THAÍS APARECIDA CARVALHO QUEIRÓZ
(coautora)
Resumo: O presente trabalho adotou como objeto de investigação o ordenamento jurídico pátrio no tocante aos delitos econômicos, e o estudo da doutrina da Willful Blindness ou Cegueira Deliberada. Em relação aos objetivos específicos pretende: apresentar uma breve análise da função econômica do Direito Penal; expor sobre a seletividade do sistema penal nos crimes econômicos, assim como discorrer sobre a doutrina e a aplicação da Willful Blindness ou cegueira deliberada no ordenamento jurídico brasileiro. A organização desse artigo utiliza-se de fontes primárias e secundárias, com objetivo de demonstrar a relação do direito punitivo com os estudos econômicos na modernidade e como a teoria supramencionada se mostrou incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro através da sua aplicação em julgamentos.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal Econômico; Lavagem de Dinheiro, Willful Blindness; Operação Lava-Jato.
Abstract: The present work adopted as a subject of investigation the national legal system regarding economic crimes, and the study of the Willful Blindnees or Deliberated Blindness doctrine. In relation to the specific objectives, it intends to: present a brief analysis of the economic function of Criminal Law; expound on the selectivity of the penal system in economic crimes, as well as discuss the doctrine and the application of Willful Blindness or deliberate blindness in the Brazilian legal system. The organization of this article uses primary and secondary sources, in order to demonstrate the relationship between punitive to be incompatible with the Brazilian legal system through is application in judgments.
KEYWORDS: Economic Criminal Law; Money Laundering, Willful Blindness; Operation Car Wash.
1. INTRODUÇÃO
A Cegueira Deliberada ou Willful Blindness, surgiu na Inglaterra, no ano de 1861, é aplicada quando o agente finge não saber da ilegalidade da procedência de bens, para ludibriar as autoridades. A mencionada doutrina, teve grande importância para o combate de delitos, tendo em vista, que facilitou a investigação e posterior condenação aos agentes, representando um maior rigor ao combate à corrupção e Lavagem de Dinheiro.
O Segundo Capítulo deste trabalho faz uma breve análise da função econômica da punibilidade e dos impactos.
Em seguida, o Terceiro Capítulo mostra a perspectiva da seletividade do sistema penal principalmente nos crimes econômicos, trazendo uma problematização sobre a impunidade.
No Quarto Capítulo, refaz a origem da Doutrina da Willful Blindness ou Cegueira Deliberada e sua aplicabilidade. Ressaltando que o ordenamento jurídico espanhol apresentou uma alternativa de prévia inaplicabilidade, podendo ser este exemplo comparado ao do Brasil.
Por último, no Quinto Capítulo faz-se uma análise acerca da compatibilidade ou não da teoria da Cegueira Deliberada com o ordenamento pátrio, como se deram as primeiras tentativas de aplicação e em que se baseiam os argumentos dos Tribunais Superiores atualmente tendo como paradigma julgados anteriores e contemporâneos à Operação Lava-Jato.
2. UMA BREVE ANÁLISE DA FUNÇÃO ECONÔMICA DOS CRIMES ECONÔMICOS
O Direito Penal tem o objetivo de estudar todos os comportamentos, tanto da lei seca, quanto as ações e desse modo, analisar quais as penas ou medidas de segurança podem ser aplicadas. Por isso, é de grande importância a relação do direito penal com a economia, para entender os comportamentos e os custos para combater as atividades ílicitas (BUSATO, 2017).
“É necessário que a ao aplicar uma pena, deve-se atentar ao custo-benefício dos métodos utilizados para chegar o mais próximo possível de um ponto social equilibrado (BOWLES; FAURE; GAROUPA, 2008)". Nesse sentido, resta claro a possibilidade do Direito Penal buscar formas de punições penais com gastos pequenos aos Estados e com elevado grau de eficiência.
Por isso, vê-se a objetividade de medir quantos crimes podem ser punidos e quais agentes devem passar despercebidos, e que a compêtencia da investigação criminal está ligada ao fato do custo para detectar as atividades criminosas e a natureza da ação (BECKER, 1974).
“Para os economistas, é possível comparar às sanções penais com os preços de produtos, sendo que quanto maior a pena de um crime menos as pessoas devem incidir nele, o mesmo acontece com as reações das pessoas para com os preços do mercado (COOTER; ULEN, 2010)”.
Destaca-se que a força de uma sanção, juntamente com seu elevado grau de punição, tem o intuito de fazer cessar as condutas delituosas, relacionando, com a cultura, na medida que a sociedade percebe as devidas punições aos agentes, gerando repercussão dos valores protegidos pelo ordenamento jurídico, como aponta REALE, 1996:
Uma norma não surge como arquétipo ou esquema ideal, mas como elemento integrante de um modelo de uma classe de ações exigida, permitida ou proibida pela sociedade, em virtude da opção feita por dada forma de comportamento (REALE, 1996. p. 606).
É importante mencionar, como a economia estuda o comportamento de uma sociedade, segundo RAMOS, 2018:
A Economia fornece uma teoria comportamental para prever como as pessoas reagem às leis. Essa teoria, baseada em como as pessoas reagem a incentivos, suplanta a intuição da mesma maneira como a ciência suplanta o bom senso. Mais ainda, a economia fornece um padrão normativo útil para avaliar o direito e as políticas públicas. As leis não são apenas argumentos técnicos; elas são o instrumento para se atingir objetivos sociais importantes (RAMOS, 2018. p. 118).
Assim como há um estudo para a lesgislção vigente, a economia também é necessária nesse aspecto para analisar todos os impactos empregados na sociedade e no ordenamento jurídico, regulando também os custos da intervenção do Estado, ou seja, engloba o estudo da regulação entre Direito e a Economia.
Pelo o exposto, nota-se que o direito econômico se envolve completamente com as normas e acompanha toda sua introdução para aumentar a produtividade nas investigações, como também, para regular a sociedade.
3. A SELETIVIDADE DO SISTEMA PENAL NOS CRIMES ECONÔMICOS
Quando falamos de criminalidade na economia, é de grande importância tratar da impunidade, principalmente da classe com um elevado nível financeiro, ainda assim, destaca-se que os crimes financeiros não são devidamente investigados, muitas vezes pela complexidade do esquema, que, tem o intuito de ludibriar as autoridades investigativas.
Ademais, para a sociedade, os autores desses delitos financeiros não são vistos como criminosos, e por isso trazem impactos na criminalização, sendo a primeira, uma criação da lei, e também, a aplicação da lei pelas autoridades. Sutherland relata que a aplicação lei se dava por três fatores, são eles, segundo AMARAL, 2015:
(1) status:poder imuniza os “homens de negócio” em relação aos crimes, já que incriminá-los poderá trazer problemas para o incriminador no futuro; no caso dos EUA, Sutherland afirma que as campanhas para eleição de membros do Ministério Público e os necessários apoios políticos para nomeação de juízes atuavam como freios ao aparelho de persecução penal no que tange aos membros influentes da sociedade. Esta conclusão não pode ser aplicada ao Judiciário brasileiro menos sujeito a interferências externas nos processos de nomeação de juízes, mas pode se aplicar de forma correlata ao Legislativo, responsável por criar as leis penais repressoras de crimes econômicos, já que muitas vezes os criminosos econômicos são os financiadores das campanhas dos parlamentares;
(2) homogeneidade cultural: juízes, administradores, legisladores e homens de negócios possuem a mesma formação cultural, muitas vezes partilham as mesmas origens sociais e essa homogeneidade faz com que não seja uma tarefa fácil caracterizar os criminosos econômicos dentro do estereótipo do criminoso comum.
(3) a relativa desorganização na reação aos crimes de colarinho branco: as violações das leis pelos homens de negócios são complexas e produzem efeitos difusos. Não se tratam de agressões simples e diretas de um indivíduo contra outro. Além disso, podem permanecer por muitos anos sem serem descobertas. Os meios de comunicação de massa não exprimiriam uma expressiva valoração moral da coletividade a respeito dos crimes do colarinho branco, em parte porque são fatos complexos, de difícil colocação jornalística, mas, sobretudo porque também os jornais pertencem a homens de negócios, que às vezes são responsáveis por numerosos ilícitos análogos. Por fim, a normativa que disciplina as atividades econômicas fazem parte de um setor novo e especializado do ordenamento jurídico, pois os velhos delitos constantes dos códigos penais comuns constituíam-se de condutas danosas para o indivíduo (AMARAL, 2015. p. 10).
A seletividade da aplicação das leis pode ser observada em todo o Estado, tal fator, causa lacunas para os atores que ocorrem em crimes financeiros, juntamente com a falta de capacitação e falta dos equipamentos necessários para a investigação criminal, o que dificulta o trabalho da autoridade policial para elucidar os crimes que geralmente são complexos nessa área.
No âmbito legislativo, percebe-se a precariedade da técnica da Lei, acarretando muitas vezes na abolsição dos denunciados.
Nesse segmento, no poder judiciário, é nitido o rigor aos crimes patrimoniais, em comparação aos delitos financeiros que são seletivos a uma camada social com um poder aquisitivo elevado, mencionando novamente AMARAL (2015):
O Direito Penal, diferente de outras searas jurídicas, repudia a responsabilidade objetiva. No Direito Civil, por exemplo, é perfeitamente possível que alguém seja responsabilizado e obrigado a pagar indenização resultante de um dano pelo qual não foi responsável direto — a mera relação de causalidade entre o dano e o agente, independentemente de sua culpa, é suficiente para gerar uma responsabilidade de indenizar. O Direito Criminal, porém, veda tal possibilidade.
A sanção penal só pode ser imposta após aferida em juízo a culpa do acusado, e a pena será proporcional à reprovabilidade que incide sobre sua conduta — por isso o Código Penal explicita que, no concurso de agentes, cada qual será punido na medida da sua culpabilidade.Tal preceito veio a ser questionado quando do advento da criminalidade econômica, especificamente nos denominados “crimes societários”.
Seriam aqueles em que a prática reiterada de delitos ocorre envolvendo uma estrutura societária empresarial — em concurso de agentes, portanto — mas muitas vezes fica difícil identificar o papel de cada um dos acusados na trama criminosa, ou mesmo de aferir quem possuía de fato o poder decisório.
Tendo isso em vista, o MP passou a se valer da chamada denúncia genérica para mover ação penal contra os envolvidos num delito societário. A característica dessa série que, na peça inicial do processo penal, que é a denúncia, não ocorre a individualização das condutas, todos os sócios que de alguma forma estiveram envolvidos no organograma empresarial seriam acusados, e a sua participação efetiva no crime e sua culpabilidade seriam averiguadas somente no próprio processo criminal.
Alegava-se que a denúncia genérica seria inadmissível no Direito Brasileiro por conta da violação do princípio da responsabilização subjetiva, e que estar-se-ia atribuindo uma responsabilidade objetiva — acusando indivíduos de crimes pelo simples fato de integrarem uma específica estrutura empresarial, na qual poderiam, em tese, participar da execução de delitos econômicos.
Defensores dessa medida alegam que não afronta as garantias individuais, uma vez que a denúncia em si não é mais que a peça processual que aciona a jurisdição criminal, mas que a averiguação da culpa dos réus sempre se faz sempre no bojo do próprio processo penal e que, independente de a denúncia ser genérica ou não, se não for provada a culpa de um ou outros envolvidos, o resultado não será outro senão sua absolvição dos acusados.
Uma consideração importante ensejada pelo problema da responsabilidade objetiva nos crimes societários envolve a distinção entre o cargo ocupado pelo agente e a função por ele efetivamente exercida. Na situação, por exemplo, em que não haja coincidência entre ambos — em que o indivíduo acusado possui um cargo que em tese permitiria que ele tivesse conhecimento e efetivamente atuasse na execução dos crimes, mas não exercia efetivamente função nenhuma no organograma criminoso (AMARAL, 2015. p. 38).
Em razão disso, há uma crítica, devido a essa diferenciação das seletividades nos crimes econômicos, tendo em vista que, a camada mais pobre da sociedade, atinge um percentual absurdo de condenações quanto aos crimes de colarinho branco não, tal fato gera uma insegurança jurídica, quando um magistrado inocenta os empresários, fomentando o capitalismo e aumentando as desigualdes sociais e penais (KARAM, 1996).
4. A DOUTRINA DA WILLFUL BLINDNESS OU CEGUEIRA DELIBERADA
No tópico em pauta, será apresentado como ocorreu o surgimento da Teoria da Willful Blindness, visando compreender de forma mais ampla esse instituto. Além disso, é um assunto de extrema relevância e que auxilia para o entendimento sobre a aplicação da Teoria nos casos de maior repercussão midiáticas acontecidas no Brasil.
A Teoria da Cegueira Deliberada, teve uma aplicação em destaque nos anos de 1861, o qual era o caso de Regina vs. Sleep, tendo Sleep embarcado em um barco com parafusos de cobre, entretanto, tal produto pertencia ao estado inglês. O juiz na ocasião decidiu absolver o réu, pelo motivo de não haver provas suficientes de que Sleep conhecia da procedência desse bem (KLEIN, 2012).
Tal julgamento, gerou repercussão à época, e gerou um desdobramento conclusivo de que não era necessário o conhecimento da origem dos bens para condenar o agente, tendo este, ocorrido em ignorância deliberada (RONCHI, 2017).
Percebe-se então que o simples ato em ignorar todo o contexto de uma suposta atividade ilícita, passou a ser compreendido que a pena pode ser equiparada ao crime comum e começou a ser aplicada em muitos julgados para responsabilização subjetiva aos agentes acusados.
Cabe ressaltar que o Estados Unidos também, utilizou-se da mencionada doutrina, para julgar os crimes relacionados ao tráfico de drogas, devido a grande notoriedade nas cortes inglesas.
A Cegueira Deliberada, nos sistemas de common law, existe a possibilidade de imputar crime ao agente, cujo este, mesmo sem saber que encontra-se de posse de substâncias ilícitas (RAGUÉS I. VALLÉS, 2008).
Outra linha de embasamento na aplicação da teoria, é que no momento em que o indivíduo comete infração penal, ele possuía consciência que juridicamente existe responsabilização criminal para o ato praticado (CALLEGARI; WEBER, 2017).
A discussão acerca da aplicação da doutrina começou a ser irradiada para Cortes de outros países. No caso do Supremo Tribunal Espanhol, considerado de tradição da civil law, diferentemente de outros países, como por exemplo, Estados Unidos e Inglaterra, a aplicação da teoria começou a se dar somente a partir dos delitos ocorridos contra a lavagem de dinheiro e saúde pública (RAGUÉS I. VALLÉS, 2008).
Salienta que nos casos que envolvem a aplicação da Willful Blindenss, carece a observância acerca do dolo para que seja constatado que o sujeito realmente saiba que está envolvido em uma possível atividade delitiva, mas sem saber ao certo qual. Dessa maneira, o sujeito defende o argumento da ignorância, ou seja, ele não quis enxergar, se manteve cego, de outro modo “não se sabe por que não se quer saber”. Aqui, é cabível uma crítica à aplicação da Teoria, tendo em vista ser uma possível lesão ao Princípio da Legalidade, considerando a dificuldade de apuração. Nesse diapasão, o sujeito pode ser responsabilizado por tudo que acontecer, inclusive nos casos em que o fato seja de difícil previsão, haja vista, principalmente, ao fato da não admissão de modalidade culposa em diversos ordenamentos fundados no civil law (FEIJOO SÁNCHEZ, 2009).
Também é prudente asseverar o entendimento de Francis Beck, que irá definir a cegueira deliberada quando: “o agente intencionalmente “cega-se” diante de situação em que, se mantivesse os olhos abertos, teria condições de reconhecer ou suspeitar fundadamente da tipicidade da conduta que pratica”. Assim, o agente “enterraria sua cabeça” para não ter condições de conhecer detalhes da conduta que realiza, e da qual percebe a grande probabilidade da ocorrência de algo ilícito. De forma menos figurativa, são empregadas as expressões “evitação de consciência” e “ignorância deliberada”, igualmente representativas da conduta voluntária do agente no sentido de evitar o pleno conhecimento do contexto fático que envolve o seu comportamento.
Diante do exposto, e considerando a dificuldade de apuração do dolo eventual na produção probatória em crimes de lavagem de dinheiro, parte da doutrina e, mais especificamente, nos julgamentos da Operação Lava-Jato e outras Ações Penais que serão tratadas detalhadamente no próximo capítulo, é possível afirmar que o Brasil adotou-se como embasamento teórico o instituto originário da common law (onde há o desconhecimento do dolo eventual). O caso da aplicação em sede nacional se amolda ao exemplo espanhol de incorporação da teoria num sistema de civil law.
5. APLICAÇÃO DA WILLFUL BLINDNESS OU CEGUEIRA DELIBERADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Sendo o tópico a seguir o problema principal do presente trabalho, retrataremos a aplicação da Willful Blindness no ordenamento jurídico penal brasileiro e o entendimento jurisprudencial fixado pelo Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, bem como a demonstração dos casos mais polêmicos para melhor entendimento.
“A teoria da cegueira deliberada foi utilizada pela primeira vez no julgamento do famoso caso do furto ao Banco Central de Fortaleza/CE, ocorrido em agosto de 2005 (CARVALHO E FAYET, 2020, p.7)”.
No caso supramencionado, é possível relatar que no dia seguinte ao furto ao Banco Central, os criminosos compraram 11 veículos em uma revendedora de carros denominada Brilhe Car, totalizando um desembolso de R$ 980.000,00, no qual o pagamento fora realizado em espécie. Estima-se que a quantia furtada é de R$ 167,7 milhões, no qual a Polícia Federal calcula que, no máximo, R$ 60 milhões foram recuperados, por meio da venda de bens dos criminosos participantes ou pelo resgate de quantias em espécie durante as investigações.
Analisando o inteiro teor do ácordão da Ação Penal nº 2005.81.00.014586-0, que foi julgado pelo Tribunal Regional da 5ª Região, é possível afirmar que o órgão entendeu que um dos envolvidos na operação cometeu o delito da lavagem de dinheiro previsto na lei 9.613/98. Observemos os seguintes trechos retirados do respectivo acórdão:
Conclui-se, assim, como fato incontroverso, que foi o réu JOSÉ CHARLES MACHADO DE MORAIS quem efetuou o pagamento de R$ 980.000,00 em notas de cinqüenta reais, referente aos onze veículos adquiridos da Brilhe Car.
Recorde-se, aqui e uma vez mais, os conceitos de dolo eventual e a doutrina da cegueira deliberada (willful blindness ou conscious avoidance doctrine) expostos anteriormente, no que pese entendermos que José Charles sabia da ocorrência do furto e, conseqüentemente, da origem do dinheiro
O recorrente JOSÉ CHARLES esteve várias vezes na empresa BRILHE-CAR para escolher os veículos a serem adquiridos com o produto do furto. Estranhamente, pela primeira vez em vários anos, acompanhou o motorista da transportadora de sua propriedade em viagem a São Paulo, ocasião em que a carreta em que viajava, além, dos veículos adquiridos com o dinheiro subtraído do Banco Central, conduzia também mais de 3 milhões de reais ocultados em um dos carros transportados.
JOSÉ CHARLES MACHADO DE MORAIS: pena de 18 anos e 10 meses de reclusão e pena pecuniária de 600 dias-multa, arbitrados em 5 salários mínimos.
Entretanto, a sentença foi reformada, quando foi afastada a aplicação da Cegueira Deliberada por inadequação quanto aos autos. O argumento apontado é que, para o enquadramento no crime de lavagem de dinheiro, previsto no inciso I, §2º, do art. 1º da Lei 9613/98, somente ocorreria se o sujeito tivesse consciência da procedência ilícita dos valores, não fazendo necessário que este tivesse absoluta certeza sobre o fato, tendo sido tudo demonstrado nos autos.
Segue posicionamento firmado pelo Tribunal Regional Federal:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. FURTO QUALIFICADO À CAIXA-FORTE DO BANCO CENTRAL EM FORTALEZA. (...) TEORIA DA CEGUEIRA DELIBERADA (WILLFUL BLINDNESS). INEXISTÊNCIA DA PROVA DE DOLO EVENTUAL POR PARTE DE EMPRESÁRIOS QUE EFETUAM A VENDA DE VEÍCULOS ANTES DA DESCOBERTA DO FURTO. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO.
(...)
2.4- Imputação do crime de lavagem em face da venda, por loja estabelecida em Fortaleza, de 11 veículos, mediante o pagamento em espécie: a transposição da doutrina americana da cegueira deliberada (willful blindness), nos moldes da sentença recorrida, beira, efetivamente, a responsabilidade penal objetiva; não há elementos concretos na sentença recorrida que demonstrem que esses acusados tinham ciência de que os valores por ele recebidos eram de origem ilícita, vinculada ou não a um dos delitos descritos na Lei n.º 9.613/98. O inciso II do PARÁGRAFO 2.º do art. 1.º dessa lei exige a ciência expressa e não, apenas, o dolo eventual. Ausência de indicação ou sequer referência a qualquer atividade enquadrável no inciso II do PARÁGRAFO 2º.
(...)
(PROCESSO: 200581000145860, ACR5520/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA, Segunda Turma, JULGAMENTO: 09/09/2008, PUBLICAÇÃO: DJ 22/10/2008 - Página 207).
Neste sentir, segue posicionamento de Correia e Pádua, 2018:
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (2008) entendeu que não havia elementos suficientes que demonstrassem que os acusados tinham ciência da ilicitude dos valores recebidos, sendo assim, segundo o Tribunal, a condenação configuraria um caso de Responsabilidade Penal Objetiva (COOREIA; PÁDUA, 2018. P. 442).
Prosseguindo, considerando a repercusão da Ação Penal n º470 tramitada no Supremo Tribunal Federal, conhecida pela mídia como “Mensalão” também merece ser apreciada. No tocante do escandâlo, aduz Correia e Pádua, 2018:
A Ação Penal 470, conhecida como Mensalão, foi recebida pelo Supremo Tribunal Federal em 2007, dentre os quarenta denunciados, havia parlamentares e ministros, os quais foram denunciados pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta, dentre outras fraudes. Os envolvidos visavam à compra de suporte político e financiamento de campanhas eleitorais (CORREIA; PÁDUA, 2018. p. 442).
Nesta perspectiva, demonstramos o voto da Ministra Rosa Weber no julgamento da Ação Penal:
Pode-se identificar na conduta dos acusados-beneficiários, especialmente dos parlamentares beneficiários, a postura típica daqueles que escolhem deliberadamente fechar os olhos para o que, de outra maneira, lhes seria óbvio, ou seja, o agir com indiferença, ignorância ou cegueira deliberada. Para o crime de lavagem de dinheiro, tem se admitido, por construção do Direito anglo-saxão, a responsabilização criminal
através da assim denominada doutrina da cegueira deliberada
(willfulblindness doctrine). Em termos gerais, a doutrina estabelece que age intencionalmente não só aquele cuja conduta é movida por conhecimento positivo, mas igualmente aquele que age com indiferença quanto ao resultado de sua conduta (ROSA WEBER, 2007. p. 1297).
E, para finalizar, CARVALHO e FAYET conclui:
Nesse processo, a Ministra Rosa Weber, em seu voto, lançou mão da teoria da cegueira deliberada para imputar a prática do crime de lavagem de dinheiro a alguns dos agentes processados, argumentando, para tanto, que na conduta dos réus estava presente a indiferença em relação à origem do dinheiro, o que era suficiente para o reconhecimento do dolo eventual na prática desse injusto, sendo aplicável, assim a willful blindness doctrine (CARVALHO; FAYET, 2020. p. 7).
Portanto, resta demonstrado que a menção à Teoria da Willful Blindness na decisão da Ação Penal pelo Supremo Tribunal deu maior repercussão a Teoria, demonstrando a sua aceitação pelo Tribunal Superior e possibilidade de aplicação em nosso ordenamento jurídico (CORREIA; PÁDUA, 2018).
No tocante da aplicação da cegueira deliberada pelo entendimento jurisprudencial fixado pelo Supremo Tribunal Federal, podemos expor que no escopo, na Ação Penal nº 5023135-31.2015.4.04.7000, o juiz federal Sérgio Moro também entendeu ser possível à aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada para fundamentar a condenação do réu Ivan Gomes Torres Júnior em razão da prática da lavagem de dinheiro.
Segue trecho do ilustre juiz como suporte na sua decisão:
Aqui são pertinentes as construções do Direito anglo-saxão para o crime de lavagem de dinheiro em torno da ‘cegueira deliberada’ ou ‘willful blindness’ e que é equiparável ao dolo eventual da tradição do Direito Continental europeu. (MORO, Sérgio Fernando. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo, Saraiva, 2010).
E continua:
A doutrina da cegueira deliberada, apesar de constituir construção da common law, foi assimilada pelo Supremo Tribunal Espanhol (STE), ou seja, corte da tradição da civil law, em casos de receptação, tráfico de drogas e lavagem, dentre outros (MORO, 2010).
Destarte, resta demonstrado que o juiz Sérgio Moro utilizou decisão do Supremo Tribunal Espanhol para embasar a condenação do réu aludido, sob o argumento que o ele possuía conhecimento, ainda que não absoluto, do esquema que envolvia o parlamentar, tendo o agente conduzido com dolo não eventual ao não se opor ao pedido feito pelo chefe á época dos fatos. Somente a caráter de conhecimento, vale informar que réu Ivan Gomes Torres Júnior era chefe do gabinete do ex-deputado Pedro Corrêa, e que ele teria disponibilizado a sua conta bancária para que o parlamentar recebesse dinheiro oriundo de propina paga por empreiteiras que visavam celebrar contratos privilegiados a Petrobrás. Consequentemente, o réu foi condenado a cinco anos pelo crime de lavagem de dinheiro.
De modo similar, nas Ações Penais nº 50472-2977.2014.4.04.7000/PR e 5007326-98.2015.4.04.7000/PR versam sobre a possibilidade, ou não, de aceitação do dolo eventual em sede de lavagem de dinheiro e sobre a possibilidade de aceitação do emprego da cegueira deliberada como foi feito no ordenamento espanhol, instituto com origem no common law, em uma realidade de civil law, respectivamente.
Em suma, mormente a partir das decisões oriundas da Operação Lava-Jato, a imputação da Lavagem de Dinheiro através do dolo eventual no Brasil pode advir de dogmaticamente insatisfatória. Podemos concluir que o perigo dessa aplicação é uma possível lesão ao Princípio da Legalidade na medida em que pode dar espaço a explicações simplistas e supor o dolo do agente criminoso nos casos em que há dificuldade de apuração. Esse anseio se assevera visto que não existe responsabilização penal culposa no crime analisado e, concomitantemente, somada à pressão social e midiática, grande esforço internacional e nacional para punição evidenciando um caráter emergencialista do Direito Penal.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo do presente trabalho foi discorrer sobre a aplicação da Cegueira Deliberada no ordenamento jurídico brasileiro e o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF e Superior Tribunal de Justiça - STJ, sendo que para isso abordou os seguintes temas: uma breve análise do Direito Penal econômico, especificamente abrangendo a seletividade do sistema penal nos crimes econômicos, e a aplicação da cegueira deliberada no ordenamento jurídico brasileiro.
Como mostrado, a eficiência jurídica é de grande valia para o Estado, sendo um importante princípio - o custo benefício, se sobrepondo muitas vezes sobre o mérito do caso.
Ressalta-se que com a evolução tecnológica, foi possível o avanço de condutas criminosas mais complexas com potencialidade de obter lucros lesando muitas vezes o próprio Estado, por exemplo, nos casos de crimes de Lavagem de Dinheiro, tendo em vista que as condutas cada vez mais difíceis de ser identificadas, sendo o lucro disfarçados aos olhos da Lei.
Observa-se que, o objetivo também foi criticar, não só os prejuízos econômicos mas os sociais, causados pela seletividade de crimes financeiros em comparação com crimes patrimoniais.
Nessa linha de raciocínio, passou-se a utilizar a Cegueira Deliberada, para auxiliar nas condenações pelos crimes mais simples, mas principalmente em casos de delitos complexos.
No Brasil, com a reformulação da Lei nº Lei 9.613 no ano de 2012, juntamente com a aplicação da Cegueira Deliberada em outros países, houve um esforço para introduzir a mencionada doutrina nos julgamentos, com intuito de diminuir a atuação do crime organizado.
A partir de então, a teoria ganhou relevâncias nos tribunais brasileiros, principalmente para fundamentar sentenças criminais, nos delitos de lavagem de capitais e organização criminosa. Na Ação Penal nº 5023135-31.2015.4.04.7000, um dos desdobramentos da Operação, o juiz federal Sérgio Moro entendeu ser possível a aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada para fundamentar a condenação do réu Ivan Vernon Gomes Torres Júnior em razão da prática de lavagem de dinheiro. Na condição de ex-assessor do deputado Pedro Corrêa, o réu teria disponibilizado a sua conta bancária para que o parlamentar recebesse dinheiro oriundo de propina paga por empreiteiras que visavam celebrar contratos privilegiados com a Petrobrás.
Concluindo-se, a partir das decisões oriundas da Operação Lava-Jato, a imputação da Lavagem de Dinheiro, sob o aspecto do dolo eventual no Brasil mostrou-se insatisfatória, tendo em vista o perigo dessa aplicação e uma possível lesão ao princípio da Legalidade na medida em que pode dar espaços a argumentos simplistas, em que há dificuldade de apuração.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Una.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: WAGNER, Mateus Pinheiro. A aplicação da willful blindness ou cegueira deliberada no ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 jun 2021, 04:29. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56817/a-aplicao-da-willful-blindness-ou-cegueira-deliberada-no-ordenamento-jurdico-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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