RESUMO: Este artigo propõe discutir quanto à possibilidade do julgador considerar as condutas processuais dos sujeitos litigantes, inclusive de seus advogados, ao proferir a sua decisão final quanto ao mérito da demanda. Com esta análise, buscamos discutir se a conduta dos sujeitos litigantes durante o processo pode ser considerada como meio prova para formação do convencimento do juiz ou se constitui apenas como prova indiciária.
Palavras-chaves: Provas. Conduta Processual. Meio de Prova. Prova Indiciária.
ABSTRACT: This paper proposes to discuss the possibility of the judge, considering the civil procedure conduct of the parties, specially of Parties’ attorneys, to render a final decision on the merits. From this analysis, we look forward to discuss if the civil procedure conduct of the parties during the lawsuit can be considered as evidence itself to influence directly the judge’s conviction or if should be considered only as circumstantial evidence.
Keywords: Evidences. Civil Procedure Conduct. Means of evidence. Circumstantial Evidence.
Sumário: 1. Introdução e Relevância do Tema. 2. Noções Introdutórias Quanto à Finalidade da Prova e sua Definição. 3. Obrigatoriedade de Colaboração para Elucidação de Fato Controvertido. 4. Conduta Processual Como Meio de Prova. 5. Considerações Finais.
1.Introdução e Relevância do Tema.
Este artigo busca estudar a possibilidade de os juízes considerarem a conduta processual[1] dos sujeitos que participam dos processos judiciais como meio de prova. Considerando ser o processo o meio de obtenção de justiça[2], os atos praticados durante sua tramitação, pelos sujeitos litigantes e seus advogados, nos parece que podem ser considerados per si pelo juiz para formação de seu convencimento.
A discussão deste tema não é novidade na academia[3], especialmente na literatura estrangeira, como se observará. Ainda nos anos 1970, a Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul publicou texto do juiz Ney Ahrends[4], no qual defendeu-se a necessidade do juiz considerar, em seu convencimento, a conduta processual das partes e seus advogados, posto que “não raro o comportamento assume relevo, depois do estudo e análise de alegações e peças produzidas nos autos, mesmo sem caráter de confissão, sempre que as circunstâncias apontem benefício ou vantagem em favor do adversário”.
Todavia, a despeito de expressivos nomes na seara do direito processual civil já terem enfrentado o tema, não nos parece exauridas as discussões e ainda muito se pode contribuir e questionar[5], sobretudo considerando os raros casos que observamos a aplicação desta técnica (conduta processual como meio de prova).
Além disso, em corriqueiras oportunidades, as provas diretas, produzidas por meio de documentos e depoimentos, não permitem a extração da veracidade das afirmações realizadas pelas partes e, mesmo nestas situações, não se observa a utilização de tal técnica. Oportuno, assim, melhor analisarmos este assunto, afinal “el hombre no juzga nunca sin constatar el juicio con las pruebas”[6].
Nas situações práticas em que juízes se deparam com a dificuldade de formar seu convencimento pelas vias ordinárias há de ser criativo, fechar os olhos ao conservadorismo e apontar a atenção aos demais elementos do processo, como a conduta processual dos sujeitos litigantes e seus advogados durante o iter processual. É este, portanto, o objetivo deste trabalho.
Com a finalidade de corroborarmos a possibilidade de considerar a conduta processual como meio de prova, inicialmente é preciso estabelecer algumas premissas quanto ao conceito de prova e sua finalidade no processo; em seguida, passamos a expor o dever de colaboração de todos aqueles que participam do processo para elucidação dos fatos sub judice. É necessário, a nosso ver, trilhar este caminho[7] para se chegar ao cerne da questão e as constatações finais propostas: a absoluta admissibilidade da conduta processual das partes ser considerada como meio de prova.
2.Noções Introdutórias Quanto à Finalidade da Prova e sua Definição[8].
A prova não serve para reconstruir um fato pretérito, tampouco para se descobrir a verdade absoluta[9]. Imperioso que se abandone tal utopia.
Isto porque, para que se possa afirmar que a verdade de certo fato restou constatada, deve ser possível, de igual modo, asseverar que atingiu-se a única possibilidade da forma de que determinado fato ocorreu, não sendo cabível admitir qualquer outra alternativa, por mais remota que seja[10]. Isto não é possível no mundo real, na medida em que jamais poderá se afirmar que se desvendou à única hipótese da ocorrência dos fatos em análise. Necessário, assim, encarar a realidade, por mais severa que possa ser.
Não obstante, importante considerar que no exercício de reconstrução de um fato pretérito não há como se eliminar os elementos subjetivos dos sujeitos que participarão desta atividade. Com efeito, Marinoni e Arenhart[11] pontuam que quando se busca a reconstrução de fatos é impossível a não alteração de seu conteúdo, pois é inconscientemente adicionado “um toque pessoal que distorce a realidade”. Logo, ao reconstruir os fatos, o resultado final pode refletir a cenário distinto considerando a incidência de elementos subjetivos.
Assim, reafirmamos não ser possível pensar em um processo judicial que, diante de determinada situação fática controvertida, apresente uma decisão final como verdade absoluta quanto à reconstrução de fatos passados. Contrariamente, o que se pode imaginar é uma solução final que reflete, diante desta situação fática controvertida, o que provavelmente ocorreu. E, para estimativa desta probabilidade, serve o processo por meio da fase postulatória e, sobretudo, instrutória.
Nem mesmo com a produção das provas se atingirá a certeza do que se sucedeu. Ora, exemplo clássico seria o exame de DNA, afinal se trata de um exame técnico, porém que garante tão somente 99,999% de certeza[12], isto é, reflete uma elevadíssima probabilidade, mas não certeza.
Afirmamos, assim, que a prova é o meio empregado para se demonstrar concretamente a probabilidade de veracidade daquilo que é afirmado; e, o destinatário final[13] – o juiz – a partir da produção desta prova e dos demais elementos dos autos formará seu convencimento, estimando e explicando motivadamente as razões que levaram a entender da probabilidade daquele fato ser verdade[14].
Em outros termos, chega-se ao ponto máximo da verossimilhança, ao menos considerando os meios disponíveis ao julgador, a partir da qual pode se afirmar que há uma certeza subjetiva da ocorrência daquele fato[15], cuja solução final é legitimada pelo procedimento que a antecedeu[16].
Portanto, os jurisdicionados precisam se conformar que, considerando a distribuição dos ônus probatórios, ao fim da fase cognitiva, o pronunciamento final é a verdade refletida no processo e juridicamente capaz de fundamentá-lo[17], muito embora não seja a verdade absoluta (ou a única) sobre a situação fática controvertida.
Bem assim, concluímos que finalidade da prova é servir como elemento de argumentação e retórica explorado pela parte para convencer o Estado-juiz da probabilidade de veracidade quanto às suas afirmações e impugnadas pela parte adversa.
Pois bem, uma vez constatada o objeto da prova, a conceituamos[18] como o meio pelo qual se produz e demonstra ao Estado-Juiz a probabilidade de veracidade da afirmação fática controvertida[19]. Há inúmeras conceituações clássicas a respeito da prova, contudo, como observado por Marinoni e Arenhart, a grande maioria referem-se a reconstrução de um fato antecedente ou “à verificação desse fato, gerando no juiz a convicção de certeza sobre sua efetiva ocorrência” [20].
De tal modo, não nos parece eficaz e produtivo trazer neste estudo tais definições. Por sua vez, o que merece ser compreendido é o fato de a prova ser o meio previsto em lei ou moralmente legítimo[21], com cunho retórico, empregado pela parte para convencer o julgador acerca da probabilidade de veracidade da ocorrência do fato afirmado em determinado processo e impugnado pela parte adversa.
Uma vez estabelecido o conceito e a finalidade da prova, possível prosseguir para a análise do dever (ou não) dos sujeitos litigantes colaborarem para a elucidação destes fatos controvertidos.
3.Obrigatoriedade de Colaboração para Elucidação de Fato Controvertido.
Não se ignora que alguns dispositivos do vigente CPC possuem redação que podem gerar interpretações antagônicas pelos operadores do direito, porém não é este o caso dos arts. 14, II; 77 e 379. Uma leitura de tais artigos, especialmente se realizada em conjunto com outras disposições do Código, permite afirmarmos que todos aqueles, sejam os sujeitos litigantes ou terceiros, que possam contribuir para o deslinde de determinada situação fática controvertida devem assim fazer. Em outros termos, o Legislador impôs o dever passivo de colaboração[22].
Não se trata, ressalta-se, de uma recomendação ou sugestão de que a parte e o terceiro colaborem[23], mas de uma imposição, isto é, um dever[24] e [25]. Tanto é assim que, em caso de violação, o ordenamento positiva sanções aplicáveis (e.g.: multa por ato de litigância de má-fé[26]).
Ora, se há sanções processuais pela conduta não colaborativa, se trata de obrigação imposta aos sujeitos processuais para terem uma conduta colaborativa. Afinal, qual o sentido de o Estado ter o monopólio da jurisdição e ser conivente com condutas que impeçam a efetiva prestação da tutela jurisdicional[27]? Não há como se admitir quaisquer embaraços criados, independente de quem o faz, para a entrega do direito tutelado.
Assim sendo, denota-se que o dever de colaborar com a elucidação dos fatos controvertidos e jamais alterar a verdade destes deve ser encarado com muita seriedade e cautela por aqueles que participam de processos judiciais, sobretudo as partes[28].
Prova disto é o fato de que, muito embora o réu tenha o dever de impugnar especificamente as afirmações realizadas na petição inicial (art. 341), o inciso II, do art. 77 do CPC, expressamente proíbe a apresentação de “defesa quando cientes de que são destituídas de fundamento”. Evidentemente, o Legislador não poderia impor ao réu a obrigação de afirmar que o pedido do autor merece acolhimento, sob o argumento da obrigação de colaboração para elucidação dos fatos controvertidos, mas, de igual modo, não poderia admitir o réu faltar com a verdade. A solução encontrada é a possibilidade de não impugnação pelo réu de tais fatos, os quais serão presumidos como verídicos.
Esta constatação é de muita relevância. O CPC inequivocamente apresenta disposições que revelam a preocupação do legislador com a obrigatoriedade de todos os sujeitos processuais colaborarem para a elucidação dos fatos controvertidos e, se esta colaboração significar a confissão ou de alguma forma corroborar o pleito autoral, possibilita-se, até mesmo, o silêncio, mas jamais a mentira ou alteração da verdade[29] e [30]. De outra forma não poderia ser.
A Legislação Processual impõe sanções quando ocorre a violação da obrigação de colaboração, sendo que estas podem ser desde uma punição pecuniária, como a presunção da veracidade do fato afirmado[31]. Logo, nota-se a importância dessa obrigatoriedade de colaboração em matéria probatória, que pode influenciar diretamente na decisão final.
Entretanto, o que nos intriga não são as clássicas hipóteses de que a conduta processual pode conduzir ao reconhecimento da pretensão, mas sim a possibilidade de se considerar o comportamento processual como meio de prova, o que analisaremos a seguir.
4.A Conduta Processual das Partes Como Meio de Prova.
Restou evidenciado que a conduta daqueles que participam dos processos judiciais, especialmente das partes, é de absoluta importância, na medida em que, a depender da forma de agir, a solução final poderá ser contrária aos interesses daquele que viola a imposição de colaboração[32]. Não é admissível a cumplicidade do Estado em não coibir veemente sujeitos que participam do processos e faltam com a verdade ou agem com deslealdade[33].
Tanto é assim que, o Código[34], por sua vez, cuida de algumas situações que esta conduta gera uma presunção de veracidade, afinal não há, repisa-se, como aceitar um instrumento estatal, cuja função é a tutela dos direitos dos jurisdicionados, admitir condutas que não reflitam a boa-fé e a lealdade processual.
Assim, podemos afirmar, sem receio, que o Legislador se preocupou em vigiar e punir comportamentos processuais que violam a boa-fé, a lealdade e cooperação. Não se olvida, no entanto, a legitimidade do pleno exercício do contraditório e ampla defesa, mas isto não se sobrepõe o dever de lealdade processual[35] e [36].
Contudo, o que chama nossa atenção, como dito, é a possibilidade de o juiz considerar a conduta processual das partes como meio de convencimento. Antes, porém, vejamos o devido valor probatório do comportamento processual das partes.
4.1 A Valoração Probatória da Conduta Processual das Partes.
O CPC, ao contrário do direito estrangeiro[37], não dispõe expressamente acerca da valoração da conduta processual das partes, mas também não o proíbe. Pelo contrário, nota-se o tratamento, indiretamente, ao possibilitar que o juiz forme seu convencimento pela conduta (ação ou omissão) dos sujeitos processuais.
Vejamos, para exemplificar, a hipótese de recusa do réu em se submeter ao exame de DNA em ação de investigação de paternidade. O sistema brasileiro permite o julgador concluir [presumir como verdadeiro], através desta conduta processual do réu, que a pretensão do autor merece acolhimento[38].
Ou seja, a legislação processual permite que o julgador entenda não ter o réu argumentos e/ou provas razoáveis para impugnar os fatos apresentados pela parte autora[39]. Afinal, se o réu atua de forma a proporcionar o grau máximo de probabilidade da veracidade (ou não) da afirmação de fato do autor, mostra-se absolutamente escorreita a imposição do sistema, no exemplo proposto, que o juiz assuma serem verdadeiros os fatos alegados pelo autor[40].
Bem assim, se a conduta processual da parte pode influenciar diretamente no convencimento do juiz acerca da veracidade do fato afirmado, não parece ser possível defender a existência de uma limitação de valoração probatória com relação a esta conduta. Isto se dá, segundo pensamos, por três principais razões.
Primeiramente, o CPC admitiu o sistema probatório de livre convencimento motivado, ou seja, o juiz pode avaliar ilimitadamente as provas produzidas[41], sendo necessário, no entanto, que motive as razões que levaram a seu convencimento final. Ademais, neste sistema, não há hierarquia entre as espécies típicas de provas, tampouco em sua valoração[42]. Bem assim, não há óbice para a conduta processual das partes ser considerada livremente no convencimento final do juiz desde que esclareça as razões que levaram a decidir daquela maneira.
A segunda razão é extraída da leitura do art. 369 do CPC, posto que se nota o encaixe perfeito da conduta processual das partes na disposição legal[43]. Afinal, trata-se de meio moralmente legítimo, a despeito de não especificado no Código, pode servir para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Finalmente, outro motivo que sustenta nossa posição é, como visto, o fato do CPC priorizar o dever de lealdade e cooperação processual de todos os sujeitos processuais, inclusive das partes, não admitindo afirmações mentirosas ou atos de má-fé.
A conduta processual das partes pode influenciar diretamente e de forma ilimitada, salvo exceções, no convencimento do magistrado, que motivará as suas razões de decidir, inclusive esclarecendo sua conclusão final fundamentado no agir (ou omissão) das partes – e seus advogados – durante a marcha processual.
Na medida em que compreendida e corroborada a admissibilidade de o juiz extrair argumentos de prova a partir da conduta das partes, cabe verificar, como provocado por Gorla[44], se este comportamento se caracteriza como meio de prova ou, de fato, mero elemento valorativo.
4.2 A Conduta Processual das Partes Como Meio de Prova.
A grande maioria dos processualistas, clássicos e contemporâneos, defende ser a conduta processual das partes como elemento de valoração da prova, mas não como fonte de prova[45]. Isto porque, o julgador deve considerar o comportamento processual apenas indiretamente, como mero indício, não podendo considerá-lo como meio exclusivo para formar sua convicção.
Em outros termos, segundo esta corrente, a conduta adotada pelos sujeitos processuais se constitui como indício, mas, conforme William Santos Ferreira esclarece, a formação do convencimento do juiz “dependerá de um raciocínio, com outros elementos sendo considerados, para se chegar ao fato desconhecido, o que, em última análise, é uma presunção hominis, com incidência das máximas de experiência”[46]. Discordamos parcialmente deste entendimento.
Darci Ribeiro, de forma inédita, ao que parece, defende a possibilidade da conduta processual das partes assumir a figura de meio de prova, desde que se verifique um ato desleal ou violação ao dever de dizer a verdade[47]. Segundo o processualista[48], isto ocorre no caso de responsabilidade do sujeito processual que falta com a verdade, pois “a conduta da parte é fonte primordial da prova” deixando de ser, portanto, “mero elemento indiciário de prova”, posto que nenhuma outra prova, típica ou atípica, poderia convencer quanto à probabilidade de veracidade da afirmação de que tal litigante agiu com má-fé. E, o processualista continua, “o fato gerador da obrigação é o comportamento da parte e o convencimento do juiz”. É aqui que reside a divergência com a doutrina predominante.
A interpretação proposta pelo processualista é precisa. A conduta processual não deve, em toda situação, ser encarada como mero elemento de valoração de prova, isto é, não há óbice de ser considerada como fundamento principal e exclusivo para convencimento do juiz, como defendem a maior parte dos estudiosos.
Pensemos, a título hipotético, nas situações em que o juiz tem contato direto com as partes e seus advogados[49]. Os magistrados, especialmente aqueles com mais experiência, podem extrair, nestas oportunidades, condutas inconscientes que podem fundamentar diretamente seu convencimento, como a forma de falar (sempre considerando o costumeiro nervosismo das pessoas que participam de audiências), desvio de olhar aos advogados ou insegurança de encarar “olho-a-olho”[50]. Note-se que estes elementos podem formar diretamente o convencimento do juiz, sem a necessidade, ressalta-se, de um exercício racional, tomando em conta outros elementos, para se chegar a conclusão de fato ainda desconhecido.
Não verificamos, salvo melhor juízo, respaldo razoável para se sustentar a resistência em aceitar, portanto, a conduta como meio de prova e não apenas e sempre como elementos indiciários.
Defendemos, assim, a depender do fato controvertido concreto e de forma muito bem fundamentada, a absoluta admissibilidade do juiz tratar a conduta processual das partes como meio de prova. Não vemos qualquer vedação legal para tanto. Pelo contrário. Imprescindível que a conduta das partes seja vista pelos juízes como meio de prova para formar seu convencimento quanto ao(s) fato(s) controvertido(s), que motivará sua decisão, à luz do preceituado pelo art. 371 do CPC.
Como dito, em determinadas situações não se pode atingir o mesmo convencimento, por qualquer outro meio de prova, exceto pela conduta processual das partes. Limitar o comportamento das partes como prova indiciária é criar embaraço desnecessário e repugnado pelo vigente Código. Imprescindível, como defendemos, sua admissão como meio de prova[51].
Uma questão final que guarda importância é analisar se a conduta processual como meio de prova exige que tenha sido esta praticada pessoalmente pela parte ou poderia ser considerado o modo de agir de seu(s) advogado(s). A partir da premissa de que os advogados das partes atuam em juízo de acordo com os interesses de seus clientes, não pensamos se caracterizar como exceção à regra defendida.
Com efeito, a conduta processual do advogado evidentemente é reflexo do que o representado no processo perquire, podendo, portanto, ser absolutamente considerada como meio de formação fundamental do convencimento do juiz a depender da situação concreta[52]. Sob este aspecto, cabe relembra que Gorla[53] escorreitamente já defendia, com fundamento no “princípio da responsabilidade pela escolha do defensor”, a necessidade de o representado suportar as consequências em decorrência da atuação de seu advogado.
De tal modo, a partir destas provocações, seja a conduta processual da parte[54], seja de seu advogado, este modo de agir ou omitir pode servir como meio de prova.
5.Considerações Finais.
Diante do quanto exposto, esperamos que tenhamos despertado atenção quanto à importância e relevância do tema, que há décadas é debatido entre processualistas de indubitável envergadura, mas ainda pouco explorado pelos operadores do direito, seja por desconfiança ou insegurança. Com efeito, o que observamos na prática, limita-se, de fato, as hipóteses em que o Legislador tomou para si a responsabilidade e positivou as situações em que a conduta processual pode ser considerada per si como meio de prova para convencimento do juiz que bastará fundamentar nesse sentido através da presunção de veracidade. Defendemos a admissibilidade de ir além.
Propusemos, como premissa fundamental, a necessidade de se abandonar a utópica noção de que as provas servem para reconstrução de fatos ocorridos no passado ou, ainda mais ingenuamente, para se descobrir a verdade do que ocorreu. Isto é impossível.
A nosso ver, como dito, a prova serve como elemento de argumentação e retórica empregado pela parte litigante para convencer o Juiz da probabilidade de veracidade quanto às afirmações fáticas realizadas e controvertidas. Apenas para isto.
Na medida em que a finalidade da prova é esta demonstração de probabilidade, buscamos suscitar e demonstrar que o CPC impôs aos sujeitos processuais (partes, advogados e terceiros) um dever de colaboração e lealdade processual para elucidação dos fatos controvertidos trazidos ao Poder Judiciário. Ressalta-se, trata-se de um dever e, assim sendo, não há outra escolha senão o cumprimento de tal ordem, sob pena de arcar com a responsabilidade desta conduta.
A partir de tal constatação, objetivamos destacar algumas situações em que a conduta processual das partes influi diretamente no convencimento do julgador – a partir de uma presunção de veracidade. Mas não paramos por aí. Necessário, a nosso ver, o entendimento de que a conduta processual das partes ou de seus advogados possa ser considerada como meio de convencimento dos juízes e não como elemento indiciário.
Antes de ingressarmos em tal seara, mostramos a impossibilidade de limitação à valoração probatória da conduta processual das partes, seja (i) pela adoção no Brasil do sistema de livre convencimento motivado; (ii) pelo fato de a conduta processual enquadrar-se, sem dúvidas, nos pressupostos trazidos pelo art. 369 do CPC; ou ainda (iii) pela obrigatoriedade dos sujeitos processuais agirem de acordo com a boa-fé; e lealdade e cooperação processual, sob pena de serem responsabilizados em caso de violação.
A partir da elucidação destes pontos, finalmente, chegou-se ao cerne da questão, qual seja, a admissibilidade de considerar a conduta processual das partes como meio de prova e deixar de lado, destarte, a noção de que apenas pode servir como prova indiciária. Afinal, não é difícil pensarmos em hipóteses, nas quais a conduta processual é a melhor das provas para fundamentar o convencimento do juiz; e, uma vez inexistindo vedação legal, não vislumbramos razão para a proibição ou crítica de que pode servir como meio de prova. Afinal, se o Legislador positivou algumas hipóteses (não taxativas) e não vedou, por qual razão não avançar?
Além do mais, destacamos que na produção da prova oral, por meio da conduta processual da parte, o magistrado pode extrair elementos de suma importância para seu convencimento, como, por exemplo – mas não limitado, a imprecisões de certa forma ordinárias e irrelevantes[55], nervosismo exacerbado, desvio de olhares ou procura desesperada por auxílio de advogados.
De tal modo, a conclusão de que a conduta processual da parte per si pode ser considerada como meio de prova não encontra obstáculo legal, tampouco jurisprudencial, nos deparamos, porém, com nítida divergência doutrinária, como destacado no decorrer deste trabalho.
Portanto, por meio das provocações trazidas, esperamos ter contribuído para o entendimento minoritário de que a conduta processual das partes possa ser considerada como meio de prova; e contrapor alguns pontos do posicionamento contrário e predominante. O único fato incontroverso é a necessidade de nos aprofundarmos na matéria. Afinal, em seara processual “não há outra matéria que reflita melhor o movimento político, social e cultural do mundo contemporâneo”[56] quanto as discussões e provocações atinentes à matéria probatória. Aguardemos, portanto, maiores discussões a respeito deste nada novo tema.
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TUNALA, Larissa Gaspar. Comportamento Processual Contraditório. São Paulo: Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo. Orientador: Professor Titular Dr. José Roberto dos Santos Bedaque. 2014.
[1] A conduta ou comportamento processual é, segundo pensamos, fato jurídico processual, isto por ser o evento constatado a partir de determinada ação ou omissão, independentemente da vontade do sujeito ativo, mas que se mostra relevante para aquela situação em concreto. Este fato, como é de conhecimento, é verificado através dos atos processuais praticados pelos sujeitos processuais, que pode apresentar importância para a formação do convencimento do juiz acerca de certo fato controvertido.
[2] Sobre esta contemporânea compreensão: ASSIS, Araken de. Cumulação de Ações. 5ª Ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil. 2019. P. 44; FUX, Luiz. Tutela de Segurança e Tutela da Evidência. São Paulo: Saraiva. 1996. P. 319/320; e SEIXAS, Antônio Eduardo Reichmann. Sucessão de Bens Situados em Território Nacional e a Competência Exclusiva do Juiz Brasileiro: do CPC/1973 ao CPC/2015. In: Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais. Vol. 274. 2017. P. 295.
[3] Nos dias de hoje não é difícil localizar textos tratando de temas atinentes ao direito processual civil como se novidade fossem. Sob este prisma, com sua habitual precisão, o Prof. João Batista Lopes relembra que algumas modificações trazidas pelo vigente Código de Processo Civil – e sua consequente não se constituem como verdadeiras inovações e as denomina de “antigas novidades”: LOPES, João Batista. “Antigas Novidades” do Novo CPC. In: Revista de Processo. Vol. 287/2019, jan./2019. P. 487/488.
[4] AHRENDS, Ney Gama. Comportamento Processual da Parte Como Prova. In: Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul - AJURIS. Ano III, mar/1976. P. 74/79. Há outros trabalhos, ainda mais antigos, em sentido semelhante, como: CAPPELLETI, Mauro. La Oralidad Y Las Pruebas En El Proceso Civil. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa-América. 1972. P. 150/152; e GORLA, Gino. Comportamento Processuale Delle Parti e Convincimento Del Giudice. In: Rivista di Diritto Processuale Civile, Vol. XII, parte II. Padova: CEDAM. 1935.
[5] Nesse sentido asseverou Carlo Furno: “Sin embargo, creo posible y útil considerar en este momento alguna manifestación típica de la conducta de las partes que, a pesar de su notable interés teórico y decisiva relevancia práctica, o no ha sido objeto de disciplina orgánica ex lege, medianamente satisfactoria desde un punto de vista sistemático, o no ha llamado lo bastante la atención de los estudiosos.” (FURNO, Carlo. Teoria De La Prueba Legal. Trad. Sergio Gonzales Collado. Madrid: Revista de Derecho Privado. 1954. P. 75/77).
[6] CARNELUTTI, Francesco. Derecho y Proceso. Trad. Santiago Santis Melendo. Buenos Aires: EJEA. 1971. P. 73.
[7] Chamamos atenção ao leitor que, diante das limitações deste trabalho, alguns pontos, que certamente mereceriam análise com mais vagar e cautela, serão analisados de forma mais sintética.
[8] Nos parece ser neste estudo mais lógico, em primeiro momento, compreender a finalidade da prova e, em seguida, apresentarmos a sua conceituação.
[9] Marinoni e Arenhart, em obra referência sobre matéria probatória no direito processual civil, Prova e Convicção, dedicam um capítulo específico quanto às relações entre verdade e a prova: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova e Convicção. 5ª ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil. 2019. P. 25/56.
[10] Ao se analisar a lição de Michael Villey, chega-se à conclusão de que não há espaço para uma parte de verdade ou, ainda, que esta poderia ser imperfeita. A verdade é ou não, trata-se, por conseguinte, de um conceito absoluto (VILLEY, Michael. Réflexions Sur La Philosophie Et Le Droit: les carnets. Paris: PUF. 1995. P.1).
[11] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 35. Em sentido semelhante, discorrendo sobre este exercício de reconstrução, Gadamer afirma quanto à interpretação: “compreender é sempre interpretar, e, por conseguinte, a interpretação é a forma explícita de compreensão” (GADAMER, HansGeorg. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Trad. Flávio Paulo Meurer. 2. ed. Petrópolis: Vozes. 1998. P. 459).
[12] Não se ignora que alguns estudiosos já defenderam se tratar de grau de certeza diante do resultado absoluto (SOUZA, Ionete de Magalhães. A Certeza da Paternidade Através da Perícia Genética e a Efetividade do Acesso à Justiça: uma análise constitucional. Florianópolis: Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa Catarina. Orientador: Horácio Wanderlei Rodrigues. 2001. P. 80). Não concordamos, pois, a nosso ver, trata-se de uma probabilidade muito próxima à certeza, mas ainda não afasta uma chance, mesmo que mínima, de resultado diverso. Nesse sentido, em interessante trabalho intitulado “Importância do rigor técnico-científico dos exames de DNA Relato de casos”, as biólogas Me. Cristiane Lommez de Oliveira e a Dra. Laélia Maria Pinto, afirmam que poderia “parecer preciosismo exigir mais de 99,99% de precisão” dos exames de DNA para fins de paternidade, porém, como destacam as autoras, “o 0,01% que falta representa 1 erro a cada 10.000 testes”; e, ainda, destacam, em referência aos laboratórios que garantem 99,9% de acerto, que isto corresponderia a um teste errado a cada 100 realizados (OLIVEIRA, Cristiane Lommez de; pinto, Laélia Maria. Importância Do Rigor Técnico-Científico Dos Exames De DNA: relato de casos. P. 3. Disponível em:
https://ibdfam.org.br/_img/artigos/Import%c3%a2ncia%20do%20rigor%20t%c3%a9cnico-cient%c3%adfico%20dos%20exames%20de%20DNA.pdf. Acesso em 22.11.2020).
A argumentação traçadas pelas autoras, a despeito de trilhar caminho diverso do que busca se discutir, corrobora nosso entendimento de que o exame de DNA não se trata de uma certeza, mas sim de uma probabilidade, cuja chance de erro é quase mínima, mas não deixa de existir e, por isso, trata-se de mera probabilidade.
[13] Quanto ao fato de o juiz ser o destinatário final da prova: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 62.
[14] Sob este prisma, por todos: CALAMANDREI, Piero. Verità e Verosimiglianza Nel Processo Civile. In: Rivista di Diritto Processuale. Padova: Cedam. 1955. P. 164.
[15] Ovídio Batista defendia ser o princípio da verossimilhança o guia norteador das ações judiciais, o qual seria responsável pela decisão que recebe a petição inicial e até mesmo, se o caso, de prolação de sentenças liminares (SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de Processo Civil. Vol. 1. 4. ed. São Paulo: Ed. RT. 1998. P. 70/71).
[16] Nesse sentido, a doutrina explica: “São a forma e as garantias que permeiam o procedimento que permitem que a decisão daí emanada seja legítima e represente, ipso facto, a manifestação de um Estado de Direito.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 60). Em sentido semelhante: MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Ed. RT. 2000. P. 156/157; e DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 5. ed. São Paulo: Malheiros. 1996. P. 140/145.
[17] Nesse sentido, ao distinguir a verdade forma e substancial: ARRUDA ALVIM, José Manoel. Dogmática Jurídica e o Novo Código de Processo Civil. In: Revista de Processo Vol. 1/1976, jan.-mar./1976. P. 99.
[18] No caso, a conceituação de prova se limitará ao campo do direito e especificamente do processo, não abrangendo, assim, outros ramos da ciência.
[19] Liebman define prova como “os meios que servem para dar o conhecimento de um fato e por isso para fornecer a demonstração e para formar a convicção da verdade de um fato específico” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile: principi. Vol. 1. 5. ed. Milano: Giuffrè. 1992. P. 318).
[20] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 67.
[21] CPC, art. 369.
[22] Nesse sentido: DINAMARCO, Cândido Rangel. Os Efeitos do Recurso. In: Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis de Acordo com a Lei 10.352/2001. Nelson Nery Jr. et. al. [coord.]. Vol. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002. P. 26.
[23] Sobre as principais diferenças entre ônus e dever, por todos, recomenda-se: SICA, Heitor Mendonça. Preclusão Processual Civil. 2. ed. São Paulo: Atlas. 2008. P. 103. Dentre as constatações defendidas pelo processualista paulista, destacamos, com relação ao ônus, que não há uma obrigação, mas a prática do ato evita uma situação de desvantagem, ao contrário do dever que, em caso de descumprimento, a desvantagem é observada independentemente do exercício e necessariamente é imposta uma sanção.
[24] Não se ignora que, evidentemente, em algumas situações não faria sentido se exigir o cumprimento de tal obrigação. Assim, o próprio CPC prevê hipóteses em que esta obrigação é dispensada, conforme preceitua o art. 379.
[25] Larissa Gaspar Tunala em sua dissertação de mestrado defendida na Universidade de São Paulo, aduz que o dever se caracteriza quando “exercidos no interesse alheio (...) se destaca pela exigência de uma conduta ou uma omissão no interesse de outrem, sob pena de imposição de sanções” (TUNALA, Larissa Gaspar. Comportamento Processual Contraditório. São Paulo: Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo. Orientador: Professor Titular Dr. José Roberto dos Santos Bedaque. 2014. P. 76).
[26] Conforme dispõe o art. 80, II, do CPC, aquele que “alterar a verdade dos fatos” e, portanto, violar o dever de colaboração imposto pelo art. 77, I, do mesmo Codex, está sujeito ao pagamento de multa e a condenação ao pagamento de indenização pelos prejuízos ocasionados, além de dever arcar com os honorários sucumbenciais e despesas e custas processuais (art. 81 do CPC).
[27] Sob este viés, ao tratar dos deveres e ônus das partes, Dinamarco argumenta: “Descumprir imperativos de conduta instituídos em benefício alheio é lesar o titular desse interesse; no caso das partes, descumpri-los é comprometer o correto exercício da jurisdição, que é do interesse geral do Estado.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Volume II. 8ª Ed., rev. e atual. São Paulo: Editora Malheiros. 2018. P. 240/241).
[28] Importante destacarmos que os sujeitos processuais não podem ser punidos por afirmarem fatos que acreditavam serem verídicos, mas, com a instrução do processo, constatou-se que a probabilidade de não serem era maior. A essência é a absoluta impossibilidade de afirmarem fatos que, desde o início, tinham a convicção que eram falsos. Nesse sentido: MITIDIEIRO, Daniel. Colaboração no Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2009. P. 108; TARUFFO, Michele. Uma Simples Verdade: o juiz e a construção dos fatos. São Paulo: Marcial Pons. 2012. P. 106; TUNALA, Larissa Gaspar. Op. Cit. P. 106.
[29] Oportuno ressaltarmos que isto limita-se aos fatos controvertidos e não constitutivos.
[30] O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu se tratar de ato de litigância de má-fé quando se verifica a alteração da verdade dos fatos: AgRg na RCL nº. 1.941, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção.
[31] Há diversos exemplos desta situação no CPC, como é o caso da parte intimada a depor que não comparece ou se recusa (art. 385, §1º); a recusa de apresentação de documentos (art. 400); e no CC, como, em caso de recusa a se submeter a exame injustificadamente (arts. 231 e 232).
[32] Nesse sentido, em trabalho versando sobre a conduta processual dos sujeitos processuais, Eduardo Scarparo afirma: “Não se deve ter dúvidas de que a parte que age com lealdade no curso do processo gera para si uma predisposição benéfica a favor da aceitabilidade de seus argumentos. Por outro lado, quando a chicana é a regra da atuação, contaminam-se com malgrados as proposições que são apresentadas” (SCARPARO, Eduardo. Ethos e Comportamento Processual Como Prova no Processo Civil. In: Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, Vol. 273/2017, Nov./2017. P. 43/67).
[33] A respeito, Darci Ribeiro relembra que o processo, antes de tudo, é um “instrumento de realização da justiça, que está colocado à disposição das partes pelo Estado, para que elas busquem a prestação da tutela jurisdicional, e nenhum instrumento de justiça pode existir fundado em mentira.” (RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 1998. P. 119). No mesmo sentido: COUTURE, Eduardo J. El Deber de las Partes de Decir La Verdad. In: Estudios de Derecho Procesal Civil. Tomo III. Buenos Aires: Depalma. 1979. P. 236; e GAIO, Institutas. Apêndice da obra de Tucci e Azevedo, Lições de História do Processo Civil Romano. P. 197 e seguintes.
[34] É mais uma das “antigas novidades” do vigente CPC, visto que o Prof. Buzaid, na exposição de motivos do código revogado, já afirmava: “Posto que o processo civil seja, de sua índole, eminentemente dialético, é reprovável que as partes se sirvam dele, faltando ao dever da verdade, agindo com deslealdade e empregando artifícios fraudulentos; porque tal conduta não se compadece cm a dignidade de um instrumento que o Estado põe à disposição dos contendores para atuação do direito e realização da justiça.” (Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1973 nº. 17. Disponível em https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/177828/CodProcCivil%201974.pdf?sequence=4. Acesso em 22.09.2020).
[35] Dinamarco entende a realidade do processo como um verdadeiro campo de “combate”, mas isto não legitima, por óbvio, condutas condenadas pelo ordenamento jurídico: “A realidade do processo é a de um combate para o qual a lei os municia de certas armas legítimas e de uso legítimo, mas com a advertência de que será reprimido o uso abusivo dessas armas ou o emprego de outras menos legítimas.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. Cit. P. 303).
[36] A respeito da obrigação dos sujeitos que participam dos processos agirem com boa-fé, lealdade e de forma colaborativa, para Couture, o que define se, de fato, se trata de uma obrigação, dever ou ônus é a forma que o sistema traz como consequência em caso de desrespeito a tais disposições. Para o doutrinador, se constituirá como obrigação quando o ordenamento jurídico dispor uma “reparación al adversário por el daño que se le había hecho faltando a la verdad" (COUTURE, Eduardo J. Op. Cit. P. 254), esta é a situação do sistema brasileiro, como esclarecido no tópico anterior (conf. CPC, art. 77, I).
[37] Sobre a positivação no direito estrangeiro, podemos citar o artigo 2.279 do Código Civil Italiano, o qual dispõe, em tradução livre, que “As presunções não previstas pela lei são deixadas ao cauteloso exame do juiz”, que poderá extrair um fato desconhecido de um que já tem ciência. Ao analisar este dispositivo, Gambi reconhece a cautela adotada pelo sistema italiano, mas assevera que “não se trata de uma liberdade de formação do convencimento judicial sem limites, exigindo-se cautelas antes de possibilitar o uso de regras de experiência para deduzir de fatos conhecidos outros desconhecidos. As expressões ‘graves’ e ‘precisas’ significam que as regras de experiência devem ser sérias; por ‘concordantes’, entende-se que deve haver um concurso de mais indícios, o que não exclui a possibilidade de uma única presunção poder bastar para o convencimento judicial.” (CAMBI, Eduardo. Conduta Processual das Partes (e de seus Procuradores) Como Meio de Prova e a Teoria Narrativista Do Direito. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 57, dez. 2013. Disponível em: www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao057/Eduardo_Cambi.html. Acesso em: 14 jan. 2014). Este fato também foi observado por Cappelletti: “el lector sabe que el Código de procedimiento civil, acogiendo una concepción ya precedentemente impuesta en nuestra jurisprudencia y en varios ordenamientos extranjeros, ha previsto expresamente la posibilidad de que el comportamiento de las partes (y de sus procuradores) en el proceso pueda asumir un valor probatorio, y precisamente, como por general se especifica, un valor indiciario.” (CAPPELLETI, Mauro. Op. Cit. P. 152).
[38] O art. 2º-A da Lei nº. 12.004/09, que alterou a Lei nº. 8.560/92, assim dispõe:
“Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos.
Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético - DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.”
[39] Marinoni e Arenhart propõem exemplo semelhante e discorrem a hipótese de o réu não apresentar defesa, o que ocasionaria a incidência dos efeitos da revelia e asseveram: “(...) aquele que não se defende, provavelmente, não tem argumentos para contrapor as afirmações de fato feitas pelo autor, razão pela qual estes devem ser tidos por verdadeiros” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 414).
[40] Por oportuno, importante relembrar a necessidade de que o pronunciamento, assim como quaisquer outros, seja devidamente fundamentado, especialmente o convencimento do magistrado, à luz do art. 489, §1º, do CPC.
[41] Oportuno registrar que trata-se de regra geral, que comporta exceções, como é a situação prevista no art. 406 do CPC, que exige “instrumento público como da substância do ato”.
[42] Nesse sentido: LOPES, João Batista. A Prova No Direito Processual Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1999. P. 49/51.
[43] Esta também é a conclusão de Ivan Righi: “O Código de Processo Civil recepciona o princípio da valoração racional da prova (art. 131) - e, além disso, dispõe que todos os meios legais ou moralmente legítimos são hábeis à demonstração ‘da verdade dos fatos em que se funda a ação ou a defesa’ (art. 332). Indiscutivelmente, portanto, no direito brasileiro, a conduta processual das partes é fator produtivo de conseqüências probatórias.” (RIGHI, Ivan Ordini. Eficácia Probatória do Comportamento das Partes. In: Revista da Faculdade de Direito da UFPR. Vol. 20. 1981. P. 4).
[44] GORLA, Gino. Op. Cit. P. 25.
[45] Nesta linha de pensamento: Carlo Furno, em Teoria De La Prueba Legal; Gino Gorla, em Comportamento Processuale Delle Parti e Convincimento Del Giudice; Isolde Favaretto, em Comportamento Processual das Partes Como Meio de Prova; Ney Ahrends, em Comportamento Processual da Parte Como Prova; William Santos Ferreira, em Princípios Fundamentais da Prova Civil.
[46] FERREIRA, William Santos. Princípios Fundamentais da Prova Cível. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2014. P. 79.
[47] RIBEIRO, Darci Guimarães. Op. Cit. P. 128/129.
[48] Ibid., p. 129.
[49] Nesse sentido, o processualista mineiro Humberto Theodoro Jr. defende: “registra a jurisprudência que, para apreciar a credibilidade das testemunhas, os julgadores devem levar em conta numerosos dados, como o seu comportamento, seu modo de responder ao interrogatório, seu caráter, sua moralidade, suas antecedentes judiciários, seu grau de desenvolvimento intelectual, a fidelidade de sua memória, o seu senso de observação e a verossimilhança do seu relato” (THEODORO JR., Humberto. Comentários ao Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense. 2005. P. 539/540).
[50] Paulo Roberto de Gouvêa Medina, a despeito de defender ser a conduta processual como prova indiciária, corrente a qual parcialmente criticamos, assevera que o juiz deve “observar e avaliar não só o que a parte declara, em depoimento pessoal ou em interrogatório, senão também, de um modo geral, como se comporta ela em juízo, relativamente aos fatos da causa”. Cabe destacar que, segundo o respeitoso processualista mineiro, “todo comportamento relacionado à lide ou que envolva os fatos controvertidos da causa, como comportamento processual deve ser considerado, na medida em que se traduza em atos do processo”, porém esta consideração deve se dar “pelos meios de prova comuns” (MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa. A Prova das Intenções no Processo Civil. In: Doutrinas Essenciais de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, Vol. 4, Out/2001. P. 643/656).
[51] Chamamos atenção da imprescindibilidade do juiz fundamentar de forma concatenada e robusta o seu convencimento, isto porque é necessário que os jurisdicionados compreendam os motivos que levaram o julgador a considerar a sua conduta processual como meio de prova a formar seu convencimento final.
[52] Nesse sentido: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit. P. 418; e RIGHI, Ivan Ordini. Op. Cit. P. 6/7.
[53] GORLA, Gino. Op. Cit. P. 30. No mesmo sentido, Calamandrei sabiamente afirmava: “O cliente não sabe que, muitas vezes, depois da vitória, deveria abraçar comovido não o seu advogado, mas, sim, o defensor da parte contrária” (CALAMANDREI, Piero. Elogio Dei Giudici Scritto da un Avvocato. 4. ed. Firenze: Le Monnier-Firenze. 1959).
[54] Esta conduta não pode ser considerada como qualquer atitude da parte ou de seu advogado, como, a título exemplificativo, a ausência de cumprimentos socialmente recomendáveis, como relembra Righi: “Não, porém, a elegância no trato ou a falta de educação, a simpatia ou a antipatia, etc. - neste sentido, nem o pior comportamento possível justifica a sentença desfavorável” (RIGHI, Ivan Ordini. Op. Cit. P. 4).
[55] Muito comum, em depoimento pessoal, a parte depoente narrar detalhadamente as questões atinentes ao(s) fato(s) controvertido(s), que levaria a crer que aquele período de tempo foi marcante em sua vida ou que teria boa memória, mas não conseguir responder perguntas básicas e rotineiras da mesma época ou de período de tempo mais recente.
[56] DENTI, Vittorio. Estudios de Derecho Probatorio. Trad. Santiago Santís Melendo. Buenos Aires: EJEA. 1974. P. 155.
Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP (2012/2016). Especialista em Direito e Economia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (2017/2019). Pós-graduando em Direito Processual Civil na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP (2019/2021). Mestrando em Direito Processual Civil na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP (2020/2022). Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: REZENDE, LUCAS RIBEIRO VIEIRA. A conduta processual das partes como meio de prova Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jun 2022, 04:10. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58740/a-conduta-processual-das-partes-como-meio-de-prova. Acesso em: 22 nov 2024.
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