RESUMO: O trabalho analisará as psicopatias que acometem a mente humana e tornam o indivíduo propenso à prática de crimes. Algumas psicopatias podem tornar o indivíduo inimputável ou semi-imputável, o que decorre do grau de discernimento deste acerca da conduta criminosa. A inimputabilidade acarreta a presunção de periculosidade do indivíduo, enquanto que na semi-imputabilidade a periculosidade deve ser atestada pelo juiz no caso concreto. Tanto a inimputabilidade quanto a semi-imputabilidade devem ser constatadas em laudo pericial. O trabalho objetiva detectar as principais psicopatias bem como os fatores endógenos e exógenos que contribuem para que o indivíduo pratique crimes acometidos destas psicopatias, além de relacionar as principais características destes indivíduos com o intuito de identificá-los no meio social. A consequência em razão da declaração da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, somada à comprovação da prática do fato criminoso, é a condenação do indivíduo ao cumprimento de uma das espécies de medida de segurança, que pode ser a detentiva ou restritiva. Os indivíduos que cumprem medida de segurança restritiva ficam sujeitos a um acompanhamento ambulatorial, enquanto que os que cumprem medida de segurança detentiva são submetidos à internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, que em muitos casos não possuem condições de tratar os fatores endógenos e exógenos que ocasionam a prática de crimes.
PALAVRAS-CHAVES: Psicopatias. Criminosos. Culpabilidade. Imputabilidade. Medida de Segurança.
ABSTRACT: The work will analyze the psychopathies that affect the human mind and make the individual prone to the practice of crimes. Some psychopathies can make the individual unthinkable or semi-imputable, which is due to the degree of his discernment about criminal conduct. The immobility implies the presumption of danger of the individual, while in semi-imputability the danger must be attested by the judge in the specific case. Both the ineligibility and the semi-imputability should be verified in an expert report. The work aims to detect the main psychopathies as well as the endogenous and exogenous factors that contribute to the individual commits crimes affected by these psychopathies, besides relating the main characteristics of these individuals with the purpose of identifyingthem in the social milieu. The consequence due to the declaration of ineligibility or semi-imputability, added to the proof of the practice of criminal fact, is the condemnation of the individual to the fulfillment of one of the types of security measure, which can be the detaining or restrictive. Individuals who comply with a restrictive security measure are subject to outpatient follow-up, while those who comply with a detention security measure are subject to custody hospital admission and psychiatric treatment, who in many cases are unable to deal with the endogenous and exogenous factors that lead to the commission of crimes.
KEYWORDS: Psychopathies. Criminals. Culpability. Imputability. Security Measure.
1 INTRODUÇÃO
O tema relacionado à punibilidade e da aplicação da medida de segurança aos psicopatas homicidas no sistema penal brasileiro, será analisado de acordo com a criminologia, que em suma, estuda o crime, o criminoso e a vítima, ou seja, analisa o comportamento, a personalidade, a periculosidade e as causas da criminalidade, bem como medidas para intervir no ato delitivo de modo que o agente, após cumprir a sanção, se ressocialize no meio social. A medicina legal que trata de meios de investigações, através de técnicas e procedimentos médicos por meio de solicitação judicial, com intuito de averiguar e elucidar casos inerentes e de interesses judiciários, e a psiquiatria forense que no direito há três conceitos indispensáveis para o desenvolvimento da psiquiatria forense, são eles: entendimento, determinação e discernimento.
A psiquiatria forense tendo uma ligação com direito, visa buscar o equilíbrio e auxiliar as soluções e demandas judiciais empunhando assim seus conhecimentos e de tal forma buscando assim a adequações e o equilíbrio nos conflitos.
Serão analisados os comportamentos humanos decorrentes de psicopatias que tornam o individuo propenso à prática de crimes, analisando mais especificamente a psicopatia denominada distúrbio de personalidade anti-social, sua distinção dentre as outras psicopatias, bem como os reflexos de seu diagnóstico em face da lei penal.
O trabalho buscará identificar as psicopatias que podem ocasionar a prática de crimes, analisar os fatores endógenos e exógenos relacionados à psicopatologia denominada distúrbio de personalidade anti-social, explicar as consequências do diagnostico dessa psicopatia no curso da persecução penal, bem como descrever como se dá a punição e a aplicabilidade da medida de segurança ao agente no atual sistema penal brasileiro aos portadores desta psicopatia.
Para tanto serão utilizados os métodos de pesquisa científica e a metodologia compreendida ainda na indicação de como será feita a análise do material pesquisado ou do tipo de análise que será efetuada: seletiva, crítica ou reflexiva, descritiva, analítica etc.
2 PSICOPATIAS (TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE)
A psicopatia tem como características o comportamento emocional, interpessoal e comportamental que conduz ao modo de funcionamento patológico, que se resume em uma desordem emocional que ocasiona o aumento de comportamentos anti-sociais. É uma anomalia psíquica, um transtorno anti-social da personalidade, devido à qual, apesar da integridade das funções psíquicas e mentais, a conduta social do indivíduo que sofre dessa anomalia se encontra patologicamente alterada.
Conforme a Autora Ana Beatriz Barbosa:
Existem, basicamente, três correntes acerca do tema psicopatia e seu conceito. A primeira considera a psicopatia como uma doença mental. A segunda a considera como uma doença moral, enquanto que a terceira corrente considera a psicopatia como transtorno de personalidade.[1]
As causas que se encontraram a conduta psicopática indicam que, por serem indivíduos relativamente insensíveis, quase nunca adquirem medos condicionados, tais como o medo da desaprovação social ou da humilhação, medo de que restrinjam suas más ações, medos esses que dariam a esses indivíduos um senso do bem e do mal.
A manifestação do comportamento anti-social constitui uma das características fundamentais da psicopatia, embora nem sempre se verifique a prática criminosa.
Quando se fala de psicopata, logo imaginamos um individuo com cara de mau, de aparência estranha e desvios de comportamentos tão óbvios que poderíamos reconhecê-los a qualquer momento. Errado!!
Reconhecer um psicopata não é tão fácil assim. Pois eles enganam e representam muito bem. São pessoas frias, insensíveis, manipuladoras, perversas, transgressoras de regras sociais e desprovidas de sentimentos de culpa e remorso.
De acordo com a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa: “É importante ressaltar que os psicopatas possuem níveis variados de gravidade: leve, moderado e severo. Qualquer que seja o grau de gravidade, todos, invariavelmente, deixam marcas de destruição por onde passam, sem piedade”[2].
2.1 Das principais psicopatias que podem ocasionar a prática de crimes
Estes indivíduos, também recebem outras nomenclaturas como de sociopatas, personalidades antissociais, personalidades psicopáticas, personalidades dissociais, personalidades amorais, entre outras.
Mas podemos observar e reconhecer desde a infância a vida adulta, alguns comportamentos e características relacionados a psicopatias, observando a intensidade e com que frequência as tais características ocorrem.
Algumas das principais características de um psicopata segundo a Revista Superinteressante;
Podemos observar características de psicopatia desde a infância até a vida adulta. Antes dos 18 anos, por uma questão de nomenclatura, o problema é chamado de Transtorno da Conduta. Crianças ou adolescentes que são fortes candidatos à psicopatia possuem um padrão repetitivo e persistente que podem ser sintetizados pelas características comportamentais descritas abaixo:
· Mentiras freqüentes (às vezes o tempo todo);
· Crueldade com animais, coleguinhas, irmãos etc.;
· Condutas desafiadoras às figuras de autoridade (pais, professores etc.);
· Impulsividade e irresponsabilidade;
· Baixíssima tolerância à frustração com acessos de irritabilidade ou fúria quando são contrariados;
· Tendência a culpar os outros por seus erros cometidos;
· Preocupação excessiva com seus próprios interesses;
· Insensibilidade ou frieza emocional;
· Ausência de culpa ou remorso;
· Falta de empatia ou preocupação pelos sentimentos alheios;
· Falta de constrangimento ou vergonha quando pegos mentindo ou em flagrante;
· Dificuldades em manter amizades;
· Permanência fora de casa até tarde da noite, mesmo com a proibição dos pais. Muitas vezes podem fugir e levar dias sem aparecer em casa;
· Faltas constantes na escola sem justificativas ou no trabalho (quando mais velhos);
· Violação às regras sociais que se constituem em atos de vandalismo como destruição de propriedades alheias ou danos ao patrimônio público;
· Participação em fraudes (falsificação de documentos), roubos ou assaltos;
· Sexualidade exacerbada, muitas vezes levando outras crianças ao sexo forçado;
Introdução precoce no mundo das drogas ou do álcool;
· Nos casos mais graves, podem cometer homicídio.[3]
Em face de algumas destas características acima descritas, podemos relacionar algumas psicopatias que levam o agente à prática de crimes, tais como:
Transtorno narcisista - Tem exagero em querer se sentir superior e a necessidade em menosprezar e rebaixar os demais para se sentir bem. Se preocupa obsessivamente com a maneira com que os outros o enxergam. Isso é um transtorno de personalidade.
Transtorno paranóide – Este transtorno é caracterizado principalmente pela desconfiança e suspeitas gerenalizadas. As pessoas que sofrem deste transtorno, são cismadas demais, acham que estão sendo perseguidas. São desconfiados, têm sensibilidade excessiva a contrariedades e o sentimento de sempre serem prejudicados pelos outros.
Transtorno esquizóide – São desapegados, não têm interesse pelo contato social, têm dificuldade em se relacionar de forma íntima e afetiva com as demais pessoas e bloqueio para experimentar prazer e relações sexuais, e são indiferentes a elogios e críticas. (não é a mesma coisa que esquizofrenia).
Transtorno Borderline – Sua principal característica é a ausência de empatia. São indivíduos impulsivos e imprevisíveis. Agem de forma descontrolada em determinadas situações, tem perturbações que dificultam a definição de preferências pessoais e provocam o sentimento de vazio.
Transtorno Anti-social - As pessoas acometidas por este transtorno, são indiferentes aos sentimentos alheios, podem ter comportamento cruéis, não obedecem a normas e obrigações, violam os direitos das pessoas, cometem facilmente atos violentos e não sentem remorso pelo que fazem.
Este último, o transtorno de personalidade, descrito no DSM-IV-TR, como já relatado é caracterizado pelo comportamento impulsivo do indivíduo afetado, tem desprezo por normas sociais, e indiferença aos direitos e sentimentos dos outros.
Segundo Trindade, Beheregaray e Cuneo:
[...] Apesar de Transtorno de Personalidade Antisocial e Psicopatia serem, muitas vezes, considerados sinônimos, a maioria dos pesquisadores concorda que o Transtorno de Personalidade Antisocial e a Psicopatia são patologias diferentes. A psicopatia é considerada uma doença mais ampla e grave e de difícil tratamento, sendo mais rara. O Transtorno de Personalidade Anti-Social refere-se, fundamentalmente, a condutas delitivas e antisociais.
O Transtorno de Personalidade Antisocial caracteriza-se por um padrão de desrespeito a normas sociais e violação dos direitos dos outros, propensão a enganar e mentir para obter vantagens pessoais, impulsividade, dificuldades de fazer planos para o futuro, irritabilidade, agressividade, irresponsabilidade e ausência de remorso.
O transtorno, porém, não é sinônimo de criminalidade. Muitos indivíduos com Transtorno de Personalidade Antisocial podem nunca vir a matar ou delinquir, adotando, por exemplo, um estilo de vida parasitário, em que usam os outros em benefício próprio, manipulando, sem nunca precisarem cometer atos violentos.[4]
Porém, como já visto, muitos dos indivíduos assumem um padrão de desrespeito e violação dos direitos dos outros, o que geralmente ocorre por volta dos 15 anos de idade, seguindo alguns critérios como impulsividade, irritabilidade, agressividade, propensão a mentiras, dificuldades a se adequar a normas sociais, cometendo assim comportamentos ilícitos, ausência de remorso. Vale ressaltar que o comportamento anti-social não ocorre exclusivamente durante o curso da esquizofrenia ou relacionado algum episódio maníaco.
3 fatores endógenos e exógenos que levam o psicopata à prática de crimes
Estudos afirmam que na verdade, os psicopatas são portadores do distúrbio do transtorno de personalidade anti-social.
[...] transtorno catalogado desde 1968, cujos principais sinais são o desrespeito dos desejos, dos direitos ou dos sentimentos alheios e um padrão repetitivo de violação das normas. “A prevalência desse distúrbio na população é estimada em 2,5%”, afirma o psiquiatra Marco Antônio Beltrão, diretor do Instituto de Medicina Social e Criminológica do Estado de São Paulo (Imesc). Segundo essa proporção, o Brasil teria nada menos que 4,5 milhões de pessoas nessa condição – o equivalente à soma das populações do Estado de Mato Grosso e de Sergipe. [5]
Vejamos, quem nem todos os psicopatas são criminosos cruéis. Pois, não significa que quem sofra deste distúrbio, necessariamente seja ou se torne um assassino.
Diz o neurologista Henrique Del Nero, da Universidade de São Paulo:
[...] na maioria dos portadores desse transtorno, o comportamento antisocial se manifesta por traços como egoísmo e falta de escrúpulos. É aquele colega de trabalho que atropela os outros para subir na vida ou o político que desvia dinheiro de um hospital para crianças órfãs com câncer para sua conta bancária. Boa parte dessas pessoas também são psicopatas”. [...] “Mas menos de um 1% comete assassinatos cruéis.[6]
Desta forma passamos a analisar os fatores que contribuem para uma possível prática de crime. Precisamos admitir e reconhecer que há uma séries de problemas, fatores externos que podem levar alguém a prática de violências. Ou seja, uma serie de outros fatores interligados ao desenvolvimento da personalidade, como a violência, traumas infantis, como o abuso infantil, a falta de oportunidades associados ao o uso de entorpecentes e os lugares onde a pobreza predomina e que atua direta e indiretamente na formação de um assassino frio.
O simples fato de ter posse de uma arma de fogo nas mãos, faz exaltar o ego da pessoa que convive com todo esses problemas, e faz com que o individuo que se sinta excluído, sinta por algum momento o prazer de sentir-se diferente, importante e no poder.A pessoa de poucas oportunidades e que vivem no mundo de exclusões, em uma sociedade que esbanja o consumismo e que possui frustrações e sofrimentos físicos e psíquicos que perturbam o equilíbrio emocional, possivelmente virá a ser um portador de distúrbios de personalidade anti-social e poderá vir a delinquir.
Analisando às causas contribuintes para o crime, faz-se avaliar os fatores exógenos,como a rejeição, abusos, frustrações, impotência sexual, entre outros, que contribuem e potencializam esses defeitos, Bem como;
· Os fatores sociais ligados à falta de estrutura familiar.
· Os fatores sociopedagógico relacionados à falta de educação e falta de educação moral.
· Fatores socioeconômicos, interligados a pobreza, ao desemprego, a exclusão, a falta de oportunidade, maus tratos, exploração, a sociedade preconceituosa que esbanja o consumismo, a ganância, más companhias e comportamento ilícitos.
Quanto aos fatores de ordem interna, chamados endógenos, encontram-se as neuroses e caracterizadas por fobias taras, comportamento histérico, agitado, impulsivo, violento, neurótico, agressivo apático, astênico, fanático, conforme salienta JORGE TRINDADE, senão vejamos:
Essas anomalias, quando chegam aos estados mórbido-mentais, são chamadas de psicopatias ou neuroses e caracterizadas por fobias taras, comportamento histérico, agitado, impulsivo, violento, neurótico, agressivo apático, astênico, fanático; enfim, um comportamento desarmônico incompatível com as normas e padrões sociais. [7]
Sendo assim, os fatores endógenos são relacionados ao psíquico, são denominadas causas internas, que podem, dependendo do caso, preponderar sobre outros fatores.
4 DO DIREITO PENAL E O CRIME
O direito penal constitui-se em um ramo do direito direcionado à tutela dos bens jurídicos mais relevantes para a sociedade. Sendo assim, o direito penal objetiva tipificar condutas que são capazes de lesionar os bens jurídicos eleitos como os mais valiosos para uma convivência pacífica em sociedade.
Neste sentido, o crime, em seu aspecto sociológico, constitui-se em toda conduta humana que viola os bens jurídicos protegidos pela lei penal.
Sendo assim, o direito penal possui uma função de extrema importância em nossa sociedade que se caracteriza pela proteção dos valores essenciais para o convívio social.
O direito penal deve ser analisado, no entanto, sob dois aspectos. Primeiro deve ser analisado o resultado lesivo decorrente da conduta criminosa, ou seja, o dano causado pela prática do crime. Segundo deve ser analisada a própria conduta criminosa em si, ou seja, se a conduta do agente pode ser considerável reprovável sob o aspecto social.
Nesta linha de raciocínio, é possível concluir que a existência do crime não depende exclusivamente de um resultado que viola um bem jurídico penalmente tutelado, mas se faz necessário também uma detalhada análise da conduta do agente, no sentido de a mesma ser reveladora de reprovabilidade social.
Tal reprovabilidade social da conduta vem a ser chamada de culpabilidade. Logo, culpabilidade é o juízo de valor acerca da conduta criminosa do agente.
De acordo com a teoria finalista, adotada pelo código penal, temos que o conceito analítico de crime, que é a análise dos elementos que compõem o fato criminoso, são o fato típico e a ilicitude, também chamada de antijuridicidade, enquanto que a culpabilidade passou a ser um pressuposto para aplicação da pena, ou seja, não integra o conceito de crime, mas se faz como um requisito necessário para que haja aplicação de pena pelo juiz.
Desta forma as consequências do diagnóstico dessa psicopatia no curso da persecução penal, dependerá de exames e avaliação médica para possível aplicação da sanção penal, cabendo o sujeito ser capaz ou não de compreender a ilicitude de sua conduta, ou seja, sua culpabilidade.
Ressalta-se que como ocorre a propensão para a prática de crimes, o indivíduo portador desta psicopatia pode ser considerado inimputável ou semi-imputável,como já dito, a depender do grau de discernimento do mesmo no momento da prática do fato criminoso.
Estabelece o art. 26 do Código Penal Brasileiro:
Inimputáveis Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Redução de pena (...) Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.[8]
4.1 REFLEXOS DO DIAGNÓSTICO DAS PSICOPATIAS EM FACE DA LEI PENAL
4.1.1Da imputabilidade e semi - imputabilidade
Logo, entende-se que o inimputável é aquele que não possui nenhum discernimento acerca de fato criminoso praticado, o que pode ser ocasionado pela psicopatia objeto do presente trabalho.
Já o semi-imputável vem a ser aquele que possui um relativo discernimento acerca do fato criminoso praticado.
Ressalta-se que a lei penal não prevê a aplicação de pena para estes indivíduos mas sim de medida de segurança, que vem a ser uma segunda espécie de sanção penal.
Para raciocinar sobre causas da culpa, deve-se levar em conta que a ligação psíquica entre o sujeito e o fato é feita mediante o conhecimento de culpabilidade e, por conseguinte, o da imputabilidade, necessita sempre empregar informações da ciência médica especializada na função psíquica.
Desta forma, ao se aplicar noções das funções psíquicas à ética que se julgar da existência no mínimo de duas situações determinantes entre o sujeito e o ato; a situação voluntária (volitiva) e a situação involuntária (ou impulsiva casual). Induzindo para o direito a diferença entre essas duas formas de relacionamento dentre o sujeito e o objeto, deste modo, brotou a distinção jurídica entre dolo e culpa. [9]
Para que exista o dolo, se faz necessário que três subsídios estejam preservados, sendo eles: a consciência do ato (psíquico), a vontade (psíquico) e o conhecimento da ilicitude (normativo). Para que haja a culpa, sem o dolo, tem que haver a ausência ou o prejuízo de um ou mais desses três elementos citados acima. Destarte, a culpa poderá existir, independentemente e da consciência. Já no que diz ao dolo, não. Sendo assim, a culpa independe da consciência do indivíduo.
De tal modo, a não imputabilidade ou a inimputabilidade encontram-se presentes, quando não se pode atribuir ao sujeito à culpa e, evidentemente, ao dolo. Quase sempre, essa situação diz respeito ao agente que não tem condições de discriminar a natureza ilícita de uma ação, ou seja, não tem consciência completa do que está praticando ou não tem nenhum tipo de domínio sobre sua vontade. Pode-se citar aqui o indivíduo que possui o transtorno de personalidade psicopática.
A culpabilidade, como já demonstrado anteriormente, é um pressuposto para aplicação da pena, um requisito para que o juiz possa aplicar pena ao agente. A culpabilidade, como juízo de reprovabilidade social da conduta, é composta pela capacidade e pela imputabilidade.
Capacidade vem a ser a chamada maioridade, que o indivíduo atinge aos dezoito anos completos. Imputabilidade vem a ser a consciência sobre o caráter ilícito da conduta criminosa.
4.1.2 Da medida de segurança
A medida de segurança é a sanção penal imposta pelo Estado, com finalidade e preventiva, com o intuito de evitar que o autor que tenha praticado uma infração penal de periculosidade, volte a praticar semelhante delito.
Sua finalidade é exclusivamente preventiva, visando tratar o inimputável e o semi-imputavel, que de qualquer forma, demostram ter probabilidade de vir a cometer novas práticas danosas.
Sendo assim, para que o juiz aplique a medida de segurança em um caso concreto são necessários dois requisitos: Deve ficar comprovada a chamada “periculosidade”, que vem a ser o potencial lesivo do agente, ocasionado pela doença da qual ele é portador, ou seja, a possibilidade de o indivíduo continuar a praticar crimes, além do segundo requisito que é a comprovação da prática do fato criminoso, que ocorre com o término da instrução processual.
No que se refere à periculosidade, esta pode ser de duas espécies: presumida ou real. A periculosidade presumida ocorre caso o agente seja considerado inimputável pelo perito. Já a real ocorre quando o perito atesta a semi-imputabilidade do agente. Neste caso, o juiz deverá verificar no caso concreto se existe ou não a periculosidade do agente, ou seja, o juiz decide acerca da periculosidade. Caso entenda que não exista, poderá, ao final do processo, aplicar pena ao agente, já entendendo que está presente a periculosidade, poderá aplicar medida de segurança ao final do processo.
Assim é o entendimento de Damásio E. de Jesus:
Enquanto a pena é retributiva-preventiva, tendendo atualmente a readaptar socialmente o delinquente, a Medida de Segurança possui natureza essencialmente preventiva, no sentido de evitar que um sujeito que praticou um crime e se mostra perigoso venha a cometer novas infrações penais.10
4.1.2.1 Pressupostos
Embora de forma implícita, constituem pressupostos fundamentais para a aplicação das medidas de segurança, tanto a prática de fato previsto como crime, quanto a periculosidade do agente, conforme se verifica nos artigos 97 e 98 do Código Penal Brasileiro.
Art. 97 - Se o agente for inimputável, o juiz determinará sua internação (art. 26). Se, todavia, o fato previsto como crime for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial.
Prazo
§ 1º - A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos.
Perícia médica
§ 2º - A perícia médica realizar-se-á ao termo do prazo mínimo fixado e deverá ser repetida de ano em ano, ou a qualquer tempo, seo determinar o juiz da execução.
Desinternação ou liberação condicional
§ 3º - A desinternação, ou a liberação, será sempre condicional devendo ser restabelecida a situação anterior se o agente, antes do decurso de 1 (um) ano, pratica fato indicativo de persistência de sua periculosidade.
§ 4º - Em qualquer fase do tratamento ambulatorial, poderá o juiz determinar a internação do agente, se essa providência for necessária para fins curativos.
Substituição da pena por medida de segurança para o semi-imputável.
Substituição da pena por medida de segurança para o semi-imputável:
Art. 98 - Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º.[10]
Pressuposto da aplicação da medida de segurança é também a periculosidade, ou seja, o conhecimento da possibilidade de voltar a delinquir. Embora se tenha afastado quase que completamente do texto legal o termo “periculosidade”, o Código Penal ainda reconhece tal estado em algumas hipóteses, como as do art. 77, inciso II, e art. 83, parágrafo único, pelos quais se negam o sursis e o livramento condicional àqueles que, por suas condições pessoais, provavelmente voltarão a cometer ilícitos penais.
4.1.2.2 Espécies
São duas as modalidades de medidas de segurança, a detentiva e restritiva.
A detentiva, trata-se de internação em hospital de custodia e tratamento psiquiátrico. Art 97, CP.
É aplicada, em regra, para os indivíduos que praticaram crimes punidos com pena de reclusão.
Uma vez que o laudo pericial apontar a inimputabilidade do indivíduo, estará preenchido o primeiro requisito para aplicação da medida de segurança que é a periculosidade do agente, devendo o juiz prosseguir no processo afim de que se verifique o preenchimento do segundo requisito, qual seja, a prática do fato criminoso, o que acarretará a aplicação de uma medida de segurança detentiva caso o crime praticado seja punido com pena de reclusão.
A internação do agente deve ser realizada em hospital de custódia, uma vez que se trata de indivíduo reconhecidamente portador de uma psicopatologia que pode ocasionar a prática de crimes. Em alguns Estados da Federação, é possível encontrarmos Manicômios Judiciais, que são locais destinados exclusivamente aos portadores de psicopatias, onde o tratamento é realizado de modo mais adequado.
Não se admite, em hipótese alguma, apesar de se verificar como uma prática rotineira em vários Estados brasileiros, o encaminhamento do indivíduo condenado à medida de segurança detentiva às Cadeias Públicas ou Penitenciárias, em razão da falta de hospitais de custódia ou Manicômios Judiciais.
Tal realidade reflete a falta de estrutura do nosso sistema penitenciário e ocasiona na maioria dos casos um grave retrocesso no estado de saúde do condenado, uma vez que tanto a Cadeia Pública quanto a Penitenciária não possuem as condições específicas de tratamento destas patologias.
Ressalta-se ainda que é possível que o juiz determine o cumprimento de medida de segurança detentiva para o agente que praticou crime punido com pena de detenção, dependendo do grau de periculosidade do agente, o que deve ser apontado no laudo pericial.
Já a Restritiva, refere-se a tratamento ambulatorial e destina-se ao agente que praticou crime punido com pena de detenção.
No tratamento ambulatorial são dispensados cuidados médicos à pessoa submetida a tratamento, que não implica em internação. Quando sujeito a esse tratamento o agente deve comparecer ao hospital nos dias em que o médico determinar, para que, de tal forma, seja aplicada a terapia prescrita.
É um tratamento que pode ser à base de medicamentos ou mesmo terapias que busquem uma melhoria na periculosidade do agente.
Ressalta-se que se no curso do cumprimento da medida de segurança restritiva ocorrer um retrocesso no estado de saúde do agente que resulte em um aumento da periculosidade, o juiz da execução penal pode determinar a conversão da medida de segurança restritiva em medida de segurança detentiva, ou seja determinar a internação do agente em hospital de custódia ou em manicômio judicial.
Não existe previsão legal para o inverso, ou seja, se o paciente praticou crime punido com a pena de reclusão e iniciou o cumprimento de medida de segurança detentiva, não poderá, em hipótese alguma, ser transferido para medida de segurança restritiva.
4.1.2.3 Aplicação
A aplicação da medida de segurança depende, como já mencionado, do preenchimento de dois requisitos, que são a periculosidade do agente e a comprovação da prática do fato criminoso.
Se no curso da persecução penal ocorrer a suspeita de que o agente seja portador de alguma psicopatia, a defesa, o Ministério Público ou mesmo o juiz, de ofício, podem instaurar o chamado incidente de insanidade mental. Trata-se de um incidente processual que irá verificar a sanidade mental do indivíduo ao tempo da prática do fato criminoso.
Neste incidente processual o agente será submetido à perícia médica para verificação do grau de discernimento no momento da prática do fato criminoso.
Em se verificando que o agente não possuía nenhum discernimento acerca do fato criminoso praticado, o laudo apontará para a inimputabilidade do agente.
No entanto, se ficar comprovado que o agente possuía um relativo discernimento acerca do fato criminoso que praticou, o laudo apontará para a semi-imputabilidade.
Ressalta-se que, na inimputabilidade, a periculosidade, que é um dos requisitos para aplicação da Medida de Segurança, será presumida, ou seja, para o inimputável presume-se o potencial lesivo, que consiste na probabilidade que o agente possui de continuar a praticar crimes.
Já na semi-imputabilidade a doutrina costuma afirmar que a periculosidade não é presumida, mas sim real, ou seja, o juiz deve constatar, no curso do processo, o grau de discernimento do indivíduo acerca do fato criminoso praticado. Ou seja, se no decorrer do processo o juiz verificar que o agente possuía um grau de discernimento suficiente para entender o fato criminoso, poderá aplicar pena ao final da persecução penal, com o caso de diminuição de pena previsto no parágrafo único do art. 26 do Código Penal Brasileiro, enquanto que se entender que o agente não possuía um suficiente discernimento acerca do fato praticado, poderá aplicar Medida de Segurança.
Em todos os casos, o magistrado deverá prosseguir no curso do processo para que se verifique a presença do segundo requisito para aplicação da Medida de Segurança, que é a comprovação da prática do fato criminoso, pois caso não reste comprovada a prática do fato criminoso, o agente deverá ser absolvido ao final do processo e não condenado à Medida de Segurança.
4.1.2.4 Do prazo e da cessação da periculosidade
A medida de segurança, como tratamento destinado ao semi-imputável e ao inimputável que praticou um fato criminoso e possui a chamada periculosidade, não possui, na nossa legislação pátria, prazo de duração, uma vez que a presunção da lei é no sentido de que o agente deve executar o tratamento até que ocorra a cessação da periculosidade.
Sendo assim, a sentença que condena o agente à medida de segurança, não prevê um prazo para sua duração, uma vez que o agente deve ser tratado até que persista a probabilidade da prática de crimes, chamada de periculosidade. No entanto, tal sentença penal condenatória já estabelece o prazo para que o agente realize a primeira reavaliação.
A lei prevê que o juiz da sentença penal condenatória já deve fixar o prazo, que pode ser de no mínimo um ano e no máximo três anos para que o agente realize a chamada reavaliação, que consiste em um novo exame médico com a finalidade de verificar se persiste ou não a periculosidade do agente.
É possível que mediante pedido da defesa ou mesmo do Ministério Público, o juiz da execução penal autorize que a reavaliação seja feita em um período menor que aquele estabelecido pelo Juiz na sentença penal condenatória.
Deste modo, caso o laudo médico aponte que permanece a periculosidade do agente, o juiz da execução penal deverá renovar o prazo para nova reavaliação, e assim deverá proceder nas próximas reavaliações, por prazo indefinido, sempre que o laudo médico indicar que persiste a periculosidade do agente.
De outro modo, caso o laudo pericial aponte para a cessação da periculosidade, o Juiz da execução penal poderá por fim ao cumprimento da medida de segurança, determinando a desinternação caso o agente cumpra medida de segurança detentiva ou a liberação caso o mesmo cumpra medida de segurança restritiva.
Cumpre ressaltar a existência de posicionamentos doutrinários que limitam o tempo de duração da medida de segurança ao tempo de cumprimento da pena máxima prevista em abstrato no tipo penal de acordo com o crime praticado, outros entendem que o juiz deve limitar a trinta anos, em analogia ao que dispõe o art. 75 do Código Penal, que seria o limite para o cumprimento de pena privativa de liberdade, no entanto, tais opiniões permanecem minoritárias, uma vez que se entende que a medida de segurança, como tratamento que é, deve perdurar o tempo necessário para que cesse a periculosidade do agente.
Por fim, esclarece-se que a desinternacão ou a liberação do agente será sempre condicional, de modo que, caso o agente volte a praticar qualquer fato indicativo de que persiste a periculosidade dentro de um período de um ano, votará à situação anterior. Sendo assim não é necessário que o agente volte a praticar crime neste período, mas sim qualquer ato que indique a persistência da periculosidade.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa determinou as principais psicopatias que podem levar o indivíduo à prática de crimes, dando ênfase à psicopatia denominada distúrbio da personalidade anti-social. Foram listadas as principais características e fatores determinante para o diagnóstico das psicopatias que podem levar o agente à prática de crimes, de modo a possibilitar a identificação destes indivíduos em casos concretos no decorrer de processos criminais, tornando a aplicação da lei penal mais adequada e o processo mais eficiente.
A importância acerca do conhecimento das características destes indivíduos pode refletir em um número muito maior de diagnósticos de psicopatias no curso de processos criminais do que o que existe hoje. A falta de conhecimento acerca das principais características comportamentais de indivíduos portadores de psicopatias ainda ocasiona a aplicação da sanção penal inadequada ao caso concreto, deixando o agente criminoso sem o devido tratamento.
Em razão deste eventual diagnóstico pode ocorrer o reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade do agente, o que pode vir a acarretar a aplicação de medida de segurança ao mesmo.
Foram expostas as espécies de medida de segurança, que vem a ser a sanção penal adequada para estes indivíduos, bem como os requisitos para sua aplicação e detalhado o seu desenvolvimento, de acordo com o crime praticado, até o seu término que deve ocorrer com a cessação da periculosidade do agente, demonstrando que o mesmo não possui mais a probabilidade de voltar a praticar crimes em razão da doença mental.
Verificou-se ainda que os indivíduos que são condenados à medida de segurança não podem, em hipótese alguma, cumprir pena em estabelecimento prisional, uma vez que não cumprem pena, mas sim um tratamento estabelecido pela lei. No entanto, verifica-se ainda que em diversos Estados da Federação os indivíduos condenados à medida de segurança são postos em cadeias publicas, sem um tratamento adequado e individualizado de acordo com o que requer a psicopatia diagnosticada.
A falta de estrutura do Estado ainda figura como o principal óbice para efetivação da medida de segurança, impedindo-a de fazer funcionar do modo previsto na legislação penal brasileira.
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[1]SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008. P.36
[2] SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008. P.17
[4]TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; CUNEO. Psicopatia - A máscara da justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 39,40.
[5]Disponível em http://super.abril.com.br/ciencia/mente-mata-442855.shtml. revista veja. Abr. 2009. Mente que mata, por Rodrigo Cavalcante / Adriano Sambugaro. Acesso em: 30 Set. 2013.
7TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; CUNEO. Psicopatia - A máscara da justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 76.
Graduando(a) do Curso de Direito no Centro Universitário Luterano de Manaus – ULBRA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JOHN, Camila Caroline Viana. Da punibilidade e da aplicação da medida de segurança aos psicopatas criminosos no sistema penal brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 maio 2021, 04:32. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56553/da-punibilidade-e-da-aplicao-da-medida-de-segurana-aos-psicopatas-criminosos-no-sistema-penal-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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