JÚLIA SABATELAU
(coautora)
VIRGÍLIO QUEIROZ DE PAULA.
(Orientador)
1.ORTOTANÁSIA: CONCEITUAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO
A ortotanásia é de origem etimológica grega, sendo orthos: reto/correto e thanatos: morte, ou seja, significa "morte correta". A aplicação do termo consiste no não prolongamento da vida por meios não naturais ou que impliquem no prolongamento do sofrimento, como respiradores ou tratamentos como a quimioterapia, em pacientes terminais. Sendo considerado por muitos, uma morte natural, boa ou desejável, tendo em vista que os sintomas da doença terminal são tratados paliativamente, evitando assim um sofrimento indigno no fim da vida. (Tanaka, Sônia Yuriko Kanashiro. Estudos Avançados de Biodireito. 1ª edição)
Com base no entendimento do conceito da Ortotanásia, podemos citar outros dois termos que também são importantes de trabalhar neste texto: morte digna ou boa morte.
O termo eutanásia, conhecida como “morte boa e honrosa”, “alívio a dor”, é entendida como uma forma de aliviar o sofrimento do paciente interrompendo a vida por meio de medicamentos terminais, sendo proibido essa forma no Brasil. Sendo importante ressaltar que o Código de Ética Médica brasileiro de 1988 tem todos os artigos relativos ao tema contrários à participação do médico na eutanásia ou no suicídio assistido. (Borges R. Eutanásia, ortotanásia e distanásia: breves considerações a partir do biodireito brasileiro. Jus Navigandi 2005.)
A eutanásia ativa consiste e necessita de um agente causador da situação morte no paciente, e não através do paciente, de forma deliberada, a pedido do indivíduo com a enfermidade ou em estágio terminal, sem que haja sofrimento.
Em casos que ocorra morte causada pelo próprio paciente, denomina-se suicídio, suicídio assistido ou morte assistida. Onde o agente, o terceiro, tem o papel apenas de orientar ou auxiliar, sem que dele origine o ato ou a causa mortis.
A chamada sedação paliativa tem como objetivo, apenas, a sedação do enfermo, evitando que o mesmo sofra, distinguindo das outras formas citadas, a sedação paliativa não procura prolongar ou antecipar o fim da vida, sendo o meio que mais se assemelha a ortotanásia. (Patrícia Donati Almeida. As diferenças entre eutanásia, morte assistida, ortotanásia e sedação paliativa. Jusbrasil - Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes)
Termo pouco conhecido, porém, utilizados nos tratamentos praticados no meio medicinal, tem como objetivo prolongar a vida do paciente a qualquer meio, esse termo é nomeado como distanásia, também conhecido como obstinação terapêutica, sendo um tratamento que não proporciona qualidade de vida ao paciente enfermo e sim prolonga a vida biológica. (Selli ML, Alves JS. Distanásia: percepção dos profissionais da enfermagem. Rev Lat Am Enfermagem 2009)
Nesse sentido, enquanto, nos termos citados, pode-se dizer que, diferente de outros métodos, a eutanásia possui como objeto o final da vida de forma não natural, podendo ser ativa ou passiva. Em contrapartida a distanásia, possui a intenção incessante de utilizar todos os recursos possíveis para prolongar o máximo o tempo de vida, não prezando por sua qualidade. A ortotanásia se baseia em encontrar uma morte sem sofrimento, dispensando qualquer recurso/métodos descomunal de prolongamento a vida, na eutanásia vem o princípio da qualidade de vida do paciente, utilizando de cuidados paliativos. (Junges JR. Reflexões legais e éticas sobre o final da vida: uma discussão sobre a ortotanásia. Rev Bioét 2010.)
Realocando os métodos de forma subjetiva, obtém-se aqueles que prolongam a vida a qualquer custo sendo ele a distanásia. A interrupção da vida por meio de terceiro de forma consentida e sem sofrimento é denominada eutanásia. A interrupção da vida com o auxílio de terceiro, sem que haja sofrimento, pode ser conhecida como o suicídio assistido ou morte assistida. Já sedação do paciente sem o intuito de tratamento a fim de aliviar o
sofrimento sem interromper a vida chamada de sedação paliativa. Por fim, a ortotanásia consiste em apenas tratar os sintomas sem que haja interrupção da vida ou tratamento da enfermidade.
Em meados de 1960 na Inglaterra, a médica, enfermeira e filósofa Dame Cicely, desenvolveu o conceito “cuidados paliativos”, e o descreveu como a filosofia de cuidar dos indivíduos em estados terminais com doenças incuráveis ou severas. Em seus estudos foram definidos quatro elementos pelo qual o paciente neste estado passava, sendo eles a dor física, dor psicológica (emocional), dor social e dor espiritual. A fim da obtenção de ganho em qualidade de vida, e não tempo, os profissionais da saúde deveriam atuar em todas as esferas, aliviando assim o sofrimento e levando conforto aos pacientes. (Pessini L. A filosofia dos cuidados paliativos: uma resposta diante da obstinação terapêutica [The Philosophy of Palliative Care - A Response to Therapeutic Obstination]. Mundo Saúde (1995).
Com o reconhecimento do tratamento paliativo, em 1990 a OMS - Organização Mundial de Saúde, reconheceu o tratamento paliativo e o definiu como sendo “o cuidado ativo e total dos pacientes cuja enfermidade não responde mais aos tratamentos curativos''. Controle da dor e de outros sintomas, o cuidado dos problemas de ordem psicológica, social e espiritual são os mais importantes. O objetivo dos cuidados paliativos é atingir a melhor qualidade de vida possível para os pacientes e suas famílias”. (Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Cuidados paliativos oncológicos: controle da dor, INCA 2001)
O termo se tornou uma filosofia, quando reconhecido pela OMS (Organização Mundial da Saúde), teve assim seus princípios definidos, sendo eles:
a) Veracidade: respeito constante à verdade. Fundamentado nas relações de confiança interpessoais. Significa dizer a verdade ao paciente e seus familiares, possibilitando a participação concreta deles nas tomadas de decisões.
b) Proporcionalidade terapêutica: relação proporcional entre os meios terapêuticos empregados e os resultados esperados. Este critério aborda o julgamento das intervenções médicas no que diz respeito aos riscos e benefícios da ação, a utilidade ou inutilidade da medida, levando em consideração o prognóstico e os custos de ordem física, psicossocial e econômica.
c) Duplo efeito: observa que a realização de um ato terapêutico tem dois efeitos — um positivo e outro negativo. Receia-se que os efeitos negativos da intervenção médica possam ser fatais, implicando em uma forma de eutanásia.
d) Prevenção: prevenir e implementar ações para abordar possíveis complicações inerentes à evolução clínica do paciente a fim de se evitar sofrimentos desnecessários.
e) Não abandono e tratamento da dor: o primeiro princípio diz ser condenável afastar-se ou abandonar um paciente porque este se recusa a se submeter a um determinado tipo de terapia que o médico considerou ser a mais adequada opção de tratamento. O segundo diz que o paciente, nos momentos de dor, tem direito ao adequado tratamento álgico.
Promovendo assim a qualidade de vida do paciente, proporcionando uma morte ou vida de qualidade, sendo objeto de uso da ortotanásia.
No Brasil, especificamente na legislação brasileira, não se tem a permissão tácita da prática da ortotanásia, porém como já demonstrado, o tratamento paliativo ou a ortotanásia estão presentes no Brasil desde a década de 80. Com a difusão da informação passou a ser ainda mais popularizada, após o reconhecimento pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Em decorrência das reflexões viabilizadas pela Segunda Guerra Mundial, introduziu-se o conceito de direitos humanos e foram estabelecidos padrões de respeito à dignidade da pessoa humana, o que, de certa forma, trouxe a necessidade de se falar do direito à vida e, como reflexo, sobre o direito à morte digna, resgatando o direito à autonomia e à autodeterminação, proporcionados também pela pós-modernidade. (MORITZ, 2011, p. 188).
Neste contexto o Conselho Federal de Medicina (CFM), realizou um processo longo de elaboração para criar e publicar em 28 de novembro de 2006, a resolução CFM nº 1.805, dispondo:
Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.
§ 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação.
§ 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada no prontuário.
§ 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de solicitar uma segunda opinião médica.
Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar.
Respeita o processo natural do viver e o devido curso da morte, empregando apenas medidas paliativas ao enfermo, com objetivo de amenizar os sintomas advindos desse processo, tentando humanizar o máximo possível o momento da morte (BARBOSA; LOSURDO, 2018, p. 170)
Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal (Preâmbulo Res. 1.805/2006 CFM).
Assegurando a garantia da dignidade da pessoa humana, disposto no artigo 1º, inciso III, onde: ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”, artigo 5º, inciso III, e sem sintonia com o inciso XIV da Constituição Federal de 88 (CF/88).
No Código Penal Brasileiro, não possui uma exclusão de ilicitude em casos de enfermos submetidos a ortotanásia, porém o mesmo poderá ser caracterizado como omissão ou auxílio ao suicídio. Apesar de ser uma conduta atípica, poderia ser caracterizada dentro do artigo 121 do Código Penal (CP), podendo conter uma minorante, segundo o parágrafo 1º artigo do 121 do CP, que prevê:
Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (Parágrafo 1º artigo do 121 do CP)
Ao que tange o artigo 122 do CP.
Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.
Parágrafo único - A pena é duplicada: Aumento de pena
I - se o crime é praticado por motivo egoístico;
- se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.
Na prática, o pedido da “vítima” não afasta a ilicitude, e seu consentimento se torna irrelevante para a caracterização da eutanásia. No entendimento penal, formal da doutrina a ortotanásia, se caracteriza como a ação omissiva do agente, um tipo de eutanásia. Não sendo bem difundida a diferença entre ambos, ou a caracterização dentro do código penal, pode ocorrer, sem os devidos procedimentos, a caracterização do delito. (Guastini VCR. Título I – Do Crime contra a pessoa. In: Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. e Diniz MH. O estado atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva)
A prática do consentimento informado é considerada a expressão de uma atitude eticamente correta, uma vez que esta condição manifesta o reconhecimento do paciente como um ser autônomo, livre e merecedor de respeito, observando o princípio da dignidade da pessoa humana. Ainda, o consentimento informado é uma importante ferramenta na legitimação e fundamentação do ato médico, por isso, é uma condição indispensável na relação médico-paciente (CLOTET; GOLDIM; FRANCISCONI, 2000, p. 13).
O direito à vida resguardada no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 88, no entendimento de André Ramos Tavares (2012, p.575), pode ser compreendido por duas vertentes, sendo em primeiro lugar, o direito de permanecer existente, e, em segundo lugar, o direito ao um nível adequado de vida. E é nessa segunda vertente que a prática da eutanásia encontra guarita (BARBOSA; LOSURDO, 2018, p.181).
Quando as esferas do direito à vida entram em conflito, como nas situações de solicitação da morte piedosa, é inquestionável que a insistência em continuar vivo aos que desejam morrer, puni o referido nível de vida adequado. O exercício do direito de viver na vida adequada ou minimamente digna, nos remete ao questionamento, se viver é um direito ou apenas um dever do cidadão (BARBOSA; LOSURDO, 2018, p.181-182).
Pode-se compreender a dignidade humana como um princípio constitucional que permeia todo o ordenamento jurídico, tendo um valor supremo inerente a todo indivíduo e base de sua existência, diante da devida garantia dos direitos fundamentais e sociais que orienta uma vida digna (GOUVÊA; DEVAL, 2018, p. 52). Nesse sentido, a positivação da dignidade da pessoa humana é transformada em norma de valoração base aos demais direitos fundamentais (BARBOSA; LOSURDO, 2018, p.181).
4. CONSIDERAÇÕES ÉTICAS E FILOSÓFICAS SOBRE O INÍCIO E FIM DA VIDA
O estudioso Ramataro (2013), afirma que desde a antiguidade grega, grandes filósofos como Platão, Sócrates e Epicuro, já vislumbravam a discussão acerca da “morte digna”. Sendo divididas em duas vertentes e ao decorrer dos séculos o modo aristotélico permeou-se como o mais coerente. (Bosco,2015)
Embora a vida e a morte sejam consideradas intrínsecos, o questionamento sobre o que seria a morte digna, é muito recente e por isso ainda não se tem uma definição exata, considerando também que o que é ético e moral pode sofrer variações de um povo e cultura para o outro. Levando em consideração que o direito à vida sempre existiu e que a morte não pode ser dissociável à vida, muito se pode questionar sobre como se é garantido uma vida digna, sem que haja uma morte digna. (Bosco, 2015)
A primeira, liderada por Platão, Sócrates e Epicuro, defendia a ideia de que o sofrimento resultante de uma doença dolorosa justificava o implemento do suicídio. E a segunda vertente implementada por Aristóteles, Pitágoras e Hipócrates, consistia em condenar a eutanásia e o suicídio assistido.
Os favoráveis à morte voluntária pautam-se sob a fundamentação do princípio da liberdade e da autodeterminação, que defendem a possibilidade de o indivíduo dispor de sua própria vida, em determinadas circunstâncias bem definidas. (PIMENTEL, 2012, p.14), já os opositores tomam como fundamento o princípio constitucional da inviolabilidade do direito à vida, tendo ainda, entre esses extremos, a posição intermediária, que busca a harmonização dos demais posicionamentos, visto o princípio da dignidade da pessoa humana. (GOUVÊA E DEVAL, 2018, p. 52)
A discussão sobre a morte voluntária se torna complexa e polêmica, principalmente por abordar aspectos morais, éticos, científicos, religiosos, jurídicos e filosóficos (GOUVÊA; DEVAL, 2018, p. 52).
O homem, especialmente aquele imerso na cultura ocidental contemporânea, embora tenha plena consciência de sua mortalidade, não parece estar devidamente preparado, em termos psicológicos, para lidar com a ruptura que o fenômeno
―morte‖ representa. O pensamento sobre a finitude da vida e o conceito de morte como um estado de inconsciência permanente, geralmente, o assusta e amedronta. Muitas vezes, mesmo quando não é a ideia de uma completa e eterna ausência de consciência que inquieta, é a suposição da existência de um universo desconhecido - a ser descortinado somente a partir da cessação da vida - que faz nascer o temor de muitos. Por essas e outras razões, o homem tende a negar a morte ou, ao menos, a distanciar-se de assuntos que remetem a ela. (Danielle Cortez Pimentel, 2012, p. 15)
A importância dos princípios constitucionais e a vida sendo vista sob a ótica da dignidade pessoa humana, observa-se que uma pessoa em pleno equilíbrio psíquico e ciente de sua condição médica, deveria ter a possibilidade de exercer seu direito de reger a própria vida, mesmo nos casos que seu desejo seja a morte, afinal cada pessoa tem um limite de suportabilidade que deve ser respeitado (DIAS, 2018, p. 56)
Não obstante destacáveis filósofos, como Sócrates e Schopenhauer, cada qual no seu tempo, terem fornecido importantes contribuições na análise da morte, enquanto algo desconhecido, que obriga o ser humano a pensar e buscar explicações, Espinosa eleva a morte ao status de um verdadeiro alvo da filosofia, a partir de sua afirmação de que: “o homem livre em nada pensa menos que na sua morte e sua sabedoria não é uma meditação da morte, mas da vida”. (BORGES, 2011, p. 249).
5. DISTINÇÃO DE DIGNIDADE E DIREITO
A distinção de dignidade e direito parte do princípio de que dignidade não é conhecida como uma norma jurídica, ou seja, ela não é reconhecida no âmbito do ordenamento jurídico. A dignidade é um atributo que todo ser humano possui independentemente de qualquer requisito ou condição, ou uma lei, seja ele de religião, nacionalidade, posição, sexo, social etc.
Relacionando a dignidade com a ortotanásia, é uma grande discussão que implica dentro do nosso âmbito jurídico. Pois o direito de morrer dignamente está relacionado com o desejo de se ter uma morte natural, humanizada, sem o prolongamento da vida e do sofrimento por meio de tratamento comprovadamente ineficaz para a cura de alguma enfermidade fatal.
Já com base no direito de morrer já vem se relacionando com a eutanásia, ela já é vista como forma de suicídio pois a pessoa escolhe quando provocar a sua morte, extinguindo a possibilidade do sofrimento ali vivido sendo prolongado com tratamentos ineficazes para a sua cura.
Após uma breve análise dos conceitos, possibilitar às pessoas com doença terminal e em grande sofrimento viver os seus últimos dias da forma mais digna quanto possível e com menos dores, é sim considerada uma “morte digna”. Porém, é necessário delimitar o que significa estado de terminalidade ou doença terminal, confrontando-se com a situação daqueles que se encontram em coma ou em estado vegetativo persistente, ou seja, paciente que tem estado grave ou gravíssimo, tendo ainda a sua personalidade permanecendo intocada e, com ela, todos os seus direitos, indo até mesmo contra a dignidade da morte.
Podemos citar vários casos fora do Brasil, como por exemplo, o caso da Nancy Beth Cruzan, no Missouri, um estado norte americano localizado na Região Centro- Oeste do país. Faleceu aos trinta e três anos, doze dias após ser retirada, por ordem judicial, a sua sonda de alimentação, a qual era usada há oito anos. O pedido foi feito pelos seus próprios pais. Já em estado vegetativo persistente e com lesões cerebrais irreversíveis, embora seu sistema respiratório e cardiovascular ainda funcionasse bem. A decisão da Corte foi fundamentada após testemunhas afirmarem haver depoimento de Nancy no sentido de não desejar viver “como um vegetal”, em virtude do acidente. (José Roberto Goldim e Cruzan V. Director, Department of health, 2005)
Outro exemplo que teve bastante repercussão, foi o caso de um norte- americano chamado Terri Schiavo, que faleceu em março de 2005, após passar quinze anos em estado vegetativo persistente. Durante esse tempo, também era alimentada e hidratada por sonda. Houve disputa judicial entre o seus pais e o seu esposo e, em última instância, foi determinado pela Justiça que a sua sonda fosse retirada, para que tivesse lugar o “processo natural de morte”. Ela morreu após treze dias. (Folha de São Paulo, 2005)
Então podemos observar que nos casos de Nancy Beth Cruzan e Terri Schiavo, a história de vida das pessoas com quadros irreversíveis traz grande comoção aos familiares e a sociedade. Sendo relevante citar o valor moral e social, entretanto, não constituem justificativa aceitável para dispor da vida de um ser humano, ainda que da vontade do doente. Muito já se discutiu a ideia, no Brasil, de considerar a interrupção da vida dessas pessoas, pois não têm ao menos consciência do seu estado de saúde e da sua existência, utilizando para isso o argumento de que as suas condições de vida seriam indignas.
Em vários países podemos ver que já existem inúmeras leis que enxergam as condições indignas vividas ali por pacientes terminais e tomam frente de decisões para que ainda possa haver uma morte digna sem infringir o Direito daquela pessoa, permitindo até mesmo a eutanásia, em alguns casos.
Para que se possa efetivar o direito à morte digna, é importante regular o comportamento e as condutas da sociedade, através de normas que disciplinam a convivência das pessoas que compõem o Estado brasileiro, para que possa sanar esse problema social, tendo em vista a proteção da qualidade de vida inerente ao ser humano, assegurando condições materiais mínimas de sobrevivência.
A dignidade da pessoa humana se relacionaria com a possibilidade de a pessoa administrar sua vida e realizar sua personalidade seguindo sua própria consciência, desde que não viole direitos alheios, trazendo, como uma de suas vertentes, a autonomia do indivíduo, a liberdade e o poder de autodeterminação (FILHO, 2010, p. 83).
6.PAÍSES QUE ACEITAM A PRÁTICA E SUAS LEIS
Partindo de uma análise sobre outros países, podemos citar vários países internacionais que possui garantia legal sobre o processo da ortotanásia (desligamento de aparelhos ou retirada de medicamentos, sendo conceito contrário do auxílio para a distanásia - prolongamento da vida, etc.), desta maneira, já é autorizada na Suíça, Luxemburgo, Bélgica, França, Holandês e na Alemanha.
Por sua vez, a prática desse processo nesses países não precisamente é legalmente praticada pelos médicos, como no caso do filme Mar adentro lançado em 2005, quem prestou auxílio foi uma amiga (não um médico). Por analogia in bonam partem (tipo analógico de julgar os casos do direito penal sem prejuízo ao réu.), poderia ser beneficiada pela legislação penal, considerando que em alguns desses países informados, liberar o paciente para que venha a ter uma morte pelo processo natural em casa é sendo considerado também até mesmo uma prática cultural, no qual ocorre a excludente punição de um ato criminal penal.
Podemos concluir que existem várias legislações específicas sobre o assunto que envolve a morte humana. Ditando este modelo de forma que o paciente estando com a doença incurável tem a liberação para poder ter a autoadministração de medicamentos para inibir as dores, sendo considerado um procedimento menos "agressivo" partindo do ponto de vista dos médicos, que concorda em privilegiar a autonomia do paciente.
7. FUNDAMENTAÇÕES UTILIZADAS POR ESSES PAÍSES
Dos países citados no tópico acima trago o país Suíça como nossa primeira citação, tendo uma fundamentação bastante interessante em termos do direito da morte, ela possui duas associações de auxílio à morte - a EXIT e a DIGNITAS - destacando que atualmente o país da Suíça não possui legislação específica acerca do tema.
Esses métodos utilizados e não puníveis vêm por intermédio de uma decisão estabelecida pela Corte Federal do país, instância máxima judiciária, que em 2006 consignou que toda a pessoa tem direito a “boa morte” ou “morre bem”, desde que tenha plena capacidade de discernimento, tratando-se, assim, de uma interpretação do art. 115 do CP suíço, que não pune o crime de auxílio ao suicídio, quando essa ajuda não é realizada por motivos egoísticos.
A partir desta interpretação da lei, entidades não governamentais, como as principais citadas acima, passaram a estabelecer suas próprias regras de auxílio ao suicídio, sob o formato de associações, com normas internas bastante liberais.
Esse paradigma poderá ser considerado utilizado para muitos países que buscam uma legislação a respeito do assunto. A chamada "The Belgian Act on Euthanasia" traduzindo em linguagem brasileira “A Lei Belga sobre a Eutanásia”, conhecido no país da Bélgica possui uma legislação bastante avançada sob em vista das demais normas internacionais, mas com regras específicas e rígidas a respeito de tal prática, criada em 28/05/2002.
Prevendo a prática da eutanásia como medida de auxílio à morte, sendo obrigatório o controle médico, ausência de qualquer pressão externa, observando a manifestação clara de vontade, além da análise feita enquanto a condição fútil medicamentosa, e insuportável sofrimento físico e mental.
A notificação é obrigatória ao Estado, sendo que todos os casos devem ser submetidos a uma comissão de revisão, sendo tudo muito bem analisado. É de se destacar que o parlamento da Bélgica, ocorreu a alteração em sua lei, realizada em 2014, na qual retirou qualquer limite de idade para a realização da eutanásia, expandindo assim a possibilidade de morte assistida aos adolescentes e crianças.
Luxemburgo também possui lei autorizadora da morte auxiliada, denominada de "Euthanasia and Assisted Suicide" que em português se ler “Eutanásia e Suicídio Assistido”, desde 16/03/2009, evidentemente como o próprio nome diz ela permite às duas práticas, e em contrapartida, no mesmo momento, foi promulgado uma lei específica para regulamentar os cuidados paliativos sobre o assunto.
Podemos considerar a semelhança da lei luxemburguesa aos modelos Belga e Holandês, regulamentando, ainda, a possibilidade das chamadas "diretivas antecipadas de vontade", prática que autoriza ao paciente, enquanto ainda consciente, determinar quais serão suas vontades, quando não mais possuir capacidade de expressá-las de maneira integral e completa.
Com os exemplos internacionais, podemos concluir, que nos indica duas formas de trabalharmos esse assunto: Podemos nos basear na interpretação do CP ou legislação específica, que descriminaliza os procedimentos, mediante determinados requisitos.
A interpretação dada à norma penal não nos parece ser o caminho mais tranquilo, pois, além da falta de atualização do nosso CP sobre o assunto que nos deixe claro como será punível criminalmente um ato irregular, a nossa sociedade avança muito mais rápido que as nossas leis. E se partirmos pelo ponto das interpretações das decisões judiciais, elas sofrem alterações ao longo da história, e o que pode representar uma proibição, num momento posterior, transforma-se em liberdade e, pior, diante de um caso concreto a diversidades de detalhes que surgem de acordo com novos problemas que vem apresentando diante do assunto.
Conforme exposto pela nossa Constituição Federal, a vida é um bem jurídico muito bem tutelado é assegurado por ela, onde descrito em nosso artigo 5º da CF que diz: (Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade…), no qual a sua especial proteção no que tange à inviolabilidade do direito à vida. Trazendo o direito fundamental da pessoa humana.
Para começarmos a discorrer sobre o assunto com clareza é interessante frisarmos que o direito à vida é a premissa dos direitos proclamados pelo constituinte sendo um direito elementar de todos os demais, não faria sentido declarar qualquer outro se, antes, não fosse assegurado o próprio direito de estar vivo para usufruir dos outros direitos e liberdades dispostos na nossa Constituição.
Contudo, podemos pontuar que o direito à vida é o primeiro valor moral de qualquer pessoa, originando-se a dignidade da pessoa humana, liberdade, integridade física e psíquica. Tendo como imprescindível a existência do ser humano, o Estado deve preservar e repelir atos que atentam contra ela, porém, o direito à vida não possui caráter absoluto, como bem pensado por Gilmar Antônio Bedin em seu livro Os direitos do homem e o neoliberalismo. De 2002, p. 44:
O direito à vida é, portanto, um direito que transpassa todo o mundo moderno. Além disso, este direito está tão arraigado em nosso cotidiano que qualquer iniciativa em o restringir torna-se, de imediato, uma questão polêmica. Com efeito, basta olharmos para as controvérsias estabelecidas diante da pena de morte, da liberação do aborto e da permissão da eutanásia para verificarmos a veracidade da afirmação anterior.
A Constituição, no artigo 5º, inciso XLVII, alínea a, traz a impossibilidade de pena de morte no Brasil, salvo em caso de guerra declarada, todavia, é notável a exceção ao direito à vida também em casos de aborto legal (crianças anencefálicas), saúde da gestante ou estupro ou em casos de legítima defesa.
Conforme abaixo podemos trazer entendimento do Superior Tribunal de Justiça no qual cita em um Mandado de Segurança número 23.452l do ano de 1999, que homologa o caráter não absoluto de direitos fundamentais:
Os direitos e garantias individuais não têm caráter absoluto. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo por que razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas – e considerado o substrato ético que as informa – permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.
Diante disso, o regime jurídico acaba sofrendo limitações de ordem jurídica, que são destinadas de um lado, a assegurar a existência harmoniosa das liberdades, e por outro lado, defender proteção da integridade do interesse social gerando um fundamento ético, em nenhuma hipótese os direitos ou as garantias podem ser exercidas em forma que traga impraticabilidade da ordem pública com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.
Não podemos deixar de citar, conforme os atuais juristas, o direito à vida começa com a fecundação e termina quando o corpo para de emitir sinais vitais naturalmente. Diante disso, o aborto e a eutanásia não são permitidos no Brasil.
Em conformidade com o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) n. 54, o aborto somente é permitido em casos de risco de vida, de gravidez resultante de estupro e de anencefalia fetal. Assim, uma mulher não pode optar pela interrupção da gravidez se não se enquadrar em alguma das hipóteses mencionadas, pois o feto que está se desenvolvendo em seu ventre já é considerado uma vida.
Nossa legislação vigente considera a eutanásia uma prática como um homicídio porque acredita-se que o correto é a morte natural sem intervenção médica ou de terceiros (ortotanásia).
Sendo um direito, e não se confundindo com uma liberdade, não se inclui no direito à vida a opção por não viver. Na medida em que os poderes públicos devem proteger esse bem, a vida há de ser preservada, apesar da vontade em contrário do seu titular. Daí que os poderes públicos devem atuar para salvar a vida do indivíduo, mesmo daquele que praticou atos orientados ao suicídio. (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, 2017, p. 231).
Assim sendo, a dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da população, envolvendo, desta forma um complexo de deveres e direitos fundamentais que assegurem a população, contra o todo e qualquer ato degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida salubre.
Por parte do Estado e a medicina eles tem por objetivo em prolongar a vida de um paciente acometido de doença grave e incurável a qualquer custo, ocorre que pode estar ferindo a própria dignidade do paciente, pois o resultado dos tratamentos sem relevância que já não traz a cura mais é levar a pessoa a um estado de permanente sofrimento e angústia. Não podemos deixar de observar que faz da pessoa um ser digno, é respeitar a qualidade de vida, desta forma gerando bem-estar e, assim, prestando compromisso com a sua vida e do próximo. Não permitindo assim, que a vida seja uma batalha incansável contra o fim natural de todo ser vivo, a morte. Entendemos que o Estado não obriga ninguém a permanecer vivo, haja vista que a vida é um direito assegurado a todos. Direito este que deverá ser observado cuidadosamente quando outros estiverem em conflito, visando à vontade e bem-estar do responsável desse direito.
O Conselho Federal de Medicina brasileiro aprovou a Resolução nº 1.805/2006, sobre a prática da ortotanásia, que autoriza o médico a limitar ou suspender tratamentos, no caso de doença grave sem possibilidades de cura, e a ofertar cuidados paliativos, desde que com consentimento do paciente ou seu representante legal.
Deixando com bastante clareza a prática da chamada ortotanásia, ao assim definir:
"Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal."
Analisando brevemente a legislação, não há a garantia de que não há impedimento legal nenhum para o procedimento. E se não há previsão legal que impeça a prática, segue-se que deve ser permitida, como prevê o artigo 5º, II, da nossa atual Carta Magna, porquanto “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Desta maneira, não há, na ortotanásia, a ação de ofender a vida, como há na eutanásia, portanto há não do que se fala em homicídio previsto no artigo 121, do Código Penal, omissão de socorros, prevista no artigo 4°, do Código Penal, ortotanásia enquadra os pacientes em estado irreversíveis, mesmo recebido todos os cuidados necessários para sua recuperação hipotética, a situação continua sem melhoria. A insistência dos tratamentos pode ferir o princípio da dignidade humana, prevista no artigo 1º, III, da Constituição Federal.
Frisamos que na ortotanásia, não há do que se dizer que o paciente faleça por abandono, desleixo, negligência ou falta de cuidados. Quando falamos de ortotanásia, falamos de uma situação em que o sujeito já recebeu tratamento e desta mentira prolongar sua vida seria estender seu falecimento. Permitir que um sujeito em sofrimento, com morte iminente faleça não é privar-lhe o direito à vida, tampouco ofender a indisponibilidade do direito a esta, mas garantir sua dignidade. Não devemos entender, portanto, que a ortotanásia fere a indisponibilidade do direito à vida.
“Sobre muito refletir a propósito do tema, chegou à convicção de que a resolução, que regulamenta a possibilidade de o médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente na fase terminal, realmente não ofende o ordenamento jurídico. Desde então a ortotanásia é, pacificamente, aceita pelo nosso ordenamento jurídico.” (JUIZ. Roberto Luis Luchi Demo)
Diante do exposto pelo juiz Roberto, segue-se a conclusão de que a ortotanásia é uma prática que leva ao melhor caminho a ser tomado para fazer valer o princípio da dignidade humana. Não podendo ser confundido com eutanásia que a punições criminalmente em casos que forem cometidos essa prática, tampouco com distanásia. É a permissão para que o paciente faça para que possa falecer naturalmente, quando já se encontra em estado de saúde irreversível, sendo sua morte um ato inevitável.
10 - PROFISSIONAIS DA SAÚDE E A ORTOTANÁSIA
Ao longo das pesquisas realizadas a fim de esclarecer a opinião dos profissionais da saúde e dos familiares que lidam com pacientes em casos terminais, é notório a predileção do bem-estar, dignidade e da boa morte desses pacientes. Visando o sofrimento que a família e principalmente dos profissionais que enfrentam situações como essas, a ortotanásia é vista com bons olhos.
Psicologicamente se torna algo frustrante para aqueles que se dedicam a cuidar e a melhorar a vida de seus pacientes, por possuírem uma consciência mais ampla do prognóstico daqueles que se encontram em situação terminal. Torna-se também angustiante o sofrimento da família.
Embora a tecnologia disponível venha facilitando o cuidado e possibilitando maior sobrevida às enfermidades, vem também, ao que parece, dificultando a resiliência diante da impossibilidade de cura e da terminalidade. Ao que consta, a formação dos profissionais da saúde, em especial a de enfermeiros e médicos, está fortemente vinculada a curar doenças e salvar vidas e, quando salvar essas vidas não se torna viável, surge o sentimento de frustração.
As fragilidades e limites da intervenção profissional, por si só, já justificariam uma maior relevância da abordagem da finitude e dos cuidados em relação a ela nos processos formativos, de forma a promover uma atuação mais segura frente ao óbito de pacientes. (Santana JCB, Santos AV, Silva BR, Oliveira DCA, Caminha EM, Peres FS, et al. Docentes de enfermagem e terminalidade em condições dignas. Rev Bioét)
Sabe-se que o dia a dia na UTI é marcado por situações antagônicas, pois às vezes é possível salvar e, em outras, prorrogar o sofrimento, visto que o paciente se encontra fora das possibilidades de cura, sendo inevitável o processo da morte. Neste contexto, os profissionais são submetidos às pressões quanto à tomada de decisões em momentos críticos, à questão sobre o prolongamento ou não da vida em casos com prognóstico reservado. (Isabel Massetto, Enfermeira. Doutora. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas. Maceió, Alagoas, Brasil).
Dentre os conceitos que envolvem a terminalidade da vida, neste estudo, enfatiza-se que a distanásia tem como objetivo impedir a morte a qualquer preço, enquanto a ortotanásia propõe uma morte digna a qual deve ocorrer no momento correto, havendo a preservação da dignidade do paciente, o controle da dor e apoio psicológico concernente às questões relativas aos aspectos sociais e espirituais. (Annie, Enfermeira. Graduada. Maceió, Alagoas, Brasil)
A ortotanásia vem se firmando cada vez mais como uma possibilidade ética diante do sofrimento que antecede a morte irremediável, sendo uma prática permitida em diversos países. No Brasil, implicitamente, é tutelada através de princípios jurídicos, consubstanciados em princípios éticos e morais, porém, por não ter legislação específica, causa uma insegurança jurídica. (Santos, Enfermeira. Doutora. Professora Associada do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas. Maceió, Alagoas, Brasil).
Tendo em vista a insegurança jurídica, acarreta a permanência da prática da distanásia, que por sua vez, é considerada pela Bioética como uma morte difícil, praticada com o intuito de prorrogar a vida biológica através de tratamentos intensivos, sem valorizar a qualidade de vida e a dignidade na terminalidade. ( Isabel Massetto, Enfermeira. Doutora. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas. Maceió, Alagoas, Brasil).
Cada um traz consigo valores, crenças e uma formação profissional própria e, embora exista um consenso geral de que os profissionais devem ser imparciais e livres de preconceitos, sabe se quer assumir condutas puramente racionais é muito difícil, pois se trata de um relativo pedido de anulação da humanidade do profissional da saúde. Por outro lado, nada mais humano do que a capacidade de julgamento e decisão racional, ponderando entre diferentes argumentos e valores e, também, o desenvolvimento destas capacidades ao longo da vida, considerando a experiência e oportunidades de amadurecimento e reflexão crítica. (Saioron I, Silveira RS da, Ramos FRS)
Mostra-se fundamental avançar no entendimento acerca das estratégias de enfrentamento que vêm sendo muito estudadas pela Enfermagem. Apesar deste estudo não ter se fundamentado no conceito de coping, este vem sendo utilizado para compreender o conjunto das estratégias que podem ser utilizadas pelas pessoas para enfrentar situações estressantes.19-20 Talvez, a aplicação prática de leis normativas auxiliasse nessas condições estressantes, atenuando possíveis sofrimentos decorrentes do adoecer e morrer. (Ana Paula Nogueira, Enfermeira. Doutora. Professora Adjunta da Universidade Federal de Alagoas – Campus Arapiraca. Arapiraca, Alagoas, Brasil).
Os achados retratam a experiência de ortotanásia por parte dos profissionais, envolvendo limites, conflitos e também formas de enfrentar as demandas por decisões e cuidados eticamente e tecnicamente competentes, o que pode apontar para o interesse no aprofundamento deste conceito (coping) nestas realidades de trabalho.
Em um estudo descritivo, de abordagem qualitativa, realizado com 25 profissionais de saúde atuantes na UTI de um Hospital Universitário, em Maceió/AL, a maioria dos discursos mostraram o sentimento de desconforto e que possuíam uma opinião concernente ao assunto, embora não tenham apresentado domínio sobre os conceitos éticos discutidos. Os participantes do estudo julgaram os esforços invasivos nas situações de final de vida, atitudes com o significado de esforços fúteis ou inúteis, e acreditam que se torna necessário respeitar o limite do corpo humano e não persistir com técnicas de manutenção da vida, quando o necessário é respeitar a finitude.
Consideraram que postergar uma morte não significa salvar uma vida com investimentos em tratamentos os quais não possuem a perspectiva de um prognóstico eficiente, induzindo, assim, os indivíduos em final de vida à distanásia. Assim, este último conceito pode ser entendido como “uma morte difícil, penosa, usada para o adiamento da morte e do prolongamento da vida biológica, sem qualidade de vida e sem dignidade, com o propósito de aumentar o tempo de vida através de todos os recursos disponíveis”.
Uma outra questão interessante foi que na percepção desses profissionais, os conceitos éticos, os quais envolvem a terminalidade do indivíduo, são considerados válidos apenas para exercício profissional, excetuando experiências pessoais com seus familiares, geralmente permeadas de envolvimento emocional mais intenso e com uma perspectiva diferenciada.
Um componente importante a ser considerado é o conhecimento das possibilidades de todas as partes envolvidas, incluindo os familiares e o paciente, para que haja um consenso sobre a melhor opção. Deve-se levar em consideração a individualidade, relativa a crenças culturais e religiosas, de cada um e a predileção é de fato individual, assim possibilitando ao enfermo escolher o melhor caminho a ser seguido dentro de seu conceito próprio.
Acerca do tema e das explanações realizadas possuímos diversas problemáticas pela divergência de pensamentos e do próprio ordenamento jurídico. Ressaltando as vertentes filosóficas de Platão e Aristóteles, como também a divergência entre os Institutos Legais da Constituição Federal, do Código Penal e do Conselho Federal de Medicina.
Aristóteles e seus discípulos consideravam que a manutenção da vida deveria ser prioridade a qualquer custo até a sua finitude inevitável, o enfermo deveria ser tratado. Porém, Platão defendia a ideia da “boa vida, boa morte”, em casos de morte iminente por alguma enfermidade, o filósofo entendia que o poder de escolha sobre como morrer, seria do indivíduo, ou seja, defendia a eutanásia e a ortotanásia, denominada assim muitos anos após a existência de ambos.
A Constituição Federal de 1988 defende a dignidade da pessoa humana, contudo o Código Penal, principalmente em seus artigos 122 e 121, penaliza aquele que auxilia outrem na finalidade mortis. Tendo em vista o Conselho Federal de Medicina de nº 1.805 de 28 de novembro de 2006, institui o médico a conscientizar o paciente sobre suas opções de tratamento e de não tratamento.
O princípio da autonomia que leva em consideração o respeito à capacidade de decisão de todo o ser humano, que possibilita à pessoa humana decidir por si mesma. Há, com isso, uma anuência para que o enfermo tenha a sua vontade respeitada ou, em sua incapacidade, através de seu representante, sempre de acordo com suas crenças e vontade. Adota-se, com isto, o reconhecimento do poder de domínio do paciente sobre a sua própria vida e, também, do reconhecimento do respeito à intimidade do paciente.
(SANTORO, Luciano de Freitas)
A problemática da prática da ortotanásia é a falta de regulamentação explícita no código brasileiro, causando impasse entre os legisladores e médicos, em casos mais extremos, pode resultar em ações precipitadas do enfermo, como o fim da vida através de si (suicídio).
A proposta resolutiva, diante da problemática evidenciada acima, idealizadamente seria uma Emenda Constitucional, considerando as divergências entre os institutos legais, a Constituição, em termos legais, possui superioridade.
A Emenda Constitucional proposta acerca da ortotanásia, necessariamente visa regularizar e regulamentar a prática da ortotanásia em pacientes em estado terminal. A fim de evitar situações extremas, segurança aos profissionais da saúde, levando em consideração a vontade do paciente e da família, garantindo a dignidade humana do enfermo.
A introdução de um novo artigo na constituição por meio da emenda constitucional, teria como objetivo sanar lacunas e divergências existentes entre o código penal e o conselho federal de medicina, criando uma normativa regulamentadora. Dessa forma, apoia e concretiza o objetivo da emenda constitucional, ou seja, a adaptabilidade legislativa diante as relevantes evoluções sociais.
Assim descrito como objetivos:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - Construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - Garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
(CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988)
13. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, para elucidar as considerações finais deste estudo, vimos que o direito à vida não é tratado de forma absoluta, apesar da Constituição Federal de 1988 nos dar esse direito garantido. Desta forma, a ortotanásia é baseada, essencialmente, ao respeito da dignidade da pessoa, no qual conceituamos subjetivamente, que a escolha da boa morte ou da morte natural seja do próprio doente com doença terminal ou incurável.
Entende-se que, ainda que o Estado tenha o dever de proteger a vida humana, de acordo com o caput do artigo 5° da Constituição Federal (BRASIL, 1988), o dever da proteção não é arbitrário, sendo necessário uma análise minuciosa a respeito da situação da morte inevitável, considerando também uma análise fundamental, constitucional da dignidade da pessoa, prevista no artigo 1°, inciso III.
Trazendo então, os caminhos que introduz no que dizemos no sentido da manutenção da vida, deverá trazer consigo o respeito a escolher do próprio paciente e em situação de ausência de vícios na declaração de vontade do paciente o seu representante legal tenha a tomada de decisão, sendo preciso que seja respeitada. Este mostrou ser, portanto, o ponto idôneo para que seja evidentemente clara e respeitada a dignidade da pessoa.
Sendo o tratamento paliativo, tanto quanto o tratamento dos médicos, ou o que se resulta na ortotanásia, ou seja, aqueles que prolonguem a vida mais do que das suas forças naturais - a distanásia. Desse modo, no caso de doença grave sem possibilidades de cura, desde que com consentimento do paciente ou seu representante legal, não há do que se falar em punição ética disciplinar do médico que praticasse a ortotanásia, prevista na Resolução CFM n° 1.805 (BRASIL, 2006), foi reafirmada no Novo Código de Ética Médica (BRASIL, 2009), notamos de forma interessante como evolução, quebrando os paradigmas e fazendo valer o respeito, trazendo para o paciente terminal a autonomia da escolha, efetivando para si o melhor procedimento digno, optando, também, até mesmo pela sua morte natural.
Consequentemente, tem-se que o acatamento com todo esse processo vivido em um momento difícil que o paciente se encontra é fundamental , pois, eles tendo essa autonomia, estamos produzindo também o efeito da qualidade de vida - ainda que curta - e, sendo livre e reconhecida a sua dignidade, sendo relevante destacar, que essa escolha carrega o peso imenso pessoal e familiar, sentimento particular, podendo ser tornar uma das últimas vontades da pessoa de ser expressar e gozar naquele momento vivido.
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graduanda em Direito pela faculdade UNA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARTUR, Alexandra Martins Bento. A ortotanásia: a regulamentação no código brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 jun 2023, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61712/a-ortotansia-a-regulamentao-no-cdigo-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
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