VICTOR DANIEL OLIVEIRA DA SILVA[1]
(coautor)
RESUMO: O presente artigo visa aprofundar os estudos acerca da influência da mídia nos crimes de grande repercussão no Brasil. Serão abordadas à liberdade de expressão e a importância do papel da imprensa para os espectadores, bem como os seus malefícios e interferência direta no fato concreto, transformando o acompanhamento dos casos em verdadeiro “reality show” da vida real, violando os princípios e garantias constitucionais do acusado, mesmo antes do trânsito julgado da sentença. Será abordada a imparcialidade do Juiz e do Júri, ao sentenciar crimes que repercutem em grande proporção no nosso país. Será abordado o sensacionalismo da mídia que resultam no clamor social e julgamento antecipado, manipulando as informações, impactando diretamente nas decisões e sentenças finais dos processos.
Palavras-chave: Influência da Mídia. Grande repercussão. Direito Penal.
ABSTRACT: This article aims to deepen the studies on the influence of the media in crimes of great repercussion in Brazil. Freedom of expression and the importance of the role of the press for spectators will be addressed, as well as its harm and direct interference in the concrete fact, transforming the monitoring of cases into a real "reality show" of real life, violating constitutional principles and guarantees. of the accused, even before the final judgment. The impartiality of the Judge and the Jury will be addressed, when sentencing crimes that have great repercussions in our country. The media sensationalism that results in social outcry and early judgment will be addressed, manipulating information, directly impacting the decisions and final sentences of the processes.
Keywords: Media Influence. Great repercussion. Criminal Law.
SUMÁRIO: 1) Introdução. 2) Direito Penal e Processo Penal. 2.1) Princípios do Direito Penal e Constitucionais. 2.1.1) Principio da Presunção de Inocência. 2.1.2) Principio da Verdade Real. 2.1.3) Principio da ampla defesa e contraditório. 2.1.4) Princípio da Imparcialidade Do Juiz no Processo. 2.1.5) Devido Processo Legal. 2.2) O Tribunal do Júri. 3) A Mídia e a liberdade de informação. 3.1) Opinião Pública nos crimes midiáticos. 3.2) A Influência da mídia nos julgamentos. 4) Considerações finais. Referências Bibliograficas.
1 INTRODUÇÃO
A mídia tem um papel de grande relevância ao repassar as informações para seus espectadores, exercendo um grande poder de influência, muitas vezes influências negativas por se tratar do enfoque sensacionalista midiático, principalmente se tratando de tragédias.
Tal influência pode afetar principalmente o lado emocional da pessoa que vai receber a notícia, que muitas vezes, são pessoas leigas em determinados assuntos. Assim, é de se considerar o papel de grande responsabilidade da mídia, que por muitas vezes transmite informações errôneas de forma imprudente, sem ser realmente investigadas, apenas por busca de audiência e “furo” de notícias.
Dessa forma, resulta em um grande retrocesso na nossa sociedade, além de desrepeitar o Principio da Presunção da Inocência (artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal) que dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. A finalidade desse princípio é resguardar a garantia de segurança jurídica da tutela das liberdades.
Representando um grande retrocesso e descumprimento do referido preceito constitucional, o papel da mídia nos casos atuais de grande repercussão tem, em grande parte, enfoque puramente sensacionalista, condenando o acusado antes mesmo de garantir-lhe o direito a um devido processo legal, amparado assim pelo contraditório e a ampla defesa.
Essse tipo de postura da mídia sensacionalista ocasiona o julgamento antecipado pela população, sem deixar margens para que o réu seja condenado somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, conforme previsto na Constituição Federal. No nosso país temos grandes exemplos desses tipos de situações, principalmente quando se trata de crimes que ganham uma grande repercussão, tais como o caso da Daniela Perez em 1992, da Eloá em 2008, caso da Suzane Von Richthofen em 2002, o caso do goleiro Bruno em 2010, que se tornou um grande circo midiático, entre outros.
O trabalho em tela visa abordar as consequências da influência midiática na nossa sociedade em casos de crimes de grande repercussão, causando o prévio julgamento, resultando na condenação antes mesmo do devido processo legal.
2 DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL
O Direito Penal é um instituto jurídico de suma importância na proteção dos bens jurídicos da sociedade, sendo esse o ramo do direito para aplicações de sanções cabíveis ao caso concreto.
Na esfera criminal, todo o trâmite processual, incluindo desde a defesa dos acusados e vítimas envolvidos até o julgamento/sentença condenatória, através da figura do advogado ou denfensor público ocorrem através do Processo Penal.
Segundo Andrade (2017), o processo penal funciona como meio fundamental de garantia dos direitos do acusado, não sendo um mero instrumento de efetivação do Direito Penal, mas, um instrumento de efetivação dos direitos humanos fundamentais.
2.1 PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL E CONSTITUCIONAIS
Os princípios são aplicados como orientação, direção da aplicação da Lei, não devendo ser superior a Lei, mas sim garantidor dos direitos dos seres humanos em sociedade.
2.1.1 Principio da Presunção De Inocência
O princípio de presunção da inocência encontra-se positivado na Constituição Federal, bem como no texto legal da Convenção dos Direitos Humanos. Dispõe o art. 5º, LVII da CF/88 que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. No mesmo sentido, o art. 8º, item 2, da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), aponta que “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente a sua culpa”.
Para utilização do princípio em tela, é necessário observar a regra probatória denominada como in dubio pro reo até o trânsito em julgado, ou seja, "na dúvida, adote-se a resolução que for mais favorável ao réu". Segundo essa regra, o Ministério Público ou o querelante têm o ônus de provar a culpa do acusado.
Deve-se observar também a regra de tratamento e suas dimensões interna e externa. Na dimensão interna o objetivo e fazer com que o magistrado se convença da inocência do réu e absolva-o quando não for provada sua culpa. Já a dimensão externa, visa impedir o julgamento e publicidade abusiva do acusado, uma vez que ainda não foi condenado judicialmente.
2.1.2 Principio da Verdade Real
O princípio da verdade real no ponto de vista de Ada Pelegrini, pode ser definido como:
O princípio dispositivo consiste na regre de que o Juiz depende, na instrução da causa, da iniciativa das partes quanto às provas e às alegações em que se fundamentará a decisão: judex secundum allegat ET probata partium uidicare debet.(PELEGRINI,2008,p.70).
Assim, o princípio da verdade real, aponta que o julgador deve buscar estar mais próximo possível das verdades ocorridas no fato (uma vez que é impossível a verdade absoluta), para a aplicação da pena e da apuração dos fatos.
O Direito Processual Penal adota o princípio da verdade real, material ou substancial pautados no art. 156.
2.1.3 Principio da Ampla Defesa e Contraditório
Discorre Diego Augusto Bayer que:
A ampla defesa encontra correlação com o princípio do contraditório e é o dever que assiste ao Estado de facultar ao acusado a possibilidade de efetuar a mais completa defesa quanto à imputação que lhe foi realizada. Abrange a autodefesa, realizada pelo acusado em seu interrogatório, e a defesa técnica, que exige a representação do réu por um defensor, que pode ser constituído, públio, dativo ou ad hoc.(BAYER, 2013)
Nesse sentindo, Igor Luis Pereira e Silva aponta que:
O princípio da ampla defesa determina a participação efetiva no processo penal, abrangendo a autodefesa, a defesa técnica, a defesa efetiva e a possibilidade de utilização de todos os meios de prova passíveis de demonstrar a inocência do acusado, incluindo as provas obtidas ilicitamente. (PEREIRA E SILVA, 2012, p.270)
O princípio da ampla defesa e contraditório derivado da frase latina Audi alteram partem (ouvir o outro lado) garante que nenhum acusado sofra os efeitos da sentença sem ter tido a possibilidade de ter efetivamente participado da formação da decisão judicial, ou seja, do direito de defesa.
2.1.4 Princípio da Imparcialidade do Juiz no Processo
A Imparcialidade do Juiz é o principal requisito para que o magistrado possa exercer sua função jurisdicional, uma vez que o mesmo deve se colocar acima e entre as partes. Nessa linha, discorre o art. X da Declaração Universal dos Direitos Humanos que:
Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele. (UNICEF, 1948)
Assim, o presente princípio dispõe que o magistrado deve conduzir o processo como instrumento de justiça para que seja vencida a parte que realmente tenha razão.
2.1.5 Princípio do Devido Processo Legal
No Processo Penal, o princípio do Devido Processo Legal visa garantir que todos os envolvidos possuam as mesmas condições e garantias nas tratativas processuais, disponibilizando um julgamento justo, impossibilitando o Estado de decidir qualquer demanda de forma arbitrária.
2.2 O TRIBUNAL DO JÚRI
O Tribunal do Júri,utilizado para julgar crimes de imprensa, chegou ao Brasil em 1822, onde era composto pelo Juiz de Fato e vinte quatro cidadãos nomeados pelo Corregedor e Ouvidores do crime, compondo o Conselho de Sentença, através do requerimento do Procurador da Coroa e Fazenda (Promotor e o Fiscal dos delitos).
No ano de 1824, o Tribunal do Júri passou a julgar causas cíveis de criminais, porém em 1842 o júri passou a ser disciplinado pelo Código de Processo Criminal.
Em 1967 a Constituição do Brasil, no art. 150, §18, manteve o Júri dentro do capítulo dos direitos e garantias individuais. Em 1972, houve a alteração em alguns pontos do Código de Processo Penal, apontando que o réu pronunciado, se primário e de bons antecedentes, poderia responder em liberdade.
A partir da vigência da Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso, XXXVIII, o Júri foi apontado como uma Garantia Constitucional, garantindo a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para os crimes dolosos contra a vida (art. 5°, inciso XXXVIII, da CF/88).
Atualmente nosso Júri é composto por homens e mulheres com idade mínima de 18 anos, reputação ilibada, sem qualquer ligação com o acusado, e possui como objetivo principal julgar os crimes dolosos contra a vida.
Sobre o Tribunal do Júri, discorre Queiroz:
Com alguma frequência o tribunal do júri tem decidido pela absolvição de réus que alegam negativa de autoria, exclusivamente, apesar de responder, afirmativamente, às duas perguntas iniciais sobre a materialidade e a autoria delitiva, conclusivas de que foi o réu quem praticou o homicídio ou dele participou. Para alguns autores, essa decisão, embora contraditória, seria legítima em virtude da soberania dos veredictos, razão pela qual os jurados estariam livres para decidirem como quiserem, para além do ordenamento jurídico. (QUEIROZ, 2012)
Dessa forma, até que seja julgado, o acusado não pode ser considerado culpado, devendo o Júri conduzir um julgamento justo de acordo com o caso concreto, por pessoas imparciais e leigas.
3 A MÍDIA E A LIBERDADE DE INFORMAÇÃO
A mídia tem um papel de suma importância para sociedade, levando informações aos cidadãos, no entanto, essas informações devem ser repassadas com segurança, onde o jornalista/escritor do conteúdo faça se valher da boa-fé e sensatez.
O direito a informação é uma garantia constitucional que contribui para a formação da opinião pública passando a ser uma espécie de controle social.
Art 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; (BRASIL, 1988)
Nesse sentido, completa Almeida que “A constituição federal em seu artigo 5º, IV, consagra o direito à livre manifestação do pensamento como uma das garantias fundamentais dos cidadãos e m dos pilares do Estado Democrático de Direito” (ALMEIDA, 2007, p.15)
Discorre Miranda (2015) apud Abrantes (2021):
cumpre observar que o direito de informar, ou ainda, a liberdade de imprensa leva à possibilidade de noticiar fatos, que devem ser narrados da maneira imparcial. A notícia deve corresponder aos fatos, de forma exata e factível para que seja verdadeira, sem a intenção de confundir o receptor da mensagem, ou ainda, sem a intenção de formar nesse receptor uma opinião errônea de determinado fato. O compromisso com a verdade dos fatos que a mídia deve ter vincula-se com a exigência de uma informação completa, para que se evitem conclusões precipitadas e distorcidas acerca de determinado acontecimento. (MIRANDA, 2015 apud ABRANTES, 2021)
Quando se tem um crime de grande barbaridade (ao qual vai muito ao contrário dos princípios impostos na nossa sociedade), como assassinatos, estupros, sequestros e etc., a mídia intensifica a notícia e dramatiza a situação, resultando no impacto e comoção da sociedade que passa a antecipar julgamento do suposto acusado, cobrando intensivamente “justiça” para aquele caso concreto
Nesse ponto de vista, observa Aury Lopes Jr. (2005):
Mas velocidade das noticias e a própria dinâmica de uma sociedade espantosamente acelerada são completamente diferentes da velocidade do processo, ou seja, existe um tempo do direito que está completamente desvinculado do tempo da sociedade (LOPES JR, 2005, p.80).
Sendo assim,resta claro, que o desempenho da mídia no transporte de notícias deve ser de forma responsável devido a sua grande influência na opinião pública e até mesmo nos julgamentos.
3.1 OPINIÃO PÚBLICA NOS CRIMES MIDIÁTICOS
Conforme já citado, é de suma relevância o papel da mídia sobre o controle social e construção da opinião pública.
Nesta perspectiva leciona Greco (2012):
O controle social é exercido por meio de duas categorias, como deixamos antever. Existe o controle forma, realizado por profissionais ligados diretamente ao Estado, a exemplo policiais, promotores de justiça, juízes etc., e outro de natureza informal, que é procedido por qualquer pessoa que não tenha especificamente essa função, podendo ser levado a efeito por pessoas próxima ao agente,como seus pais, vizinhos,colegas de trabalho,professores, transeuntes, imprensa etc. (GRECO, 2012,p.34)
Geralmente, a mídia é o principal meio de comunicação ao qual a população se mantém informada acerca dos acontecimentos atuais e na maioria das vezes, sem nenhuma visão crítica. Dessa forma, a mídia além de trazer a informação para a sociedade, tem o “poder” de passar adiante a interpretação dos fatos conforme sua ideologia editorial.
Vale destacar que por diversas vezes, a mídia tende a “apelar” para o uso das imagens voltadas a manipular a opinião pública, oferecendo ao seu público informações previamente julgadas do que se entende por certo ou errado, o justo ou o injusto. Nesse sentido, discorre Anderson Schreiber:
Em uma sociedade global ávida por notícias e informações e conectada em tempo integral com os novos e instantâneos meios de comunicação, são grandes os riscos de utilizações indevidas de imagens de arquivo, sobretudo se descontextualizadas no momento de sua reutilização. (SCHREIBER, 2013, p. 159)
Não há de se duvidar da importância que os meios de comunicação tem para a sociedade, sendo responsáveis pelo desenvolvimento complementar dos entes sociais. No entanto, apartir dos avanços tecnológicos, observa-se que a originalidade das informações vem sendo superadas conforme ideologias de quem quer transmitir a mensagem, não deixando a par do receptor, as conclusões e críticas acerca de determinados assunto
Dessa forma, temos que a opinião pública, vem sendo construída sem verificações e análise crítica das informações que lhe são repassadas, sendo as informações produzidas unilateralmente, reproduzidas instantâneamente sob esse ponto de vista unilateral no meio social.
A influência da mídia, sobre a opinião pública pautadas na ideologia da sua editora, viola as garantias fundamentais do acusado, uma vez que antes mesmo do julgamento pelo corpo jurídico competente, a população já faz o seu julgamento. No Brasil, temos grandes exemplos desse tipo de situações, como por exemplo, o casa do casal Nardoni que antes mesmo do julgamento, já foram apontados como culpados pela população.
O ponto levantado ao longo dessa pesquisa, não se trata de impedir a mídia de repassar informações e sim que tal prática seja realizada com responsabilidade e dentro da lei.
“Desta forma, quando os meios de comunicação de massa distorcem os acontecimentos de uma investigação ou de um processo criminal, extrapolam o seu direito de informar a população, atuando, pois, fora âmbito da proteção constitucional à liberdade de manifestação. O mesmo se verifica quando a mídia abusa do direito de manifestar sua opinião(...)”. (FREITAS, 2018, p.280)
Pontua Peres e Blattes:
No ramo jurídico, verificam-se consequências negativas oportunizadas pelo indevido uso das tecnologias informacionais. Estas são ferramentas poderosas de registros, processamento e propagação dos discursos midiáticos e ideológicos, que podem levar (e frequentemente levam) a uma simplificação informativa que acaba gerando falsos consensos, ou um senso comum simplificado ou grosseiro, invertendo o sentido real dos acontecimentos.(PERES e BLATTES, 2014)
Dessa forma, por todo exposto, é imprescidível a responsabilidade do transmissor das informações e a conscientização dos espectadores vulneráveis, para não serem manipulados pelas ideologias da mídia, sem o senso crítico e análise das notícias sob diversas perspectivas.
3.2 A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NOS JULGAMENTOS
A mídia possui uma estreita relação com as notícias criminais, principalmente quando se tratam de crimes horrendos e repugnantes aos olhos da sociedade, transmitindo uma visão sensacionalista do crime para os receptores da informação.
Nesta diaspasão, analisa Peres e Blattes:
A violência é um produto de consumo que invade os meios de comunicação de massa. Assim, o sucesso criminal e a visibilidade do mal se incorporaram à agenda midiática. Nessa medida, os meios de comunicação de massa podem abarcar todos os sentidos dos receptores, isto é, telespectadores, ouvintes e leitores, de modo que os olhos e ouvidos fiquem vulneráveis a sua série de registros informacionais. E, quando a propagação midiática se trata de matéria criminal, é que o audiovisual se torna ainda mais atrativo e, consequentemente, sob ele se lançam diversos olhares punitivos.
Essa influência é legitimada diante de um discurso ideológico repressivo que acaba sendo incorporado pela população, na medida em que consome o “produto” da notícia-crime. A mídia, ao mesmo tempo em que dá acesso à informação, tenta formar a opinião pública direcionando uma mensagem carregada de conteúdo valorativo que, em certa medida, estereotipa certas situações, cria inverdades e generaliza enfoques e dados. (PERES e BLATTES, 2014)
Em razão do aumento da violência e criminalidade, criações de Leis mais gravosas para os indivíduos que cometem os ilícitos e insegurança da sociedade, o papel de transmissão de informações da mídia, vem com uma responsabildade maior, uma vez que além de demonstrar os crimes que vem ocorrendo, deve demonstrar a punição desses crimes.
No entanto, a mídia sensacionalista, ultrapassa os limites de sua representação, convertendo o temor social em suas técnicas de articulação resultando no clamor social, sendo utilizado como ferramenta da defesa ou acusação do Tribunal do Júri.
Não deveria a mídia, assumir o papel de julgador e investigador tendo em vista que o seu dever se resume em repassar a infomação com o compromisso da imparcialidade. Para um julgamento justo, cabe a competência do Tribunal do Júri, garantido constitucionalmente.
Vale ressaltar que, por mais horrendo que seja o crime, não pode-se resultar na perda dos direitos constitucionais garantidos ao réu, uma vez que, pode ocorrer de o suspeito ser inocentado ao final da persecução penal.
Sobre o tema, leciona Sandro Roberto Vieira18:
Certamente nestes exemplos, defensores e promotores de justiça, deixam de lado a letra da lei e partem para o lado emocional, comovendo assim os jurados sobre suas teses adotadas, não poderia ser de outra forma, pois se formado o convencimento pela mídia nada adiantaria apenas falar dos direitos do acusado. (VIEIRA, 2009)
Conforme já citado, o corpo de jurados é formado por sete cidadãos sorteados aleatoriamente entre 25 pessoas para representar o povo no julgamento dos crimes dolosos contra a vida, elencados no art. 74, §1º, do Código de Processo Penal.
Os jurados são os juízes de fato, estando submetidos às mesmas regras processuais dos juízes togados, inclusive em relação à suspeição e impedimento, conforme dispõe o art. 448,§ 2º, CPP: “Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados”.
Sobre a temática, discorre os artigos 252 e 254, do CPP:
Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:
I - tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II - ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;
III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;
IV - ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.
Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:
I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;
IV - se tiver aconselhado qualquer das partes;
V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
VI - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo. (BRASIL, 1941)
Posto isso, observa-se que a mídia pode ser uma “ameaça” para o julgamento e condução do Tribunal do Júri, apartir do instante que transmite falsas informações, oferencendo um “julgamento”, antes do próprio Conselho de Sentença. Dessa forma, sendo o corpo de jurados composto por cidadãos leigos, sem formação jurídica, receptores desses meios informativos, percebe-se a dificuldade em filtrar as informações obtidas por meio dos instrumentos midiáticos, podendo ser facilmente influenciados pelas mídias sensacionalistas e apelativas, tomando decisões pautadas no pré-julgamento dos fatos e supeito.
É essencial que o Poder Judiciário conduza um julgamento de forma coerente e responsável, desde a denúncia até a sentença final. No entanto, é imprescindível que o corpo de jurados, sejam imparciais para realizar o julgamento de forma justa. Caso não ocorra dessa forma, o desaforamento é uma medida imperativa que visa deslocar a competência para o julgamento do processo, vejamos:
Art. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas.
Art. 428. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (BRASIL, 1941)
Embora o legislador tenha previsto a possibilidade de desaforamento, dependendo da repercussão midiática, alguns casos alcançam notoriedade nacional, impossibilitando o desaforamento.
Por fim, com base nos estudos até aqui, verifica-se que os integrantes do Tribunal do Júri, podem ser facilmente manipulados consciente ou inconsciente, por meio da ideologia midiática. Assim, é importante que os jurados “deixem de lado”, os seus pré-julgamentos e preconceitos para que seja realizada a decisão justa, tendo em vista que o suspeito até o último momento ainda pode ser considerado inocente e a decisão final impactará a vida desse indivíduo para sempre.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O principal objetivo dessa pesquisa era mostrar a influência da mídia sobre as decisões nos tribunais de júri e seu impacto na opinião pública.
O papel da imprensa é essencial para a nossa democracia. Porém, tal função deve ser desenvolvida pautada na honestidade, responsabilidade e seriedade. Assim, a informação repassada a população deixará a cargo das pessoas a formação crítica do pensamento, resultando na justiça social livre de interesses privados.
Ao longo da pesquisa, foi possível vislumbrar a grande influência dos instrumentos de comunicação no processo penal e nos julgamentos, principalmente sobre o corpo dos jurados, violando garantias constitucionais positivadas dos acusados, tais como à presunção de inocência e a imparcialidade do júri e juiz.
Já é definido pela legislação, as atribuições e funções de acusação, julgamento e condenação ao Poder Judiciário, e quanto as investigações, ficam a cargo da autoridade policial. Portanto, a mídia não deve desempenhar funções ao qual não são atribuídas a sua classe, devendo se ater à objetividade e a ética.
Porém, Conforme demonstrado ao longo do presente estudo, a realidade é outra. Infelizmente, a imprensa veicula os fatos criminosos de forma sensacionalista e ideológica, manipulando a opinião pública.
Além disso, os jurados do Tribunal de Júri, muitas vezes deixam se levar pela influência da mídia e clamor social, não cumprindo a imparcialidade frente a tal realidade.
Dessa forma, ficou claro a insegurança jurídica do Tribunal do Júri uma vez que os jurados dão o seu veredito baseado em seu convencimento pessoal, sem necessidade de fundamentação.
Por fim, apartir do presente estudo, conclui-se que não se trata de censurar a mídia, mas exigir o cumprimento de seu papel com responsabilidade, transparência e ética. A manipulação da opinião pública e do Tribunal do Júri pela mídia, resulta na violação de dois princípios fundamentais para o exercício da justiça, sendo eles a imparcialidade e a presunção da inocência, direitos fundamentais do acusado. Além disso, o impacto que o julgamento errôneo pode trazer na vida de um inocente, o marcará para sempre. Assim, é importante que a mídia exerça a sua função com cautela e respeito a todosos envolvidos.
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Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA Contagem.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Emanuelle Amorim de. Casos de grande repercussão no direito penal brasileiro – a influência midiática Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 dez 2022, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/60693/casos-de-grande-repercusso-no-direito-penal-brasileiro-a-influncia-miditica. Acesso em: 21 nov 2024.
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