RESUMO: A presente pesquisa busca evidenciar os aspectos concernentes a violência contra a mulher, com enfoque as medidas protetivas de urgência, que são conferidas a mesma pela Lei Maria da Penha, em casos de agressão e violência doméstica. Contudo, por diversos motivos, tem-se que as medidas protetivas de urgência podem não ser eficazes para o combate a violência contra a mulher, sendo valioso ressaltar que, por vezes, uma agressão não coibida ou combatida corretamente acaba resultando no óbito da vítima, o que é também denominado como feminicídio pela doutrina. Visa-se evidenciar que a ineficácia das medidas protetivas de urgência podem ser causadoras do feminicídio, pois em muitos casos, o óbito da vítima poderia ter sido prevenido se a medida protetiva de urgência pudesse ter sido aplicado ou se tivesse eficácia. Para isso, utilizou-se a apresentação dos preceitos quanto a violência contra a mulher em sua forma como violência de gênero e reflexo da cultura patriarcal, bem como os preceitos do feminicídio e apresentação de dados estatísticos e judiciais quanto a existência da premissa.
PALAVRAS-CHAVE: Lei Maria da Penha. Medidas Protetivas de Urgência. Violência de gênero. Violência contra a mulher.
ABSTRACT: The present research seeks to highlight aspects related to violence against women, focusing on urgent protective measures, which are conferred the same by the Maria da Penha Law, in cases of aggression and domestic violence. However, for a number of reasons, urgent protective measures may not be effective in combating violence against women, and it is valuable to emphasize that sometimes an aggression that is not curbed or fought correctly results in the death of the victim, which is also termed feminicide by doctrine. It is evidenced that the ineffectiveness of emergency protective measures can be the cause of femicide, since in many cases, the death of the victim could have been prevented if the emergency protective measure could have been applied or if it had effectiveness. For that, the presentation of the precepts regarding violence against women in its form as violence of gender and reflex of the patriarchal culture, as well as the precepts of feminicide and presentation of statistical and judicial data regarding the existence of the premise.
KEYWORDS: Maria da Penha Law. Emergency Protectiv Measures. Gender Violence. Violence against women.
Sumário: 1 Introdução, 2 A Violência Contra A Mulher: Lei Maria Da Penha, 2.1 A Violência Doméstica Como Resultado Da Violência De Gênero, 2.1.1 Histórico E Conceito Da Lei Maria Da Penha, 2.1.2 Finalidades E Objetivos Da Lei, 2.2 Medidas Protetivas De Urgência, 2.3 A Ineficácia Das Medidas Protetivas De Urgência. 2.3.1 Estatísticas Dos Crimes De Feminicidio, 3 Considerações Finais, Referencias.
1 INTRODUÇÃO
A violência contra a mulher é um processo amplo de opressão, sendo impossível determinar o período da história em que se iniciaram os abusos físicos e psicológicos no âmbito familiar, somente afirmar que a violência de gênero não data da época atual, mas desde os primórdios. Com o desenvolvimento da sociedade e a emancipação da mulher, que passa a trabalhar fora da esfera familiar, essa dependência diminuiu, entretanto, a violência não, em função da cultura patriarcal quanto a dominância do homem sobre a mulher.
Após anos sofrendo caladas, diversas manifestações e, inúmeras lutas por uma justiça eficaz, as mulheres conquistaram uma Lei, de n°11.340/2006. Essa lei tem como função oferecer amparo contra a violência de gênero, que por muito tempo permaneceu escondida dentro dos lares. Contudo, esta Lei, conhecida como Maria da Penha, gerou algumas controvérsias e, após 12 anos de existência, vem trazendo modificações e ampliando seu campo de abrangência como, por exemplo, à aplicação de seu dispositivo não só as mulheres como aos homens.
Como hipótese principal, parte-se do pressuposto que a distinção entre princípios e regras é uma ferramenta bastante eficaz para consolidar possíveis controvérsias a cerca desses aspectos, bem como para estruturar o entendimento da teoria dos princípios e a máxima da proporcionalidade. As regras são normas impositivas, já possuem estipulação legal, já os princípios norteiam o direito, indicam uma direção a seguir, solucionam seus conflitos por meio da ponderação de interesses em cada situação em concreto.
A escolha do tema se deu em razão de ser a Lei n° 11.340/2006 um acontecimento social relevante — tendo em vista a necessidade de amparo às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Violência esta que representa, além dos aspectos políticos, culturais e jurídicos, um problema de saúde pública, haja vista a crescente constatação de que a violência doméstica está associada a traumas físicos e mentais. Contudo, aborda-se em específico as Medidas Protetivas de Urgência, estas configuradas como instrumentos de proteção e coibição a violência contra a mulher, porém, por vezes resultantes em ineficazes, tendo em vista os diversos casos de feminicídios ocasionados em momento posterior a ausência ou até mesmo liberação das Medidas Protetivas de Urgência.
O percurso metodológico é a junção de um conjunto de etapas e processos a serem realizados, de forma ordenada e sistemática, na investigação científica, representando o passo a passo que consiste desde a assistência da realização da pergunta problema até a obtenção dos resultados da pesquisa e quais os caminhos percorridos para obtenção de tal ato (REIS, 2010).
Já Lakatos e Marconi (2007, p. 86) afirmam que o método da indução representa um processo mental, ao qual por meio da partilha de dados particulares, com a devida constatação, pode-se inferir a respeito da verdade geral ou universal, abrangente a mais do que as partes examinadas. O objetivo central desse método é da investigação mais ampla do que as premissas que deram base a mesma.
Ainda em consonância com o método do raciocínio indutivo, a generalização de conceitos que são abordados, tem sua origem por observações de casos concretos. As constatações particulares dos pesquisadores originam da elaboração do aspecto geral. Com isso, a pesquisa possui sua base no método de abordagem indutiva, ao que concerne a demonstração de caráter geral com abordagem da problemática apresentada em momento anterior (PRODANOV; FREITAS, 2013, p. 28).
De acordo com Gerhardt e Silveira (2009, p. 33), a pesquisa qualitativa tem preocupação com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, com foco na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais. Segundo os autores, essa modalidade tem como escopo o universo de significados, motivos, aspirações, valores, entre outros, o que compreende um aspecto não tangível da pesquisa. Algumas das características dessa modalidade de pesquisa consistem na objetivação do fenômeno, hierarquização das ações de descrever, compreender, explicar, precisão das relações entre o global e o local em determinado fenômeno, observância das diferenças entre o mundo social e o mundo natural, entre outros métodos.
Ao que concerne quanto a tipologia da pesquisa, tem-se a evidenciação quanto ao método exploratório, com a finalidade de proporcionar a maior familiaridade do problema evidenciado, para que se possa ter maior facilidade na construção de hipóteses. A natureza quanto ao objetivo da pesquisa é exploratório, pelo fato da sua busca por fatores que, por meio do procedimento metodológico, levam a evidenciação das hipóteses de pesquisa (GIL, 2010).
Para o levantamento de dados, consoante preconiza Fonseca, se dá por meio da pesquisa bibliográfica, ao qual:
A pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que já se estudou sobre o assunto. Existem porém pesquisas científicas que se baseiam unicamente na pesquisa bibliográfica, procurando referências teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a resposta (FONSECA, 2002, p. 32).
Porquanto, busca-se pela análise sobre a teoria por meio de livros, artigos científicos, periódicos, teses e documentos produzidos pelo meio acadêmico para sintetização do pensamento de autores que visaram o entendimento acerca dos elementos motivadores da pesquisa.
2 A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: LEI MARIA DA PENHA
Atualmente, a denominada violência contra a mulher vem sendo comumente chamada de “violência de gênero”, buscando um caráter social e biológico mais abrangente. A violência de gênero, em decorrência da fragilidade e inferioridade do sexo feminino diante do masculino, tem servido quase como um sinônimo de violência contra a mulher, visto que os atos violentos em função de gênero têm se caracterizado por uma maior incidência de casos que tenham mulheres como vítimas. Portanto, percebe-se que a violência de gênero é um fator hegemonicamente de dominação masculina e de subjugação feminina. Assim, a violência de gênero é quase um sinônimo de violência contra a mulher e está caracterizada pela incidência de atos violentos em função do gênero feminino. Logo, a violência contra a mulher é um aspecto que resulta na anulação da sua autonomia, onde é concebida como “vítima” (CARVALHO, 2017, p. 2).
2.1 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA COMO RESULTADO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO
Para um melhor entendimento acerca do que representa a violência doméstica como resultado de uma cultura patriarcal e violência de gênero, é necessário que se apresente o conceito do que é gênero. O conceito de gênero, em relação ao âmbito jurídico está relacionado ao princípio da igualdade, presente no artigo 5º, caput da Constituição Federal de 1988, que diz: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza [...]” (BRASIL, 1988).
Em primeiro momento, é preciso destacar um ideal contemporâneo acerca da ideologia. A noção de ideologia tem uma relação direta quanto a uma oposição a algo que seria a verdade científica, em função da dificuldade histórica de se produzir um fato tido como científico e verídico. Teria um ideal secundário em relação ao objeto de análise, devendo sempre ser utilizada com precauções (FOUCAULT, 1979, p. 11).
Com isso, o gênero em termos de conceito é constituído como fator relevante para que a mulher ganhasse mais notoriedade no âmbito sociocultural para que a partir da ideologia do que representa o gênero fosse constituído a transformação social necessária. É necessário até em dias atuais que se discuta o papel do conceito de gênero na luta pela igualdade que deveria ser realidade para muitas mulheres. Com isso, é do entendimento de Manfrao:
[...] O conceito de gênero permitiu o deslocamento da questão feminino do espaço tradicionalmente estabelecido como privado para o espaço público, fazendo com que determinados problemas antes vistos como particulares passassem a receber especial atenção das instituições públicas, no que Andrade denominou ‘politização do espaço doméstico’. Um exemplo é a violência conjugal, que emergiu do âmbito familiar para tornar-se objeto da agenda governamental, no tocante à elaboração de políticas públicas que oferecessem respostas à demanda feminina por mecanismos que coibissem tal forma de violência. Tal deslocamento permitiu que as mulheres passassem a se enxergar como sujeito de direitos, atuando no polo ativo das relações judiciais e demandando do Estado a resolução de conflitos. (MANFRAO, 2019, p. 6).
Conforme entendimento supracitado, é visto que problemas antes presentes no âmbito familiar, se tornariam objetos de interesse de pauta governamental para que respostas da problemática a respeito da violência conjugal fossem objetos das políticas públicas. Contudo, para que existam políticas públicas que procurem coibir a violência sofria pela mulher, antes é necessário que seja visualizada a conduta da sociedade em punir as vítimas colocando nas mesmas a culpabilidade pelo ato que sofreram.
Foucault (1979) aborda um pensamento interessante sobre a mudança necessária dos discursos presente na ciência. Cita a medicina que, até o final do século XVIII existiam lentas transformações. Aborda ainda o contexto de que, as mudanças proporcionadas servem de forma mais profunda quanto a uma nova abordagem e modo de falar e de ver um conjunto de situações. Cita ainda que “viva a descontinuidade, estamos nela e nela ficamos”, o que corrobora o entendimento de que a descontinuidade, ou seja, a constante evolução deve ser abraçada, porquanto, deve-se mudar, evoluir, não deixar que preceitos arcaicos ditem toda uma sociedade por diversos anos a fio, como a cultura do patriarcado ainda exerce seu poder na sociedade.
A objetificação e atribuição da culpabilidade da mulher faz parte de comportamentos dentro do que é chamado sistema patriarcal. Esse sistema tem por origem a dominação masculina, sendo possível percebê-la nos contextos históricos desde os primórdios e ainda na atual sociedade, existem adeptos abertos e sutis ao sistema do patriarcado. Com pensamento de mesma natureza, Nye postula que:
O modo de Beauvoir ver as mulheres sempre como escravas e os homens sempre como senhores foi herdado por várias gerações de feministas inglesas e norte-americanas. Foi cunhado um nome para denotar a dominação universal das mulheres pelos homens—patriarcado. A amplidão dos temas tratados em O segundo sexo preparou o caminho para alegações feministas radicais de que: o patriarcado é a constante universal em todos os sistemas políticos e econômicos; que o sexismo data dos inícios da história; que a sociedade é um repertório de manobras nas quais os sujeitos masculinos firmam o poder sobre objetos femininos. Violações, pornografia, prostituição, casamento, heterossexualidade — tudo isso são imposições do poder masculino sobre as mulheres. A aquiescência das mulheres é uma indisposição de má fé de enfrentar sua própria falta de poder. (NYE, 1995, p. 119).
Nye (1995) destaca de forma precisa o modo como a mulher é vista em sociedade não como um ser e sim como uma coisa, uma posse do sexo masculino que, se questiona, enfrenta um arsenal de argumentos dotados de pouca fundamentação. É destacado como o patriarcado está presente em vários eixos da sociedade, desde o mais alto até o mais baixo. O patriarcado, conforme destacado por Nye foi e ainda é uma “constante universal em todos os sistemas políticos e econômicos”, revelando que, se existe uma constância acerca da hierarquização e dita superioridade masculina, esse mesmo fator revela a divergência entre os direitos garantidos as pessoas em razão de seu gênero. Essa diferença, não em termos de direitos igualitários, mas em específico de tratamento da sociedade para com o indivíduo fomenta o processo de preconceito e discriminação, fatos geradores de violência de diversas formas e intensidades.
O poder exercido pela cultura do patriarcado e a consideração da mulher como objeto é permeado pela consideração de que o poder não tem sua estruturação e continuidade simplesmente pela negativa de ação, mas é aceito porque produz coisas, induz a algum tipo de prazer, alguma forma de saber, produz um discurso que encanta e se perpetua. O poder é exercido como uma rede de produção que atravessa a sociedade mais do que simplesmente o dizer não possui (FOUCAULT, 1979). Por isso, é preciso entender o poder que a violência de gênero possui uma rede, um discurso atraente aqueles que se deixam atrair e darem continuidade e que deve ser desconstruído.
Logo, tem-se que a verdade é construída na sociedade, ou seja, os ideias que os indivíduos possuem advém da demonstração do poder, seja por meio de repasse ou até mesmo de discurso. Com isso, fica subentendida a ideia motivadora de que se a mulher constitui-se um ser inferior ao homem, se é tida como objeto, pela lógica masculina patriarcal, não existe expressão de vontade, logo a mulher deveria estar sempre a postos para satisfazer os desejos do ser superior que a comanda.
Consoante Soares (1999), constitui a violência contra a mulher “uma violência masculina que se exerce contra as mulheres pela necessidade dos homens de controlá-las e de exercer sobre elas o seu poder”. A modalidade da violência sendo a mulher figura de vítima, como visto outrora, advém, em especial, do fator histórico da mulher em razão do patriarcalismo predominante.
A sociedade ao qual se tem a estrutura atual é permeada de relações de dominação, atribuindo ao homem o poder do comando, de dominação, de proteção e provimento. Contudo, existem diversas desigualdades, que são constituídas por meio da sociedade, dando um papel totalmente submisso, cuidadora do lar, sendo que a mulher pode e até deve ser muito mais do que isso, deve-se fornecer a mulher a oportunidade de decidir sobre o seu futuro, se deseja ser esposa, mãe e cuidadora da casa, mas também profissional, acadêmica e mulher, pois acima de tudo, a mulher não é só um objeto para procriação e cuidado, mas sim um ser humano.
Neste diapasão, mais do que para regulamentar quaisquer relações econômicas ou sociais, a Lei Maria da Penha ingressa no sistema jurídico brasileiro com uma finalidade muito determinada: contribuir para modificar uma realidade social, forjada ao longo da história que discrimina a mulher nas relações familiares ou domésticas, aviltando-a à condição de cidadã de segunda categoria, rebaixando sua autoestima e, por consequência, afetando-lhe a dignidade humana.
Assevera Dias (2015, p. 24) que ninguém acredita que a violência sofrida pela mulher seja exclusivamente de responsabilidade do agressor. “A sociedade ainda cultiva valores que incentivam a violência, o que impõe a necessidade de se tomar consciência de que a culpa é de todos. O fundamento é cultural e decorre da desigualdade no exercício do poder, o qual gera uma relação de dominante e dominado”. O processo de naturalização é feito a partir da dissimulação, utilizada com o intuito de tornar invisível a violência conjugal. [...]. Daí o absoluto descaso de como sempre foi tratada a violência doméstica.
Cavalcanti (2018) define violência contra a mulher como qualquer conduta, ação ou omissão de discriminação, agressão ou coerção, praticada pelo simples fato de a vítima ser mulher, e que cause danos, morte, constrangimento limitação, sofrimento físico, sexual, moral, psicológico, social, político ou econômico ou perda patrimonial, que pode ocorrer em espaços públicos ou privados.
Por intermédio do preconizado no artigo 7º da Lei 11.340/06, o legislador buscou descrever algumas formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, conforme exposto:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria (BRASIL, 2006).
As definições contidas no referido artigo não são considerados tipos criminalizadores, ou seja, não definem tipos penais. A função deste artigo é definir situações que impliquem em violência no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, para os fins da lei (HERMANN, 2018).
A relação de tipos de violência elencadas no artigo 7º da Lei não é exaustiva e não tem correspondência com tipos penais, sendo que traz a expressão “entre outras”, sendo possível o reconhecimento de outras ações que configurem violência doméstica e familiar contra a mulher (DIAS, 2015).
2.1.1 Histórico e Conceito Da Lei Maria Da Penha
Em um breve histórico a insurgência da Lei 11.340/2006, decorre da triste história de vida de uma farmacêutica cujo nome deu origem a lei, Maria da Penha, uma dentre tantas vítimas de violência doméstica no Brasil, assim como muitas mulheres ela sofria reiteradas agressões do então companheiro, professor Universitário e Economista Marco Antônio Heredia Viveros, que tentou inclusive por diversas vezes matá-la. Dias aborda que:
Por duas vezes, seu marido, o professor universitário e economista M.A.H.V., tentou matá-la. Na primeira vez, em 29 de maio de 1983, simulou um assalto fazendo uso de uma espingarda. Como resultado ela ficou paraplégica. Após alguns dias, pouco mais de uma semana, nova tentativa, buscou eletrocutá-la por meio de uma descarga elétrica enquanto ela tomava banho (DIAS, 2017, p. 13).
A história de Maria da Penha, o motivo que levou a lei a ser batizada com esse nome, pelo qual, irreversivelmente, passou a ser conhecida, remonta ao ano de 1983, no dia 29 de maio desse ano, na cidade de Fortaleza, no Estado do Ceará, a farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, enquanto dormia, foi atingida por tiro de espingarda desferido por seu então marido, o economista Marco Antônio Heredia Viveiros, colombiano de origem e naturalizado brasileiro. Em razão desse tiro, que atingiu a vítima em sua coluna, destruindo a terceira e quarta vértebras, teve lesões que a deixaram paraplégica. (CUNHA; PINTO 2012).
Por derradeiro a lei Maria da Penha trouxe várias alterações, uma delas são as medidas protetivas de urgência como proibição de contato, proibição de o agressor de frequentar determinados lugares, prisão preventiva do agressor, isto como medida mais grave, meio do juiz fazer a real e eficaz proteção a vítima. A lei visa não só a proteção da mulher, mas também dos familiares, ou testemunhas. (BIANCHINI, 2014).
A Lei Maria da Penha vem para atender um compromisso constitucional, e chama a atenção na sua ementa, onde há referência não só a norma constitucional, mas também as Convenções Sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as mulheres e sobre a Interamericana para prevenir punir e erradicar a violência contra a mulher referências essas poucos usais na legislação infraconstitucional, além de atender as recomendações feitas pela OEA pela condenação do Brasil, também reflete uma nova postura frente à aos tratados internacionais na proteção aos direitos humanos.
2.1.2 Finalidades e Objetivos Da Lei
De acordo com o artigo 1º da lei 11.340/06, conclui-se que o objetivo da lei é coibir e prevenir a violência de gênero no âmbito doméstico, familiar ou de uma relação íntima de afeto, configurando como violência doméstica e familiar qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão ou sofrimento físico, sexual ou psicológico e danos morais ou patrimoniais. (BIANCHINI, 2014). Dispõe o artigo 1º da Lei 11.340/2006, in verbis:
Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar (BRASIL, 2006).
Portanto, a lei Maria da Penha não trata de todos os tipos de violência contra a mulher, mas somente aqueles que se manifestam no âmbito doméstico interligado a família ou uma relação íntima de afeto, aquela baseada no gênero. Entende-se por violência doméstica aquela praticada dentro do lar, como por exemplo, contra o filho, a sobrinha, avó, etc. Assim classifica-se a violência contra a mulher como aquela praticada dentro do ambiente doméstico, por tanto a título de exemplo, se a mulher é assassinada pelo marido para que esta não o entregue a polícia, não seria caso de aplicação da lei Maria da Penha, pois não há uma questão de gênero. (BIANCHINI, 2014).
Em resumo conclui-se que, o objeto da lei é a violência de gênero no âmbito doméstico e familiar ou de uma relação íntima de afeto, é a violência contra a mulher baseada no gênero, assim tratado em seu artigo 5º onde define seu objeto configurando a violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero.
Consoante, dispõe o artigo 5º da lei 11.340/06:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual (BRASIL, 2006).
Via de regra, a Lei Maria da Penha é uma lei para mulheres onde sua aplicação aos homens se tornaria em regra inviável, considerando-se as especificidades da violência de gênero não vislumbra sua aplicação ao homem, ademais, estima-se que o homem médio seja em 99,9% fisicamente mais forte que as mulheres, além de ser necessária a existência da violência discriminatória que é em absoluto desde muitos anos trazidos nos germes da sociedade às mulheres, o que não se verifica nos casos isolados em que o homem seja vítima deste tipo de violência (BIANCHINI, 2014).
Ademais em destaques alguns artigos da Lei 11.340/06 como o artigo 3º que elenca os direitos das mulheres que são, na verdade direitos inerentes à pessoa humana, portanto tanto homens quanto mulheres independentemente de sexo tais como, segurança, cultura, educação, moradia, lazer, entre outros, e em seu artigo 5º fala em violência doméstica e familiar de qualquer forma de ação ou omissão.
2.2 MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
Lamentavelmente após a vigência da Lei Maria da Penha pouquíssimo foi realizado pelo Poder Público no sentido de efetivar as medidas nela previstas, vez que se tem visto um pequeno número de programas especificamente voltados à lei, ou se existentes, é evidente a sua falta de divulgação. (COELHO, 2010) Além da necessidade das assistências mencionadas, um dos aspectos relevantes da Lei Maria da Penha são as suas medidas protetivas de urgência que se mostram eficientes para a proteção do gênero feminino. As medidas protetivas de urgência significam a expressão da proteção judicial relativa à mulher de todos os seus direitos e garantias fundamentais estabelecidos na Constituição Federal (CF), independente de raça, cultura, religião, escolaridade, idade, e etc. (PORTELA, 2011).
Estas medidas são asseguradas nos casos em que há qualquer ação ou omissão resultante de violência contra a mulher, que lhe cause morte, lesão, ou sofrimento físico, psicológico, moral ou patrimonial. No entanto, para que haja a concessão das mesmas, é necessária a caracterização da conduta agressiva dentro do âmbito doméstico ou familiar dos envolvidos.
Ressalta-se que, infelizmente, a concessão das supracitadas medidas protetivas de urgência não significa a proteção efetiva da mulher, visto que não há ainda programas estatais estruturados para atendê-las e meios eficientes para impedir novos atos de violência (COELHO,2010). Desta maneira, como mecanismo marcante que a lei em questão abrange, as medidas protetivas de urgência foram inseridas com o objetivo de realizar uma proteção mais efetiva para as mulheres que não se sintam amparadas apenas com a denúncia da violência sofrida, e dessa forma, possibilitam um maior conforto às vítimas, atuando na forma de manutenção do procedimento.
Conforme artigo 18 e 19 da lei 11.340/06, apresenta-se o seguinte teor:
Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas:
I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;
II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;
III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
§ 1o As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.
§ 2o As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.
§ 3o Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público (BRASIL, 2006).
As medidas protetivas em caráter de urgência podem ser condidas de oficio ou a requerimento do Ministério Público, ou a requerimento da ofendida, prescindindo de advogado, dada a urgência da situação, podem ser requeridas pela vítima; Passada a urgência vale a regra do artigo 27, nomeando-se advogado para acompanhamento. (CUNHA; PINTO, 2011).
Valioso apresenta o que dispõe o artigo 22 da Lei 11.340/06, ao que:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios (BRASIL, 2006).
O artigo supracitado elenca medidas protetivas que obrigam o agressor, voltadas diretamente ao sujeito ativo da violência doméstica, impondo-lhe obrigações e restrições, tais medidas restringem determinados direitos do agressor a fim de proteger a vítima, impondo-lhe comportamento omissivo, cuja conduta que afrontar a ordem de abstenção tipificará então o crime de desobediência à ordem judicial, com previsão expressa no artigo 359 do Código Penal, com possibilidade de prisão em flagrante (PORTO, 2017).
Em continuidade às medidas protetivas de urgência para Bianchini (2014, p. 193) “muito embora a mulher em situação de violência doméstica e familiar seja a primeira destinatária das medidas protetivas, várias delas dirigem-se, também, aos familiares”, dirigidas a mulher, nenhuma delas possui natureza criminal, podendo inclusive, serem cumuladas ou não, dependendo da complexidade e peculiaridades do caso concreto. (BIANCHINI, 2014, p. 190).
O artigo 23 da lei dispõe sobre as medidas protetivas com relação à ofendida:
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar à ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos (BRASIL, 2006).
A lei confere ao juiz a possibilidade de determinar a separação de corpos entre a vítima e agressor, a lei abrange de um lado a mulher ofendida e de outro o agressor, levando-se em conta que a lei abrange também, as relações homoafetivas, portanto nada impede o juiz de decretar a separação de corpos entre duas homossexuais (CUNHA; PINTO 2011).
O artigo 23, I, que autoriza o juiz a determinar o encaminhamento da ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento, esta providência dependera da existência de tais programas, que não necessariamente necessitam ser específicos às vítimas de violência doméstica, como por exemplo, a Secretaria de Assistência Social pode ter programas de auxilia habitacional ou alimentar para pessoas necessitadas, a Secretaria de Saúde que poderá atender as vítimas e seus familiares, aquelas que necessitarem de algum tratamento médico ou até mesmo acompanhamento psicológico através de Centros de Atendimento Psicossocial (PORTO, 2017).
2.3 A INEFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
A ineficácia das medidas protetivas já se inicia na fase extrajudicial, no atendimento pela autoridade policial, onde na maioria esmagadora das vezes é realizada de forma precária, devido à falta de efetivo. Sujeitando vítimas a longas esperas e deixando-as vulneráveis a novas violências. As falhas na aplicação da lei começam nos registros imprecisos e desarticulados dos órgãos responsáveis por acolher as denúncias, passam pela falta de estrutura para atendimento das vítimas e culmina na ausência de uma rede de enfrentamento conjunto das instituições (MATIELLO; TIBOLA, 2013).
É claro que a eficácia das medidas protetivas de urgência não se atrela a decretação da prisão preventiva do agressor, haja vista que quando há a necessidade da decretação da prisão preventiva, as medidas protetivas por si só já se demonstraram ineficazes. Outrossim, há ineficácia das medidas protetivas de urgência nas situações em que a vítima acaba de sofrer a nova agressão física ou psicológica mesmo tendo medidas protetivas de urgência deferidas em desfavor de seu agressor e, solicita atendimento policial. Os policiais ao verificarem a situação de violência autuam o agressor em flagrante, mas este pode ser libertado minutos depois mediante pagamento de fiança (MATIELLO; TIBOLA, 2013).
A maior crítica e onde se encontra a maior ineficácia, está no fato de que a mulher vítima para ter garantida a execução de suas medidas protetivas através da prisão preventiva, precisa sofrer uma nova agressão ou ameaça, o que de forma clara viola sua integridade física, seu psicológico e acima de tudo seu direito garantido constitucionalmente o direito a dignidade humana, pois para que haja prisão é necessário descumprimento e de que forma na maioria esmagadora das vezes este descumprimento ocorre. Através de uma nova agressão física, através de uma ameaça ou ainda um contato telefônico, mas todos que violam tanto a integridade física, quanto a integridade psicológica da ofendida que já se encontra abalada desde a primeira agressão. Com isso, tem-se que, em muitos momentos não ocorre somente uma nova agressão física e sim, a última forma de violência física: o feminicídio. Corrobora-se a verificação central da pesquisa levantada por meio de dados estatísticos e ações judiciais as quais se apresenta a ineficácia das medidas protetivas de urgência em face do cometimento do feminicídio.
2.3.1 Estatísticas dos crimes de feminicidio
Com relação a número de homicídios de mulheres no Brasil, 52% da violência praticadas pelos maridos e companheiros são de risco de morte, conforme dados do disque 180 de janeiro a julho de 2012, reduzido a 46,3% no ano de 2013. De acordo com pesquisas realizadas por Universidades da Federação de 2012, segundo Mapa da Violência, o Espirito Santo é o Estado com maior percentual de mulheres vítimas de homicídio com 9,8% para cada cem mil mulheres ocupando o 1º lugar em maior incidência de homicídios contra a mulher, enquanto que o Rio Grande do Sul teria uma porcentagem de 4,1% no 19º lugar, já o Estado do Piauí está em último lugar 27º com um índice de 2,5%. O Brasil em linhas gerais, segundo dados do Mapa da Violência de 2012, ocupa o 7º lugar entre os países que possuem o maior número de mulheres mortas, entre 87 países. (BIANCHINI, 2014).
Segundo o IPEA (2013), no Brasil, 13 mulheres são mortas por dia, e entre os anos de 2004 a 2014, houve um aumento considerável de respectivamente 11,1% nas taxas de homicídio, o que demonstra a grande dificuldade dos mecanismos trazidos pela Lei Maria da Penha, como das suas medidas protetivas de urgência em combater a violência. O Brasil ocupa o 5° lugar em um ranking de 83 países, sobre o maior índice de homicídio de mulheres, também é registrado de acordo com o IPEA, que a maior parte das vítimas possui baixa escolaridade, e cerca de 48% das mulheres possuem apenas 8 anos de estudo (JACOBO,2015).
Com base nos dados do IPEA (2017), 29% dos feminicídios ocorreram no domicílio, 31% em via pública e 25% em hospital ou outro estabelecimento de saúde, destacando um fator elementar, que trata da parcela significativa do gênero feminino que enfrenta a violência mais comum, caracterizada como a intrafamiliar, cometida por seus parceiros ou parentes, que compõem muitas vezes relacionamentos abusivos e sufocantes, que resultam nos mais diversos transtornos caracterizados pela lei.
Essa hostilidade expressa-se de maneira corriqueira, sendo de estruturas psicológicas ou levando a um agrave ainda maior causando o óbito da individua. Além disso, segundo dados do Senado (2013), quase 40% das mulheres afirmam ter procurado alguma ajuda logo após a primeira agressão. Para as demais, a tendência é buscar ajuda da terceira vez em diante ou não procurar ajuda alguma, o que acontece em 32% e 21% dos casos, respectivamente.
A Pesquisa do Senado (2013) indica também que em relação à última agressão sofrida, 35% das vítimas realizaram denúncia formal contra os agressores, nas delegacias comuns, da mulher ou na Central de Atendimento à Mulher (180), que já prestou mais de 2,7 milhões de atendimentos desde a criação da central, até junho de 2012. A mesma pesquisa aponta que aproximadamente 34% das vítimas procuraram alternativas à denúncia formal, como a ajuda de parentes, de amigos e da Igreja, e 15% não fizeram nada a respeito da última agressão sofrida. Tais dados indicam que o principal motivo para as mulheres escolherem essas vias alternativas à denúncia formal é certamente o medo do agressor, fator apontado por 74% das entrevistadas.
Dessa forma, diante das apresentações dos dados, é patente que a lei não tem se mostrado eficaz, visto que se tivesse, não haveria um aumento significante na taxa de violência após a instauração da lei, nem as vítimas estariam sendo dominadas por sentimento de medo devido à falta estrutura do estado para combater a violência. Destarte, o estado precisa atuar em diversos campos para que as vítimas se sintam amparadas e colaborem com a atuação do estado na repressão da violência, denunciando os seus agressores. Com isso, apresenta-se o entendimento jurisprudencial acerca da concessão de medidas protetivas de urgência e mesmo assim, a vítima chegou a óbito, em função da ineficácia da mesma.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a aprovação da Lei Maria da Penha, não foram demonstrados resultados significativos na redução da violência sofrida pelas mulheres, conforme os dados analisados. Os índices de violência voltaram a subir após o sancionamento da lei em 2006, sendo elevada no ano de 2008, onde superou a taxa de violência existente antes da implementação da lei, crescendo consideravelmente em 2013, o que demonstra que a lei não trouxe resultados plausíveis para a redução dos atos impetuosos contra as mulheres.
Partindo da premissa da violência de gênero e da importância da Lei Maria da Penha no Brasil, identificou-se elementos que contribuem para ineficácia da lei e das suas medidas de proteção em favor da mulher.
É importante acentuar que o patriarcalismo ainda subsiste na modernidade, e essa conduta revela o problema sociocultural advindo desse sistema patriarcalista, cuja marca principal é a discriminação e a submissão da mulher.
Assim, o conflito de gênero está por trás da violência doméstica que não pode ser tratada pura e simplesmente como matéria criminal. Portanto, é importante que, para atuação no combate à violência contra a mulher, exista uma atuação mais efetiva do Estado, como também a participação das mulheres vítimas de violência, em buscar denunciar os seus agressores, combatendo dessa forma a ineficácia existente na Lei Nº 11.340/2006.
Conclui-se que, na ausência de mecanismos que reforcem a efetividade da Lei 11.340/2006, esta pode ser considerada ineficaz para os fins a que se destina, em especial para o combate a evolução de uma agressão para o crime de feminicídio, uma vez que o Poder Público não possui estrutura mínima para a sua adequada aplicabilidade, o que termina por gerar na sociedade a percepção de que a Lei Maria da Penha é um texto meramente ilusório e formal.
REFERÊNCIAS
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PALMEIRA, Yasmin Correa. A Lei Maria da Penha e as Medidas Protetivas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 maio 2021, 04:31. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56499/a-lei-maria-da-penha-e-as-medidas-protetivas. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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