DARIO AMAURI LOPES DE ALMEIDA[1]
(orientador)
RESUMO: A jurisprudência entende que o reconhecimento fotográfico constitui um simples ponto de partida para uma investigação policial que deve ser posteriormente endossada para poder atuar como prova hábil para minar a presunção de inocência de uma pessoa. O objetivo do presente artigo é analisar as controvérsias sobre o reconhecimento fotográfico no sistema de investigação brasileiro. A metodologia utilizada foi uma revisão de literatura em livros, artigos, doutrinas e jurisprudências que sustentassem a temática apresentada. Conclui-se que o reconhecimento fotográfico ajuda os investigadores a restringir as buscas por suspeitos mais rapidamente, exonerar inocentes, alcançar justiça para as vítimas e beneficiar nossas comunidades de muitas outras maneiras. Na aplicação da lei, este reconhecimento serve como uma ferramenta para auxiliar os analistas humanos, que, em última análise, devem usar outros meios para verificar uma identidade.
Palavras-chave: Inquérito Policial. Reconhecimento fotográfico. Direito Penal.
ABSTRACT: The jurisprudence understands that photographic recognition constitutes a simple starting point for a police investigation that must be later endorsed in order to be able to act as skillful evidence to undermine the presumption of innocence of a person. The purpose of this article is to analyze the controversies over photographic recognition in the Brazilian investigation system. The methodology used was a literature review in books, articles, doctrines and jurisprudence that supported the presented theme. It concludes that photographic reconnaissance helps investigators narrow down searches for suspects more quickly, exonerate innocents, achieve justice for victims, and benefit our communities in many other ways. In law enforcement, this recognition serves as a tool to assist human analysts, who ultimately must use other means to verify an identity.
Keywords: Police Inquiry. Photographic recognition. Criminal Law.
Sumário: 1. Introdução. 2. Inquérito Policial. 3. Reconhecimento Fotográfico. 3.1 Prova do reconhecimento fotográfico realizado na sede da polícia. 4. Considerações Finais. 5. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A identificação dos possíveis responsáveis pelo cometimento de um crime é absolutamente necessária para poder realizar uma acusação formal contra determinada(s) pessoa(s). Para tanto, o inquérito policial é imprescindível e, especificamente, a identificação por meio de imagens fotográficas mostradas a terceiros (testemunhas/vítimas do crime) é inquestionável.
A jurisprudência entende que o reconhecimento fotográfico constitui um simples ponto de partida para uma investigação policial que deve ser posteriormente endossada para poder atuar como prova hábil para minar a presunção de inocência de uma pessoa.
Um dos aspectos lógicos que emerge do “timing” do inquérito policial é que se o exame fotográfico visa descobrir o contribuinte do procedimento ainda não identificado, assim sendo difícil pensar que essa diligência deva ser abrangida pelas garantias da legalidade assistência.
Esta circunstância óbvia significa que parte da investigação policial essencial é realizada à margem de qualquer direito de defesa. Portanto, embora sua prática seja admitida, deve ser realizada com minucioso cumprimento de diversos requisitos destinados a eliminar o arbítrio e a contaminação da própria diligência. Em outras palavras, o inquérito policial deve ser garantido como absolutamente confiável.
O papel da ciência nas investigações criminológicas nunca foi tão manifesto. As imagens de evidência agora são feitas usando uma gama ofuscante de tecnologias para capturar pistas minuciosas e muitas vezes invisíveis. Contudo, é imperial apontar se essa prática do reconhecimento fotográfico é constitucional, embora amplamente aceita pelos tribunais, por conta do procedimento adotado para sua elaboração e eventual desvirtuamento de normas legais incidentes, no entanto, por vezes, o reconhecimento fotográfico se desenvolve sem observar determinadas formalidades legais, acarretando seu enfraquecimento ou até mesmo sua invalidação no transcorrer da instrução criminal. Por outro lado, a jurisprudência tem se posicionado predominantemente no sentido de que ele tem valor probatório desde que associado a outros elementos que o ratifiquem.
Assim, surge a seguinte problemática: Reconhecimento por foto pode embasar uma condenação criminal?
Desta forma, o presente trabalho é relevante não apenas nas questões acadêmicas e jurídicas mas, sobretudo, para a sociedade, uma vez que estará apresentando um melhor entendimento e um conhecimento maior e mais atualizado acerca do tema abordado.
A forma de abordagem do estudo foi qualitativo, pois se buscou realizar uma abordagem profunda do fenômeno que encontra-se ligado ao objetivo proposto. Relata-se que os objetivos metodológicos foram exploratórios e descritivos. Os procedimentos técnicos foram: Bibliográficos, Documental e Levantamento. Os materiais bibliográficos foram: Livros; Artigos; Dissertações e outros.
Diante disto, o objetivo do presente artigo é analisar as controvérsias sobre o reconhecimento fotográfico no sistema de investigação brasileiro.
2 INQUÉRITO POLICIAL
De acordo com Duarte (2015), o inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de cunho administrativo, que é conduzido pela Polícia Judiciária e com vistas a colher preliminarmente provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria.
Para Mirabete (2017, p. 60) se trata “de instrução provisória, preparatória, informativa, em que se colhem elementos por vezes difíceis de obter na instrução judiciária”. Assim, entende-se, que o inquérito policial presta-se, a partir da Lei 11.690/08, a garantir provas que não podem ser repetidas em juízo, conforme dispõe o art. 155 do Código de Processo Penal que destaca:
O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Portanto, para uma melhor conceituação, não se pode lançar mão de que além da apuração da materialidade do crime e de sua autoria o inquérito policial serve também para resguardar as provas cautelares, não-repetíveis ou que devam ser produzida de forma antecipada, em razão de sua perecibilidade.
De acordo com Tourinho Filho (2017, p. 111) :
[...] Apurar a infração penal é colher informações a respeito do fato criminoso. Para tanto, a Polícia Civil desenvolve laboriosa atividade, ouvindo testemunhas, tomando declarações da vítima, procedendo a exames periciais, nomeadamente os de corpo de delito, exames de instrumento do crime, determinando buscas e apreensões, acareações, reconhecimentos, ouvindo o indiciado, colhendo informações sobre todas as circunstâncias que circunvolveram o fato tido como delituoso, buscando tudo, enfim, que possa influir no esclarecimento do fato. Apurar a autoria significa que a Autoridade Policial deve desenvolver a necessária atividade visando a descobrir, conhecer o verdadeiro autor do fato infringente da norma.
O inquérito policial deve ocorrer em caráter sigiloso em razão de preservar os envolvidos e promover a investigação de maneira a não ser influenciada por opiniões adversas, e nem por artifícios que busquem coibir ou confundir o trabalho realizado pelas polícias para a solução do inquérito, evitando-se pré-julgamentos, em razão do cumprimento da presunção de inocência.
A presunção de Inocência está elencada na Carta Maior em seu artigo 5º, LVII:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Desse modo é que Delmanto Junior (2016, p. 61) entende que o direito à presunção de inocência encontra-se consagrado em nosso ordenamento constitucional “do modo mais amplo possível, traduzindo-se em um verdadeiro direito fundamental internacional, cuja aplicação é imediata, segundo expressa previsão constitucional”.
O inciso X do artigo supracitado estabelece que:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
De acordo Bonfim (2018, p. 140):
O inquérito policial será sigiloso somente se necessário à elucidação do fato ou para preservar o interesse social (art. 20 do Código de Processo Penal, recepcionado pela Constituição Federal). Não é o sigilo, portanto, característica de todo e qualquer inquérito policial.
Além do caráter do sigiloso do inquérito policial visar à presunção de inocência, a divulgação de informações poderia atrapalhar o andamento das diligências realizadas. O artigo 20 do CPP determina que: “art. 20 - a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade” (BRASIL, 2014).
A garantia constitucional da liberdade do homem condiz com o princípio da legalidade, uma vez que este possui a regra de que o crime deve estar previamente definido em lei, por isto, será punido pelo Estado, de acordo com Wegener (2012), somente em casos em que houver a prática de condutas definidas em lei consideradas indesejáveis, conforme dispõe art. 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal que diz que não há crime sem lei anterior que o defina e não há pena sem prévia cominação legal.
O princípio da legalidade determina que as medidas de cautela impostas ao indivíduo somente podem ser aquelas previstas expressamente pela lei e devem possuir pressupostos de cabimento próprios, não podendo a liberdade pessoal de o indivíduo ser restringida ou limitada por outro meio.
Neste sentido, conforme entendimento de Mendonça (2011), este princípio pode ser compreendido de duas formas: a primeira é que deve se observar a forma estabelecida em para cada medida cautelar, observando todas as suas formalidades. A segunda trata da necessidade de que todas as medidas cautelares devem estar previstas em lei.
3 RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO
Quando ocorrem determinados tipos de crimes, o inquérito policial é imprescindível para apurar a possível autoria dos fatos ocorridos. Por isso é comum a realização de diversos procedimentos policiais, dentre eles a identificação dos possíveis autores por meio de imagens fotográficas apresentadas a terceiros testemunhas dos fatos, o que se denomina reconhecimento fotográfico.
Certamente qualquer advogado que tenha intervindo na área criminal saberá que quando a vítima ou o lesado relatar os fatos, o instrutor do boletim de ocorrência, a fim de esclarecer a autoria do mesmo, poderá proceder a mostrar ao denunciante uma bateria de fotografias de pessoas com características fisionômicas e características semelhantes às descritas pelo denunciante. O curioso é que, se formos ao Direito Processual Penal, a diligência de reconhecimento fotográfico não está regulamentada como tal. Por isso é normal que muitas vezes surjam certas dúvidas quanto à prática deste tipo de diligência.
É comum na prática forense criminal, quando a vítima/lesado relata os fatos, que o instrutor do boletim de ocorrência, (no desenvolvimento do primeiro processo policial e, para esclarecer a autoria dos fatos relatados), proceda apresentar ao denunciante uma bateria de fotografias de pessoas com feições/fisionomias e características semelhantes às descritas pelo denunciante.
Lima (2020) salienta que se formos à leitura da nossa Lei de Processo Penal percebemos que tal diligência não é regulamentada como tal, encontramo-nos perante uma técnica policial que se delineou segundo critérios jurisprudenciais ordinários e de natureza constitucional.
1. Reconhecimento fotográfico vs assistência jurídica.
De acordo com a jurisprudência do STF, o procedimento de identificação por reconhecimento fotográfico dispensa a presença de advogado, nesse sentido, os referidos processos são procedimentos de investigação que a polícia judiciária pode utilizar para apurar os fatos criminosos que investiga, sem os referidos processos.
Nucci (2020) aponta que isso viola o direito a um processo com todas as garantias, na medida em que, por um lado, se trata de uma diligência precariamente regulada e, também, de natureza altamente técnica que requer não apenas a assistência de um advogado verificar o correto desenvolvimento do mesmo, mas também, o conhecimento da jurisprudência desenvolvida a este respeito.
2. As chamadas bases de dados de pré-classificação e policiais.
Atualmente encontramos um procedimento em que os policiais atuantes mostram à vítima uma série de fotografias de sujeitos.
Para além da existência de fotografias, coexistem muitas outras bases de dados policiais que contribuem para a investigação do crime e que eventualmente podem ser acedidas (OLIVEIRA, 2020).
A existência e regulamentação de documentos e arquivos que contenham qualquer tipo de dados pessoais devem cumprir os requisitos tanto da LGPD e dos seus Regulamentos posteriores, como da regulamentação específica que a complementa. Portanto, não é uma questão trivial que os dados de uma pessoa tenham sido cancelados ou não e, isso para que um sujeito possa ser identificado ou não e, possa ser visto (posteriormente e como resultado disso) imerso em um crime como autor de um suposto crime.
Nucci (2020) salienta que uma questão importante é a de elucidar se a formação terá sido contaminada caso a vítima ferida tenha identificado o suspeito previamente em exame fotográfico de forma "irregular". Pode ser o caso em que a vítima é apresentada (na referida bateria fotográfica) com um assunto que não deveria constar na referida lista fotográfica (por não reunir as devidas garantias exigidas para a sua inclusão como inexistência de características físicas, raça diferente da aquela aduzida pela vítima, deve ser anulada a sua inclusão no referido processo, etc.) ou, se a inclusão da referida fotografia for correta. O autor ainda salienta que exames fotográficos anteriores geralmente não afetam negativamente os exames de formação subsequentes a ponto de determinar a impossibilidade de avaliação e que a confiabilidade, veracidade e consistência de um exame ou identificação não seja prejudicada pelo fato de as testemunhas terem sido anteriormente exibidas à força policial um álbum com fotografias do suspeito. A exibição de fotografias é um método de investigação que serve para orientar as investigações realizadas pela polícia judiciária, não tem outro âmbito e de forma alguma invalida ou questiona um eventual desfile de identificação que é realizado posteriormente. Em última análise, tal reconhecimento fotográfico não priva os demais procedimentos sumários ou provas do julgamento oral que poderiam ser praticados sobre os mesmos dados dessa identificação de validade.
3. Critérios jurisprudenciais para adequação do reconhecimento fotográfico
A diligência original de identificação por meio de imagens fotográficas, deve ser produzida, conforme exigido por jurisprudência reiterada, com o estrito cumprimento de uma série de requisitos, todos eles destinados a garantir a fiabilidade e a ausência de contaminação por influências externas, voluntárias ou involuntárias, que possam ocorrer nos critérios expressos por quem procede à referida identificação.
Nesse sentido, é necessário que, de acordo com Lima (2020), a diligência seja realizada nas delegacias, sob a responsabilidade dos funcionários, que o documentarão fielmente. Realiza-se através da exibição de um número tão plural quanto possível de clichês fotográficos, constituídos por fisionomias que, pelo menos algumas delas, apresentam certas semelhanças entre si em suas características físicas (sexo, idade aproximada, raça, etc. ), coincidindo com as oferecidas inicialmente, em seus primeiros depoimentos, pela pessoa que procede à identificação
Da mesma forma, se houver várias pessoas convocadas a identificar, sua intervenção ocorre independentemente umas das outras, com o necessário isolamento entre elas, com o propósito lógico de evitar influências recíprocas e endossar a aparência de "sucesso" que uma eventual coincidência acarretaria. identificação separada. Mesmo nesse sentido, para evitar ainda mais possíveis interferências, é aconselhável alterar a ordem de exibição dos quadros para cada uma dessas intervenções.
É claro que a diligência seria gravemente falha se os policiais dirigissem aos participantes da identificação qualquer sugestão ou indicação, por mais leve ou sutil, sobre a possibilidade de qualquer uma das identidades dos fotografados.
E, por fim, mais uma vez para evitar qualquer tipo de dúvida, a documentação do processo deve incluir no relatório a página do álbum exposto onde a fisionomia da pessoa identificada com a assinatura, nessa imagem, do declarante, bem como quaisquer declarações de interesse (certezas, dúvidas, reservas, ampliação de dados, etc.) que tenha manifestado no momento da realização da identificação.
4. Operabilidade processual e eficácia probatória:
Oliveira (2020) pontua que:
1º. Os exames fotográficos por si só não constituem prova idônea para destruir a presunção de inocência. Pode ser tão eficaz quando a testemunha ou os funcionários em exercício assistem ao julgamento oral e ali declaram sobre aquele reconhecimento que foi feito em seu dia.
2º São meras ações policiais que constituem a abertura de uma linha de investigação, por vezes imprescindível porque não há outro meio de obtenção de uma pista que possa levar à identificação do criminoso.
3.º A polícia tentará não ir ao exame fotográfico quando o suspeito já tiver sido identificado.
4. Não obstante, ainda que o reconhecimento fotográfico tenha sido realizado antes de tal audiência judicial, mesmo nos casos em que houve identificação prévia do suspeito, tal reconhecimento fotográfico não priva os demais processos sumários ou provas do julgamento oral que poderia ser praticado sobre os mesmos dados dessa identificação.
5. Presunção de inocência e reconhecimento positivo no reconhecimento fotográfico
Nucci (2020) e Lima (2020) salientam que o direito à presunção de inocência não é invalidado pelo resultado do reconhecimento fotográfico, mas pelo resultado dos meios de prova praticados no ato do julgamento.
Oliveira (2020, p. 43-44) aponta que a diligência original de identificação através de imagens fotográficas deve ser produzida no estrito cumprimento de uma série de requisitos resumidos, entre outros:
a) a diligência é realizada nas delegacias, sob a responsabilidade dos funcionários, encarregados do boletim de ocorrência, que o documentarão fielmente.
b) é realizada através da exibição de um mínimo dos mais plurais clichês fotográficos possíveis, constituídos por fisionomias que, pelo menos algumas delas, apresentam certas semelhanças entre si em suas características físicas (sexo, idade aproximada, raça, etc…) coincidindo com aquelas oferecidas inicialmente em seus primeiros depoimentos, pela pessoa que procede à identificação.
c) Da mesma forma, se houver várias pessoas convocadas a identificar-se, a sua intervenção ocorre independentemente de uma ou de outra, com o necessário isolamento entre elas, com o objetivo lógico de evitar influências recíprocas e endossar o aparecimento de "vento" que suporia um possível correspondência de identificação separada. Mesmo nesse sentido, para evitar ainda mais possíveis interferências, é aconselhável alterar a ordem de exibição dos quadros para cada uma dessas intervenções.
d) Naturalmente, a diligência será gravemente falha se os policiais dirigirem aos participantes na identificação qualquer sugestão ou indicação, por mais leve ou sutil, sobre a possibilidade de qualquer uma das identidades dos fotografados .
e) E, por fim, novamente para evitar todo o tipo de dúvidas que possam surgir, a documentação do processo deve incluir na declaração a página do álbum exposto onde a fisionomia da pessoa identificada com a assinatura nessa imagem, do declarante, bem como quantas manifestações de interesse (certezas, dúvidas, reservas, ampliação de dados, etc...) este pode ter manifestado no momento da realização da identificação”.
A doutrina e a jurisprudência têm se posicionado pela licitude do reconhecimento fotográfico para a composição do conjunto probatório referente à autoria delitiva, já que não está em dissonância com qualquer norma de ordem constitucional ou legal. O posicionamento majoritário é que, embora não exista lei expressa sobre essa espécie, é possível sua utilização se estiver em consonância com as outras provas de autoria carreadas nos autos. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) tem se posicionado exatamente nesse sentido:
EMENTA: RECONHECIMENTO DO ACUSADO- MÉRITO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – [...] O reconhecimento fotográfico configura meio de prova válido, especialmente quando confirmado em juízo e reforçado pelos demais elementos probatórios produzidos. Devidamente comprovadas a autoria e a materialidade do crime, a confirmação da condenação é medida que se impõe [...].
O STF também tem entendimento nessa linha:
EMENTA: HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. ALEGADA NULIDADE DO PROCESSO POR CONTER RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO REALIZADO SEM A PRESENÇA DO PACIENTE. I - O reconhecimento fotográfico do acusado, quando ratificado em juízo, sob a garantia do contraditório e da ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para lastrear o édito condenatório. Ademais, como na hipótese dos autos, os testemunhos prestados em juízo descrevem de forma detalhada e segura a participação do paciente no roubo [...].
Lima (2020) salienta, no entanto, que o reconhecimento também será invalidado se, antes da apresentação de várias fotografias, for apresentada à testemunha uma única fotografia do suspeito. Além disso, se antes de entrar na sala onde o reconhecimento é realizado, a testemunha pode ver o detido, caso já esteja detido.
As divergências quanto ao valor probatório ocorrem, basicamente, em razão da fragilidade do reconhecimento fotográfico, mesmo quando seguidos os procedimentos do artigo 226 do CPP.
3.1 Prova do reconhecimento fotográfico realizado na sede da polícia
Para a operacionalidade e eficácia probatória da diligência de reconhecimento fotográfico policial, Souza (2019) e Mendonça (2011) mencionam que:
1º. Os exames fotográficos por si só não constituem prova idônea para destruir a presunção de inocência. Pode ser tão eficaz quando a testemunha ou os funcionários em exercício assistem ao julgamento oral e lá depõem sobre aquele reconhecimento que foi feito em sua época.
2º. São meras ações policiais que constituem a abertura de uma linha de investigação, por vezes essencial porque não há outra forma de obter uma pista que possa levar à identificação do criminoso.
3º. A polícia tentará não ir ao exame fotográfico quando o suspeito já tiver sido identificado.
4º. No entanto, mesmo que o reconhecimento fotográfico tenha sido realizado antes de tal audiência, mesmo nos casos em que houve identificação prévia do suspeito, tal reconhecimento fotográfico não priva os demais processos sumários ou provas do julgamento oral que poderiam ser realizado sobre a validade das outras investigações preliminares.
Aprofundando essa questão, Pick (2017), afirma que pessoas que, por uma série de circunstâncias apuradas pela polícia, tenham sido incluídas como possíveis autores de atos que tenham determinadas características, trata-se de atividades policiais que são incorporadas ao boletim de ocorrência e que, portanto, carecem de valor probatório. Uma reiterada doutrina jurisprudencial teve oportunidade de se manifestar, sobre a incidência probatória dos reconhecimentos fotográficos realizados na Polícia, por meio da exposição de álbuns com fotografias de pessoas registradas pela polícia. Ninguém pode contestar que, entre os vários métodos policiais que podem ser utilizados para iniciar uma investigação com o objetivo de identificar o suposto autor de um ato criminoso, está o de mostrar álbuns fotográficos, caso contrário, seria difícil avançar nas investigações necessárias e imprescindíveis para se chegar à prisão e disposição judicial dos possíveis suspeitos. Essa diligência normalmente é realizada no momento da denúncia dos fatos na delegacia, mas, em outros casos, é realizada quando da instauração de Processos Preliminares nos respectivos tribunais, os quais foram arquivados provisoriamente por desconhecimento do autor.
Queiroz (2019) assevera que, no que diz respeito ao reconhecimento fotográfico, insiste que deve ser salientado que se trata de um procedimento de investigação policial, realizado nos primeiros momentos com o intuito de canalizar as investigações para esclarecimento dos fatos, e que são utilizados álbuns fotográficos de criminosos habituais no domínio da atividade criminosa onde se classifica o acontecimento em causa. Por consequência, por si só não tem valor probatório, uma vez que visa a obtenção de uma identificação inicial de um suspeito, que terá de se submeter a diligências judiciais, com as garantias e formalidades estabelecidas na Lei de Processo Penal, identificação que deve ser ratificada em plenário, na presença do tribunal.
Não é que se trate de uma identificação no julgamento oral, uma vez que este meio de prova faz parte da fase de instrução preliminar, como prova pré-constituída, mas sim que os seus resultados são validados em plenário.
Consequentemente, após o início da investigação através da exibição de fotografias, e após a detenção dos suspeitos, deve ser realizado um desfile de identidade, com todas as garantias, que é o que servirá de prova, uma vez ratificado no ato do julgamento oral (ALMEIDA, 2018).
Em seu trabalho, Gentil (2021) sinaliza que a exposição de várias fotografias de diferentes pessoas às testemunhas não constitui efetivamente um procedimento de reconhecimento de identidade, mas sim uma investigação preliminar, geralmente levada a cabo pela Polícia, a fim de orientar adequadamente as investigações destinadas a identificar o autor dos fatos. As verificações de identidade são realizadas em filas com a presença física do suspeito, que deve ser assistido por advogado, ou no mesmo ato do julgamento oral. Na realidade, a prova é constituída pelo depoimento da testemunha no ato do julgamento em que, submetida ao interrogatório das partes, no entanto, o autor reforça que nem mesmo o reconhecimento em linha realizado na fase de investigação é a diligência de prova suscetível de avaliação, ao apontar que tal diligência, ainda que feita com todas as garantias, não se pode considerar que se configure como prova antecipada e pré-constituída de impossibilidade de reprodução no julgamento oral em virtude de seu suposto caráter irrepetível. Para ser entendida como prova válida e suficiente para refutar a presunção de inocência, a diligência deve ser reproduzida no julgamento oral mediante a ratificação da vítima ou testemunha no referido julgamento, de modo a poder submeter a sua declaração a contradizer a oralidade e imediatismo, como exigem as garantias constitucionais do processo. É essencial, portanto, que, se possível, a vítima ou testemunha compareça ao plenário para ratificar a referida diligência uma vez que, como prova testemunhal, é, por sua natureza, perfeitamente reprodutível no ato da prova oral, devendo, portanto, ser objeto de contraste e contradição pelas partes oralmente e sem diminuir os direitos de defesa do acusado.
Na mesma linha, Zafaronni (2018) considerou prova suficiente para enfraquecer a presunção de inocência o reconhecimento feito no julgamento oral, sem qualquer dúvida, pela testemunha, não obstante as irregularidades dos reconhecimentos fotográficos, ou mesmo dos reconhecimentos em roda anterior, especialmente quando a testemunha aponta inequivocamente para uma pessoa durante o plenário, a sua força probatória reside na credibilidade ou fidedignidade do testemunho da pessoa que faz a identificação.
A prática desse tipo de identificação também foi justificada pela jurisprudência em resposta à insegurança e medo das vítimas de confrontar seus agressores em círculo. A realidade social de insegurança cidadã, e até de represálias mortíferas contra as vítimas que fazem o reconhecimento, serviu de álibi para afirmar a validade disso quando feito por meio de fotografias. E, Garcia (2021) explica que a prática de provar a identidade do infrator tornou-se conflituosa e difícil nos últimos anos. São fatos notórios deduzidos de máximas de experiência ou regras de vida, tanto a insegurança cidadã quanto o medo, até pânico, das vítimas de roubos de colaborarem com o reconhecimento de seus agressores. A retaliação, às vezes mortal, é a causa desses medos.
Em suma, a legitimidade do reconhecimento fotográfico nas delegacias de polícia "como meio válido de investigação" aparece hoje sem sombra de dúvida. O reconhecimento fotográfico realizado na sede da polícia, através da exposição de álbum ou série de fotografias de criminosos conhecidos que, devido ao seu modo de funcionamento possam ser suspeitos de terem cometido o crime perseguido, constitui diligência legítima para o início da investigação, dirigindo-a contra a pessoa determinada reconhecida por aquele meio ou técnica geralmente utilizado na prática de todas as Polícias dos diversos países; diligência cujo valor é de natureza pré-julgamento, de modo que não constitui prova por si só, embora possa ser levado a julgamento por outros meios probatórios processualmente admissíveis (PACELLI; FISCHER, 2017).
A identificação fotográfica é, como se vê, de natureza subsidiária; aceitável, enfim, quando a escalação não pode ocorrer, seja porque ainda não há suspeito ou porque, mesmo existindo, ele não está disposto ou disponível para participar de uma escalação de identificação ou, em suma, por alguma outra circunstância justificada. Mas o que acontecerá quando ocorrer uma identificação com foto em circunstâncias tais que um desfile de detentos poderia ter sido realizado? Não parece que por isso qualquer valor deva ser categoricamente negado; especialmente se houver posteriormente um reconhecimento em linha ou uma identificação no próprio plenário. Nucci (2020) sustenta com bom senso que no fundo, o que importa não é o método utilizado para identificar o acusado, o que importa é que a identificação seja livre, espontânea e confiável.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por mais de uma década, as autoridades federais, estaduais e locais usaram com sucesso a tecnologia de reconhecimento o fotográfico como uma ferramenta eficaz em milhares de investigações. Muitos funcionários de segurança pública sentem que essa tecnologia está se tornando um divisor de águas para manter as comunidades seguras, apontando para casos em que os crimes nunca teriam sido resolvidos ou evitados sem ela, podendo assim, embasar uma condenação criminal. No entanto, é necessário ter muita cautela, uma vez que muitos indivíduos podem correr o risco de ver negado o direito a um julgamento justo por uma falha nesse reconhecimento.
Se a ferramenta for usada corretamente, o design for aprimorado para controlar efetivamente o viés e os resultados forem divulgados adequadamente, o reconhecimento fotográfico pode ter o potencial de ser benéfico – os réus criminais podem ser identificados com precisão, reduzindo assim as condenações de pessoas inocentes. Se usado de forma inadequada, no entanto, pode levar a resultados injustos. Os tribunais devem aplicar o padrão de materialidade para garantir que as informações de reconhecimento fotográfico sejam qualificadas como material. Os promotores e as autoridades devem divulgar os resultados do reconhecimento fotográfico e os níveis de confiança. Por fim, o Congresso deve regular o reconhecimento fotográfico para garantir que seja usado de maneira justa, benéfica e precisa. O reconhecimento fotográfico está rapidamente se tornando um pilar das investigações policiais, mas se as verificações sobre seu uso forem insuficientes, envolverá pessoas inocentes.
O reconhecimento fotográfico ajuda os investigadores a restringir as buscas por suspeitos mais rapidamente, exonerar inocentes, alcançar justiça para as vítimas e beneficiar nossas comunidades de muitas outras maneiras. Na aplicação da lei, este reconhecimento serve como uma ferramenta para auxiliar os analistas humanos, que, em última análise, devem usar outros meios para verificar uma identidade.
Atualmente, o reconhecimento fotográfico é usado principalmente como uma técnica investigativa para identificar suspeitos que, posteriormente, são identificados por testemunhas oculares ou combinados por uma testemunha com uma fotografia de câmeras de vigilância. O software supostamente não é usado sozinho para estabelecer a causa provável de uma prisão. Mas a pesquisa mostra que, na realidade, muitas agências de aplicação da lei confiaram quase exclusivamente em sistemas de reconhecimento fotográfico para realizar uma prisão.
O uso do reconhecimento fotográfico está se expandindo em parte devido à maior disponibilidade de fotos. Está se tornando cada vez mais provável que os crimes sejam capturados por câmeras de monitoramento, o que, por sua vez, contribuirá para o aumento do uso de software de reconhecimento facial por parte da aplicação da lei.
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[1] Professor e orientador do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO – CEUNI/FAMETRO.
Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO – CEUNI/FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BIANCHI, Bruna da Silva. Inquérito policial: uma análise acerca das controvérsias sobre o reconhecimento fotográfico no sistema de investigação brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 maio 2022, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58490/inqurito-policial-uma-anlise-acerca-das-controvrsias-sobre-o-reconhecimento-fotogrfico-no-sistema-de-investigao-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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