RESUMO: O presente artigo pretende explicar os principais aspectos da personalização do feminicídio após ser inserido no Brasil como homicídio qualificado. Para isto, foi realizada essa pesquisa bibliográfica, combinadas a teses doutrinárias e artigos jurídicos, com a finalidade de alcançar os objetivos pretendidos. Tratando-se de uma inovação legislativa, solucionar e debater os pontos principais. Inaugura-se este trabalho aduzindo o conceito do feminicídio na doutrina e a natureza dessa qualificadora. Em seguida, uma breve introdução sobre o princípio da insignificância, se é aplicável ou não. Finalmente, as principais discussões sobre o referido tema e a pessoa transexual figurar como sujeito passivo no crime de feminicídio.
Palavras chave: Feminicídio; violência contra a mulher; princípio da insignificância; gênero; constitucionalidade da qualificadora; transexual vítima.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Feminicídio. 2.1 Homicídio qualificado. 2.2 Feminicídio 3. Razões da condição de sexo feminino. 3.1 Violência doméstica e familiar contra mulher. 3.2 Menosprezo à condição de mulher. 3.3 Discriminação à condição de mulher. 4. Tipologia do feminicídio. 5. Natureza da qualificadora do feminicídio. 6. Constitucionalidade da qualificadora. 7. Da competência nos crimes de feminicídio. 8. Do princípio da insignificância. 9. Do entendimento dos tribunais. 10. Aplicação da qualificadora (feminicídio) para transexuais. 11. Conclusão. 12. Referência bibliográficas.
O trabalho de conclusão de curso tem como objetivo explanar sobre o crime de feminicídio como uma das qualificadoras no crime de homicídio, no cenário jurídico.
A maior violação direta aos direitos humanos das mulheres é o crime de feminicídio, pois ceifa sua vida, sendo que a cada uma hora e meia uma mulher é morta no país por causas violentas, sendo o Brasil considerado o 7º pais do mundo que mais mata mulheres, portanto, é dever do Estado proteger as mulheres vítimas.
O feminicídio estando incluso a fim de qualificar o crime de homicídio, previsto no artigo 121 do Código Penal, entrou em vigor com a promulgação da Lei 13.104 em 09 de março no ano de 2015, especificando que se trata do homicídio em desfavor da mulher em razão de ser do sexo feminino, no cenário de violência doméstica e familiar, e quando há situação de discriminação à condição de ser mulher.
Destaque-se, ainda que anteriormente a esta referida lei acima mencionada não existia uma punição específica para o homicídio que praticado contra a mulher por razões que envolvessem o sexo feminino. Quer dizer, o feminicídio era penalizado de forma geral como simplesmente homicídio. O enquadramento que se fazia era de homicídio qualificado por motivo torpe – inciso I do § 2°, do artigo 121 – ou fútil – inciso II - ou em razão em virtude de dificuldade da vítima de se defender – inciso IV, todos do Código Penal.
No primeiro capítulo aborda-se sobre a conceituação do crime de feminicídio, terminologia e entendimentos, como realmente ocorre a configuração do crime ao incidir a referida qualificadora.
No segundo capítulo e subtítulos seguintes, este trabalho aborda sobre Razões da Condição de sexo Feminino, suas características, as diferenças de cada estado do Brasil em relação a competência na instrução criminal antes de ir à Júri, e no terceiro capítulo aborda-se sobre a aplicação do princípio da insignificância, pertinente a entendimentos atuais e de grande importância a Súmula 589 do STJ.
Finaliza-se o presente trabalho abordando no último capítulo sobre a aplicação da qualificadora (feminicídio) para os homicídios que envolvem transexuais como vítimas.
Apresentando o cenário das leis e normas, criadas para amparar e dar mais respaldo a mulher surgindo mais uma qualificadora agora no Código Penal no Capítulo que trata Dos Crimes contra a pessoa, particularmente no artigo 121, que trata de homicídio.
Espera-se que este artigo contribua com o debate sobre crime tão grave e relevante.
FEMINICÍDIO
É importante destacar como configura o crime de feminicídio, pois apesar de popularizado é um tema pouco conhecido, onde poucas pessoas sabem exatamente como a morte feminina restará caracterizada como feminicídio. No artigo “Feminicídio e as mortes de mulheres no Brasil”, publicado pela autora Wânia Pasinato, há uma análise sobre todo o assunto incluindo o aspecto histórico do feminicídio desde as primeiras exposições sobre tal tema:
A maior parte dos trabalhos consultados para este artigo toma como referência a definição elaborada por Russel e Radford (1992), ainda que estejam se referindo a mortes que ocorrem em diferentes contextos e sejam praticadas por diferentes agentes. Excetuando-se o caso da Guatemala (Cladem, 2007 – entre outros estudos) que guarda muitas semelhanças com a situação de Ciudad Juarez, nos outros países os estudos se referem a assassinatos de mulheres por seus (ex)maridos e (ex)companheiros. (...) Segundo Russel e Radford (1992), a primeira característica desta definição considera o feminicídio como mortes intencionais e violentas de mulheres em decorrência de seu sexo, ou seja, pelo fato de serem mulheres. Para Fragoso (2002), o que explicaria as mortes não seria a condição de gênero, mas o fato de as mulheres não estarem desempenhando seus papéis de gênero adequadamente. Para as três autoras, nessas mortes não são identificados outros motivos relacionados à raça/etnia, geração, ou à filiação religiosa ou política. (PASINATO, 2011, p 11 disponível em http://www.scielo.br/pdf/cpa/n37/a08n37.pdf.).
Conforme a autora escreveu, há diversos entendimentos sobre o tema, inclusive em questão de terminologia, se é femicídio ou feminicídio, o referido assunto não será abordado nesse trabalho, pois já está consagrado no Código Penal brasileiro como feminicídio.
A autora também aborda sobre a questão da desigualdade de gênero, o que aumenta ainda mais as mortes de mulheres, e fala sobre a primeira vez em que se discutiu sobre feminicídio:
A expressão femicídio ou – ‘femicide’ como formulada originalmente em inglês – é atribuída a Diana Russel, que a teria utilizado pela primeira vez em 1976, durante um depoimento perante o Tribunal Internacional de Crimes contra as Mulheres, em Bruxelas. Posteriormente, em parceria com Jill Radford, Russel escreveu um livro sobre o tema, o qual viria a se tornar a principal referência para os estudos aqui analisados (...) De acordo com a literatura consultada, Russel e Radford utilizaram a expressão para designar os assassinatos de mulheres que teriam sido provocados pelo fato de serem mulheres (...) outro característica que define femicídio é não ser um fato isolado na vida das mulheres vitimizadas, mas apresentar-se como um ponto final em um continuum de terror, que inclui abusos verbais e físicos e uma extensa gama de manifestações de violência e privações a que as mulheres são submetidas ao longo de suas vidas. (PASINATO, 2011, p 05, 06, disponível em http://www.scielo.br/pdf/cpa/n37/a08n37.pdf.).
Conforme a realidade penal brasileira, o feminicídio possui requisitos típicos que são: a) violência doméstica e familiar; b) menosprezo à condição de mulher ou c) discriminação à condição de mulher, tudo isso previsto no artigo 121 §2º, inciso VI e §2°a do Código Penal, vejamos:
2.1 Homicídio qualificado:
§ 2° Se o homicídio é cometido:
2.2 Feminicídio:
VI- Contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.
§ 2o- A considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve
I - Violência doméstica e familiar;
II - Menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
No Congresso Nacional Brasileiro o termo “Razões de gênero” foi trocado por Razões da condição do sexo feminino, ficando definido no inciso VI do artigo de homicídio. Durante os debates na Câmara, inicialmente o projeto de lei era para que fosse descrito como: se o homicídio é praticado “contra a mulher por razões de gênero”, porém uma das bancadas de parlamentares, foi contra essa expressão, pressionaram para que a palavra “gênero” fosse trocada por “sexo feminino”, essa mesma bancada objetivava distanciar a possibilidade de transexuais serem abarcados pela lei. Assim, fica nítido que o sujeito passivo é a mulher, podendo aplicar por analogia homem quando for relação homo afetiva. Sobre esse tema abordaremos no último capítulo. Conforme o artigo supracitado explanar-se á sobre os requisitos típicos a saber:
3.1 Violência doméstica e familiar contra mulher.
Uma das primeiras razões que a Lei trouxe foi especificar que o crime precisa envolver violência doméstica e familiar, automaticamente remete-se à Lei 11.340, Lei Maria da Penha, que em seu artigo 5º, define esse conceito como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.
Percebe-se que para configurar a violência doméstica que justifica a qualificadora do feminicídio é de suma importância analisar se a agressão vital se dá em razão do gênero ou não, e, a Lei Maria da Penha também define o contexto em que se dá a violência doméstica e familiar, que é: no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto (art. 5º, I a III).
O segundo requisito para que configure a qualificadora é a morte em razão de menosprezo, onde o sujeito ativo não nutre nenhum apreço ou estima pela vítima, sujeito passivo, o que também configura desdém, desvalorização, desapreço, e desprezo literalmente.
Pode-se encontrar a designação de discriminação contra a mulher no artigo 1° do Decreto n° 4377/2002, definido na Convenção sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher.
A Lei que incluiu a qualificadora do feminicídio veio de forma tardia, pois desde 2002 o Brasil já havia promulgado o Decreto sancionando medidas a fim de erradicar todas as formas de violências entre os gêneros, isto posto, o avanço nesse sentido é extremamente lento.
A discriminação pode ocorrer de diversas formas, como por exemplo ao entender que a mulher não pode trabalhar fora de casa, e se ela contrariar isso, é morta, restringindo a ser do lar, ou matar pelo simples fato de ela estudar ou chefiar alguma empresa. São muitos os casos em que vitimam mulheres pela discriminação, sendo uma característica predominante de sociedade machista e patriarcal, que é o caso do Brasil.
Nos estudos sobre feminicídio há algumas espécies a esse crime, mais comum é a classificação em três grupos para dividir o feminicídio: o feminicídio não íntimo, o feminicídio íntimo, e o feminicídio por conexão, conforme serão explicados a seguir.
O feminicídio íntimo ocorre quando a vítima tem ou teve uma relação afetiva com o homicida, tal relação que inclui a relação atual ou do passado, nesta hipótese pode abarcar companheiros, namorados e noivos, não estando limitando à união matrimonial. Os dados do Relatório sobre o Peso Mundial da Violência Armada retratam que 66 mil (sessenta e seis mil) mulheres morrem anualmente vítimas de homicídio doloso, e na maioria dos casos ocorre no âmbito domésticos por seus parceiros, familiares ou amigos das vítimas.
Segundo o Mapa da Violência do Brasil, 68,8% das mortes de mulheres ocorreram dentro de casa, sendo que 42,5% do total das agressões, o agressor é o parceiro ou ex-parceiro da mulher. Mais ainda, na faixa dos 20 aos 49 anos, 65% das agressões tiveram autoria do parceiro ou do ex. Nessa categoria de feminicídio é incluído, ainda, aqueles cometidos por qualquer outro homem com que a vítima tem ou teve uma relação familiar, de convivência ou semelhantes, abarcando nisso o pai, o irmão, o primo, o filho.
O feminicídio não íntimo, ocorre quando a vítima não possuía qualquer relação familiar ou de convivência com o agressor, havendo a agressão sexual ou não. Geralmente, acontece por homens com os quais a vítima possuía alguma relação de confiança ou subordinação, exemplo os colegas de trabalho, amigos, ou sendo o agressor um desconhecido. Nessa categoria costuma-se incluir também os feminicídios cometidos contra as mulheres atuantes em profissões marginalizadas, como é o caso das profissionais do sexo.
O feminicídio por conexão, refere-se às mulheres assassinadas por estarem na “linha de fogo” de um homem que pretendia matar outra mulher, ou seja, mulheres que tentam evitar a consumação de um assassinato e acabam morrendo, incidindo na ocorrência da “aberratio ictus”.
As qualificadoras criminais são classificadas como de natureza objetiva ou subjetiva, sendo que as qualificadoras objetivas referem a respeito do crime em si relacionado ao meio e modo de execução. As qualificadoras subjetivas são relacionadas ao agente, aos motivos e fins do crime.
No crime de homicídio as qualificadoras são divididas no artigo 121 do Código Penal, sendo os incisos I, II e V classificados como de natureza subjetiva, e dos incisos III, IV e V tidos como de natureza objetivas, como o inciso VI foi inserido posteriormente no rol desses incisos pairou dúvidas em relação à sua natureza, se o feminicídio necessita ter sua natureza jurídica classificada como objetiva ou subjetiva. Existe uma divergência entre vários aspectos na questão jurídica, há os que defendem o feminicídio ser de natureza objetiva e há os que defendem ser de natureza subjetiva.
De acordo com a Corte Suprema, a Lei da Maria da Penha, e, a Lei do Feminicídio, ambas são instrumentos que promovem a igualdade em seu sentido material, pois no aspecto físico, a mulher é mais vulnerável que o homem, além de que no contexto histórico a mulher vem sendo vítima de submissões, discriminações e sofrimentos por questões relacionadas ao seu gênero.
Na ação declaratória de constitucionalidade - ADC 19 -, e na Ação de inconstitucionalidade – Adin 4424 – foi debatido sobre o tratamento penal e processual penal desigual entre mulheres e homens, em ambas as ações o STF considerou constitucional todos os dispositivos da Lei Maria da Penha que confere o tratamento jurídico diferenciado, não existindo assim violação do princípio constitucional da igualdade pelo fato de no caso a vítima ser mulher haver uma punição maior. A criminalização específica, e mais penosa, intensa, do feminicídio está sendo mundialmente adotada em diversos países.
Destaca-se ainda, que ao tratar da constitucionalidade da Lei Maria da Penha, o Supremo Tribunal Federal se pronunciou a respeito da desigualdade de gênero. No julgamento da ADI 4.424, alhures mencionado, os ministros entenderam que a atuação do Estado no combate a esse tipo de violência de gênero está fundamentada em diversos dispositivos jurídicos, como, por exemplo: a) artigo 226, parágrafo 8º da Constituição Federal (“O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.’’); b) Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher; e c) Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.
É evidente que a violência em desfavor da mulher não é uma violência banal, mas cometida principalmente pela sua condição de mulher e praticada no âmbito doméstico e familiar, se torna equivocada afirmações de que a inclusão do feminicídio como qualificadora representa uma forma de discriminação, pois são afirmações baseadas na noção de igualdade advindas da ideia de igualdade formal.
Após a promulgação da Constituição de 1988, as mulheres brasileiras conquistaram a igualdade formal, visto que de acordo com o artigo 5º, inciso I, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, porém, as mulheres ainda não conquistaram a igualdade material em relação aos homens. Apesar de formalmente poderem usufruir de todos os direitos que são reconhecidos aos homens, na prática, as mulheres sofrem diversas limitações no exercício desses direitos, prova essa de que foi preciso incluir uma qualificadora no Código Penal especificamente para tentar coibir crimes nessa questão, pois não há igualdade.
Após a promulgação da lei do feminicídio várias discussões giraram em torno da competência para o processamento e julgamento, se seria no Tribunal do Júri ou Vara especializada de Violência doméstica. É notável que no artigo 74, §1° do Código de Processo Penal Brasileiro, está definido a competência para julgamento dos crimes contra a vida, conforme a seguir:
Art. 74, §1º. Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121. §§1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados”
A competência para o julgamento é no Tribunal do Júri, porém, para processamento da instrução criminal depende da Lei estadual de organização judiciária de cada estado, Há estados que preveem em sua lei de organização judiciária que crimes dolosos contra a vida praticados no âmbito da violência doméstica até a pronúncia devem ser instruídos por Vara de violência doméstica, posteriormente deverá ser redistribuído para Vara do Tribunal do Júri. De acordo com o STF, é possível essa previsão de acordo com os estados, desde que obrigatoriamente seja julgado no Júri. Cada Estado organiza sua Lei de regimento interno e decide como as Varas atuam, obedecendo o Código de Processo Penal, ficando livre para escolher, conforme a disponibilidade do Fórum, se instrui a primeira fase do inquérito em Vara do Tribunal do Júri ou em Vara de Violência Doméstica.
No cenário jurídico, no âmbito penal, o primeiro a tratar sobre o princípio da insignificância foi Claus Roxin no ano de 1964, tal princípio também é conhecido como bagatela ou infração bagatelar própria. Esse princípio não tem previsão expressa no Código Penal, porém está consolidado em doutrinas e jurisprudências com todos os requisitos para sua configuração. Entende-se que tal princípio é uma casa supralegal de exclusão da tipicidade material, caso o fato for penalmente insignificante quer dizer que não resultou nenhuma lesão ou perigo ao bem protegido juridicamente, que no trabalho em questão seria a vida das mulheres. Se o princípio é aplicado em favor do réu ele é absolvido por atipicidade material com fulcro no artigo 386, III do Código de Processo Penal.
Recentemente foi publicada pela 3ª Seção do STJ a Súmula 589 que aduz:
É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticadas contra a mulher no âmbito das relações domésticas. STJ. 3ª Seção. Aprovada em 13/09/2017, DJe 18/09/2017.
Em muitos casos recentes, os Tribunais Superiores estão julgando no sentido de afastar a hipótese de aplicar a insignificância em casos envolvendo relação familiar doméstica:
Princípio da insignificância e violência doméstica. Inadmissível a aplicação do princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica. Com base nessa orientação, a Segunda Turma negou provimento á recurso ordinário em “habeas corpus” no qual se pleiteava a incidência de tal princípio ao crime de lesão corporal cometido em âmbito de violência doméstica contra a mulher (Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha) (STF: RHC 133.043/MT).
Nessa mesma vertente o Superior Tribunal de Justiça já havia julgado nesse mesmo sentido:
A jurisprudência desta Corte Superior está consolidada no sentido de não admitir a aplicação dos princípios da insignificância e da bagatela imprópria, aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra mulher, no âmbito das relações domésticas dada a relevância penal da conduta, não implicando a reconciliação do casal atipicidade material da conduta ou desnecessidade de pena. Precedentes” (HC 333.195/MS)
É o que entende o STJ, após esse entendimento na Súmula 589, não admitindo a aplicação dos princípios da insignificância aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal da conduta.
Ao tratar de feminicídio, por mais perceptível que parece ser já associa-se excluindo que só há possibilidade de a vítima ser mulher e não homem, porém dentro desse assunto há uma enorme discussão se é aplicável a figura do transexual como vítima do referido crime. Para chegar a uma resposta é preciso compreender o significado do transexualíssimo. Segundo Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, “o transexual não pode ser confundido com o homossexual, bissexual, intersexual (também conhecido como hermafrodita) ou mesmo com o travesti. O transexual é aquele que sofre uma dicotomia físico-psíquica, possuindo um sexo físico, distinto de sua conformação sexual psicológica. Nesse quadro, a cirurgia de mudança de sexo pode se apresentar como um modo necessário para a conformação do seu estado físico e psíquico”
A segunda corrente, mais liberal e moderna, defende que se o transexual tiver feito a cirurgia de mudança de sexo de forma definitiva e alterado seu registro civil, deve receber tratamento de acordo com a sua nova característica física, posto que a condição psicológica já o colocava nessa posição. Percebe-se que tal posicionamento combina dois critérios: a) o biopsicológico, que consiste na realização da mudança do sexo de origem para correlação ao sexo psicológico e, b) o jurídico, traduzindo-se como a alteração do gênero nos assentos cartorários civis.
Ainda que a temática seja um tanto quanto nova, a atualidade do mundo moderno requer soluções à altura de seu progresso e avanço, o Direito precisa encarar com responsabilidade e ética o desafio de adequação dos transexuais, a fim de que não remanesçam sem identidade social, tanto no âmbito do direito privado e, primordialmente, diante do direito público, obrigação maior do Estado, objetivando estimular a discussão acerca do feminicídio e a possibilidade da pessoa transexual figurar como vítima desse crime hediondo.
Este trabalho de conclusão de curso teve como foco falar sobre o crime de feminicídio por meio da apresentação no cenário jurídico, explanando sobre a tipificação e inserção desta conduta no sistema penal. Com a Lei 13.104/2015 em vigor, o referido crime foi incluído no inciso VI do artigo 121 §2º, do Código Penal, entrando assim no rol de qualificadoras do maior crime contra a vida que é o homicídio, e sendo inserido como crime hediondo, passando a ser competência do Tribunal do Júri, assunto que foi tratado nesse trabalho. Um dos grandes questionamentos que ainda era feito é se a Lei da Maria da Penha já não punia o feminicídio. A resposta não poderia ser outra que não. Em que pede ser uma lei que cria normas processuais com o escopo de proteger a mulher vítima de violência doméstica, não se tipificava novas condutas.
No decorrer deste trabalho foi entendido que o feminicídio é o crime de ódio que mata oito mulheres por dia no Brasil, sendo necessário o entendimento a respeito do assunto a fim de que não haja julgamentos errôneos e injustos em desfavor das vítimas do aludido crime. Ao longo do estudo, observamos os posicionamentos de diversos juristas e doutrinadores, que mesmo sendo uma inovação o tema, é algo extremamente recorrente na sociedade, sendo que antes era pouco debatido e levado em consideração a importância de declarar a igualdade de gênero a fim de pelo menos tentar abreviar o número de vítimas do crime de feminicídio.
A intenção da aprovação da Lei nº 13.104/15 foi tirar o feminicídio da imperceptibilidade, consequentemente instituir que seja debatido por juristas e políticos, pois o esclarecimento do tema gera enfrentamento à violência das mulheres.
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Transexual pode ser vítima de feminicídio? Disponível em: https://www.megajuridico.com/transexual-pode-ser-vitima-de-feminicidio/. Acesso em 08/11/2017.
1 PASINATO, Wânia. Femicídios e as mortes de mulheres no Brasil. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-83332011000200008&script=sci_arttext. Acesso em: 07/11/2017.
2 Idem
3Disponível em http://www.dizerodireito.com.br/2015/03/comentarios-ao-tipo-penal-do.html. Acesso em 07/11/2017.
4 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4377.htm acesso em 08/11/2017
5 Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/mapa2012_mulher.pdf. Acesso em
08/11/2017
6 Idem
7 Aberratio ictus, em Direito penal, significa erro na execução ou erro por acidente.
8Disponível em: https://canalcienciascriminais.com.br/a-natureza-da-qualificadora-do-feminicidio/. Acesso em 08/11/2017
9 Disponível em:http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5719497. Acesso em 08/11/2017.
10 Disponível em:http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6393143. Acesso em 08/11/2017
11 Disponível em:http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/15893-15894-1-PB.pdf. Acesso em: 08/11/2017
em:http://www.mariaberenice.com.br/manager/arq/(cod2_732)23__a_mulher_e_o_direito.pdf. Acesso em 08/11/2017
13 HERMANN, Leda Maria. Maria da Penha: lei com nome de mulher. Campinas: Servanda, 2007, p. 8384.
14 Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6098167. Acesso em 08/11/2017.
15 Disponível em : http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=595394. Acesso em 08/11/2017.
16 Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/jurisprudencia/decisoes-em-evidencia/14-9-20172013-novas-sumulas-do-stj. Acesso em 20/09/2017.
17 Disponível em: https://www.megajuridico.com/transexual-pode-ser-vitima-de-feminicidio/. Acesso em 08/11/2017.
18 FRANÇA, Genival Veloso de. Fundamentos de Medicina Legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005, p.142.
19 Disponível em:https://franciscodirceubarros.jusbrasil.com.br/artigos/173139537/feminicidio-eneocolpovulvoplastia-as-implicacoes-legais-do-conceito-de-mulher-para-os-fins-penais. Acesso em 08/11/2017.
20 Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal, parte especial, Editora Juspodivm, Salvador, 2016, p. 66.
21 Delmanto, Celso, Código Penal. Comentado, 9ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2016, p. 971
22 Disponível em:https://rogeriogreco.jusbrasil.com.br/artigos/173950062/feminicidio-comentariossobre-a-lei-n-13104-de-9-de-marco-de-2015. Acesso em 08/11/2017.
Bacharelanda em Direito pelo CEULM – ULBRA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CUNHA, Rosana Belém da. Feminicídio na Sociedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jun 2021, 04:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56821/feminicdio-na-sociedade. Acesso em: 25 nov 2024.
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