RESUMO: O presente trabalho visa esclarecer a execução provisória da pena, correlacionando sua aplicação ao princípio da não culpabilidade e determinar os efeitos desta execução, em especial, no que tange a prescrição. Com o antigo posicionamento adotado pela pacífica jurisprudência, utilizavam os patronos do máximo número de recursos para que se estendesse ao máximo o lapso temporal entre o julgado de primeiro grau e o trânsito em julgado, mantendo, desta forma, o acusado solto. Em que pese já haver entendimentos antigos do Supremo Tribunal Federal pela aplicação da execução provisória da pena, consolidou-se após o ano de 2009 (dois mil e nove) que a pena deveria ser aplicada apenas com o trânsito em julgado, porém em decisão histórica, a Suprema Corte retoma seu antigo entendimento, determinando a aplicação da pena a partir do exaurimento de fatos e provas, permeando, ainda, o presente trabalho pelos efeitos desta decisão no âmbito da prescrição. Verificou-se em pesquisa que tal decisão não fere o princípio da não culpabilidade, tendo em vista que os recursos aos Superiores Tribunais não visam revisitar fatos e provas, não ferindo, portanto, o duplo grau de jurisdição e a presunção de não culpabilidade, mesmo se a questão pender de recurso, inclusive gerando para o acusado a mudança da prescrição da pretensão punitiva para prescrição da pretensão executória, mesmo que provisório o cumprimento de pena.
Palavras-chave: Execução provisória da pena. Supremo Tribunal Federal. Princípio da não culpabilidade. Prescrição.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA E SUA RELAÇÃO COM O PRINCÍPIO DA NÃO CULPABILIDADE 1. Conceito e previsões normativas anteriores. 2. O princípio da não culpabilidade e seus efeitos na visão do Supremo Tribunal Federal. 2.1. Do ativismo judicial. 2.2. Execução provisória da pena e princípio da presunção de não culpabilidade 3. Prescrição após HC 126.292/SP. CONCLUSÃO REFERÊNCIAS
O princípio de presunção de inocência ou não culpabilidade é um dos princípios norteadores do Direito Processual Penal brasileiro e se caracteriza como uma regra de tratamento pela qual deve ser submetido o acusado durante todo o chamado “persecutio criminis”, ou seja, o caminho pelo qual o Estado deve exercer, respeitando o devido processo legal, para que possa exercer seu “jus puniendi”.
Destarte a importância do presente princípio, histórica se mostra a decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou, em mudança de sua firme jurisprudência, o início da execução provisória da pena após decisão que exaure a análise de fatos e provas, como ocorre, normalmente, após o julgamento em duplo grau de jurisdição. Cabe, portanto, definir se tal decisão de nossa Suprema Corte macula o referido princípio e, ainda, seu reflexo no que se refere a prescrição da pena.
Percebe-se, portanto, que a execução provisória da pena pode se caracterizar como principal impeditivo à aplicação do princípio da não culpabilidade, razão pela qual se faz necessária estabelecer às condições pela qual irá ser aplicada, sua forma de atuação perante o princípio da não culpabilidade e seus reflexos penais, em especial na forma de prescrição que corre enquanto cumprida esta pena provisória.
Tendo em vista o exposto, pode-se concluir que o presente artigo científico vem a responder aos seguintes questionamentos: O que é o princípio da não culpabilidade? O início da execução provisória da pena estaria ferindo tal princípio? De que forma deve-se aplicar a prescrição durante a execução provisória da pena?
O artigo científico deve atender a objetivos, tratando neste do seguinte objetivo geral: Analisar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal acerca do termo inicial para o cumprimento de pena. Além dos seguintes objetivos específicos: Definir o princípio da não culpabilidade; adequar a atuação do presente princípio com a execução provisória da pena, e, ainda, determinar de que forma deve correr a prescrição durante a execução provisória de pena.
A justificativa que ensejou o discorrimento acerca do presente veio da importância constitucional do princípio da não culpabilidade, estando presente em tratados internacionais de direitos humanos e a verificação de sua possível violação pela Suprema Corte pátria. Não se pode excluir dentre as justificativas a segurança jurídica, princípio necessário, em especial, na correta aplicação da execução da pena provisória, tendo em vista que o recente tema ainda é gerador de muitos questionamentos por parte dos juristas e da população.
Em relação aos aspectos metodológicos, as hipóteses foram investigadas por meio de pesquisa bibliográfica. A abordagem é qualitativa, procurando aprofundar e abranger as ações e relações humanas, observando os fenômenos sociais de maneira intensiva. Quanto aos objetivos, a pesquisa é descritiva, buscando descrever fenômenos, descobrir a frequência que um fato acontece, sua natureza e suas características, e exploratória, procurando aprimorar, buscando maiores informações sobre o tema em questão.
Tendo em vista o exposto, tratará a primeira seção do conceito do princípio da não culpabilidade, histórico e forma de aplicação.
A segunda seção trará a decisão do Supremo Tribunal Federal no “Habeas Corpus” 126.292, suas razões e a forma que se relaciona com o princípio da não culpabilidade.
Na terceira seção, apresenta-se o que acontece após o início do cumprimento da execução provisória, dando enfoque na prescrição e sua forma de aplicação.
Ante o exposto, desenvolver-se-á um estudo acerca da matéria, com o escopo de explicitar o viés constitucional da decisão de nossa Suprema Corte, colaborando para o melhor entendimento acerca do tema e buscando dar maior segurança jurídica aos operadores do direito e a população.
O princípio da não culpabilidade, ou da presunção de inocência, como amplamente colocado na doutrina, teve sua primeira aparição na Declaração dos Direitos do Homem e do cidadão de 1789, conforme afirma o autor Antônio Alberto Machado (2014, p. 71), esta estabeleceu que todo homem deverá ser presumido inocente até que tenha sido declarado culpado, “verbis”;
O princípio liberal de inocência, proclamado no art. 9o da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, estabelece que todo homem deve ser presumido inocente até? que tenha sido declarado culpado.
Após a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, a Assembleia da Organização das Nações Unidas proclamou em 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos, sendo de grande importância, a também previsão deste princípio que deve ser adotado por todas as nações, conforme expresso texto transcrito:
Artigo 11.
Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. 2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no 'momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso. (Organização das Nações Unidas, 1948)
Mais recentemente, em tratado pelo qual o Brasil reconhece força supralegal, o Pacto de San José da Costa Rica previu este princípio, visando tratar-se claramente da presunção de inocência “Art. 8º §2º Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa”.
Percebe-se que os documentos mostrados se referem claramente a uma presunção de inocência, porém o que está claramente previsto na promulgada Constituição Federal de 1988 aparenta se tratar de um conceito diferente, o qual se associa de forma mais íntima com o princípio da não culpabilidade, conforme o bojo de seu artigo 5º, inciso LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”
Apesar da citada diferença que produz efeitos práticos, os doutrinadores colocam majoritariamente esses princípios como sinônimos, conceituando Guilherme de Souza Nucci (2017, p. 34):
Conhecido, igualmente, como princípio do estado de inocência (ou da não culpabilidade), significa que todo acusado é presumido inocente, até que seja declarado culpado por sentença condenatória, com trânsito em julgado. Encontra-se previsto no art. 5.º, LVII, da Constituição. Tem por objetivo garantir, primordialmente, que o ônus da prova cabe à acusação e não à defesa. As pessoas nascem inocentes, sendo esse o seu estado natural, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável ao Estado-acusação evidenciar, com provas suficientes, ao Estado-juiz, a culpa do réu.
Levy Emanuel Magno (2013, p.56) também traz em sua obra conceito semelhante igualando os enunciados de não culpabilidade e presunção de inocência: “Enuncia que todo acusado e? presumidamente inocente até que seja declarado culpado por sentença penal condenatória, com trânsito em julgado”.
Depreende-se do exposto o conceito do princípio da não culpabilidade, que tem grande importância na aferição de legitimidade ao instituto tema do presente artigo, colocando-se como regra de tratamento àquele que se submete ao processo e determinando que este deverá ser tratado como não culpado até que o Poder Judiciário tenha decido de forma cabal acerca de sua culpa no processo.
Cabe ressaltar que alguns autores, tal como Antônio Alberto Machado (2009, p.72,) afirmam em sua obra que este princípio teria apenas viés formal, não se coadunando com a razão para o qual foi criado, como pode-se inferir do seguinte:
É forçoso concluir que esse discurso racional e meramente retórico dos e garantias liberais, consagrados no âmbito constitucional, tal como a presunção de inocência, para a maioria dos acusados tem efeitos apenas “encantatório”, não efetivo, operando tão somente no nível formal. São, por assim dizer, fórmulas destinadas a proporcionar uma aparência de legalidade democrática aos mecanismos de repressão e controle da sociedade pelo Estado com o objetivo de justificar essa repressão. Atuam, portanto, no campo ideológico, que é o campo imaginário social em que “as imagens discursivas são vividas como a realidade concreta da sociedade.
Deve-se apontar aqui a discordância do presente autor nesse parâmetro, existindo várias situações que comprovam que o Direito Brasileiro adota o princípio da não-culpabilidade como esposa, o entendimento seguido, Guilherme de Souza Nucci (2017, p.33) ao afirmar serem as prisões cautelares formas excepcionais e necessárias que não maculam o referido princípio e que existe este em sua plenitude no ordenamento jurídico da República Federativa do Brasil:
Por outro lado, confirma a excepcionalidade e a necessariedade das medidas cautelares de prisão, já que indivíduos inocentes somente podem ser levados ao cárcere quando realmente for útil à instrução e à ordem pública. A partir disso, deve-se evitar a vulgarização das prisões provisórias, pois muitas delas terminam por representar uma nítida – e indevida – antecipação de pena, lesando a presunção de inocência.
Definido o conceito do princípio da não culpabilidade, traz-se à baila a mudança do entendimento do Supremo Tribunal Federal quanto a execução provisória da pena, determinando suas razões e fundamentando em seu arrimo tanto constitucional como legal.
Como visto acima, o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade é admitido tanto em Tratados internacionais como em nível constitucional em nossa célebre Constituição Federal de 1988, sendo consagrado pela grande maioria dos juristas que interpretam o ordenamento jurídico brasileiro.
Ocorre que até o ano de 2016 (dois mil e dezesseis) era pacífico no âmbito da doutrina e da jurisprudência que se deveria interpretar o dispositivo previsto artigo 5º, inciso LVII da Carta Magna, de forma restritiva, garantindo aos réus, exceto em casos de prisão cautelar, que somente seriam recolhidos ao cárcere com o trânsito em julgado de sentença condenatória penal, como extrai-se do histórico “Habeas Corpus” relatado pelo então Ministro Eros Grau no ano de 2009 (dois mil e nove):
EMENTA: HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O art. 637 do CPP estabelece que “[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença”. A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. 2. Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos “crimes hediondos” exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: “Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinquente”. 6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados --- não do processo penal. A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários e subsequentes agravos e embargos, além do que “ninguém mais será preso”. Eis o que poderia ser apontado como incitação à “jurisprudência defensiva”, que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais. A comodidade, a melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço. 7. No RE 482.006, relator o Ministro Lewandowski, quando foi debatida a constitucionalidade de preceito de lei estadual mineira que impõe a redução de vencimentos de servidores públicos afastados de suas funções por responderem a processo penal em razão da suposta prática de crime funcional [art. 2º da Lei n. 2.364/61, que deu nova redação à Lei n. 869/52], o STF afirmou, por unanimidade, que o preceito implica flagrante violação do disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição do Brasil. Isso porque --- disse o relator --- “a se admitir a redução da remuneração dos servidores em tais hipóteses, estar-se-ia validando verdadeira antecipação de pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal, e antes mesmo de qualquer condenação, nada importando que haja previsão de devolução das diferenças, em caso de absolvição”. Daí porque a Corte decidiu, por unanimidade, sonoramente, no sentido do não recebimento do preceito da lei estadual pela Constituição de 1.988, afirmando de modo unânime a impossibilidade de antecipação de qualquer efeito afeto à propriedade anteriormente ao seu trânsito em julgado. A Corte que vigorosamente prestigia o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade não a deve negar quando se trate da garantia da liberdade, mesmo porque a propriedade tem mais a ver com as elites; a ameaça às liberdades alcança de modo efetivo as classes subalternas. 8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual Ordem concedida. (Minas Gerais, Supremo Tribunal Federal, HC: 84078-7, Relator: Min. Eros Grau, 2009)
Percebe-se, portanto, que, a partir do ano de 2009 (dois mil e nove), a Suprema Corte construiu seu entendimento, com base em interpretação mais restrita ao texto do princípio da não-culpabilidade, garantindo o necessário trânsito em julgado da sentença penal condenatória para o início do cumprimento da pena, fato que, como demonstrado posteriormente, não se coadunava com a posição que vinha sendo adotada pela Suprema Corte após a promulgação da Constituição Federal.
Ressalta-se que tal entendimento gerou certa morosidade no cumprimento de algumas penas no Brasil, já que advogados utilizaram de recursos protelatórios fazendo com que viesse a crivo do Poder Judiciário uma quantidade demasiada de recursos que tornaram muito alongado o tempo para se conseguir o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, o que gerou certa sensação de impunidade dentre os jurisdicionados, já que deve o Poder Judiciário garantir, especialmente na esfera penal, a celeridade e a duração razoável do processo.
Para que se entenda a decisão do Supremo Tribunal Federal é necessário definir o que muitos tem chamado de ativismo judicial, modelo pelo qual essa Corte egrégia têm-se utilizado cada vez com mais frequência para suprir a figura do legislador e regular uma situação que, segundo o crivo dos Excelentíssimos Ministros, urge de apreciação e regulação por esse douto Poder, sendo o princípio da inafastabilidade de jurisdição a forma pela qual se encontrou para que o Supremo Tribunal Federal garanta a aplicação dos Direitos e garantias fundamentais que não estivessem regulados pelos demais Poderes ou que estes não os estivessem garantindo.
Escreve de forma loquaz o douto Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso (2015, p.318-319) o conceito de ativismo judicial:
A ideia de ativismo judicial esta? associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.
Destaca-se o que está presente no terceiro item na afirmação de que o Poder Judiciário impõe condutas ou abstenções ao Poder Público no que se refere a políticas públicas, grande exemplo presente na interpretação do princípio da não culpabilidade supedâneo do trabalho aqui disposto.
Definido o ativismo judicial, importante ressalva faz o também Ministro de nossa Suprema Corte Alexandre de Moraes (2017, p.808), que explicita as balizas pela qual a atuação do Poder Judiciário deve se enquadrar ao decidir de forma ativa em uma situação levada a seu crivo.
O bom senso entre a “passividade judicial” e o “pragmatismo jurídico”, entre o “respeito à tradicional formulação das regras de freios e contrapesos da Separação de Poderes” e “a necessidade de garantir às normas constitucionais a máxima efetividade” deve guiar o Poder Judiciário, e, em especial, o Supremo Tribunal Federal na aplicação do ativismo judicial, com a apresentação de metodologia interpretativa clara e fundamentada, de maneira a balizar o excessivo subjetivismo, permitindo a análise crítica da opção tomada, com o desenvolvimento de técnicas de autocontenção judicial, principalmente, afastando sua aplicação em questões estritamente políticas, e, basicamente, com a utilização minimalista desse método decisório, ou seja, somente interferindo excepcionalmente de forma ativista, mediante a gravidade de casos concretos colocados e em defesa da supremacia dos Direitos Fundamentais.
Destarte, pode-se extrair dos excertos que o ativismo judicial é forma importante pela qual o Tribunal guardião da Constituição garante os valores ali contidos, devendo o mesmo prezar pelo bom senso, utilizando também de auto contensão para que não ultrapasse os limites da razoabilidade e interfira de forma inadequada na forma federativa de Estado.
Exaurida a parte conceitual acerca do ativismo judicial, inicia-se a explanação acerca da decisão do Supremo Tribunal Federal que determina o momento em que se deve iniciar o cumprimento da pena no processo penal.
A população brasileira tem sentido uma verdadeira morosidade no julgamento de processos, em especial os que chegam nos Tribunais Superiores, em excessivo número de recursos pleiteados, dentre estes estão os que, normalmente, recebem maior repercussão midiática.
Um dos obstáculos a rápida prestação jurisdicional tem sido o elevado número de processos pelos quais tem que julgar os Tribunais Superiores e a Suprema Corte, razão pela qual muitas ações podem ter duração de 20 (vinte) ou 30 (trinta) anos, mesmo que se tente respeitar a celeridade processual.
Ocorre que no processo criminal, desde o ano de 2009 (dois mil e nove) até a histórica decisão do Ministro Teori Albino Zavascki proferida no ano de 2016 (dois mil e dezesseis), somente poderia se iniciar o cumprimento da pena após o trânsito em julgado da condenação, diferindo do que sempre dispôs o Processo Civil, onde, em muitos casos, a parte pode realizar o cumprimento de sentença provisório.
Diante do exposto, decidiu o Supremo Tribunal Federal, acompanhando o douto Ministro Teori Zavascki, por admitir a execução provisória da pena privativa de liberdade, após o julgamento de órgão colegiado que exaure o exame de fatos e provas, como se extrai da ementa do histórico Habeas Corpus 126.292, que adveio do estado de São Paulo:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado. (São Paulo, Supremo Tribunal Federal, HC: 126.292, Relator: Min. Teori Zavascki, 2016)
Destarte, definiu o Supremo Tribunal Federal uma completa mudança em sua jurisprudência consolidada, afirmando que a sentença penal condenatória deverá ser cumprida imediatamente após decisão de órgão colegiado, e que, já a partir desse momento, estariam garantidos o duplo grau de jurisdição e a não culpabilidade esculpida na Carta Maior.
Tal decisão veio fulcrada em alguns argumentos que já eram adotados antes do supra exposto julgamento do Ministro Eros Grau que mudou o entendimento para dar interpretação gramatical ao dispositivo da Constituição Federal, adotando do ativismo judicial para garantir que não houvesse um vácuo temporal muito extenso entre a decisão de primeiro grau e o trânsito em julgado da condenação, fato que violaria a garantia da duração razoável do processo e o princípio da proteção deficiente.
Diante do exposto, deve-se analisar as razões invocadas pelo douto Ministro Teori Zavascki que mudou o termo inicial para o cumprimento da pena.
“Ab initio”, demonstra-se que os Ministros do Supremo Tribunal Federal adotaram o conceito do princípio da não culpabilidade como regra de tratamento, não se admitindo em nenhuma forma que, antes do trânsito em julgado, exista tratamento como culpado àquele que não teve seu julgamento findo, não cabendo ao acusado demonstrar sua não culpa, e, sim, ao Parquet, como titular da ação penal pública, que o acusado cometeu o fato a ele imputado.
Assim foi claro o Ministro relator Teori Zavascki ao expor em seu voto:
Realmente, antes de prolatada a sentença penal há de se manter reservas de dúvida acerca do comportamento contrário à ordem jurídica, o que leva a atribuir ao acusado, para todos os efeitos – mas, sobretudo, no que se refere ao ônus da prova da incriminação –, a presunção de inocência. A eventual condenação representa, por certo, um juízo de culpabilidade, que deve decorrer da logicidade extraída dos elementos de prova produzidos em regime de contraditório no curso da ação penal. Para o sentenciante de primeiro grau, fica superada a presunção de inocência por um juízo de culpa – pressuposto inafastável para condenação –, embora não definitivo, já que sujeito, se houver recurso, à revisão por Tribunal de hierarquia mediatamente superior. É nesse juízo de apelação que, de ordinário, fica definitivamente exaurido o exame sobre os fatos e provas da causa, com a fixação, se for o caso, da responsabilidade penal do acusado. É ali que se concretiza, em seu sentido genuíno, o duplo grau de jurisdição, destinado ao reexame de decisão judicial em sua inteireza, mediante ampla devolutividade da matéria deduzida na ação penal, tenha ela sido apreciada ou não pelo juízo a quo. Ao réu fica assegurado o direito de acesso, em liberdade, a esse juízo de segundo grau, respeitadas as prisões cautelares porventura decretadas. (São Paulo, Supremo Tribunal Federal, HC: 126.292, Relator: Min. Teori Zavascki, 2016)
Destarte, a regra de tratamento da não culpabilidade deve se aplicar durante todo o processo, porém essa somente impede o cumprimento da pena até o momento em que os julgadores podem analisar matéria factual e probatória, o que ocorre até o duplo grau de jurisdição nos processos em que a competência originária não seja de outra forma determinada, não havendo o que se falar nesse impedimento em sede de Recurso Especial ou Extraordinário.
O Supremo Tribunal Federal coloca também, de forma corroboradora ao esposado, que este entendimento adotado apenas remonta a antigas decisões prolatadas por esta Egrégia Corte. Estes afirmam que os recursos as cortes superiores e para a Suprema Corte, devem em regra possuir efeito meramente devolutivo e não suspensivo, assim dispôs no Habeas Corpus 68.726, provindo do Distrito Federal e julgado posteriormente a nossa Constituição Federal de 1988:
Habeas corpus. Sentença condenatória mantida em segundo grau. Mandado de prisão do paciente. Invocação do art. 5º, inciso LVII, da Constituição. Código de Processo Penal, art. 669. A ordem de prisão, em decorrência de decreto de custódia preventiva, de sentença de pronúncia ou de decisão e órgão julgador de segundo grau, é de natureza processual e concernente aos interesses de garantia da aplicação da lei penal ou de execução da pena imposta, após o devido processo legal. Não conflita com o art. 5º, inciso LVII, da Constituição. De acordo com o § 2º do art. 27 da Lei nº 8.038/1990, os recursos extraordinário e especial são recebidos no efeito devolutivo. Mantida, por unanimidade, a sentença condenatória, contra a qual o réu apelara em liberdade, exauridas estão as instâncias ordinárias criminais, não sendo, assim, ilegal o mandado de prisão que órgão julgador de segundo grau determina se expeça contra o réu. Habeas corpus indeferido. (Distrito Federal, Supremo Tribunal Federal, HC: 68.726, Relator Min. Néri da Silveira, 1991)
Deve-se colacionar que o supracitado artigo está revogado pelo atual Código de Processo Civil, porém o mesmo não dispôs de maneira diversa do aqui discorrido, tratando o artigo 995, “caput”: “Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. ”
Seguia o Superior Tribunal de Justiça o mesmo posicionamento já aqui esposado, conforme se extrai de julgamento prolatado no ano de 2008 (dois mil e oito):
HABEAS CORPUS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. TRÂNSITO EM JULGADO PARA A ACUSAÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. 1. Esta Corte pacificou o entendimento de que é possível a execução provisória da pena na hipótese em que tenha ocorrido o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, haja vista a impossibilidade de majoração da reprimenda ou de agravamento do regime prisional. 2. Ordem concedida. (Minas Gerais, Superior Tribunal de Justiça, HC: 28847, Relator: Min. Paulo Gallotti, 2008)
Ao analisar a legislação infraconstitucional, percebe-se que o legislador já tinha esse entendimento consolidado, quando no artigo 637 do Código de Processo Penal, dispõe acerca do Recurso Extraordinário.
Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.
O Superior Tribunal de Justiça após julgar de forma contumaz e pertinente, decidiu cristalizar a presente interpretação no texto de sua Súmula 267: “A interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão. ”
Expostas as razões esculpidas na jurisprudência pátria acerca do tema, deve-se expor o pensamento doutrinário, em especial o saudoso doutrinador Guilherme de Souza Nucci (2017, p.730) que expõe as razões pelas quais o Supremo Tribunal Federal adotou as razões mencionadas para determinar que a pena fosse cumprida após o duplo grau de jurisdição:
Voltou-se à opção existente antes de 2009, quando se interpretava que esta situação era viável, uma vez que os recursos especial e extraordinário não tinham efeito suspensivo. Logo, não era questão de transitar em julgado, mas de respeitar os ditames processuais. Após a decisão de 2.º grau, não mais existe o efeito suspensivo, motivo pelo qual o STF passou a admitir a prisão. Entendemos equivocada essa postura, mas compreendemos os motivos de política criminal daí advindos. O principal é a frequente utilização dos recursos especial e extraordinário apenas e tão somente para atrasar o trânsito em julgado, pois, quando o dano era realmente grave, a defesa jamais deixou de apresentar o habeas corpus. O órgão a utilizar os recursos especial e extraordinário era (e continuará sendo) o Ministério Público; raramente a defesa precisava disso. Quem movimentava, do ponto de vista defensivo, tais recursos tinha por fim prolongar, sem fundamento lógico-jurídico, o trânsito em julgado.
Resumiu de forma loquaz o doutrinador supracitado, determinando que sua posição é contrária ao que aqui se dispõe, porém, não deixando de admitir que os recursos Especial e Extraordinário apresentados pela defesa, de forma geral, não estavam presentes fundamentos lógico-jurídicos, somente possuindo o escopo de retardar o trânsito em julgado da condenação.
Ante o exposto, definiu-se que a aplicação do princípio da não-culpabilidade deve se apresentar como regra de tratamento processual que permeia todo o processo, o que não significa dizer que após o duplo grau de jurisdição, em processos não referentes a competência originária de Tribunal, e havendo decisão colegiada de Tribunal, o réu não poderá ser recolhido à prisão, possuindo fundamento no que decidiu o Supremo Tribunal Federal que, embasado na teoria do ativismo judicial, afirmou somente possuírem os recursos às instâncias superiores, seja na esfera penal ou cível, efeito devolutivo e não efeito suspensivo, tal como disposto no Digesto Processual Civil atualmente vigente, sendo possível assim o cumprimento provisório da pena após decisão que exaure análise acerca de fatos e provas, afastando, assim, qualquer possibilidade de violação a regra de tratamento da não culpabilidade, devendo esta perdurar, inclusive, no que tange aos supra dispostos recursos.
Em tópico final, discorre-se acerca da mudança que causou o julgamento, pela Corte Constitucional, do Habeas Corpus 126.292, proveniente do Estado de São Paulo, no que concerne a prescrição.
Antes de adentrar dos efeitos da decisão supra, deve-se, inicialmente, definir o que é a prescrição, suas espécies e formas de aplicação dentro do processo criminal, instituto de suma importância dentro do garantismo penal.
Define o já saudoso doutrinador Cléber Masson (2013, p. 916) a prescrição, em sua doutrina que trata da parte geral do Estatuto Repressor: “Prescrição é a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória em face da inércia do Estado durante determinado tempo legalmente previsto”
Conclui-se que a prescrição advém da inércia estatal em assumir o seu “jus puniendi”, tendo em vista que se determina que para a ocorrência da prescrição o lapso temporal é bastante elástico, se mostra assaz razoável que se aplique a extinção da punibilidade do agente, que não pode viver durante todo esse período as agruras de uma acusação criminal.
A prescrição é, pelo entendimento pacífico tanto dos doutrinadores quanto da doutrina, classificada em duas espécies, chamadas de prescrição da pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória, definem de forma bastante objetiva e clara os doutrinadores Gustavo Junqueira e Patrícia Vanzolini (2014,p. 671):
A prescrição pode ser classificada como prescrição da pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória:
Ha? prescrição da pretensão punitiva se o Estado não providencia, no limite temporal fixado pela lei, a certeza da culpa (com o trânsito em julgado da sentença condenatória).
Ha? prescrição da pretensão executória se o Estado não providencia, no lapso temporal determinado em lei, a efetivação da sanção já? certa (ao menos para a acusação). Entenda-se efetivação da sanção como o início do cumprimento da pena.
Percebe-se pela definição exposta que trazer o cumprimento de pena para momento posterior a decisão que exaure o exame de fatos e provas, traz um problema que não foi suscitado nos votos dos Ministros de nossa egrégia Suprema Corte ao julgar o “Habeas Corpus” 126.292, advindo do Estado de São Paulo, e que é de grande importância para a definição da possibilidade de aplicação de pena pelo Estado.
A problemática reside no fato de que, havendo a execução provisória, deixaria o Estado de estar em inércia ou deveria correr uma prescrição e, correndo a prescrição, não se definiu qual dos tipos de prescrição correria em relação ao condenado, se seria prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória.
Eugênio Pacelli (2017, p. 580) nos traz uma definição que é adequada ao presente caso:
Uma vez obtida a condenação e estando já em condições de ser executado o título judicial (sentença penal condenatória), o que já ocorre, segundo o atual entendimento do STF (HC 126.292, ADCs 43 e 44), após a condenação em segunda instância, põe-se em curso, então, a pretensão executória.
Destarte, o que se pode depreender do que diz o saudoso doutrinador é que com o início do cumprimento de pena ter-se-á início a prescrição da pretensão executória.
Em análise de julgados, percebe-se que para que exista a prescrição da pretensão executória, deveria haver trânsito em julgado para ambas as partes, conforme se extrai do excerto em que foi relator o Ministro Superior Tribunal de Justiça Jorge Mussi:
HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA.TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO PARA AMBAS AS PARTES. LAPSOTEMPORAL NÃO VERIFICADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. 1. O termo inicial da contagem do prazo prescricional da pretensão executória é o trânsito em julgado para ambas as partes, porquanto somente neste momento é que surge o título penal passível de ser executado pelo Estado. Desta forma, não há como se falar em início da prescrição a partir do trânsito em julgado para a acusação, tendo em vista a impossibilidade de se dar início à execução da pena, já que ainda não haveria uma condenação definitiva, em respeito ao disposto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. 2. Na hipótese, certificado o trânsito em julgado para ambas as partes aos 22.10.2008, não houve o transcurso do lapso prescricional aplicável à espécie - 4 (quatro) anos, nos termos do artigo 109, inciso V, do Código Penal -, o que impede a declaração da aludida causa de extinção da punibilidade. (São Paulo, Superior Tribunal de Justiça, HC: 180993, Relator: Min. Jorge Mussi, 2011)
Conclui-se, destarte, que o autor considera que existe uma espécie trânsito em julgado formal após a análise dos fatos e das provas, tratando a execução provisória como se pena fosse e não uma imposição cautelar, posição que justifica a espécie de prescrição dentro da classificação de pretensão executória a ser aplicada ao presente caso.
Defere-se do exposto que existe prescrição aplicável quando determinar-se a execução provisória de pena privativa de liberdade e que esta deve correr na modalidade de prescrição da pretensão executória, declarando-se que há inércia do Estado, ocorrendo da mesma forma que ocorreria na pretensão executória de uma pena com o antigo entendimento de trânsito em julgado, devendo o juiz atentar para este prazo no julgamento dos recursos constitucionais, ocorrendo, assim, o trânsito em julgado formal para as partes logo após o exaurimento da análise da matéria fática e das probatória, sendo os recursos constitucionais matéria que vai além do trânsito em julgado das instâncias ordinárias.
O presente artigo científico teve como escopo analisar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal em relação ao termo inicial de cumprimento de pena, relacioná-lo com o princípio da não culpabilidade e determinar os seus efeitos penais, destacando-se o efeito da decisão em relação a prescrição e classificando sua espécie em relação ao acusado.
O mote do presente trabalho está em decisão proferida em sede de “Habeas Corpus” número 126.292, proveniente do Estado de São Paulo, que reestabeleceu a execução provisória da pena após o exaurimento das instâncias que analisam fatos e provas.
Encontra-se, entretanto, aparente problemática ao se tentar relacionar a presente execução provisória da pena com o princípio da não culpabilidade, tendo em vista que o texto expresso da Constituição Federal afirma ser necessário o trânsito em julgado para que se venha a cumprir a pena.
Ressalta-se que a antiga composição de nossa Suprema Corte entendia que o trânsito em julgado referido, somente poderia ser considerado após o último recurso, seja ele constitucional ou ordinário, somente podendo incidir sobre o acusado as prisões cautelares.
Em razão do exposto, se mostra histórica a decisão do Ministro Teori Albino Zavascki, que foi seguida por outros 6 (seis) ministros, fato que modificou o entendimento atual acerca do termo inicial do cumprimento de pena, voltando a ser como se aplicava antes do ano de 2009 (dois mil e nove), determinando que o início do cumprimento de pena deveria se dar após o exaurimento da análise de fatos e provas.
Dentre as razões para esta decisão, eivada de ativismo judicial, está o fato de que muitos dos advogados perceberam que quanto mais recursos impetrados, maior seria o lapso entre a decisão condenatória em primeira instância e a decisão final no processo, fazendo com que as Cortes Superiores e a Suprema Corte viessem a ser abarrotadas desses recursos, para que os acusados passassem mais tempo em liberdade ou conseguissem a sua prescrição da pretensão punitiva.
Também se verificou que não seria nenhum absurdo manter o réu preso quando não há mais análise factual e probatória, tendo em seu voto o Ministro Teori Zavascki demonstrado que somente baixa porcentagem do que é recorrido, em sede de Recurso Especial e Recurso Extraordinário, é efetivamente provido.
Não há razão, portanto, de se manter o acusado em liberdade quando pouco ainda se tem de análise por parte das Cortes Superiores e da Suprema Corte, somente aumentando as decisões de improcedência aos recursos protelatórios e gerando sensação de impunidade naqueles que veem na Justiça e na pena um necessário caráter retributivo àquilo que não se admite como lesão ao bem jurídico tutelado.
Outro ponto merecedor de destaque é o da prescrição, em razão de possível controvérsia entre a inexistente inércia do Estado ou a incidência de prescrição, ainda existindo possibilidade de se entender pela incidência da prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória.
Foi demonstrado que corre a prescrição da pretensão executória como já era adotado pela Suprema Corte antes do ano de 2011 (dois mil e onze), existindo uma espécie de trânsito em julgado formal após a decisão que exaure a análise de fatos e provas.
Definido ser compatível a execução provisória da pena com o princípio da não culpabilidade e o tipo de prescrição que correrá após o início desta, agiu o Poder Judiciário para evitar despropérios e garantir melhor efetividade à seara penal dentro dos parâmetros estabelecidos por nossa Lei Maior.
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BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus. Habeas Corpus. Sentença condenatória. Trânsito em Julgado para a acusação. Execução da pena. Possibilidade. Habeas Corpus 28847. Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, Wiliam Riccaldone abreu, Tribunal de alçada do Estado de Minas Gerais, Arlindo Ciríaco de Oliveira. Acórdão 16/09/2003. DJ 17/03/2008. Decisão unânime.
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus. “Habeas Corpus”, sonegação fiscal, prescrição da pretensão executória, termo inicial, trânsito em julgado para ambas as partes, lapso temporal não verificado, constrangimento ilegal não evidenciado. Habeas Corpus 180.993. Relator Min. Jorge Mussi. Augusto Fauvel De Moraes, Luís Renato Zago, Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
André Ricardo Bonetti Rosa. Acórdão: 13/12/2011. DJ 19/12/2011. Decisão unânime.
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BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus. Habeas corpus. Inconstitucionalidade da chamada “execução antecipada da pena”. Art. 5º, LVII, da constituição do brasil. Dignidade da pessoa humana. Art. 1º, III, da Constituição do Brasil. Habeas Corpus 84.078-7. Omar Coelho Vitor, Luís Alexandre Rassi, Superior Tribunal de Justiça. Relator: Min. Eros Grau. Acórdão 05/02/2009. DJ 17/02/2009. Vencidos os Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus. Habeas corpus. Sentença condenatória mantida em segundo grau. Mandado de prisão do paciente. Invocação do art. 5º, inciso LVII, da Constituição. Código de Processo Penal, art. 669. A ordem de prisão, em decorrência de decreto de custódia preventiva, de sentença de pronúncia ou de decisão e órgão julgador de segundo grau, é de natureza processual e concernente aos interesses de garantia da aplicação da lei penal ou de execução da pena imposta, após o devido processo legal. Não conflita com o art. 5º, inciso LVII, da Constituição. De acordo com o § 2º do art. 27 da Lei nº 8.038/1990, os recursos extraordinário e especial são recebidos no efeito devolutivo. Mantida, por unanimidade, a sentença condenatória, contra a qual o réu apelara em liberdade, exauridas estão as instâncias ordinárias criminais, não sendo, assim, ilegal o mandado de prisão que órgão julgador de segundo grau determina se expeça contra o réu. Habeas corpus indeferido. Habeas Corpus 68.726. Relator Min. Néri da Silveira. Fernando Eduardo Ayres da Motta, Tribunal de alçada criminal do Estado do Rio de Janeiro, Marco Antônio da Fonseca Loureiro. Acórdão 28/06/91. DJ 20/11/1992. Decisão unânime.
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Advogado. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, David Barroso. Execução provisória da pena e sua relação com o princípio da não culpabilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 ago 2017, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/50629/execucao-provisoria-da-pena-e-sua-relacao-com-o-principio-da-nao-culpabilidade. Acesso em: 05 nov 2024.
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