ELOÍSA DA SILVA COSTA
(orientadora)
RESUMO: O presente trabalho acadêmico tem por objetivo apresentar o porte de arma de fogo e analisar sua limitação como meio protetivo em face da legislação atual, haja vista a garantia constitucional da segurança. O Estatuto do Desarmamento é uma política de controle de armas, vigorando no país desde 2003, objetivando a redução da circulação de armas, criando diversas proibições e punições a fim de incentivar uma sociedade livre de armas de fogo. No entanto, a criminalidade respondeu de forma contrária à sua finalidade. Será apresentado uma análise prática do panorama de crimes cometidos por armas de fogo, a fim de direcionar à uma identificação da eficácia das normas e regras que regem esta esfera. Dessa forma, será abordado a relação principiológica entre a Constituição Federal, e a legislação advinda deste contexto.
Palavras-chaves: Direito Penal, porte de arma de fogo, Estatuto do Desarmamento, segurança, constituição.
ABSTRACT: This academic work aims to present the carrying of firearms and analyze its limitation as a means of protection in face of the current legislation, given the constitutional guarantee of safety. The Statute of Disarmament is a gun control policy, in effect in the country since 2003, aiming to reduce the circulation of weapons, creating several prohibitions and punishments in order to encourage a gun-free society. However, criminality has responded in a way contrary to its purpose. A practical analysis of the panorama of crimes committed with firearms will be presented, in order to direct to an identification of the effectiveness of the norms and rules that govern this sphere. In this way, we will address the principiological relationship between the Federal Constitution and the legislation arising from this context.
Keywords: Criminal law, possession of firearms, disarmament statute, security, constitution.
O presente trabalho, visa examinar a limitação do porte de arma de fogo a partir do Estatuto do Desarmamento, em contraste com o dispositivo constitucional de garantia da segurança.
De uma análise histórico cultural brasileira, podemos extrair que desde o início com os povos nativos, o direito à vida, a segurança e a propriedade sempre obtiveram espaço de destaque nos dispositivos jurídicos, e apesar de sua abstrata existência estes não são exercidos em sua máxima capacidade.
A Constituição Federal de 1988, elenca em seu texto a garantia da segurança pública como dever do Estado, assegurando a preservação da ordem pública e incolumidade das pessoas e do patrimônio, por meio dos órgãos de polícia. Havendo fortuita ineficácia por parte destes órgãos, ou quando não atender de maneira satisfatória à função garantidora, não há o que fundamente o direito à segurança.
É notório a presença nas mídias de assuntos relacionados a armas de fogo, sua comercialização, circulação, ganhando grande destaque entre a população brasileira, ainda mais devido ao aumento constante da violência e alto nível de criminalidade no Brasil que na maioria dos casos é praticado com o uso desses artefatos.
É nesse contexto que entra o Estatuto do Desarmamento de 2003 e sua pretensão inicial de reduzir a quantidade de crimes oriundos pelo porte ilegal de arma de fogo, por meio da proibição de seu comércio. Ab initio, o presente trabalho se fundamenta na compreensão de que não existe atualmente, um aparato governamental ou legislativo no planeta capaz de estar em todos os lugares e em todos os momentos, fornecendo a completa garantia de todos os direitos e deveres dos indivíduos.
O crescente uso de armas ilegais para colocar intencionalmente em risco a vida, o desmantelamento das forças policiais por meio de baixos salários e a compra de armas inferiores, e a alta taxa de criminalidade no Brasil, são fatores claros que demonstrar o fracasso das políticas de restrições as armas.
Proteger-se é a lei da existência social, assim como proteger o patrimônio. No entanto, no contexto atual, vale notar que propostas relacionadas à política partidária e medidas de desarmamento limitam o direito à segurança, sem uma base científica que sustente mudanças na proibição de armas.
Para que direitos fundamentais como a vida e a liberdade, possam ser respeitados em sua plenitude no âmbito nacional, o uso defensivo das armas por meio do armamento civil e da desburocratização de registros, se mostra como o procedimento responsável por assegurar maior eficiência nas políticas de segurança pública.
Portanto, imprescindível abordar os efeitos da legislação brasileira nas garantias constitucionais previstas na Carta Magna, com o fim de explorar com maior proximidade aspectos importantes que demonstram o impacto da limitação do porte de arma de fogo em face do direito subjetivo de segurança.
2.CONCEITO DE SEGURANÇA PÚBLICA
Preliminarmente, é imprescindível uma aproximação conceitual da segurança pública, partindo de conceitos bem sedimentados na doutrina brasileira que se concentram sobretudo na sua dimensão coletiva, enquanto atividade ou dever estatal. Nos termos em que é tratada na Constituição Federal, ela não pode ser resumida em um conceito unitário.
Neste sentido, ela pode ser tomada a partir da ideia de direito fundamental individual que “é usufruída pelo indivíduo quanto à proteção de sua vida, integridade física e bens”, mas também como um bem coletivo, como “proteção da estabilidade das condições necessárias à vida pública do indivíduo” [1]1
As definições encontradas na doutrina brasileira se referem, em regra, à atividade ou sistema de segurança pública, relacionando-se assim de forma clara com o dever do Estado previsto no art. 144 da Constituição Federal. Em geral, sequer problematizam o significado de ser esta atividade também definida como um direito.
Enquanto tarefa estatal, a definição mais frequente traduz o conceito de segurança pública como sendo:
“a preservação ou restabelecimento da convivência social que permite que todos gozem de seus direitos e exerçam as suas atividades sem perturbação de outrem, salvo nos limites de gozo e reivindicação de seus próprios direitos e defesa de seus legítimos interesses. Na sua dinâmica, é atividade de vigilância, prevenção e repressão de condutas delituosas”[2]
Em síntese, nesta dimensão, pode-se afirmar que a segurança pública é atividade que busca garantir a ordem pública enquanto espaço para o adequado exercício dos direitos e convívio social sem perturbações, protegendo as pessoas e seus bens contra condutas ilícitas dos particulares.
Ela não se ocupa com conflitos de ordem moral ou desavenças e discordâncias na condução do modo de vida de cada pessoa, mas de conflitos de cunho penal ou que possam desencadear violações graves a bens, interesses e valores constitucionalmente protegidos. Também não se ocupa de conflitos privados, que podem ser solucionados através de outros mecanismos, inclusive acesso aos Tribunais tendo, portanto, uma dimensão fundamentalmente subsidiária.
A preocupação da segurança pública enquanto dever para com a comunidade é reduzir os índices de condutas delitivas e reprimir adequadamente as que forem cometidas, de forma a manter possível o equilibrado convívio em sociedade.
Já o direito fundamental à segurança pública é sobretudo a possibilidade de exigir proteção em determinadas situações que colocam em risco evidente os bens apontados como mais valiosos, especificamente designados como “incolumidade das pessoas e do patrimônio” no texto constitucional.
3.DIREITO FUNDAMENTAL À SEGURANÇA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988
A segurança dos indivíduos e da sociedade é elemento fundamental do Estado. Os princípios que são base da Constituição de 1988 estão colocados de maneira a garantir a organização da ordem pública do Estado brasileiro em que a dignidade humana deve ser respeitada. O Estado, por possuir um maior poder de coação contra atos ilícitos carrega maior parte da responsabilidade contra atos que vão de encontro a ordem de segurança do resto da sociedade que está minimamente de acordo com os padrões pré-estabelecidos.
O Estado deve atuar de forma a garantir a segurança de cada cidadão não só com interferência policial ou judicial, mas de maneira a evitar ao máximo o uso de meio repressivo a fim de manter a ordem pública.
Diversas Constituições passaram a referir-se expressamente à segurança. A Constituição Federal de 1988, albergou valor segurança como valor supremo e fundamento condicionante da atuação e legitimador do modelo de Estado democrático de direito, incluiu-a entre os direitos fundamentais arrolados no caput do artigo 5º - Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos -, ao lado dos direitos à vida, à liberdade, à igualdade e à propriedade, bem como em seu artigo 6º - Dos Direitos Sociais- e ainda em seu artigo 144, referindo especificamente à segurança pública.
A incessibilidade da defesa do direito à segurança, aliada a uma interpretação simples do art. 144 da Constituição Federal, enfatiza que a segurança é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, cria um impasse onde os meios de defesa são limitados, principalmente quando os métodos utilizados para violá-los são extintos e também arriscam sua vidas. Assim, Mello (2005) explica:
Dessarte, ou o Estado oferece ao cidadão um padrão ao menos razoável de segurança, para que ele possa desfrutar da sensação de que está medianamente protegido contra assaltos, agressões e riscos de vida, ou, se não é capaz de fazê-lo, não pode pretender impedi-lo que disponha, por si próprio, daquele mínimo de meios necessários para que não se sinta inerme, exposto à sanha do banditismo sem qualquer possibilidade de salvação.
(...)
Se, em tais circunstâncias, o Poder Público se abalançasse a despojá-lo de meios de defesa própria estaria atentando à força aberta contra os ditames constitucionais assecuratórios dos direitos à vida, à integridade física, a dignidade pessoal e à proteção do patrimônio.
Deste modo, o direito a segurança se relaciona explicitamente com o direito de se defender. A ideia de que é seu dever respeitar o direito do outro, ressalta as possibilidades de uma reação protetiva quando isto não ocorre.
Para continuar o presente trabalho, devemos conceituar a arma de fogo, bem como posse e porte, visto que existe diferenças entre eles.
A arma de fogo é um artefato capaz de disparar um ou mais projéteis em alta velocidade através de uma ação pneumática provocada pela expansão de gases resultantes da queima de um propelente de alta velocidade.
Para Nucci (2014) arma de fogo é “instrumento vulnerante, fabricado, particularmente, para ofender a integridade física de alguém, ainda que possa ser com o propósito de defesa contra agressão injusta”.
O Decreto nº 9.493, de 5 de setembro de 2018, que aprovou o Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados, conceitua arma de fogo da seguinte forma:
Arma que arremessa projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente confinado em uma câmara que, normalmente, está solidária a um cano que tem a função de propiciar continuidade à combustão do propelente, além de direção e estabilidade ao projétil (BRASIL, 2018).
O doutrinado Capez (2017, p. 360), em sua obra “Curso de direito penal: legislação penal especial”, define arma de fogo como espécie do gênero arma própria:
As armas próprias são os objetos, os instrumentos, as máquinas ou os engenhos dotados de potencialidade ofensiva, fabricados com a finalidade exclusiva de servirem como meios de ataque e defesa, tais como o socoinglês, o punhal, a espada, a lança, o revólver, a espingarda, a granada etc.
4.1 POSSE E PORTE DE ARMA DE FOGO
Salienta-se que posse e porte de arma de fogo não se confundem, visto que, ostentam finalidades diferentes.
A posse de arma de fogo significa poder mantê-la sob sua guarda em casa e no trabalho, desde que a pessoa seja o responsável legal ou proprietário do estabelecimento, conforme bem explicita o artigo 5º da Lei 10.826/2003. “A arma, deve, portanto, permanecer depositada em local abrigado, seja ele casa ou outro local onde o proprietário, comprovadamente esteja residindo ou trabalhando” (FACCIOLLI, 2015, p107).
Art. 5º O certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa.
Para ter direito à posse de arma o cidadão deve ter no mínimo 25 anos, declarar efetiva necessidade de uso, apresentar comprovação de idoneidade e inexistência de inquérito policial ou processo criminal, bem como a comprovação de capacidade técnica e aptidão psicológica, conforme o art. 4º da mesma lei.
Segundo Damásio (2005, p. 32), possuir significa “agir como proprietário ou simplesmente titular do poder de ter a arma à sua disposição”, logo, não é preciso que o sujeito seja, de fato, o proprietário da arma para caracterizar a posse, bastando tê - la em seu poder.
Sobre a posse irregular de arma de fogo prescreve o artigo 12 da Lei 10.826/03:
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
O porte de arma é proibido no Brasil desde 2003, salvo em poucas exceções explicitadas na Lei 10.826/03 hoje em vigor. O porte significa essencialmente poder trazer a arma de fogo consigo e pronta para o uso, municiada e ao alcance das mãos, em locais que não são de sua propriedade, é configurado pelo transporte, pelo deslocamento da arma de fogo. Em regra, é proibido em nosso ordenamento jurídico. Vale dizer: somente as pessoas autorizadas pelo art.6º do Estatuto do Desarmamento poderão portar armas de fogo.
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
I – os integrantes das Forças Armadas;
II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP);(Redação dada pela Lei nº 13.500, de 2017).
III – os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei; (Vide ADIN 5538)(Vide ADIN 5948).
Sobre o porte irregular de arma de fogo prescreve o artigo 14 da Lei 10.826/03:
Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.
Sobre a posse e o porte ilegal de arma de fogo prescreve o artigo 16 da Lei 10.826/03:
Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
Configura infração penal a conduta daquele que, sem registro, possuir ou manter sob guarda, em sua residência ou dependência desta, ou ainda, em seu estabelecimento de trabalho ou empresa, arma de fogo, assim como, a conduta daquele que trouxer consigo, com pronto uso, arma de fogo sem a licença da autoridade competente.
Capez (2017, p. 374) aborda os crimes de posse irregular e porte ilegal de arma de fogo da seguinte forma:
O registro assegura o direito à posse da arma de fogo pelo interessado nos locais indicados pela lei. A ausência do registro torna a posse irregular, caracterizando a figura criminosa do art. 12 (arma de fogo de uso permitido) ou art. 16 da Lei (arma de fogo de uso restrito). A concessão do porte de arma de fogo, por sua vez, permite que o sujeito traga a arma de fogo consigo, transportando-a de um lugar para outro. O porte ilegal de arma configura os crimes previstos nos arts. 14 (arma de fogo de uso permitido) ou 16 (arma de fogo de uso restrito).
Em 22 de dezembro de 2003, foi aprovada a Lei nº 10.826/2003, mais conhecida como Estatuto do Desarmamento, regulamentado pelo Decreto nº 5.123/2004, o qual dispõe sobre o Sistema Nacional de Armas - SINARM, registro, posse, porte e comercialização de armas de fogo e munição, como também definem crimes e dá outras providencias. A lei 10.826 entrou em vigor no dia seguinte à sanção do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, quando foi publicada no Diário Oficial da União. Portanto, começou a vigorar no dia 23 de dezembro de 2003.
Os principais pontos dessa lei são: proibir o porte de armas por civis, com exceção para casos onde há ameaça á vida da pessoa; O porte de arma terá duração previamente determinada, estará sujeita à demonstração de efetiva necessidade, a requisitos para a obtenção de registro; O porte poderá ser cassado a qualquer tempo, principalmente se o portador for abordado com sua arma em estado de embriaguez ou sob o efeito de drogas ou medicamentos que provoquem alteração do desempenho intelectual ou motor; As taxas cobradas para a emissão de autorização para porte e registro de armas de fogo foram aumentadas, de maneira a dissuadir o pedido de novas permissões. Para novo registro, renovação ou segunda via, a taxa é de R$ 300,00. Para a expedição de porte, renovação ou segunda via do mesmo, a taxa é de R$ 1 mil.
A Lei 10.826 prevê uma recompensa em dinheiro para o cidadão que entregar sua arma a Policia Federal. A recompensa varia de R$150 a R$ 450, dependendo do tipo de arma. Por causa desse programa foram entregues mais de 670 mil armas às autoridades entre 2004 e 2015, de acordo com o Ministério da Justiça.
O Estatuto do Desarmamento tornou mais seletivo o acesso ao porte de arma e, ao mesmo tempo, trouxe estímulos à população para se desarmar, mediante o pagamento de indenização para os indivíduos que, espontaneamente, entregarem suas armas nos postos credenciados. Destaca-se também que de 2004 até 2011 o recebimento de armas e munições pela Campanha do Desarmamento era realizado apenas pela Polícia Federal. Após 2011, outros órgãos da segurança pública passaram a integrar a rede de postos de recolhimento: Corpo de Bombeiro Militar; Guarda Municipal; Polícia Civil; Polícia Militar; Polícia Rodoviária Federal; entidades da sociedade civil.
A entrega das armas é gerenciada por um sistema informatizado, o “sistema desarma”, que foi especialmente desenvolvido para a campanha nacional do desarmamento. O sistema, é organizado de modo a garantir a confidencialidade no momento da entrega das armas de fogo e munições, a agilidade no pagamento das indenizações.
Importante destacar que a Lei nº 10.826/2003 desde o momento que entrou em vigor gerou debates calorosos, principalmente por daqueles que acreditam que a burocracia nos processos de legislação e as mais diversas ações para reduzir a quantidade de armas não são capazes de reduzir os índices de violência no País. No entanto, os que estavam á frente das campanhas para o desarmamento apostavam na premissa de que, quanto menos armas, menos violência.
6.LEGÍTIMA DEFESA E AUTOTUTELA
Em observância ao princípio da ampla defesa, contido no art. 5º, da CF, é entendido por De Plácido e Silva (2014, p. 726) que ―assiste a toda pessoa de usar de todos os meios e recursos legais, para que defenda ou proteja a sua pessoa e seus bens contra os ataques que lhe são dirigidos, ou, sob o ponto de vista penal, para que se defenda de qualquer imputação delituosa que lhe é atribuída.
O Código Penal brasileiro, ratifica a ideia de que é possível utilizar-se de alguns meios para garantir o direito de defesa, não havendo crimes nos casos de legítima defesa.
É dever do poder jurisdicional do Estado responsabilizar e punir crimes de forma imparcial e justa, ocorre que alguns tipos de defesa não podem ser postergados, principalmente aquelas situações que colocam em risco o maior bem jurídico tutelado pela Constituição, a própria vida.
Há que se considerar aqui as hipóteses de autotutela ou do exercício privado da própria segurança sobretudo quando esta é necessária para suprir espaço de omissão da atividade de segurança pública e, portanto, da proteção devida pelo Estado.
É claro que o acesso a dados de segurança pública pode ser restringido por fundamentos relevantes, sobretudo quando vulnerarem sobremaneira a atuação estatal na matéria ou quando há confronto com direitos fundamentais contrapostos.
Nestes casos, o direito à segurança pública, enquanto garantia da integridade das pessoas e de seus bens está em jogo e fica inegavelmente abalada quando é o próprio agir estatal que a viola, no presente caso, restringindo e dificultando o cidadão ao acesso as armas de fogo que possam garantir sua segurança em momentos que o Estado falhar, pois como já dito, é impossível estar em toda parte a todo momento para fins de proteção a vida e propriedades.
A falta de resultados promissores para o combate a violência na sociedade, bem como o grande aumento de crimes cometidos, só demonstra o fracasso do Estado em prover a segurança pública mínima ao cidadão de bem como garantia do seu direito de defesa e proteção patrimonial.
Para os defensores do desarmamento, os argumentos explanados trata-se de uma estratégia para burlar a lei, já os contrapostos, reafirmam a aplicabilidade da lei quando satisfeitos todos os requisitos, garantindo-se ao cidadão a disposição de uma arma de fogo para salvaguardar seus interesses de defesa e guardar seu patrimônio.
Percebe-se que as armas de fogo desempenham um papel indiscutivelmente relevante na sociedade, razão pela qual há a necessidade de uma melhora no campo das políticas públicas voltadas para o acesso a esses artefatos. Não significa que haverá uma corrida armamentista de todos os cidadãos brasileiros, apenas se resguarda o direito de se proteger e a sua vontade de aquisição de arma de fogo de forma legalizada. Também não se pode afirmar sobre este ser a solução para todos os problemas, nem tão pouco há de se falar sobre a aprovação visar combater a violência, apenas, trata-se da liberdade de autodefesa e da dignidade humana.
Para o sucesso pretendido que garanta o direito do cidadão à segurança pública, o Estado deve prover à Polícia e aos órgãos de repressão e do combate às condições e meios suficientes para que estes possam exercer o seu papel no cumprimento de sua missão constitucional, ou seja, proteger a população.
BRASIL. “CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.” 5 de outubro de 1988.
BRASIL. Decreto nº 9.493, de 5 de setembro de 2018. Aprova o Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados. Diário Oficial da União, Brasília, 05 set. 2018.
BRASIL. Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 22 dez. 2003.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. v. 4.
FACCIOLI, Ângelo Fernando. Lei das Armas de Fogo. 6ª Ed. Curitiba: Juruá, 2013.
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal do desarmamento: anotações à parte criminal da lei nº 10.826 de 2003. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.7
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Direitos fundamentas e armas de fogo. 13 de outubro de 2005. https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI17173,101048- Direitos+fundamentais+e+armas+de+fogo (acesso em 15 de outubro de 2018).
SILVA, César Dario Mariano da. Estatuto do Desarmamento. 5ª ed. Curitiba: Juruá, 2013.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 31ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: vol 1, parte geral. 9ª Ed. São Paulo: RT, 2011.
[1] Thiago André Pierobom de Ávila. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público, 2014. Disponível no repositório da biblioteca da ULisboa. P. 224.
[2] José Afonso da Silva. “Segurança Pública no âmbito municipal”. In: Revista Trimestral de Direito Público. n. 11. São Paulo: Malheiro, 1995. P. 224. Itálicos nossos.
Bacharelanda do curso de direito da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis/SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BONETO, Brenda Akemy Muracami. A limitação ao porte de arma de fogo diante do direito de segurança Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 maio 2022, 04:13. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58439/a-limitao-ao-porte-de-arma-de-fogo-diante-do-direito-de-segurana. Acesso em: 22 nov 2024.
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