WALTER MARTINS MULLER
(orientador)
RESUMO: Trata-se de revisão de literatura cujo objetivo é o de analisar a aplicação da legislação brasileira no tocante ao estupro marital. O estupro marital consiste na prática do crime de estupro pelo cônjuge ou companheiro, prática esta que há anos ocorre na sociedade sem que, na maioria das vezes, a vítima saiba que se encontra nessa situação. Assim sendo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica sobre o tema, por meio da análise de livros, legislação e materiais publicados em bases de dados eletrônicos. Como principal resultado tem-se o fato de que mesmo que a legislação penal não fale expressa e especificamente sobre o estupro marital, o cônjuge que força a mulher para praticar ato sexual deve ser enquadrado no crime de estupro, bem como, enseja a aplicação das medidas previstas na Lei Maria da Penha.
Palavras-chave: Estupro marital. Relação conjugal. Invisibilidade. Liberdade sexual.
ABSTRACT: This is a literature review whose objective is to analyze the application of Brazilian legislation regarding marital rape. Marital rape is the practice of the crime of rape by the spouse or partner, a practice that has occurred in society for years without, in most cases, the victim knowing that he is in this situation. Therefore, a bibliographical research on the subject was carried out, through the analysis of books, legislation and materials published in electronic databases. The main result is the fact that even though the criminal legislation does not expressly and specifically address marital rape, the spouse who forces the woman to perform a sexual act must be framed in the crime of rape, as well as giving rise to the application of measures provided for in the Maria da Penha Law.
Keywords: Marital rape. Marital relationship. Invisibility. Sexual freedom.
1 INTRODUÇÃO
O estupro marital consiste em um ilícito que é praticado desde os tempos mais remotos, motivado pelo retrógrado conceito e percepção de que a mulher era mero objeto de satisfação dos desejos do homem, não possuindo, portanto, liberdade sexual e sendo seu corpo considerado de propriedade dos maridos.
Embora anos de evolução, a sociedade ainda entende que a prática de ato sexual no casamento é um dever e a mulher precisa realiza-lo mesmo quando esta não é sua vontade, de modo que quando o marido lhe obriga a tal prática, não se entende como estupro ou violência sexual, uma vez que é compreendido como obrigação. Ocorre que tal pensamento deve ser superado, haja vista que a legislação brasileira já reconhece que a prática de relação sexual forçada encontra enquadrada como crime, no art. 213 do Código Penal.
Com base nisso, este trabalho tem como objetivo geral o de analisar a aplicabilidade da legislação brasileira quanto a prática de estupro pelo cônjuge. Como objetivos específicos, tem-se: conceituar o estupro marital; demonstrar a evolução dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher; analisar de que forma o Código Penal trata o crime de estupro e sua previsão sobre o estupro marital.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva, teórica e bibliográfica, a qual foi desenvolvida mediante a coleta de dados com base em materiais de fontes secundárias, quais sejam, livros de renomados autores da área do Direito Penal, legislação pertinente ao tema e materiais publicados em bases de dados eletrônicos.
2 O CRIME DE ESTUPRO
O Código Criminal do Império do Brasil, no ano de 1830 foi o primeiro instrumento legislativo a classificar o crime de estupro, sendo previsto no Capítulo II – Dos crimes contra a segurança da hora, na Seção I – Estupro, nos arts. 219 à 225.
O art. 219 versava sobre a defloração da mulher virgem, menor de dezessete anos, impondo a pena de ser banido do local onde cometeu o crime por um a três anos, em conjunto com o dever de dotar a vítima. No art. 220, caso o estupro fosse cometido por quem tivesse o poder ou a guarda da deflorada, este era banido da província por dois a seis anos. (NUCCI, 2010)
No art. 221, se o estupro fosse cometido por parente da deflorada em grau que não se permitia o casamento, ao mesmo era aplicada a pena degredo por dois a seis anos para a província mais próxima, e o deve de dotar a deflorada era mantido.
O art. 222 tratava da conjunção carnal mediante violência ou ameaça com qualquer mulher honesta, ao qual era aplicado a pena de prisão por três a doze anos, e o dever de dotar a vítima. O art. 223 trazia a disposição sobre a ofensa pessoal com a finalidade do ato libidinoso, causando dor ou algum mal físico a alguma mulher, nesse caso, o agressor era condenado a prisão por um a seis meses e multa, além de o mesmo incorrer também no delito de ofensa.
O Código versava sobre a sedução de mulher honesta, menor de dezessete anos e ter com esta a conjunção carnal, este incorreria na pena de degredo por um a três anos e o dever de dotar. E por fim, o art. 225 determinava a extinção da pena para os crimes descritos nos arts. 222, 223 e 224 caso o agressor se casasse com a vítima. (NUCCI, 2010)
Observa-se que o referido Código fazia uma diferença quanto as penas aplicadas caso a vítima fosse “honesta” ou prostituta.
Mais adiante, no ano de 1890, entrou em vigor o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil – Decreto nº 847 de 11 de outubro de 1890, o qual versava sobre o crime de estupro no Título VIII – Dos crimes contra a segurança da honra e honestidade das famílias e do ultraje público ao pudor, no Capítulo I – Da violência carnal, nos respectivos arts. 266 à 269:
Art. 266. Attentar contra o pudor de pessoa de um, ou de outro sexo, por meio de violencias ou ameaças, com o fim de saciar paixões lascivas ou por depravação moral:
Pena - de prisão cellular por um a seis annos.
Paragrapho unico. Na mesma pena incorrerá aquelle que corromper pessoa de menor idade, praticando com ella ou contra ella actos de libidinagem.
Art. 267. Deflorar mulher de menor idade, empregando seducção, engano ou fraude:
Pena - de prisão cellular por um a quatro annos.
Art. 268. Estuprar mulher virgem ou não, mas honesta:
Pena - de prisão cellular por um a seis annos.
§ 1º Si a estuprada for mulher pública ou prostituta:
Pena - de prisão cellular por seis mezes a dous annos.
§ 2º Si o crime for praticado com o concurso de duas ou mais pessoas, a pena será augmentada da quarta parte.
Art. 269. Chama-se estupro o acto pelo qual o homem abusa com violencia de uma mulher, seja virgem ou não.
Por violencia entende-se não só o emprego da força physica, como o de meios que privarem a mulher de suas faculdades psychicas, e assim da possibilidade de resistir e defender-se, como sejam o hypnotismo, o chloroformio, o ether, e em geral os anesthesicos e narcoticos. (BRASIL, 1890)
Como visto, o Código de 1890 tratava o crime de estupro de forma genérica, englobava os crimes de defloramento e o de sedução de mulher. A violência era entendida como o emprego de força física e todo e qualquer meio que pudesse privar a mulher de suas faculdades psíquicas, privando-a da possibilidade de resistir e defender-se.
Quanto ao Código Penal de 1940, o que se mantém em vigor até a atualidade, inicialmente o crime de estupro só poderia ser executado por homens e somente as mulheres poderiam ser o sujeito passivo do mesmo. Era previsto no art. 213 que dizia “constranger mulher a conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena – reclusão, de três a oito anos” (BRASIL, 1940). Como se vê, por longos anos não era prevista a hipótese de uma mulher praticar as condutas relacionadas ao crime de estupro.
Ocorre que, o Direito Penal deve estar em consonância com o contexto social e estar atualizado em relação a época de sua aplicação. Nesse sentido, tem-se o ensinamento de Nucci (2010, p. 04):
A disciplina sexual e o mínimo ético exigido por muitos à época do Código Penal, nos idos de 1940, não mais compatibilizam com a liberdade de ser, agir e pensar, garantida pela Constituição Federal de 1988. O legislador brasileiro deve preocupar-se (e ocupar-se) com as condutas efetivamente graves, que possam acarretar resultados igualmente desastrosos para a sociedade, no campo da liberdade sexual, deixando de lado as filigranas penais, obviamente inócuas, ligadas a tempos pretéritos e esquecidos
A dignidade sexual consiste em ser um direito fundamental, pertencente ao campo da intimidade, relacionado com a vida privada e a honra. Trata-se também de um direito da personalidade, sendo, portanto, inviolável. Ademais, a vida privada e a intimidade são compreendidas pela Carta Magna como valores humanos, sendo direito individual.
O Direito Penal deve mover-se em face dos anseios e das necessidades sociais, tendo em vista que é um mecanismo de controle social. Dessa forma, as transformações sociais acarretaram em mudanças legislativas que se fizeram necessárias após a década de 40.
2.1 A Reforma Penal de 2009
A edição original do Código Penal de 1940 abordava os crimes sexuais em conformidade com os costumes, ou seja, normas relacionadas com as formas de convivência social. É fácil constatar que os legisladores das épocas remotas editavam leis que visavam proteger a um mínimo ético, haja vista que a repressão dos delitos de ordem sexual confrontava o instinto sexual do homem. Nesse sentido, Noronha (2002, p. 70) dispõe:
As relações sexuais são pertinentes à vida conjugal, constituindo direito e dever recíproco dos que casaram. O marido tem direito à posse sexual da mulher, ao qual ela não pode opor. Casando-se, dormindo sob o mesmo teto, aceitando a vida em comum, a mulher não pode se furtar ao congresso sexual, cujo fim mais nobre é o da perpetuação da espécie.
Ao contextualizar a escrita do Código Penal de 1940 faz-se necessário considerar o período histórico em que ele foi escrito e os acontecimentos sociais que marcaram a época. Tem-se ainda a necessidade de considerar o processo de urbanização, modernização e industrialização onde passava esse dia, exigindo novas formas jurídicas que viessem a respaldar o Estado nas resoluções de conflito. (ROLIM, 2007)
Nesse cenário que houve a alteração de 2009, mediante a Lei nº 12.015, que promoveu mudanças no título VI do Código Penal, alterando a antiga expressão “crimes contra os costumes” para “crimes contra a dignidade sexual”, o que se mostrou mais adequada a realidade.
A expressão ora revogada tinha como finalidade salvaguardar os bons costumes e não a dignidade sexual propriamente dita. Portanto, em face da consagração das garantias constitucionais, atrelado ao progresso social, tal percepção foi superada, levando em consideração a indispensabilidade de se moldar conforme a dignidade, tal como a liberdade sexual de cada ser humano.
O diploma penal não está voltado apenas à proteção de regras meramente morais ou éticas, mas age também na defesa de bens jurídicos. Acerca disso, Nucci (2013, p. 960) dispõe:
[...] estava a merecer de uma autêntica reforma nesse contexto. O que o Legislador deve policiar, à luz da Constituição Federal de 1988, é a dignidade da pessoa humana, e não os hábitos sexuais que porventura os membros da sociedade resolvam adotar, livremente, sem qualquer constrangimento e sem ofender direito alheio, ainda que, para alguns, possam ser imorais ou inadequados.
A legislação em comento buscou voltar-se ao respeito da pessoa humana, como sendo base do Estado Democrático de Direito. O que se demonstra é na legislação anterior as vítimas não estavam protegidas de forma eficaz. Acerca do antigo título do Código Penal Bitencourt (2018, p. 37) assevera que “era impróprio, na medida em que não correspondia aos bens jurídicos que o mesmo pretendia tutelar”.
Sobre o assunto, e acerca da modificação, Rogério Greco (2018, p. 440) dispõe:
Que com a modificação legislativa, percebeu-se que o foco de proteção já não era mais a forma como as pessoas deveriam se comportar sexualmente perante a sociedade do século XXI, mas sim a tutela da sua dignidade sexual.
Consequentemente, a Lei nº 12.015 de 2009 fez a união do estupro e o atentado violento ao pudor no art. 213 do Código Penal, evitando assim, diversas confusões acerca do tipo penal. A pena do delito também aumentou de seis meses a dez anos de reclusão, ressaltando a irrelevância do sujeito passivo ser do sexo feminino ou masculino.
A modificação da nomenclatura demonstra um avanço no ordenamento penal brasileiro, que na atualidade protege a vítima de forma total, dispondo sobre os crimes sexuais como uma evidente violação a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, dispõe Greco (2018, p. 522):
A expressão crimes contra os costumes já não traduzia a realidade dos bens juridicamente protegidos pelos tipos penais que se encontravam no Título VI do Código Penal. O foco da proteção já não era mais a forma como as pessoas deveriam se comportar sexualmente perante a sociedade do século XXI, mas sim a tutela de sua dignidade sexual.
Observa-se que o interesse principal dessa modificação era facilitar a interpretação do bem jurídico preservado. O foco, portanto, era a preservação da dignidade da pessoa humana, pelo viés da liberdade sexual. A necessidade de reforma do título VI do Código Penal se deu em face da promulgação da atual Constituição Federal, que estabeleceu a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. (ESTEFAM, 2009)
Ademais, a lei em comento trouxe duas qualificadoras para a infração penal, majorando a intenção de punir aqueles que violam a liberdade sexual de outrem. Sendo assim, para quem comete o crime tipificado no caput do artigo, a pena é de seis a dez anos de reclusão. Se da conduta resultar lesão corporal grave, a sanção passa a ser de oito a doze anos de reclusão. Caso a vítima seja menor de catorze anos, a condenação será de oito a quinze anos de reclusão. Por fim, se da ação resultar a morte, a pena é de doze a trinta anos de reclusão. (BRASIL, 2009)
Como se vê, a mudança legislativa buscou acima de tudo assegurar a dignidade humana, a liberdade de escolha de parceiros e da relação sexual em si, e proteger aqueles que se encontram em situações de fragilidade, acometidos por situações que não lhe propiciam o discernimento devido para o consentimento do ato.
3 DO ESTUPRO MARITAL
3.1 Breves considerações sobre a luta feminina em prol dos direitos sexuais e reprodutivos
Os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres são frutos de árduas lutas e movimentos sociais feministas. Em solo brasileiro, destaca-se a Constituição Federal de 1988 como marco histórico sobre a temática, a qual traz em seu Título VII da Ordem Social, no Capítulo VII, mais precisamente no art. 226, §7º o dever do Estado no que tange às ações sobre o Planejamento Familiar, posteriormente regulamentado pela Lei nº 9.263/1996.
Em âmbito internacional, a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento – CIPD – a qual foi promovida pela Organização das Nações Unidas – ONU – em 1994, no Cairo, concedeu um novo olhar sobre os direitos sexuais e reprodutivos, dando enfoque sobre o olhar humanizado e não somente como perspectiva demográfica. Desse modo, os direitos sexuais e reprodutivos passaram a ser concebidos do ponto de vista dos direitos humanos. Com base nisso, a Cartilha sobre os Direitos Sexuais e Reprodutivos publicada em 2005 pelo governo federal entende tais direitos como sendo:
[...] direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva. Inclui também seu direito de tomar decisões sobre a reprodução, livre de discriminação, coerção ou violência (BRASIL, 2005, p. 7)
No que diz respeito aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, a IV Conferência Mundial sobre a Mulher ocorrida em 1995 em Pequim revalidou os pontos estabelecidos pela Conferência de Cairo, de modo que os direitos sexuais foram concebidos de forma autônoma dos direitos reprodutivos. Sobre a mudança nesse paradigma, Ventura e Negrão (2012) citados por Ferreira, Costa e Melo (2014, p. 389) discorrem que:
As mobilizações da sociedade tiveram fundamental importância para a criação de políticas e programas voltados ao tema. Os marcos legais atuais encontram-se na Constituição Federal de 1988, na Lei do Planejamento Familiar de 1996, na Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) de 2004 e em pactos internacionais como o Programa de Ação do Cairo de 1994, entre outros.
Observa-se que os direitos sexuais e reprodutivos não são a mesma coisa, embora a maioria das pessoas assim os compreendem, no entanto, estão diretamente relacionados. Com base na luta feminista, Ávila (2003) afirma que o direito reprodutivo está relacionado com a igualdade e a liberdade no que tange à vida reprodutiva, enquanto os direitos sexuais dizem respeito a igualdade e liberdade da sexualidade.
As mulheres lutaram e ainda lutam constantemente pela autonomia e liberdade sexual, bem como a reprodutivo, que devido ao sistema patriarcal foram comprometidos durante longos anos. As vitórias vieram à passos curtos e com a ascensão da democratização. Sobre isso, Ávila (2003, p. 467) discorre da seguinte forma:
Para as mulheres, a condição de sujeito construtores de direitos, e nesse caso construtoras de direitos reprodutivos e direitos sexuais, significa romper com a heteronomia a que sempre estiveram submetidas, em relação ao uso de seus próprios corpos, uma vez que todas as regras e tabus que controlaram e reprimiram suas vivências corporais na sexualidade e na reprodução foram historicamente determinadas pelos homens. Essa repressão e esse controle do corpo e da sexualidade são elementos centrais da dominação patriarcal e da sua reprodução.
Embora sejam assegurados pela legislação, os direitos sexuais e reprodutivos não são desfrutados por todas as mulheres, uma vez que a violência, opressão, dominação e a exploração são instrumentos que mantém o domínio da vida sexual das mulheres mesmo diante de tanta evolução.
Acerca do planejamento familiar, trata-se ações que compreendem como livre a decisão do homem, mulher ou do casal para controlar, estagnar ou aumentar a prole. Tal planejamento é efetivado como sendo uma competência do Estado para propiciar recursos para seu funcionamento e não pode estar vinculado com o controle demográfico. (FERREIRA; COSTA; MELO, 2014)
Ao desenvolver ações governamentais, o intuito é responder e atender as necessidades da população. No planejamento familiar não é diferente, sendo que dentre as necessidades estão o controle da natalidade, a redução do aborto, a proteção da saúde da mulher e a redução da pobreza, etc.
Embora o planejamento familiar seja uma decisão do casal, assuntos relacionados recaem sempre sobre a mulher, especialmente no que diz respeito a contracepção e esterilização, ressaltando ainda a desigualdade das relações sociais no que diz respeito ao sexo. (CISNE, 2014)
Em decorrência da ordem patriarcal e capitalista assuntos sobre a procriação, prevenção e esterilização costumam ser sempre de responsabilidade feminina. Diferente das mulheres que possuem diversos métodos contraceptivos a serem utilizados, tais como, a pílula anticoncepcional, dispositivo intrauterino, pílula do dia seguinte, adesivo anticoncepcional, anel vaginal, anticoncepcional injetável, implante anticoncepcional, dentre outros, o único método utilizado pelos homens – quando utilizam – é o preservativo masculino, popularmente conhecido como camisinha.
Para Santos e Freitas (2011) os serviços de planejamento familiar tradicionais atuam em função da vida reprodutiva, no entanto, destacando a responsabilidade exclusivamente feminina. Ademais, a participação masculina nas atividades de planejamento familiar costuma ser baixa, de modo que é essencial que haja melhores ações voltadas para a promoção de programas de saúde sexual e reprodutiva masculina.
Apesar dos avanços, atualmente a cultura do patriarcado ainda é predominante, o que influencia na decisão da mulher quanto a escolha dos métodos contraceptivos e da esterilização, uma vez que historicamente mantem-se na responsabilidade feminina, conforme destaca Lima (2010, p. 08) ao dispor sobre o assunto:
1) O número de esterilização feminina ultrapassa em grande quantidade o número de vasectomia; 2) Frente ao âmbito da concepção, especificamente nas tecnologias médico-reprodutivas, a mulher acaba por se sujeitar a riscos para alcance o projeto parental; 3) A legislação pertinente ao planejamento, perante a falta de medidas concretas, reforça o direcionamento cultural de que a mulher é a única responsável pela reprodução.
Boa parte das mulheres resolvem aderir a laqueadura tubária por acreditarem, de forma errada, que a esterilização masculina prejudicará a potência sexual do parceiro. Tal mito tem ocasionado a escusa de muitos homens ao procedimento, forçando as mulheres a realizarem a esterilização, bem como, reforçando a cultura de responsabilidade exclusivamente feminina sobre o assunto.
[...] de um lado, a não-colaboração do companheiro no que se refere ao uso do preservativo e à vasectomia e, de outro, a aceitação e incentivo para que suas mulheres mutilem seus corpos para livrarem-se de uma problemática que, apesar de envolver ambos, parece ser encarada por eles como sendo de âmbito exclusivo das mulheres [...]. (MARCOLINO; GALASTRO apud LIMA, 2010, p. 10)
Embora tantos anos tenham se passado, as mulheres ainda precisam lidar com o fardo de resquícios de um sistema patriarcal, onde seus direitos de liberdade sexual e reprodutivos ainda encontram barreiras quanto a efetividade. É essencial que o cenário atual exige ações educativas que possam conscientizar a toda a população sobre os direitos sexuais e reprodutivos como sendo de todos, desmistificando a figura da mulher como sendo a única responsável pelo planejamento familiar, ou ainda, sendo sua voz omissa quanto aos métodos de contracepção e sua vontade de reproduzir.
3.2 Do estupro marital e seu enquadramento como ilícito
O entendimento doutrinário e legislativo acerca do estupro marital consiste em algo novo, embora seja advindo de uma prática um tanto quanto constante nas relações conjugais. Em decorrência do tratamento machista para com as mulheres durante longos anos, as relações sexuais sem o consentimento da mesma não eram compreendidas como estupro, em especial se fossem cometidos pelos maridos.
Contribuindo com a explicação sobre o estupro marital, Barbosa e Tessmann (2014, p. 04) assim o define:
Considera-se estupro marital a violência sexual empregada contra a mulher na constância da união conjugal, praticada pelo seu próprio cônjuge, mediante violência física ou moral. [...] conforme expresso pelo artigo 213 do Código Penal, pode ser praticado por qualquer pessoa empregada a qualquer pessoa, não fazendo distinção se a pessoa é virgem, solteira ou casada, bastando que o agressor constranja a outra pessoa impondo sobre a mesma o uso da força física ou que pratique a violência moral para obter seu objetivo sexual, considera-se estupro.
Portanto, o estupro marital se caracteriza quando ocorre a violação sexual da mulher, quando praticada pelo próprio marido ou companheiro. Embora grandes avanços, tanto legislativos como sociais, a mulher ainda sofre constantemente com a violência sexual, principalmente quando advinda do relacionamento amoroso.
Embora o pensamento da maioria da sociedade seja no sentido de que não há um estupro quando dentro de uma relação amorosa, a análise do art. 213 do CP demonstra que o crime pode ser cometido por qualquer pessoa e o sujeito passivo deste não necessariamente precisa estar solteiro ou casado.
Sobre a superação da visão tradicionalista de que o sexo forçado é um mero exercício regular do direito, Hungria citado por Greco (2017, p. 91) assim afirma:
Questiona-se sobre se o marido pode ser, ou não, considerado réu de estupro, quando, mediante violência, constrange a esposa à prestação sexual. A solução justa é no sentido negativo. O estupro pressupõe cópula ilícita (fora do casamento). A cópula intra matrimonium é recíproco dever dos cônjuges. O próprio Codex Juris Canonici reconhece-o explicitamente[...]. O marido violentador, salvo excesso inescusável, ficará isento até mesmo da pena correspondente à violência física em si mesma (excluído o crime de exercício arbitrário das próprias razões, porque a prestação corpórea não é exigível judicialmente), pois é lícita a violência necessária para o exercício regular de um direito.
Em uma pesquisa realizada no ano de 2014 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), aproximadamente 25% dos entrevistados compreendem que as mulheres devem satisfazer sexualmente seus parceiros mesmo quando esta não for sua vontade, não sendo, portanto, estupro.
A sociedade ainda entende o “não” como “sim” dentro de um relacionamento o que faz crescer a cultura do estupro, uma vez que na esfera privada a manifestação negativa da mulher ao esposo ou companheiro não é levada a sério. A própria vítima não consegue identificar que de fato está diante de uma situação de estupro, por ser forçada a acreditar que em uma relação conjugal ou afetuosa o sexo deve existir mesmo quando esta não seja sua vontade.
Portanto, dificilmente a vítima consegue compreender que está de fato sendo vítima, valendo-se do medo da denúncia, pois não sabe como será a reação de seu companheiro. Boa parte dos casos, além das agressões sexuais, a vítima acaba por ter sua imagem exposta na delegacia, correndo o risco de que tal denúncia não seja levado a sério, e ao invés de coibir com a pratica da violência, acaba por aumentar e agravar a situação.
4 DA PROTEÇÃO DA MULHER EM CASOS DE ESTUPRO MARITAL
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a igualdade de direitos entre homem e mulher, considerando o casamento como uma comunhão plena de vida entre os cônjuges, baseado na igualdade de direitos e deveres. Por consequência, um dos pressupostos é justamente o livre e inequívoco consentimento. Com base nisso, Rovinski e Cruz explicam que:
A violência conjugal, por ocorrer em âmbito familiar, tende a ser silenciada por suas vítimas e velada aos olhos da sociedade, circunstâncias que tendem a ocultar a magnitude do problema, facilitando desta forma, distorções sobre a verdadeira realidade do conflito e as estatísticas sobre o mesmo. [...] A ideologia de que a mulher é propriedade do homem, serve para negar-lhe a oportunidade de perceber sua própria vitimização sexual. (ROVINSKI; CRUZ, 2009, p. 110).
Assim, caso a mulher seja constrangida a manter relações sexuais contra sua vontade, mesmo que durante o casamento, tem-se caracterizado o crime de estupro, embora não se tenha uma previsão no Código Penal especificamente sobre ser o sujeito ativo do crime o cônjuge ou companheiro, uma vez que a relação sexual deve ser espontânea e consentida entre as partes.
O art. 213 do Código Penal, ao tipificar o crime de estupro deixa a interpretação do sujeito ativo e sujeito passivo bem abrangente, de modo que é fácil interpretar que qualquer pessoa pode constranger outrem, inclusive o cônjuge ou companheiro.
Embora a violência sexual seja de grande repugnância social, sabe-se que esta só gera, de fato, repercussão e repúdio, bem como é entendido como de fato um delito quando do ato cometido é em ambiente público, o que faz com que o delito praticado na esfera privada seja então qualificado como mero aborrecimento decorrente da negativa em satisfazer o parceiro. Desse modo, a doutrina há muito trata do marido como autor do crime:
Entendemos que o marido pode ser sujeito ativo do crime de estupro contra a própria esposa. Embora com o casamento surja o direito de manter relacionamento sexual, tal direito não autoriza o marido a forçar a mulher ao ato sexual, empregando contra ela a violência física ou moral que caracteriza o estupro. Não fica a mulher, com o casamento, sujeita aos caprichos do marido em matéria sexual, obrigada a manter relações sexuais quando e onde este quiser. Não perde o direito de dispor de seu corpo, ou seja, o direito de se negar ao ato sexual [...]. Assim, sempre que a mulher não consentir na conjunção carnal e o marido a obrigar ao ato, com violência ou grave ameaça, em princípio caracterizar-se-á o crime de estupro, desde que ela tenha justa causa para a negativa. (JESUS, 2000, p. 96)
A invisibilidade da violência sexual no âmbito doméstico recai sobre o entendimento de que entre os cônjuges a prática de relação sexual é um compromisso ligado aos direitos e deveres do casamento, reforçando sempre a ideia de sujeição da mulher a vontade do homem. Sobre isso Mirabete (2003, p. 411) dispõe que:
Embora a relação carnal voluntária seja lícita ao cônjuge, é ilícita e criminosa a coação para a prática do ato por ser incompatível com a dignidade da mulher e a respeitabilidade do lar. A evolução dos costumes, que determinou a igualdade de direitos entre o homem e a mulher, justifica essa posição. Como remédio ao cônjuge rejeitado injustificadamente caberá apenas a separação judicial.
Nesse sentido, embora a legislação penal não tenha se inclinada para especificar dispositivo específico sobre o crime resultante da relação sexual forçada entre os cônjuges, sendo apenas reconhecido o aumento de pena quando dessa situação (art. 226 do Código Penal), a doutrina, por sua vez, compreende perfeitamente tal tipo de estupro. Importante mencionar que, em se tratando de um dos elementos que constitui o casamento, quando do descontentamento da negativa da relação sexual, a melhor medida é o divórcio ou separação entre os cônjuges, de modo sempre que o entendimento for de conseguir a satisfação desse desejo pela via forçada, caracteriza-se a violência sexual.
Importante destacar que além do Código Penal, a Lei 11.340 de 2006, a Lei Maria da Penha também atua na proteção contra a violência sexual em face da mulher. A Lei Maria da Penha consiste em uma normativa que criou mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar, em perfeita consonância com o art. 226, §8º da Constituição Federal e atendendo aos dispostos pelas Convenções Internacionais de combate à violência da mulher, tais como: Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher.
A Lei Maria da Penha traz em sua redação a introdução de definições sobre as formas de violência que são praticadas contra a mulher, especificando também todos os âmbitos onde ela poderá ocorrer.
A violência definida na referida Lei advém do conceito trazido do Conselho Nacional Econômico das Nações Unidas, que dispõe que “qualquer ato de violência baseado na diferença de gênero, que resulte em sofrimento e danos físicos, sexuais e psicológicos da mulher; inclusive ameaças de tais atos, coerção e privação de liberdade seja na vida pública ou privada”. (CAMPOS; CORRÊA, 2007)
Em seu art. 5º, a Lei Maria da Penha ratificou o entendimento de violência doméstica e familiar:
Art. 5. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.
Cabe ressaltar que, a violência pode ocorrer dentro e fora de casa, sendo por qualquer integrante da família que possua relação de poder para com a vítima. (ZANATTA; SCHNEIDER, 2017)
Essa afirmativa determina que a concepção da violência abarcada pela referida Lei está associada mais a relação de poder existente entre a vítima e o agressor do que ao espaço físico propriamente dito. Sendo assim, é possível ampliar essa definição de modo a abranger as relações íntimas de afeto que não são tocadas pela coabitação, como o namoro por exemplo.
Nesse sentido, a referida Lei dispõe expressamente sobre as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, observa-se:
Art. 7. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006) (grifo nosso)
Assim, enquanto a doutrina discutia sobre a possibilidade de ocorrer o crime de estupro durante o casamento, a Lei Maria da Penha inseriu no inciso III do artigo supracitado a violência sexual como forma de violência doméstica, integrando tal conduta como ilícito penal passível de sanção.
Portanto, quando o marido cometer estupro contra a esposa, a este deve ser aplicada a Lei Maria da Penha, que de modo igual se aplica aos casais em união estável, namoros e demais relações que se igualam a estas.
Além do art. 226 do Código Penal, o art. 61 já previa como circunstância agravante de pena quando do cometimento de crime em face do cônjuge:
Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:
II - ter o agente cometido o crime:
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)
Sendo assim, o cônjuge, ao forçar o ato sexual deve responder pelo crime de estupro, tendo sua pena majorada, conforme preveem os já citados dispositivos do Código Penal. Ademais, configurando-se a violência sexual como forma de violência doméstica, deve o mesmo incorrer ainda na aplicação das medidas impostas pela Lei Maria da Penha, quais sejam:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público. (BRASIL, 2006)
Dessa forma, compreende-se que a relação sexual forçada pelo cônjuge configura-se plenamente em crime de estupro, bem como, na modalidade de violência doméstica e familiar contra a mulher, haja vista que a relação sexual é ato que deve ser consentindo, uma vez que advém do direito à liberdade sexual da mulher, devendo este ser respeitado e cabendo ao Estado agir de forma preventiva – orientando e prestação auxílio às vítimas e encorajando-as a denunciarem o agressor – bem como, de forma repressiva, na adequada aplicação da legislação penal e da legislação especial nos casos de estupro marital.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os direitos da mulher foram evoluindo de forma lenta no ordenamento jurídico, de modo que a evolução social também se atrasou, impedindo que o Direito reconhecesse especialmente a igualdade entre homem e mulher, o que só foi possível por meio de diversas lutas pelos movimentos feministas.
No Brasil, a igualdade entre os gêneros só foi possível com o advento da Constituição Federal de 1988, igualando também os direitos e deveres dos cônjuges na sociedade conjugal, retirando da mulher o dever de sujeição e inferioridade perante o cônjuge.
Assim sendo, já não prevalece mais o entendimento de que o corpo da mulher é mero objeto de satisfação dos caprichos do homem, ou de que com o advento do casamento o corpo da mulher passa a ser propriedade do cônjuge, de modo que este deve respeitar sua companheira quando esta recusar-se ao ato sexual, uma vez que tal ato deve partir do livre consentimento da mulher, sendo que forçá-la a tal prática caracteriza-se como crime de estupro.
Portanto, o estupro marital, embora não previsto na legislação penal de forma expressa e clara, encontra guarita no art. 213 do Código Penal, pois este em nada específica a restrição a quem pode figurar no polo ativo, sendo então perfeitamente cabível o cônjuge como tal. Ademais, o art. 226 do mesmo diploma legal garante o aumento de pena quando o crime de estupro é cometido pelo cônjuge, o que evidencia ainda a preocupação do legislador em proteger a dignidade sexual mesmo dentro das relações familiares e conjugais.
Cabe mencionar que o estupro marital é considerado como uma forma de violência doméstica e familiar, prevista no rol taxativo da Lei Maria da Penha, figurando como violência sexual, o que além de ensejar a aplicação das sanções do Código Penal, enseja ainda a aplicação das medidas da Lei Maria da Penha, ressaltando então a preocupação do Estado para com a proteção da mulher que se encontra em situação de vulnerabilidade e suscetível a violência.
Embora a legislação já esteja inclinando-se para conscientizar a mulher que se encontra em situação de violência sexual dentro do relacionamento, sabe-se que falta ações de políticas públicas que viabilizem a conscientização sobre o assunto, uma vez que boa parte das mulheres, principalmente casadas ou comprometidas não sabem que estão sendo vítimas de estupro.
A discussão sobre a temática está longe de se encerrar, haja vista que o Direito acompanha a evolução social, e esta, está se movendo cada vez mais rápido. Dessa forma, espera-se que este trabalho abra caminhos para a produção de novas pesquisas, visando obter melhores resultados.
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Graduanda em Direito pelo Centro Universitário de Santa Fé do Sul-SP
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALBERGUINI, KÉTHILIN KAREN. A aplicabilidade da legislação penal nos casos de estupro marital Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jul 2022, 04:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58880/a-aplicabilidade-da-legislao-penal-nos-casos-de-estupro-marital. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
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