, que adequam os direitos homogêneos para as necessidades específicas de grupos específicos da sociedade. No caso de crianças e adolescentes, as especificidades estão conectadas à condição de seres em desenvolvimento, que significa maior vulnerabilidade a diversos aspectos da vida. (SOUZA, 2016)
Por isso, Constituição Federal e Estatuto da Criança e do Adolescente se integram, para que os direitos nela previstos possam ser efetivados para a parcela específica da população sobre a qual versa aquele:
O artigo 18 do Estatuto da Criança e do adolescente regulamenta especificamente o disposto no artigo 227 da Constituição Federal ao afirmar ser dever de todos velar pela dignidade das crianças, pondo-as a salvo de quaisquer tratamentos desumano, violento, aterrorizante ou constrangedor. Dessa forma não é exagero dizer que o legislador situou neste artigo 18 do referido Estatuto da Criança e do adolescente o ponto crucial da doutrina da proteção integral, que implicitamente é elevado à condição de princípio da proteção integral da criança e do adolescente, cujo fundamento está precisamente numa dignidade inerente que as pessoas em desenvolvimento partilham com as demais pessoas humanas, entretanto, com prioridade absoluta. (SOUZA, 2017)
Portanto, crianças e adolescentes são, hoje, sujeitos de direitos para igual proteção à condição de cidadãos (artigo 1º, I, CF/88), à sua dignidade (artigo 1º, III, CF/88), bem como aos direitos e garantias previstos pelo artigo 5º e incisos da Carta, da mesma forma em que esta proteção existe para os cidadãos maiores de 18 anos.
A mesma Carta, entretanto, traz as previsões específicas sobre a infância e a adolescência que tutelam, também, direitos e garantias fundamentais, mas na forma em que se aplicam a essa parcela específica da população.
O artigo 227, caput e incisos, da Constituição Federal de 1988, versa sobre a criança e ao adolescente, de forma expressa, mas as disposições sobre a família, que integram o mesmo Capítulo daquele artigo, estão intrinsicamente relacionadas aos direitos de crianças e adolescentes.
Como explicam BRAUNER e ALDROVANDI (2010, p. 08), as modificações nos princípios que se aplicam as entidades familiares foi profunda, na Carta de 1988, em relação ao paradigma que vigia:
As Constituições Federais subsequentes (à Constituição da Promulgação da República) em quase nada contribuíram para a modificação da concepção da família, pois mantiveram a proteção exclusiva à família matrimonializada e hierarquizada, classificada como família “legítima”, na qual os filhos “legítimos” eram gerados. Somente com a Constituição Federal de 1988, é que a concepção da família experimentou profunda alteração. Com a Constituição de 1988, um novo modelo familiar foi inaugurado, baseado em princípios como a Dignidade da Pessoa, a Igualdade e a Liberdade, a Lei Magna reconheceu a pluralidade de entidades familiares.
Assim, o princípio da igualdade, garantido a toda pessoa humana no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, está previsto, de forma específica, no parágrafo 6º do artigo 227, que proíbe a diferenciação entre filhos biológicos e filhos adotados. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 09)
O princípio da dignidade humana, que a Constituição Federal determina ser um dos fundamentos da República brasileira, está aplicado pela própria Carta, de forma específica, às crianças e aos adolescentes pelo seu reconhecimento como sujeitos de direitos, e pela adoção da doutrina da Proteção Integral e do Princípio do melhor interesse. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 09)
A doutrina da Proteção integral tem efeitos não apenas sobre a atuação estatal, mas da própria família e da sociedade, em relação à infância e à adolescência:
O dever é solidário e a referência, primeiramente à família, remete ao significado de que é a primeira esfera de atenção que a criança e o adolescente têm. Os direitos assegurados podem ser requisitados, diante do não atendimento, por qualquer criança ou adolescente, sem distinção. São portadores de uma condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e, exatamente por isso, precisam ter garantida a sua dignidade e os direitos previstos em lei. Tanto aos direitos que condicionam a sua sobrevivência, quanto aos que proporcionam o seu desenvolvimento pessoal e social e nos casos em que é imprescindível a sua proteção especial. (SOUZA, 2016)
Efetivamente, outro princípio que passa a ter uma relevância ainda maior, para tornar-se protagonista de uma série de relações jurídicas, é o princípio da solidariedade, sendo que o âmbito da família é um deles.
Alçada a “base da sociedade” (artigo 226, caput, CF/88), a família, já entendida em seu conceito ampliado que acolhe as mais diversas composições, para além da tradicional família constituída pelos genitores casados e sua prole, tem “proteção especial do Estado”.
Pois, é nesse primeiro nível de existência coletiva que o princípio da solidariedade como forma de proteção da dignidade humana pode ser expresso e efetivado, para os seus componentes:
Primordial é o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, consubstanciado no inciso III do artigo 1º, basilar da despatrimonialização do conceito de família, agora entidade familiar, comunidade de entreajuda e afeto, onde seus membros estão envolvidos por um laço muito mais psicológico, de busca do prazer e da felicidade.
O eixo, então, passa a centrar-se na pessoa humana, condição sine qua non de adequação do direito à realidade e aos fundamentos constitucionais.
Dispõe o artigo 5º, I, sobre o princípio da isonomia entre homens e mulheres, que deve ser entendida muito mais como igualdade material do que formal. (ALVES, 2008)
Em relação à adoção, os princípios da proteção à dignidade humana, da igualdade e da solidariedade se combinam para fundamentar a vedação ao tratamento diferenciado entre os filhos: o tratamento desigual implica em violação à dignidade do desfavorecido (e, não apenas, em termos patrimoniais); o princípio da solidariedade implica na necessidade de se tratarem, de forma igualitária, todos os filhos; e a solidariedade resulta no respeito à dignidade, do solidarizado e daquele que se solidariza.
É nesse sentido, também, que se deixa de entender que a filiação civil é um fato biológico, que a qualificação legal somente aceita e reproduz para fins de definição interna ao seu sistema, para afirmar que a filiação é um conceito originalmente do mundo humano, que pode considerar aspectos biológicos, mas não se funda neles para definição de sua essência – ou, nas palavras de BRAUNER e ALDROVANDI, consiste em “um ato de amor juridicamente protegido.” (2010, p. 09)
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em congruência com o que foi acima exposto, detalhou ainda mais o respeito aos princípios e direitos instituídos pela Carta na proteção da infância e da adolescência, em relação à adoção:
O referido Estatuto regulamenta a adoção, que agora é aplicada a todos os menores de 18 anos em qualquer situação, sem levar em conta a sua situação irregular, como previa o revogado Código de Menores. Não existem mais espécies de adoção com efeitos limitados, hoje a adoção é única, é irrevogável e estabelece o vínculo de filiação entre adotado e adotante(s), extinguindo os vínculos do adotado com a família biológica (salvo para impedimentos matrimoniais). O filho adotivo é integrado a nova família com os mesmos direitos que são garantidos a qualquer outro filho, de qualquer origem. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 12)
O Estatuto garantiu, assim, ainda que com limitações, a aplicabilidade dos princípios constitucionais nos processos de adoção de crianças e adolescentes, o que foi especialmente relevante no período que antecedeu a promulgação do Código Civil de 2002.
Isso porque o Código Civil ora vigente já veio modificado, em diversos aspectos, para atender à normativa da Constituição Federal de 1988. Antes dele, porém, não houvesse a legislação especial derrogado as disposições do Código Civil de 1916, a garantia desses direitos seria bastante dificultada.
Inobstante o trabalho realizado para que se operasse a primazia dos preceitos constitucionais em qualquer caso, qualquer fosse a legislação aplicável, mesmo no processo denominado constitucionalização do direito civil, poderia restar ineficiente para a proteção de tais preceitos, na ausência do Estatuto:
Nos quase vinte anos que já se passaram desde a promulgação da Constituição da República, uma verdadeira reviravolta ocorreu no âmbito do direito civil. Na atualidade, poucos civilistas negam eficácia normativa ao texto constitucional ou deixam de reconhecer seu impacto sobre a regulação das relações privadas. Estudos de teoria geral do direito acerca da aplicação dos princípios constitucionais e da metodologia de sua ponderação foram determinantes para afastar definitivamente a cristalizada concepção da Constituição como mera carta política, endereçada exclusivamente ao legislador. (MORAES, p. 223)
2 A ADOÇÃO NO BRASIL ATUAL: LEGISLAÇÃO
O Conselho Nacional de Justiça criou, em 2008, o Cadastro Nacional de Adoção, com o objetivo de tornar mais fácil a aproximação entre adotantes e adotandos, no país, além de todos os direitos já mencionados, de crianças e adolescentes, que convergem para determinar a ação prioritária e rápida do Poder Público em lhes possibilitar encontrar uma família, em 2004, foi aprovada a Emenda Constitucional nº45, que incluiu a celeridade entre os direitos dos jurisdicionados, para processos administrativos e judiciais.
As tentativas em garantir que o adotando tivesse, efetivamente, uma boa família, e mesmo a pressão em garantir outros direitos a crianças e adolescentes – como a destituição do poder familiar ser uma medida extrema, a ser tomada, apenas, em casos excepcionais -, podiam resultar em procedimentos por demais complicados e que se estendiam no tempo, muitas vezes sendo considerado um desatendimento às determinações para buscar o melhor interesse dos adotandos.
O número de pessoas dispostas a adotar é maior do que o de crianças e adolescentes formalmente passíveis de serem adotados; isso não impedia que muitos ficassem abrigados, ou em lares temporários, por bastante tempo, o que lhes é prejudicial. Quanto mais jovem o adotando, maior representatividade tem o lapso de tempo em seu desenvolvimento – psíquico, emocional e de aprendizado -, dada a velocidade com que esses processos ocorrem em pessoas mais novas. O impacto da demora, assim, é bem maior para crianças e adolescentes, do que para adultos.
Em relação à perda do poder familiar, o Estatuto da Criança e do Adolescente inovou no ordenamento jurídico brasileiro, determinando, no artigo 23, que a falta de recursos materiais não pode motivar a perda do poder familiar.
Combinam-se, portanto, disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente e disposições do Código Civil (Lei 10.406/02) para normatização da adoção, hoje, no Brasil.
O Estatuto da Criança e do Adolescente versa sobre o assunto na Subseção IV do Capítulo III, que compreende os artigos 39 a 52-D – além de aplicarem-se todas as disposições gerais sobre os direitos de crianças e adolescentes trazidas pelo ECA, especialmente nos Títulos I e II.
Grande parte das disposições do Estatuto, porém, tem a redação conferida pela chamada Lei da Adoção, que, conforme escrevem BRAUNER e ALDROVANDI (2010, p. 13):
Até 2009, a adoção era regulada, também, pelo Código Civil Brasileiro de 2002, nos artigos 1.618 ao 1.629. Quase todos os dispositivos sobre a adoção foram revogados pela “Lei Nacional da Adoção”, que também modificou o texto do Estatuto da Criança e do Adolescente. Trata-se da Lei n° 12.010, de 03 de agosto de 2009, que foi elaborada com o objetivo de desburocratizar o processo de adoção e trazer às crianças e adolescentes adotados tanto por brasileiros, quanto por estrangeiros, mais segurança e fiscalização no trâmite processual.
Dentre as modificações instituídas pela Lei, ao Estatuto, estão a diminuição da idade mínima para adotar de 21 anos para 18 anos, adaptando-o para também considerar a idade para maioridade civil instituída pelo Código Civil de 2002. Também, desde então, é possível que companheiros e ex-cônjuges adotem, se pacíficas, entre eles, questões como a guarda (BRAUNER e ALDROVANDI (2010, ps. 13-14).
Entretanto, ainda valem as disposições do Código Civil de 2002 sobre o poder familiar e suas formas de extinção – o primeiro requisito para que uma criança ou adolescente possa ser adotado, já que, enquanto perdurar o poder familiar da família biológica, não é possível iniciar esse processo.
A destituição do poder familiar está prevista nos artigos 1.635 e 1.638 do Código Civil vigente, e, como determina o Estatuto, deve ocorrer, apenas, em casos excepcionais e atendendo ao melhor interesse da criança ou adolescente (artigo 19, ECA):
A aplicação da destituição do poder familiar gera efeitos graves tanto na vida do filho quanto na vida dos pais, isto porque com a aplicação da medida, os pais perderão a autoridade e prerrogativas que tinham em relação aos filhos, havendo dessa forma a extinção do vínculo afetivo existente entre eles, por isso é que só poderemos ter a aplicação da destituição nos casos previstos em lei, e quando houver o melhor interesse da criança e adolescente. (TOMIZAWA, MOREIRA, p. 11)
Ainda que haja dissenso na doutrina sobre a natureza jurídica da destituição do pátrio poder, havendo aqueles que entendem que se trata de uma sanção (TOMIZAWA, MOREIRA, ps. 13-16), desde a Constituição Federal de 1988, e desde as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, instituiu-se o princípio do melhor atendimento ao interesse da criança e do adolescente como diretiva de quaisquer contendas que as envolvam, ou aos seus interesses.
Considerando se esse aspecto, e que há dispositivos legais no Estatuto da Criança e do Adolescente que preveem, expressamente, esse princípio, o que deve ser o parâmetro principal na decisão de destituição do poder familiar deve ser o melhor interesse da criança ou adolescente envolvido, e não a sanção ao(s) genitor (es), no sentido de uma medida que objetiva, antes de tudo, a punição por uma conduta.
Como escrevem TOMIZAWA e MOREIRA, o complexo de direitos e deveres que compõem o poder familiar existe em favor daquele que demanda a criação e educação, ou seja, o infante ou adolescente. No mesmo sentido em que existe para esses sujeitos, portanto, deve apenas ser extinto buscando a proteção dos mesmos direitos e interesses:
E é com a medida de destituição do poder familiar, que o Estado poderá excluir aquele pai do exercício do poder familiar, permitindo então que a criança/adolescente seja poupada, garantindo assim os seus direitos salvaguardados.
Dessa forma, o Ministério Público ou outro interessado diante de uma situação de risco da criança/adolescente, poderá ajuizar a referida ação, e cumprido todo o procedimento, constatando então o melhor interesse da criança e do adolescente, o juiz por meio da sentença vai excluir aquele pai ou a mãe ou até ambos os pais do exercício, não se podendo de regra requerer a retomada do exercício do poder familiar. (p. 18)
Uma vez extinto o poder familiar dos pais biológicos, é necessário que a guarda da criança ou adolescente passe a ser de outrem, de forma que o poder de fato sobre a criança ou adolescente esteja regularizada, nos termos do parágrafo 1º do artigo 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Já os aspectos da guarda da criança e do adolescente são muitos, como explica CAMERINO (2010):
Guarda: é a obrigação de prestar assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais, além de assegurar direitos previdenciários. A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros. Convém ressaltar que, embora não possam adotar, irmãos e avós podem obter a guarda de irmãos e netos, respectivamente. A guarda dos filhos menores é atributo do poder familiar.
Caso não seja possível a colocação em família substituta, logo após a destituição do poder familiar ou logo que a criança ou adolescente deixe de conviver com a família natural, a criança ou adolescente deve ser colocado em instituição de acolhimento institucional, conforme a definição do inciso IV do artigo 90; e artigo 101, parágrafo 3º, do Estatuto.
A criança ou adolescente é incluso, assim, no Cadastro Nacional de Adoção, de forma que passa a constar nas possibilidades a serem analisadas em relação às possibilidades dos adotantes (artigo 50, ECA).
Para se tornar um adotante, é necessário primeiro, apresentar uma petição à Vara da Infância e da Juventude competente (de seu domicílio), instruída de documentos de qualificação pessoal e de atestados de antecedentes criminais e certidão negativa de distribuição na Justiça Civil, e aguardar o deferimento do pedido.
Após isso, o aspirante a adotante aguarda para ser entrevistado por uma equipe interdisciplinar, que aferirá os motivos e condições da pessoa para tanto. Além dos requisitos legais, a equipe pode determinar se o aspirante tem motivos idôneos para a adoção, e condições psicológicas e sociais para tanto.
Estão excluídos da possibilidade de se tornarem adotantes, também, aqueles que se caracterizarem por quaisquer das disposições do artigo 29 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Por tratar-se de matéria de interesse público, que envolve o interesse de incapazes, o Ministério Público deve atuar, inclusive, na aprovação da inclusão dos interessados, como adotantes, no Cadastro Nacional de Adoção (artigo 50, parágrafo 1º).
Uma vez que o processo de combinação entre adotandos e adotantes tenha sucesso, passa-se ao período de convivência (artigo 46 do Estatuto), e tem um prazo de noventa dias, embora possa haver variações de acordo com diversos parâmetros – como a idade da criança, prevista nesse mesmo artigo, ou outros, como a adoção internacional.
Discussão que vem sendo dirimida pela jurisprudência é a possibilidade da adoção por casais homoafetivos. Para BRAUNER e ALDROVANDI (2010, p. 18), a discussão perpassa, também, o movimento de secularização do ordenamento jurídico brasileiro, de forma a não possibilitar que valores considerados religiosos venham a interferir na feitura e interpretação das leis do país.
As autoras narram que, ao longo dos anos 1990, com a possibilidade da adoção por pessoas solteiras, essa era a forma utilizada por casais homoafetivos para adotar: apenas um dos componentes da união adotava, em seu próprio nome, uma criança ou adolescente, tendo, assim, o pátrio poder (2010, p. 20).
Contudo, essa resposta era muito insatisfatória em relação a vários aspectos, mas, especialmente, em relação ao atendimento dos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança ou adolescente: o falecimento da pessoa que havia, oficialmente, adotado, deixava o filho em situação muito vulnerável, principalmente para que pudesse continuar sob os cuidados do sobrevivente.
Em resumo, o que se argumentava em desfavor desse tipo de adoção, sumarizam as autoras, era o que segue:
a) existência de vedação legal, pois o artigo 1622 do Código Civil impedia o deferimento de adoção a duas pessoas, salvo se forem casadas ou viverem em união estável; b) é reconhecida como entidade familiar a união estável, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família, entre homem e mulher; c) nem as normas constitucionais nem as infraconstitucionais albergam o reconhecimento jurídico da união homossexual; d) de acordo com a doutrina, a adoção deve imitar a família biológica, inviabilizando a adoção por casais do mesmo sexo. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 22)
Em adição à jurisprudência que já se consolidava no sentido da possibilidade de adoção por pessoas do mesmo sexo em união estável, desde 2011, um novo fator jurídico tornou esse direito ainda mais certo: na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência da união estável entre pessoas do mesmo sexo.
Em consonância com a ampliação do rol de núcleos reconhecidos como família, a Corte julgou que a interpretação do artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988 não pode ser literal, no sentido de que apenas homem e mulher podem constituir uma união estável – e, por conseguinte, receber o mesmo tratamento legal conferido ao casamento civil propriamente dito.
Em relação a esse aspecto, assim, já não se pode mais ser suscitada a inexistência da união estável entre duas pessoas, pelo fato de serem do mesmo sexo, para que se exclua o casal interessado da possibilidade de adotar – mesmo que o mais seguro seria que a legislação previsse, expressamente, tal possibilidade (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 24).
O fato é que, mesmo antes dessa decisão do Supremo Tribunal Federal, a possibilidade de adoção por casal homoafetivo já houvera sido chancelada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a decisão proferida no Recurso Especial nº 889.852 - RS (2006/0209137-4), de relatoria do Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 2010.
De acordo com a decisão, o melhor interesse do adotando se encontrava, no caso, na possibilidade de adoção pelo casal homoafetivo, inclusive por já existir uma situação familiar consolidada entre o casal e o adotando, aferida por laudo interdisciplinar. Nesse caso, o parecer do Ministério Público foi favorável à adoção pelo casal. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 25)
A situação indefinida sobre quem são, de fato, seus pais, ou, ainda pior, a vida em uma instituição de acolhimento – em que pesem os louváveis esforços de todos aqueles que oferecem as melhores condições aos adotandos, nelas -, são muito prejudiciais a crianças e adolescentes. Basta considerar a formas como a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou mesmo o Código Civil de 2002, se referem ao direito à uma família.
Face aos diversos estudos e laudos atestando que não há, absolutamente, qualquer prejuízo à formação do adotando pertencer a uma família composta por um casal de pessoas do mesmo sexo, não há qualquer dúvida de que os princípios da proteção integral e do atendimento ao melhor interesse de crianças e adolescentes implica na possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, que atendam à demais condições colocadas pela lei para tanto.
O “interesse superior da criança” deve ser avaliado no contexto do pluralismo do direito de família, ambos têm fundamento nos mesmos princípios: dignidade e igualdade. Assim, por derradeiro, o julgado analisou a preservação do interesse do adotando no caso concreto. Para tanto, inegável a contribuição dos estudos realizados com a família dos adotantes e adotando, por profissionais especializados, psicólogas e assistentes sociais, que só corroboraram a convicção dos julgadores sobre a ausência de prejuízo à criança em caso de adoção por homossexuais, pois, verificada a estabilidade e plenas condições para o deferimento da adoção.
A adoção se aperfeiçoa, completadas todas essas fases, pelo trânsito em julgado da sentença que decide pela adoção. O vínculo de filiação é constituído, não havendo qualquer diferenciação legal sobre filhos biológicos ou adotados, entre si, ou em relação aos direitos dos filhos adotados, para quaisquer finalidades legais.
O vínculo formado igual ao decorrente da filiação biológica, de forma que é irrevogável, e nem mesmo a morte dos pais por adoção reestabelece o poder familiar dos pais por filiação biológica (art. 49, ECA). Qualquer diferenciação para fins sucessórios está excluída, por completo, da legislação brasileira, e o vínculo se forma em relação a toda a família – ascendentes, colaterais, etc.
Camerino (201) ensina que:
A sentença que concede a adoção é de natureza constitutiva e somente produzirá efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença (efeitos ex nunc) e consequente averbação no Cartório de Registro Civil (artigo 10, III, do Código Civil), salvo na hipótese de falecimento do adotante durante o trâmite da ação, caso em que os efeitos serão produzidos a partir da data de seu óbito (efeitos ex tunc), adoção esta denominada “adoção póstuma”.
Da certidão de filiação registrada em cartório, não deve constar qualquer menção ou informação sobre o fato de ter sido lavrada em função da sentença judicial, e nem mesmo pode ser requerido o teor desta, em separado, de forma que o registro do filho adotado deve ser absolutamente igual ao dos filhos biológicos.
O que foi resguardado, pela legislação, foi o direito ao acesso à origem biológica, ao filho que o buscar (artigo 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente) - o qual, porém, não terá nenhum efeito para fins de alteração do vínculo de filiação ou sobre o registro, “que é definitivo”. (BRAUNER e ALDROVANDI, 2010, p. 27)
Finalmente, a legislação brasileira permite a adoção por estrangeiros, desde que cidadãos de países sejam signatários da Convenção de Haia, de 1993, e considerando que o Estatuto da Criança e do Adolescente determina que, também essa decisão deve ser tomada considerando-se o melhor interesse da criança ou adolescente adotando.
Em 2017, foi aprovada a Lei 13.509/2017, que confere prioridade aos processos de adoção que mantenham vínculos fraternais, facilitando a adoção de irmãos.
CONCLUSÃO
Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, muitas melhorias vêm sendo verificadas em relação ao instituto da adoção, no país. A vedação da discriminação entre os filhos em virtude da forma do vínculo é uma das mais importantes, e a ênfase no interesse dos adotandos é outra delas.
Uma legislação ainda mais profícua nesse sentido, porém, proporcionaria ainda maior segurança jurídica, e, muitas vezes, celeridade, aos processos de adoção, como é o caso da possibilidade de adoção por casais homoafetivos.
Ainda que a jurisprudência venha se consolidando, sempre, no sentido de assegurar a prevalência dos direitos e interesses dos adotantes, mesmo esse aspecto pode ter consequências deletérias para pessoas que estão na peculiar condição de seres em desenvolvimento: no momento da vida em que mais se deseja a segurança do mundo adulto, a imprevisibilidade e a incerteza podem ter efeitos prejudiciais à psique e ao desenvolvimento da pessoa.
REFERÊNCIAS
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BRAUNER, Maria Cláudia Crespo; ALDROVANDI, Andrea. Adoção no Brasil: aspectos evolutivos do instituto no direito de família. In: JURIS, Rio Grande, n. 15, 2010, ps. 07-35.
CAMERINO, Ana Carolina. A adoção na legislação brasileira. 06 de jul. de 2010. Disponível em:<https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5808/A-adocao-na-legislacao-brasileira.> Acesso em 17 nov. 2020.
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Graduando(a) do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Sara Santos da. Adoção: direitos resguardados do infante Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 abr 2021, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56378/adoo-direitos-resguardados-do-infante. Acesso em: 22 nov 2024.
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