RESUMO: O presente artigo acadêmico tem como objetivo a análise do delito de abandono de incapaz, tipificado no art. 133 do Código Penal Brasileiro. Neste delito, pune-se o agente que, de forma livre e deliberada, abandona pessoa incapaz que, por força de Lei ou de motivo diverso, esteja sob sua guarda, cuidado, vigilância ou autoridade. Neste sentido, este trabalho busca o entendimento técnico e teórico acerca do delito, analisando de forma pormenorizada as suas principais características, consumação, tentativa, sujeitos ativo e passivo e demais pontos importantes e controversos. Em segundo momento, far-se-á o estudo das características das qualificadoras e majorantes específicas do delito e, por fim, promove-se ainda a análise do delito de abandono de incapaz (art. 133, CP).
Palavras-chave: Abandono de incapaz, Código Penal.
ABSTRACT: This academic article aims to analyze the crime of abandonment of the incapacitated, typified in art. 133 of the Brazilian Penal Code. In this crime, the agent is punished for the person who, in a free and deliberate way, abandons an incapacitated person who, under the law or for a different reason, is under their custody, care, surveillance or authority. In this sense, this paper seeks technical and theoretical understanding about the crime, analyzing in detail its main characteristics, consummation, attempt, active and passive subjects and other important and controversial points. Secondly, the characteristics of the specific qualifiers and majorities of the crime will be studied and, finally, a comparative analysis between the crime of abandonment of the incapacitated (art. 133, CP).
Key-words: Abandonment of the incapacitated, Penal Code.
1.INTRODUÇÃO
O abandono de incapaz como delito tipificado no artigo 133 do código penal, apresenta-se como uma proteção da integridade física das pessoas que, por força de Lei, costume ou preceito supralegal, esteja sob guarda ou responsabilidade de outrem.
A proteção jurídica do incapaz é histórica, remonta de tempo anterior ao próprio Código Penal Brasileiro, sendo que já no código penal de 1890 era prevista a conduta de periclitação da vida e da saúde da pessoa proveniente de abandono. Neste contexto, o art. 292 buscava a proteção do menor, incapaz de se defender de eventuais riscos, contudo, esta é a primeira proteção legislativa de que se tem registro no Direito Brasileiro, tendo em vista que o Código Criminal do Império não promovia qualquer tipificação da figura do abandono.
Diante da atual tutela e proteção da incapaz face ao abandono, o presente artigo científico busca o conhecimento de todos os fatores concernentes ao delito tipificado no art. 133, buscando a compreensão completa e aprofundada em relação às majorantes e qualificadoras do delito, bem como suas principais particularidades e características.
Por fim, considerando a natureza e espécie do delito, este estudo promove ainda a análise comparativa entre o delito de abandono de incapaz e o abandono de recém- nascido, sendo que este, inicialmente, se apresenta como espécie ramificada daquele, mas com características de ensejo particulares.
2.ABANDONO DE INCAPAZ – ART. 133 DO C.P.
Para a completa compreensão do delito de abandono de incapaz (art. 133, CP), é necessária a racionalização e pré-compreensão do que se entende pelos termos “abandono” e “incapaz”, sendo que ambos constituem elementares do crime positivado pelo artigo 133 do Código Penal brasileiro. Neste sentido, esclarece-se que termo abandono tem significado de desamparo, descuido. De modo que se considera, para fins de caracterização do delito, o abandono físico e de cuidado. Ao revés, não se considera o abandono material como apto a ensejar a aplicação deste artigo, tendo em vista ser elementar de outro delito, nos termos do art. 244 também do Código Penal.(MASSON, 2018, p. 167).
Em relação ao dono da conduta do agente de abandonas, ainda que seja óbvio, é necessário esclarecer que deve limitar-se ao próprio abandono, sendo que, de outra forma, se a vontade do agente buscasse a morte do incapaz, deveria o autor ter sua conduta amoldada ao artigo 121. Esclarece-se, outrossim, que por ausência de previsão legal, não se faz possível a imputação na modalidade culposa. Deste modo, cumpre trazer à baila o entendimento de Rogério Greco, vejamos:
O delito de abandono de incapaz encontra-se no rol das infrações penais de perigo, previstas no Capítulo III do Título I do Código Penal. Considerando esse fato, a primeira conclusão a que devemos chegar, quando do estudo do mencionado delito, é de que o agente, com a conduta de abandonar, não poderá ter por finalidade causar a morte ou mesmo lesão corporal na vítima, pois seu dolo, necessariamente, deverá ser o dolo de perigo, e não o dolo de dano. Assim, se o abandono, por exemplo, é dirigido finalisticamente a causar a morte da vítima, o agente, gozando do status de garantidor, deverá responder pelo homicídio, consumado ou tentado. (GRECO, 2017, p. 279)
Acerca da necessidade de perigo concreto, tem-se assim a jurisprudência atual:
EMENTA: CRIME DE ABANDONO DE INZAPAZ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PERIGO CONCRETO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Tratando-se o tipo penal previsto no art. 133 do CP de crime de perigo concreto, não havendo comprovação inequívoca da situação de perigo decorrente do abandono do incapaz, há que ser mantida a sentença absolutória. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, 2017)
Relativamente ao termo “incapaz”, tomaremos o conceito do diploma civilista para entendimento preliminar. Assim, considera-se incapaz, via de regra, por força do art. 3º do Código Civil, os menores de 16 anos. Além deles, conforme art. 4º do mesmo diploma, outras pessoas que, por força de idade ou condição, serão consideradas relativamente incapazes e, portanto, também poderão ser sujeito passivo do crime em comento. Todavia, para fins penais, o sujeito passivo deste delito não se limita à incapacidade civil, de modo que, para Rogério Sanches Cunha, citando Magalhães Noronha, a vítima deve ser incapaz apenas de se cuidar contra os riscos a que o abandono possa se submeter, ainda que seja civilmente capaz. O autor esclarece que:
A incapacidade, pois, a que o texto alude não é a de direito privado, mas, sim, a que se traduz na impossibilidade de proteção ou preservação própria. Além dos casos apontados (tutelados, curatelados, anciões, enfermos), apresentam-na os ébrios, os paralíticos, os depauperados, os emotivos etc. O próprio sono, conforme a hipótese, pode proporcionar o crime, pela impossibilidade ela defesa. (CUNHA apud NORONHA, 2017, p. 150)
Quanto ao sujeito ativo, entretanto, se nota apenas uma limitação legal. Para ensejo do artigo, é necessário que o autor seja detentor do dever de guarda, cuidado, vigilância ou autoridade, conforme menciona o próprio artigo, de modo que, caso não o seja, a depender do caso concreto, poderia incorrer em delito diverso. Sobre o sujeito ativo do delito, Cleber Masson explica que o sujeito ativo:
É somente a pessoa que tem o dever de zelar pela vida, pela saúde ou pela segurança da vítima. Cuida-se de crime próprio, pois apenas pode ser praticado por aquele que tem o incapaz sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade. Destarte, é imprescindível a especial vinculação entre os sujeitos do delito, caracterizada pela relação jurídica estabelecida entre o agente e a vítima. (MASSON, 2018, p. 167)
Com efeito, Damásio de Jesus corrobora este posicionamento:
Tendo a qualificação de crime próprio, o abandono de incapaz exige especial vinculação entre os sujeitos ativo e passivo. Deve existir relação especial de custódia ou autoridade exercida pelo sujeito ativo em face do sujeito passivo. Essa relação jurídica pode advir de preceitos de lei, de contrato ou de certos fatos lícitos ou ilícitos. (JESUS, 2020, p. 247)
Assim, temos esclarecidos os sujeitos do delito, bem como a vontade delitiva do agente que abandona pessoa de que tem a responsabilidade, seja por força legislativa ou por convenção pessoal.
No que tange ao momento de consumação, o delito ocorrerá no momento em que a vítima é submetida a risco que, caso não estivesse em condição de desamparo pelo autor, não ocorreria. Neste sentido, ignora-se a duração ou extensão do abandono desde que o perigo percebido pela vítima seja concreto e real. A tentativa, entretanto, se é possível de forma comissiva, o que ocorrerá quando o agente abandona a vítima, mas o risco iminente e concreto não se efetiva pela atuação superveniente de terceiros. Assim é o posicionamento de Cesar Roberto Bitencourt, senão, veja:
Consuma-se esse crime com o abandono efetivo do incapaz, desde que este corra perigo real, efetivo, isto é, concreto, ainda que momentâneo, pois é irrelevante a duração do abandono, ou melhor, da situação de perigo provocada pelo abandono. S e o agente, eventualmente, reassumir, mesmo após alguns instantes, o seu dever de assistência, socorrendo a hipotética vítima, ainda assim o crime já estará consumado; o máximo que poderá acontecer será beneficiar-se com a minorante do arrependimento posterior (art. 16 do CP). É indispensável que fique demonstrado que a vítima efetivamente ficou exposta a perigo, pois o perigo abstrato ou meramente presumido não tipifica esse crime. A eventual superveniência de dano não é abrangida pelo dolo, sob pena de configurar outra infração penal. (...)O agente pode abandonar alguém, por exemplo, nas circunstâncias descritas pelo tipo penal, mas a pronta e imediata intervenção de terceiros pode impedir que o risco se concretize. (BITENCOURT, 2018, p. 259)
Em resumo, temos que o delito de abandono de incapaz visa a penalização do agente que, de forma dolosa, deixa de prestar assistência à pessoa incapacitada, expondo-a a risco concreto e efetivo. Contudo há ainda a elevação de patamares mínimos e máximos de pena em razão de condições pessoas, da vítima e/ou do autor, assunto que passaremos a tratar no próximo tópico do presente estudo.
2.1 Formas qualificadas do delito
O delito abandono de incapaz, na sua modalidade simples, tem pena de detenção de seis meses a três anos. Contudo, nos termos do parágrafo 1º, a pena será de reclusão de 01 a 05 anos, caso do abandono resulte lesão corporal de natureza grave; caso resulte na morte da vítima, a pena aplicada será de reclusão de 04 a 12 anos (art. 133, §2º). Ora, o bem jurídico penalmente tutelado pelo art. 133 como um todo é a integridade física da vítima. Assim, o que se nota é a preocupação do legislador em elevar os patamares mínimos e máximos de pena caso o risco submetido à vítima leve a lesões de natureza grave.
Neste sentido, cumpre tomar por empréstimo os termos do art. 129 §§ 1º e 2º, que nos informam quais lesões são consideradas graves/ gravíssimas. Assim, tendo em vista que o delito ocorre com o mesmo abandono, extrai-se que a elevação da pena não ocorre por uma conduta mais grave e sim por um resultado mais penoso que aquele pretendido, ensejando, assim, a punição na modalidade preterdolosa. Este é o entendimento de Cleber Masson:
São crimes qualificados pelo resultado e estritamente preterdolosos (dolo no crime de perigo e culpa na lesão corporal ou na morte), conclusão que se extrai da análise das penas cominadas em abstrato. Quando resulta lesão corporal de natureza grave, a pena é igual à da lesão corporal grave e inferior à da lesão corporal gravíssima; quando resulta morte, a pena é inferior à atribuída ao homicídio simples.(MASSON, 2018, p. 169)
Assim também informa os ensinamentos de Rogério Greco de que as qualificadoras do delito
(...)traduzem hipóteses de crimes eminentemente preterdolosos. Isso significa que o agente que criou a situação de perigo concreto para a vida ou saúde da vítima não pode, em qualquer situação, ter querido a produção do resultado morte ou lesão corporal. Assim, o dolo diz respeito à efetiva colocação em perigo, ou seja, o agente não pretende, com seu comportamento, causar a morte ou mesmo lesão corporal na vítima. Entretanto, dada a situação de perigo a que foi exposta, era previsível que tais resultados pudessem acontecer. Dessa forma, existe dolo no antecedente – quando o agente abandona a vítima, expondo-a a uma situação de perigo concreto – e culpa no consequente – quando do abandono à que foi submetida a vítima resulta lesão corporal de natureza grave ou morte. Faz-se mister ressalvar que, para fins de aplicação dos mencionados parágrafos, que, como dissemos, preveem delitos de natureza preterdolosa, é fundamental que os resultados narrados tenham sido previstos ou, ao menos, sejam previsíveis para o agente, pois, caso contrário, por eles não poderá ser responsabilizado criminalmente, conforme a regra contida no art. 19 do Código Penal.(GRECO, 2017, p. 284)
Em suma, caso o resultado mais gravoso seja, ao menos, previsível, deverá o autor ter suas penas qualificadas nos termos dos parágrafos 2º e 3º do art. 133. Do contrário, caso não se vislumbre a possibilidade de previsão do dano, o agente terá sua pena base aplicada nos moldes do caput do art. 133. Outrossim, caso o agente tenha agido com dolo em prol da morte da vítima, deverá sofrer sanção relativa ao art. 121, conforme já mencionado anteriormente.
3.ABANDONO DE INCAPAZ MAJORADO
Se os parágrafos 1 e 2 do art. 133 apresentam qualificadoras do delito, fica a cargo do parágrafo 3º a majoração de pena. Porém, ao revés das circunstâncias qualificadoras que punem o resultado gravoso, a majoração de pena ocorrerá em razão das características pessoais da vítima, do agente, ou da conduta do mesmo.
Em primeira monta, o artigo majora a pena caso o abandono ocorra em local ermo. Tal majoração tem sentido em proteger a integridade do incapaz, ao considerar o local ermo, isolado como potencialmente mais perigoso e que oferece mais riscos à vítima do abandono. Quanto à configuração do que se considera local ermo, Fernando Capaz explica que:
Lugar ermo é aquele que não é frequentado, é solitário, isolado, o que representa um perigo maior para o incapaz que é nessas circunstâncias abandonado, ante a maior dificuldade de ser socorrido. Para a incidência dessa causa de aumento exige a doutrina que o lugar seja habitualmente, e não acidentalmente, solitário. Desse modo, se o local é muito frequentado por pessoas, mas, no momento da realização do crime de abandono de incapaz, estava ermo, não incide a majorante em tela (p. ex., uma rua do centro urbano a certas horas da noite) 42. Da mesma forma, afasta-se a majorante se no local habitualmente ermo encontravam-se frequentadores. (CAPEZ, 2012, p. 237)
No mesmo sentido, Cezar Roberto Bitencourt complementa:
Lugar ermo é o local, geograficamente considerado, habitualmente solitário. Não basta que eventualmente o lugar se encontre isolado ou não frequentado. Tratando-se de um elemento normativo, é fundamental ser cauteloso em sua análise, pois as circunstâncias fático-temporais e espaciais é que deverão indicar se o lugar pode ser tido como ermo. Não o caracterizará, certamente, o fato de o incapaz ser abandonado durante a noite ou enquanto chove. O fundamento da majoração da pena, em se tratando de lugar ermo, reside na maior dificuldade ou, quem sabe, até impossibilidade de o incapaz encontrar socorro. O isolamento do local aumenta a probabilidade de dano e intensifica a situação de perigo. (BITENCOURT, 2018, p. 260)
Ainda acerca das características de lugar ermo, cumpre destacar que o referido local não poderá ser deserticamente distante ou vazio, de modo que beire o impossível a presença de qualquer pessoa, por distância ou impossibilidade de acesso pois, nestes casos, a conduta do agente não possui dolo específico de abandonar a vítima, mas sim de causar-lhe a morte, devendo ao agente ser imputada a conduta referente ao art. 121 do C.P. (GRECO, 2017, p. 285)
De outra forma, o inciso segundo do parágrafo 3º apresenta características do agente, que terá sua pena majorada em razão de ser ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima. Neste caso, a majoração da pena tem fulcro na proteção da confiança e da relação preexistente entre autor e vítima que transcende à mera obrigação de cuidado. Nas palavras de Rogério Sanches Cunha: o inciso Il aumenta a pena daquele que carrega maior dever de assistência. A enumeração é taxativa, não comportando analogias (fica excluída da majorante, por exemplo, a união estável). (CUNHA, 2017, p. 152).
Ensinamento análogo e complementar tem o autor Cleber Masson, ao afirmar que:
Fundamenta-se o aumento na maior reprovabilidade da conduta praticada quando presentes laços de parentesco ou de maior proximidade entre o autor e a vítima, os quais devem ser provados, e jamais presumidos. O rol é taxativo. Não admite analogia, por se tratar de norma prejudicial ao réu. Destarte, não alcança quem vive em união estável. (MASSON, 2018, p. 170)
Por fim, apresenta-se a majorante relativa ao inciso 3º, que majora a pena do agente nos casos em que a vítima for idosa, possuindo, ao tempo do crime, mais de 60 anos de idade.
4. ABANDONO DE RECÉM-NASCIDO
Trata-se de um delito com uma figura privilegiada, com pena máxima inferior à do abandono de incapaz, em razão do elemento subjetivo do tipo, o fim de “ocultar desonra própria”. A pena do abandono de incapaz é de 6 meses a 3 anos, e a deste crime é de 6 meses a 2 anos. É certo que pouca diferença haverá na prática, pois a fixação da pena parte do mínimo legal, sendo muito frequente a fixação da pena mínima. Em face dos valores predominantes neste momento em nossa sociedade, parece insustentável um tipo que beneficie quem abandona o próprio filho, para ocultar desonra. Se outrora a mãe solteira era estigmatizada, sofrendo forte segregação, atualmente isso não mais ocorre.
O bem jurídico tutelado é a vida e a saúde do recém-nascido.
Por se tratar de crime que tem como elemento subjetivo o fim de ocultar a própria desonra, há quem sustente que o sujeito ativo é apenas a mãe (Delmanto, Celso. et. al. Código Penal Comentado. 8ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 492). No entanto, como não é expressamente consignado no tipo, é possível dizer que é a mãe, nas hipóteses de gravidez extramatrimonial, incestuosa ou adulterina, bem como o pai, se o filho for adulterino ou incestuoso (QUEIROZ, Paulo. Et. Alli. Curso de Direito Penal: parte especial. Salvador: JusPodivm, 2013, p. 127).
Obviamente, por força do art. 30, CP, qualquer outra pessoa pode ser condenada por esse crime, como partícipe, desde que tenha induzido, instigado ou auxiliado a mãe a cometer o crime.
Já o sujeito passivo é o recém-nascido. Esse tipo contém duas condutas, expor e abandonar. Há quem sustente que os verbos têm significados idênticos (Delmanto, Celso. et. al. Código Penal Comentado. 8ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 492. QUEIROZ, Paulo. Et. Alli. Curso de Direito Penal: parte especial. Salvador: Jus Podivm, 2013, p. 127. RÉGIS PRADO, Luiz. Comentários ao Código Penal. 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 532). Para Bitencourt, porém, há diferença. Expor significa “exercer uma atividade sobre a vítima, transportando-a, no espaço, da situação de segurança em que se encontrava para lugar onde ficará sujeita a risco contra a sua incolumidade pessoal. ” Por sua vez o abandono é “um não-fazer”, em que o agente se afasta da vítima, “deixando-a ao desamparo” (Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. vol. 2. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 248). De qualquer modo, quem expõe, levando a vítima para um outro lugar, na sequência, abandona, deixando o recém-nascido desprotegido. Tanto isso é verdade, que o crime de abandono de incapaz não contém o verbo expor e, nem por isso, deixa de haver crime, caso a vítima seja levada a outro lugar.
O crime em questão é de perigo concreto, o que significa dizer que não existe o delito se não houver a real situação de perigo. Do ponto de vista processual, será imprescindível que se demonstre o efetivo perigo.
Além do dolo de expor ou abandonar, que pode ser direto ou eventual, é imprescindível o elemento subjetivo do tipo, fim de “ocultar desonra própria”.
Caso exista o abandono de recém-nascido, sem que essa seja a finalidade do agente, o crime será o de abandono de incapaz. O crime se consuma com o perigo concreto, decorrente do abandono; sendo viável a tentativa, na modalidade comissiva. Já a forma classificada se dá em razão do abandono houver o resultado lesão corporal grave a pena será de 1 a 3 anos de reclusão (§ 1º) Se resulta morte, a pena será de 2 a 6 anos de reclusão (§ 2º). Observe-se que essa figura privilegiada do art. 134, traz pena bem mais branda, na hipótese de qualificadora pela morte, em comparação com o art. 133, CP.
As duas formas qualificadas são crimes preterdolosos, de modo que é preciso que exista culpa no resultado. Se, apesar do abandono, for imprevisível o resultado, não se aplica a qualificadora por força do art. 19, CP (Delmanto, Celso. et. al. Código Penal Comentado. 8ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 492.).
A pena prevista é de detenção, de 1 a 3 anos.
Caso resulte em morte, a pena aumenta para 2 a 6 anos.Para a configuração do crime, é indispensável que a atitude tenha sido motivada pelo objetivo de esconder ato que causou desonra. O referido crime é muito parecido com o crime de abandono de incapaz, descrito no artigo 133 do mesmo Código, que também tem a finalidade de dar segurança à integridade física de todos os incapazes, incluindo os recém-nascidos. Todavia, para que esse crime se configure, não há necessidade de intenção especifica, basta que ocorra o abandono.
Trata-se de um delito de ação penal pública incondicionada, que independe de representação do ofendido ou de seu representante legal. O caput desse artigo é considerado infração de menor potencial ofensivo e, por essa razão, está submetido ao procedimento dos Juizados Especiais Criminais. Em face das penas mínimas previstas no caput (detenção, de 6 meses a 2 anos) e no § 1º (detenção, de 1 a 3 anos), é cabível a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95).
5.CONCLUSÃO
Diante exposto neste artigo, que o abandono de incapaz é um delito próprio que tem que ser cometido por uma pessoa com vínculo especial com a vítima, que tem um dever de guarda, de autoridade, de vigilância, de cuidado, e consiste na conduta de abandonar a criança, o adolescente ou o incapaz e deixa-lo ao desamparo, expondo-o em situação de risco. O seu preceito secundário, insculpido no art. 133 do Código Penal traz a evolução da lei em relação ao delito de abandono de incapaz, isto porque, o primeiro Código penal chamado Código Criminal de 1830 não trazia qualquer punição ao crime de abandono de incapaz; sendo trazido apenas no Código de 1890, chamado de Código penal dos Estados Unidos do Brasil que passou a ser delimitado como o crime de abandono de incapaz, mesmo assim limitado a criança menor de 7 (sete) anos. Desta forma, sendo que nenhum ser humano pode estar à frente de não ter seus devidos cuidados e proteção, muito menos quando se torna incapaz de se defender de riscos e atos que despreze.
O que caracteriza abandono como algo que deixa de ser assistido, impossibilitado de se cuidar, a pessoa que fica sujeita de repassar a autoridade deve ter responsabilidade e a devida assistência quando necessário, caso contrário, deve-se haver a devida punição quando se fizer o ato infracionário. No caso dos idosos, a lei do Estatuto do Idoso fará a proteção cabível, resguardando todos os seus direitos também previstos na Constituição Federal de 1988. Já no abandono do recém-nascido embora haja previsão legal ao referido crime, a imputação de pena não é fator suficiente para coibir sua prática pois, os genitores, não desejando manter consigo o recém-nascido e objetivando preservarem sua honra, acabam buscando e encontrando, outras maneiras de “abandonar” a criança; sendo fundamental um trabalho social para conscientizar e orientar os genitores de uma gravidez indesejada com alternativas legais para quando não puderem criar seu filho, encontrarem uma família que os tenha, possibilitando assim a salvação destas crianças por meio da adoção.
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