WALTER MARTINS MULLER
(orientador)
RESUMO: O presente trabalho tem o desígnio apontar a existência de grupos neonazistas no Brasil e o crescimento quem vêm tendo graças a impunidade que releva a exposição de ideologias discriminatórias que são transformadas em senso comum, que de forma indireta atrai simpatizantes, e analisar a ineficácia do crime de divulgação de nazismo, que tem como fundamental propósito coibir ideologias que enalteçam a discriminação racial, que entretanto, são inalcançáveis punitivamente, uma vez que houve falha proveniente do legislador; quanto mais tardio a apuração normativa, mais tribulação a justiça terá para reorganizar, logo, a cultura já estará acomodada. O objetivo conclusivo deste trabalho é atentar o espectador que no caso da lei não ser modificada emergencialmente, a longo prazo, grupos de ódio continuarão se expandindo e disseminando ideologias genocidas de forma impudente, e o possível impacto que surtirá na sociedade. Este projeto fora produzido baseado em artigos da internet, sites governamentais, revistas informativas, opiniões de operadores do direito e doutrinas jurídicas.
Palavras Chaves: Nazismo. Direito Penal. Crime. Racismo. Cultura.
ABSTRACT: The present work aims to point out the existence of neo-Nazi groups in Brazil and the growth they have had thanks to the impunity that reveals the exposure of discriminatory ideologies that are transformed into common sense, which indirectly attracts sympathizers, and to analyze the ineffectiveness of crime. the dissemination of Nazism, whose fundamental purpose is to curb ideologies that extol racial discrimination, which, however, are punitively unreachable, since there was a failure by the legislator; the later the normative verification, the more tribulation justice will have to reorganize, so the culture will already be accommodated. The conclusive objective of this work is to warn the viewer that in case the law is not changed urgently, in the long term, hate groups will continue to expand and disseminate genocidal ideologies in a reckless way, and the possible impact they will have on society. This project was produced based on internet articles, government websites, informative magazines, opinions of legal operators and legal doctrines.
Keywords: Nazism. Criminal Law. Crime. Racism. Culture.
1. INTRODUÇÃO
É de conhecimento que o Holocausto foi um período histórico de maior truculência mundial durante a segunda guerra, responsável pelo extermínio de mais de onze milhões de pessoas por decorrência de raça, orientação sexual, religião, procedência nacional e condição genética, entretanto, mesmo sendo um período quase suprimido, restou-se as marcas da discriminação que tanto atrai grupos políticos de ódio com a prerrogativa de seguir as ideologias retrógradas e catastróficas na intenção de revivê-las.
Os tais grupos de ódio operam diretamente, na maioria dos casos, clandestinamente através de fóruns da internet, todavia, entende-se que o medo da exposição das ideologias nazifascistas esteja se perdendo com as novas ondas de políticas extremistas, através de discursos de ódio disfarçados de senso comum que atua de forma dissimulada com a intenção de atrair simpatizantes.
No Brasil, essa concepção de falácias que propagam o ódio de forma não deslavada vem abarrotadas de ataques à comunidade LGBTQIA+, pessoas pretas, nordestinas, indígenas, ciganas e sem-teto. A primeira ideia que amplia o crescimento de tais ideais é o uso da falácia do racismo inverso, concebido pela Ku Klux Klan**** , um dos discursos mais empregados por pessoas que deslegitimam a luta contra o racismo estrutural e todo seu contexto histórico.
O papel principal do opressor é retirar o foco daquilo que não te beneficia, do que não te protagoniza e do que vai contra seus privilégios, portanto, declarar tal falácia é uma tentativa de se apoderar do lugar das vítimas, e assim, aplicar de forma desesperada seus ideais fascismos.
Ao fim da hibernação, o neofascismo se expandiu no Brasil com o começo da Era Vargas, a principal forma de despolitizar causas sociais era alienando pessoas com falácias fantasmas da existência de ameaças advindas do esquerdismo radical centralizada pelo movimento comunista, e que seus maiores aliados seriam os ativistas das lutas antirracistas e antiLGBTQfobia, promovendo assim, um ataque direto a esses grupos.
Em 2020, o número de sites neonazistas aumentou gradativamente desde a início do mandato do governo atual, cerca de 204 páginas neonazistas surgiram durante o ano, segundo a organização não-governamental Safernet. A responsabilidade institucional advém do exibicionismo político recheado de falas ultradireitistas do atual presidente da república, que expõe sua demonização a comunidade LGBTQIA+, indígenas, grupos periféricos, ciganos e estrangeiros, que são tão bem vistas nos tais fóruns de exaltação à supremacia branca.
Ante da nova onda que dissemina a exterminação de grupos oprimidos, a jurisdição brasileira reconheceu a necessidade de implementar a lei de crimes raciais à fim de punir indivíduos que estejam diretamente envolvidos com a cultura racista, é o caso da implementação da Lei 7.716/89 (Lei Caó), que visa coibir a publicação de expressões discriminatórias, no entanto, há dúvidas sobre sua eficácia quanto a intenção de punir os determinados indivíduos neonazistas espalhados pela internet.
2. LEI 7.716/89
Formulada pelo advogado, militante e jornalista Carlos Alberto Caó de Oliveira, a Lei Caó tem como objetivo primordial combater crimes ligados diretamente com discriminação de oprimidos por conta da raça, cor, procedência nacional, religião e etnia, a necessidade da implementação deriva do número exorbitante de crimes de racismo no Brasil.
A Lei de Crime de Racismo é uma das leis mais importantes já implementada e favorável em relação aos direitos humanos, visto que à partir dela novas leis de proteção grupos sociais mais vulneráveis, a intenção é gerar uma reparação histórica de grupos oprimidos, todavia, dificilmente a lei consegue alcançar grupos mais vulneráveis, justamente por conta da omissão do judiciário e até mesmo o desconhecimento da lei.
É de amplo mérito ressaltar que há um hiato interpretativo entre injúria racial e crime de racismo, este que está presente nesta lei combate vários tipos de intolerância, não só contra raça, e a injúria racial se classifica como uma qualificadora do crime contra a honra, além de que afeta exclusivamente o indivíduo, este expresso no código penal em seu artigo 140 estabelece uma pena de 1 a 3 anos de reclusão, além de multa para as injúrias motivadas por elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem, ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.
A lei de crime de racismo, não vale somente para crimes contra raça ou etnia, a lei visa proteger e garantir direitos a todos os grupos determinados oprimidos durante a história, o que inclui a proteção de liberdade e dignidade de grupos que sofreram com a hierarquização e segregação, dentre eles, grupos religiosos e grupos ao que se refere a sexualidade e identidade de gênero.
Em 2019, o Supremo Tribunal Federal decidiu que houve omissão inconstitucional do Congresso Nacional por não incrementar a criminalização de atos referente a homofobia e transfobia, assim ampliando na Lei 7.716/89 a ADO 26. Diante do voto, esclareceu Ministro Alexandre de Moraes (2019):
Entende que todas as formas de homofobia e transfobia devem ser punidas com o mesmo rigor aplicado atualmente pela Lei de Racismo, sob pena de hierarquização de opressões, decorrente da punição mais severa de determinada opressão relativamente a outra.
Esclarece o Ministro Marco Aurélio (2019) que a tese estabelece que o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis.
Há contraposições sobre a lei que criminaliza atos racistas, ao tempo que poderá servir ao favor das minorias oprimidas, também trará oportunidade para que grupos radicais de ódio se aproveitem para se fortalecer na falácia do racismo reverso, logo que o artigo posiciona um papel de igualdade entre todos ao momento que a lei decide fazer jus a proteção de quaisquer raça, etnia, religião, orientação sexual, o que é uma inverdade, visto que a sociedade se constrói em uma hierarquização de classe e raça. Se existe uma necessidade de reparação histórica ao momento em que se cria uma lei específica, é necessário deixar esclarecido o contexto.
É fato que quando há debate referente ao racismo, automaticamente já se alcança o entendimento de quem é o oprimido, precisamente devido a história e aos algoritmos, contudo, há controvérsias que surgem com a tentativa de arquitetar lacunas, discutir falácias, reproduzir falsas notícias, e contrariar a justiça.
A verdade é que uma pessoa branca está isenta de sofrer racismo no Brasil, uma pessoa heterossexual jamais sofrerá preconceito por conta da sua orientação sexual e principalmente, ninguém no Brasil será caçado por seguir o cristianismo, por exemplo. A margem do preconceito consiste na instalação da cultura, daquilo que é costume e visto como comum, o que esteja fora dessa linha de observação não é tratado com normalidade. A longo prazo, a sociedade estará diante de um senso comum que nega a existência de opressão racial, os grupos de ódio se expandirão em proporções suficiente para reprimir quaisquer tipos de ativismo social.
3. INJÚRIA RACIAL
O crime de injúria racial, se caracteriza por ser uma qualificação de crime contra a honra, punindo violências que se direcionam a um indivíduo determinado, que podem vir associados de xingamentos, gestos, comportamentos expressivos ao que se referem desprezo e repulsa com a intenção de ofender a dignidade ou decoro de alguém, o crime poderá ser qualificado se a violência tiver sido gerada por decorrência de discriminação de cor, raça, religião, procedência nacional, sexualidade, identidade de gênero, além da possibilidade de aumento de 1/3 da pena caso a conduta dar-se por realizada em algum meio de rede social da rede de computadores.
De acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal, crimes de injúria racial não prescreverão, NUCCI (2005, p.571) bem afirma que, comparando-se singelamente a pena fixada em abstrato para a injúria preconceituosa e a pena fixada em abstrato para os outros crimes, há um teor de desproporcionalidade. Contudo (e é aqui que residem polêmicas), "há épocas em que o Estado se vê levado a punir de forma mais grave certas condutas, que estão atormentando mais severamente e com maior frequência a sociedade".
Em que pese o artigo, o próprio ainda demonstra desfoco da raiz do problema, que é resolver o vírus do racismo, pois, o mesmo ainda exige a representação da vítima, se tratando, assim, de um crime subjetivo, o que se deixa a relevar que racismo não é de responsabilidade do Estado e sim um problema exclusivamente do indivíduo.
Vários estragos o racismo já causou à humanidade em diversos lugares, muitas vezes impulsionando ao extermínio de milhares de seres humanos, a pretexto de serem seres inferiores, motivo pelo qual não mereceriam viver.
Da mesma forma que a Lei 7.716/89 estabelece várias figuras típicas de crime resultantes de preconceitos de raça de cor, não quer dizer, em nossa visão, que promova um rol exaustivo. Por isso, com o advento da Lei 9.459/97, introduzindo a denominada injúria racial, criou-se mais um delito no cenário do racismo, portanto, imprescritível, inafiançável e sujeito à pena de reclusão” (NUCCI, apud AREsp 686.965/DF).
4. A BANALIZAÇÃO DO DISCURSO DE ÓDIO
O acréscimo de número de casos de nazismo no Brasil é alarmante e preocupante, mas não para a sociedade em conjunto tampouco para o Estado, visto que a mídia não declara o assunto para o público, deixando o público a mercê de falta de informação, apenas usufruindo as ideologias políticas, e opiniões pessoais que colaboram com a disseminação criminosa de ideais que até então, o público acreditava que havia se extinguido há anos.
Espécie de caçadora de neonazistas brasileiros, a antropóloga Adriana Dias estima que atualmente existem 530 células (formadas por pessoas que estão no mesmo município). Em 2019, a especialista detectara 334, o que indica um aumento de 58%. Há duas décadas, quando a antropóloga começou a vasculhar sites e blogs e não se tinha ainda a dimensão que tomariam as redes sociais e a deep web (onde os neonazistas atuam com total impunidade), o número não passava de dez. A pesquisa feita na Unicamp é permanente, e no momento em que a entrevista foi feita, a acadêmica e sua equipe tinham em mãos 200 perfis de usuários neonazistas, que podem pertencer a novas células ou a alguma detectada anteriormente, de acordo com o jornal OGLOBO.
Diretor-presidente e fundador da SaferNet Brasil, ONG focada há uma década e meia no estudo do discurso de ódio no país, Thiago Tavares também tem números preocupantes. Em 2019, foram recebidas e processadas 1.071 denúncias anônimas de neonazismo, envolvendo 544 páginas, das quais 212 foram removidas. Em 2020, foram 9.004 denúncias anônimas e 3.884 páginas, das quais 1.659 foram removidas.
“A radicalização do discurso político tem legitimado e empoderado células extremistas que atuam principalmente na região Sul do país e amplificado o ódio, o preconceito e a intolerância contra quem pensa diferente” (TAVARES, 2020). O nazismo é um assunto atual, crescente e preocupante, o Estado necessita tomar medidas cabíveis para evitar que a história se repita, o judiciário precisa mostrar preocupação.
O discurso de ódio também se torna responsável pela violência contra a comunidade LGBTQIA+, de acordo com a ONG, nos últimos 12 anos, a organização recebeu mais de 2 milhões de denúncias de discurso de ódio nas redes contra LGBT+, mulheres, pessoas negras e outros grupos. A série histórica divulgada, que traz dados coletados entre 2006 e 2017, mostra que denúncias de homofobia online totalizaram 134.832 casos nesse período.
Entre as pessoas que sofreram violência, quando se analisa, as identidades da sigla LGBT+, as pessoas pansexuais e bissexuais, segundo a pesquisa, foram as que mais relataram ter sofrido perseguição ou agressões nas redes sociais, 48% e 41%, respectivamente. Em seguida, lésbicas (37%), gays (31%) e heterossexuais (14%) – sendo este último referente às pessoas transgêneros que são heterossexuais. E quando se observa a raça dos que sofreram perseguição ou ameaça nas redes, a maioria dos relatos foram de pessoas negras, 53%. (VIOLENCIALGBT, 2021)
Não só no Brasil, como no exterior, a incidência no número de casos de grupos terroristas neonazistas crescem gradativamente, os acontecimentos mais recentes que vieram a ocorrer devido a guerra geopolítica entre o governo russo e ucraniano, foi a expansão midiática do exército neonazista ucraniano que se mostra grande e explícito, o que ocorre é o desfoque desses grupos, além da própria mídia pacificar e vitimizar, diminuindo a problemática e forçando indiretamente uma colaboração da sociedade para com os batalhões. Dessa forma, todos os outros países, incluindo o Brasil vem mantendo apoio financeiro e financiando tal exército, sem reconhecer suas ideologias.
Em uma observação dada pelo analista político Nicholas Rackers, esclareceu que o governo ucraniano entre os anos de 2014 a 2019, proclamou uma lei que também proibia a disseminação de símbolos nazistas e comunistas, porém, como no Brasil, é igualmente ineficaz.
5. OS DIREITOS HUMANOS
Os direitos humanos resguardam os direitos de liberdade e dignidade do indivíduo, o que vale ressaltar a liberdade de expressão, contudo, esse direito fora ressignificado por pessoas que acreditam que a liberdade de expressar é se despejar o ódio, discriminar pessoas e grupos sociais. Vê-se muito falar sobre ir contra a orientação sexual que fuja da heteronormatividade, com o pretexto de ir contra os valores morais desse indivíduo, porém, o direito de outrem é ferido, visto que quando se trata de orientação sexual e identidade de gênero, entende-se que se aborda sobre a essência humana, aquilo que corresponde pelo que o indivíduo é em 100% do tempo.
Outra forma tem sido utilizada para pautar sobre identidade de gênero, é a utilização errônea da nomenclatura “ideologia de gênero”, a identidade nada mais é da forma que o indivíduo queira ser visto perante a sociedade, que se diferencia do sexo biológico, este que resume a biologia do corpo humano em sua natureza reprodutiva, com a soma dos cromossomos, podendo fazer nascer um humano macho, fêmea ou intersexo, já o gênero, consiste numa construção social onde um indivíduo se identifica dentro deste contexto de sociedade.
Uma pessoa transgênero é uma pessoa que se identifica com um gênero na qual não foi designado através do nascimento com vida, já uma pessoa cis, se identifica com o gênero na qual foi designado a ela no nascimento.
Compete ao Estado legislar sobre o pluralismo de ideias, a liberdade de ensinar, aprender e divulgar o pensamento cultural sobre assuntos que não impeça o direito de existir de grupos sociais oprimidos, dessa forma, ninguém deverá exceder a liberdade de expressão e discriminar ou censurar qualquer meio que seja utilizado para incluir esses grupos. A verdade é que cidadãos preconceituosos querem ter o direito de tomar uma hierarquização e tomar o poder sobre seus pensamentos sem necessitar da penetração do Estado, almejando fugir de suas responsabilidades civis.
Os direitos humanos têm como foco, alcançar direitos e a dignidade de pessoas vulneráveis, que ao decorrer da história, sofreram com tanta repressão, tornando-se minorias que deviam viver escondidas com o medo da violência, dessa forma a constituição vem com o intuito de impor o dever e a obrigação de respeitar a dignidade destes.
No âmbito internacional, a Convenção Americana de Direitos Humanos demonstra sua importância para o contexto da restrição à liberdade de expressão frente as manifestações de ódio em seu artigo 13, § 7º, o qual determina que a lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.
No Brasil, ainda estamos dando os primeiros passos para a consolidação de uma responsabilização dos propagadores dos discursos de ódio. Devido à isso, não há uma legislação firme e concreta que preveja sanções específicas para esses casos.
Como proclamado pelo ministro Celso de Mello (2017), todos os indivíduos são iguais, são sujeitos sociais únicos com as mesmas condições. Sendo que casos como os elucidados negam a carga cultural e identitária do sujeito, propiciando a naturalização da discriminação e da violência. Nesse sentido, o temor perante a ausência de normas específicas frente as demandas por ações positivas do Estado, surgem à passos iguais a vitimização da liberdade, como esclarece Manuel Castells (2003):
A liberdade de expressão era a essência do direito à comunicação na época em que a maior parte das atividades diárias não era relacionada na esfera pública. Mas em nosso tempo, uma proporção significativa da vida cotidiana, inclusive o trabalho, lazer, a interação pessoal, tem lugar na Net. [...] O aspecto mais atemorizante e, de fato, a ausência de regras explícitas de comportamento, de previsibilidade das consequências de nosso comportamento exposto, segundo os contextos de interpretação, e de acordo com os critérios usados para julgar nosso comportamento por uma variedade de atores atrás da tela de nossa casa de vidro.
Deve-se partir da premissa de que as violações aos direitos assegurados na Magna Carta podem decorrer da inércia do Estado, exigindo, assim, ações positivas deste para que, diante das ameaças aos valores humanitários, possa-se viabilizar as condições necessárias para que todos desfrutem do adequado exercício dos direitos civis.
Portanto, devem ser considerados todos os mecanismos, sejam eles internacionais ou dispostos na Constituição Cidadã, para poder-se restringir a atuação e disseminação do discurso de ódio. Isto, atrelado aos parâmetros de intensidade, ofensividade e severidade das imputações, conforme o caso em concreto, pois busca-se não apenas uma punição aos infratores, mas a possibilidade para que todos sejam livres e atuem de forma harmoniosa com o ordenamento jurídico.
6. DIVULGAÇÃO DE NAZISMO
O parágrafo 1º do artigo 20 da lei de racismo tem por principal fornecimento punir os crimes de divulgação de nazismo, no que se refere a fabricar, comercializar, distribuir ou veicular, símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Há qualificadora no caso de divulgação por intermédio dos meios de comunicação social de qualquer natureza.
Como promulga o código penal, o crime existente é alusivo à divulgação de símbolos nazistas, excepcionalmente, por se tratar de um crime de tipo subjetivo de dolo, ou seja, é necessária exprimir a vontade de divulgar os símbolos referente a suástica para que haja um ato ilícito. O estorvo da produção do artigo, que aliás, é o escopo deste projeto, é criticar a fragilidade normativa no qual admite a impunidade entre simpatizantes nazistas que se aproveitam da simplicidade da lei ao espalhar seus discursos, suas falácias, desenvolvendo um senso crítico de pessoas comuns que sejam de acordo com suas ideias arcaicas e perversas, desta forma, a justiça tende a dar liberdade para esse tipo de expressão, ainda que de forma indireta.
O crime de apologia ao nazismo já foi objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus n° 82.424/2003, julgando o editor Siegfriend Ellwanger que fora condenado pela prática de racismo após publicar diversos livros que negou o genocídio de Judeus e todo o período do Holocausto.
É corriqueiro se deparar com ajuizamentos absolvidos onde houve a expressa pretensão de disseminar ideais nazistas. Há dois casos recentes onde a justiça permaneceu conivente, o primeiro caso ocorreu na cidade de Itajaí em 2014, onde dois simpatizantes do regime colaram cartazes pela cidade com a figura de Adolf Hitler, ditador do Terceiro Reich, com os dizeres "Heróis não morrem. Parabéns, Führer", relembrando o aniversário do ditador nazista.
No mesmo mês, um dos jovens divulgou uma foto em uma rede social juntamente com o emblema da suástica, de acordo com o juiz do caso, Augusto Cesar Allet Aguiar, "não há demonstração alguma de que os réus estivessem incitando o nazismo”, seu segundo posicionamento sobre a publicação declarou que ela atingiu poucas pessoas e que não seria possível extrair nenhuma delas apologia ou incitação ao nazismo, porque não havia comentários deste tipo.
O segundo caso criminoso que ocorreu ainda neste ano (2021) onde um jovem de 17 anos com o uso de uma suástica estampada no braço, entrou em um shopping de Caruaru onde ele foi expulso pelos seguranças. Um cidadão que estava presente decidiu abrir uma queixa-crime, entretanto, há dúvidas sobre o paradeiro e muito provavelmente, não surtirá penalização sobre o jovem, já que a lei, por sua vez, não tipifica a mera utilização de símbolos nazistas, mesmo que publicamente.
O jovem ao momento que era gravado durante a abordagem do segurança deixou claro que estava sob proteção da sua liberdade de expressão, contudo, em que pese a atipicidade da conduta, a constituição deixa de forma clara que toda liberdade de expressão deva ser limitada, em seu art. 3°, inciso IV, estabelece como um objetivo fundamental da república “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação". Um indivíduo excederá no uso da sua liberdade de expressão ao momento que ferir o direito de vida de outro indivíduo.
Há ainda outro caso recente onde um apresentador de um podcast defendeu a criação de um partido nazista no Brasil, alegando que se fazia uso da sua liberdade de expressão, no entanto, não houve punição, visto que não atingiu os requisitos legais do parágrafo 1º do artigo 20. Entre os três casos citados, tanto a justiça, quanto a legislação, se mostram despreocupadas com a onda da disseminação do nazismo no país.
O autor Marchesi aponta:
[...]De fato, o nazismo só passa a ser relevante ao Direito Penal, quando este violar o bem jurídico da igualdade em um contexto discriminante. [...]Não obstante, ora a norma é demasiadamente restrita (utilizando-se da vinculação à suástica), ora ela é excessivamente ampliativa (ao tipificar toda divulgação do nazismo), o que evidencia a falha técnica em sua redação (2015, p.139)
Em outras palavras, a absolvição dos exemplos citados se dá por conta do não cabimento da interpretação extensiva em situações em que o dispositivo é construído de modo restritivo, como aponta Capez (2012), que torna evidente a falha normativa. Essa neutralidade advém daquilo que deveria ser considerado justiça, oferece consentimento para que neonazistas saiam de suas zonas clandestinas, se misturem com pessoas comuns, alastrem suas ideias que eximem superioridade, genocídio e discriminação, para acarretar a exclusão de minorias, que por fim, gerarão mortes em massa, nutrindo uma cultura que atrapalhará soluções futuras.
"A ausência de prescrição nos crimes de racismo justifica-se como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã, para que se impeça a reinstaurarão de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admite." (LEONARDO SILVA, 2020 apud BRASIL, 2020)
Dado o exposto, observa-se uma omissão tanto do poder legislativo, quanto do judiciário ante a legislação ao que se trata sobre apologia ao nazismo, apresentando que a norma prescreve o tipo subjetivo do dolo referente a fabricação, distribuição e veiculação por qualquer meio, emblemas e símbolos que propagam somente a cruz suástica ou gamada.
7. PROJETOS DE LEI
Diante do grande crescimento midiático referente ao tema, projetos de inclusão de leis vêm tramitando no congresso, o primeiro deles que se identifica por Projeto de Lei 254/22, tem a intenção de criminalizar a conduta de acusar alguém por atitudes nazistas, o que demonstra completo retrocesso no quesito de liberdade de expressão, visto que o alvo é aumentar a voz dos disseminadores de ódio diminuindo a probabilidade de penalização. A deputada responsável pelo projeto ainda alega que os brasileiros devem ter a liberdade de manifestar opiniões e pensamentos sem que sejam taxados em massa como, bem como ela entende que certas opiniões são apenas divergências do senso comum. Alegações desta maneira evidenciam o comportamento persuasivo de como o interesse é disseminar opiniões que ferem os direitos de classes e raças sem que exista uma penalização por tais comportamentos.
Em razão do caso do influencer que defendeu o nazismo publicamente, outra lei vem tramitando no congresso, a intenção é tipificar o crime que está previsto na Lei 7.716/1989, que prevê pena de três a seis anos de reclusão e multa para quem defende, cultua, ou enaltece o nazismo, ou ainda negar o holocausto e aprovar o acontecimento histórico, a ideia do projeto é liderado na bancada feminina por Simone Tebet do MDB de Mato Grosso do Sul.
A mera utilização dos símbolos que não sejam exclusivamente a suástica, mas que continuam enaltecendo o nazismo, ou figuras que enalteçam líderes e ideais nazistas são considerados, de acordo com a norma brasileira, atípicos, sem sujeição de penalidade, advertindo que existem demasiados objetos que representam a política de discriminação, todavia, punitivamente inalcançáveis segundo a lei, pois a lei não criminaliza a conduta da apologia de forma efetiva, e sim a divulgação.
8. CONCLUSÃO
Conclui-se, então, a necessidade de uma correção normativa que tipifique, de forma ampla, a punição de diversas condutas, e que suspenda a interpretação restritiva, averiguando atos que sejam correlacionados com quaisquer símbolos, figuras ou frases que tenham por finalidade a exaltação do idealismo neonazista, negar a história, exaltar o holocausto e toda ideia que suceda dele, é imprescindível combater a cultura e não apenas ignorá-la.
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****Ku Klux Klan: Grupo supremacista branco fundado em 1865 nos EUA, que tinham como idealismo, o extermínio de pessoas pretas e minorias sociais
Bacharelando do curso de Direito do Centro Universitário de Santa Fé do Sul/SP, UNIFUNEC
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERRAZ, Isabela. A ineficácia da lei de divulgação de nazismo: os possíveis impactos a longo prazo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 jun 2022, 04:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58640/a-ineficcia-da-lei-de-divulgao-de-nazismo-os-possveis-impactos-a-longo-prazo. Acesso em: 22 nov 2024.
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