ENIO WALCÁCER DE OLIVEIRA FILHO
(Orientador)[1]
RESUMO: Este artigo consiste em apresentar a Justiça Restaurativa, como uma alternativa para a solução da crise no Sistema Carcerário Brasileiro, que diante do fracasso procuram-se métodos para aplicação de um novo modelo que define conceitos diferentes de justiça e crime, o objetivo deste trabalho é apresentar e aplicar esse método restaurativo para resolver os conflitos da sociedade e sucessivamente a melhoria do sistema carcerário brasileiro. A Justiça baseia-se num procedimento de consenso, em que a vítima e o infrator, possam resolver seus conflitos de forma que alcancem uma solução ideal para ambos à prática restaurativa têm como premissa maior reparar o mal causado esse novo modelo processual, vai muito além do punitivismo penal estabelecido atualmente.
Palavras Chave: justiça restaurativa; sistema carcerário; ressocialização.
ABSTRACT: This article presents Restorative Justice, as an alternative to the solution of the crisis in the Brazilian Prison System, that, in the face of failure, we look for methods to apply a new model that defines different concepts of justice and crime, the objective of this work is present and apply this restorative method to solve the conflicts of society and successively the improvement of the Brazilian prison system. Justice is based on a consensus procedure, in which the victim and the offender, can solve their conflicts in a way that they can reach an ideal solution for both restorative practice and have as premise to repair the evil caused by this new procedural model, goes much further of criminal punitivism currently established.
Keywords: restorative justice; prison system; re-socializ
SUMÁRIO: 1.INTRODUÇÃO 2. A CRISE NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO; 3.JUSTIÇA RESTAURATIVA UMA POSSIVÉL SOLUÇÃO PARA A CRISE DO SISTEMA CARCERÁRIO; 3.1 AS ORIGENS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA; 3.2 JUSTIÇA RESTAURATIVA SEUS PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS; 3.3 PRINCIPAIS PRÁTICAS RESTAURATIVAS; 4. A JUSTIÇA RESTAURATIVA SUA APLICABILIDADE E SEUS PROJETOS NO BRASIL; 4.1CÍRCULOS RESTAURATIVOS E SUAS SOLUÇÕES; 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 6. REFERENCIAS.
O Direito Penal é um sistema que, para além da visão do senso comum de servir à punição, serve especialmente como limitador do poder punitivo do Estado, estabelecendo regras e critérios específicos que permitem e definem as possibilidades de intervenção do Estado na liberdade individual. É um freio de legalidade que evita arbitrariedades no uso do jus puniendi. Neste sentido, temos como postulados básicos do direito penal a anterioridade, a legalidade estrita, o devido processo legal e diversos outros princípios que formam uma rede de proteção individual contra intervenções arbitrárias na vida do cidadão.
Contudo, no atual estado da arte no Brasil, o que se percebe é a existência sistemática de violações em decorrência do colapso no sistema carcerário brasileiro, com toda sorte de falhas estruturais submetendo os detentos a situações que colidem frontalmente com os postulados e garantias que forma a base de nosso Estado de Direito.
Dentre os problemas do sistema de execução penal brasileira temos a falta de aplicação efetiva da Lei de Execuções Penais, em decorrência direta da falta de investimento em uma estrutura digna somando-se a essa precarização a superlotação nos presídios identificada pelo CNJ em acompanhamento da situação prisional brasileira. Mesmo diante da escancarada realidade de precarização do sistema prisional brasileiro muito pouco é feito pelos governos para resolver ou equalizar essa situação, e em decorrência disto as prisões, que deveriam servir em seu sentido também como ambiente ressocializador do delinquente torna-se tal e qual os antigos sistemas que visavam apenas o sentido retributivo da pena (morte, tortura, penas corporais, etc.). Alguns estudiosos consideram os presídios brasileiros equiparados a masmorras medievais, locais de descarte humano a toda sorte de humilhações e degradações, tornando quase que inatingível quaisquer expectativas relacionadas à possibilidade de reintegração e ressocialização do delinquente após o cumprimento de sua pena.[2]
O Estado tem o poder e dever de assegurar os direitos e garantias dos detentos, mas infelizmente acaba se tornando ele próprio o violador destas garantias. Conforme o artigo 5º, inciso III da Constituição Federal “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”, texto este que reflete e repete os postulados do próprio sistema local e internacional de Direitos Humanos, considerado núcleo essencial e universal de direitos individuais.[3]
O que se precisa consolidar dentro de um Estado de Direito é que todos estão igualmente submetidos às regras e todos, da mesma forma, são sujeitos de direitos mínimos inerentes à própria humanidade. Esse racionalismo é uma característica dos Estados modernos que denotam o próprio grau de humanidade em que vive nossa sociedade.
Sem o respeito às garantias, e sem o trato humano com o detento, torna-se impossível que se possibilite a ressocialização de quem está sendo dissocializado, desumanizado. A sistemática violação da dignidade da pessoa dentro do sistema carcerário tem se mostrado fator que, além de não ressocializar, permite a cooptação deste detento para sistemas paralelos e criminosos, fomentando a ampliação de facções criminosas no Brasil.
Neste sentido que a Justiça Restaurativa valoriza a autonomia dos sujeitos e do diálogo entre eles com o principal objetivo de humanizar o sistema de recuperação do delinquente, transpondo o foco da ressocialização tradicional desde a transgressão e a culpa para o âmbito positivo de possibilidades prospectivas do sujeito na sociedade, ou seja, a sua participação como cidadão na sociedade na qual ele está inserido.
Desta forma a Justiça Restaurativa visa promover a democracia ativa na qual não se pressupõe que somente a vítima ou o infrator são os afetados em seus relacionamentos, mas toda a comunidade, porque, sofre as consequências em sua totalidade.
A Justiça Restaurativa não visa a impunidade, mas fazer com que aquele que comete infrações perceba a gravidade de sua conduta e se responsabilize pelos seus atos, por meio da realização de círculos com os ofensores, ofendidos e representantes da sociedade, de forma a reduzir os ciclos de violência e criminalidade e promover uma cultura da paz por meio do diálogo e da participação da sociedade neste sistema.
Assim afasta-se a ideia de apenas determinar a culpa e a consequente pena ao transgressor, mas também de fazê-lo compreender que para aquele ato infracional existem possíveis sanções e levá-lo a pensar na responsabilidade de não reincidir. Ao invés de definir a justiça como retribuição, busca-se o foco na restauração, ou seja: se o crime é um ato lesivo, a justiça significará reparar a lesão e promoção da cura. Atos de restauração - ao invés de mais violação, devem contrabalancear o dano ocasionado promovendo a inserção por meio da responsabilidade e não da punição.
Este trabalho busca uma compreensão da possibilidade de que a Justiça Restaurativa seja uma alternativa viável de incorporação de um sistema mais humano e que vise efetivamente a recuperação do delinquente para além do sistema puramente retribucionista que tem se tornado o sistema prisional brasileiro.
A proposta é apresentada como uma possibilidade de avanço naquilo que preconiza o sistema penal brasileiro, sob o aspecto normativo, tanto no que concerne aos Tratados dos quais somos parte, como a nossa Constituição e as demais leis instituindo práticas socioeducativas, democráticas e articuladas, oportunizando assim corresponsabilidades nas intervenções institucionais, na perspectiva de um novo Sistema de Garantia de Direitos.
O reconhecido fracasso do sistema punitivo não é novidade no Brasil, o sistema atual de justiça criminal está em crise e se encontra deteriorado, com presídios superlotados que não oferecem o mínimo de condições para atender às necessidades dos presos, com um aumento significativo de crimes a crise no sistema carcerário no Brasil não tem um fim e o Estado não apresenta uma solução para o problema e isto afeta o ordenamento jurídico, a dignidade da pessoa humana e toda a sociedade que sofre suas consequências.
Segundo os últimos dados divulgados em 2014 pelo Sistema Integrado de Informações Penitenciárias do Ministério da Justiça (Infopen), o Brasil chegou à marca de 607,7 mil presos. Desta população, 41% aguarda por julgamento atrás das grades. Ou seja, há 222 mil pessoas presas sem condenação, a morosidade nos julgamentos só aumenta a quantidade de presidiários. De acordo com o jornal Folha de São Paulo, os presos provisórios custam R$6,4 bilhões por ano e isso é devido à rigorosidade das leis brasileiras pelo crime de tráfico de drogas também, pela lentidão da justiça na elaboração das sentenças finais. Dessa maneira, o investimento que o Governo Federal dispõe para melhorar essa situação, não é suficiente, pois haverá um crescimento nos gastos relacionados com a gestão das pessoas detidas, consequentemente, causa a superlotação nos presídios do Brasil. (PRUDENTE, 2012, online)
A reincidência é grande, o que gera uma pergunta na sociedade e que muitos de nós já ouvimos. Se o sistema carcerário é tão ruim por que os reincidentes cometem novos crimes para voltar? A resposta é a falta de oportunidades de trabalho ao ex-presidiário, e a única opção que lhe resta é voltar a infringir a lei, pois quando retornam ao convívio social é como se a própria coletividade o empurrasse novamente para o mundo do crime. Há um certo preconceito e isso tudo sem dúvida, torna pouco provável a reabilitação de um ex-detento. Uma reportagem publicada pela Gazeta do Povo[4]revela o drama de presos que são despejados na sociedade após anos de encarceramento sem que, durante esse período, o Estado tenha tomado providências para que essas pessoas se tornassem aptas a encarar o novo desafio. Há o preconceito, a dificuldade de arranjar trabalho, a necessidade de se readaptar. E há o medo de cair de novo em erro.
Sentindo-se desamparados e desumanizados pelo Estado, os presidiários, prometendo lutar por seus direitos, deram origem às facções, organizações controladas por criminosos que estão dentro do sistema penitenciário e também fora dele, usando da violência como principal arma para desestabilizar os órgãos de segurança e a sociedade. Com a reincidência, torna-se cada vez mais difícil a reabilitação, de modo que, dentro dos presídios os detentos sofrem com abusos tanto por parte dos agentes penitenciários quanto de outros detentos. Acuados, a única opção que lhes resta é se unir as chamadas “Facções”. (PELIZZOLI, 2014)
Apesar de serem originadas em determinada localidade, não é incomum que as facções se alastrem por todo o território nacional e assim ocorreu com o PCC, considerada a maior facção do Brasil.
O PCC surgiu em 1993, na casa de custodia de Taubaté-SP, mais conhecido como “Masmorra”, pela severidade dos castigos aplicados. Na intenção de lutar por seus direito alguns detentos de uniram e formaram uma espécie de partido, e posteriormente, formularam um “estatuto” que regulamentava as normas internas do grupo, e a relação entre o partido e o Comando Vermelho do Rio de Janeiro. (ZIZEK, 2006)
O estatuto foi publicado no Jornal Folha de São Paulo em 25 de Maio de 1997, e dispunha de dezesseis itens, sendo o de maior relevância o de número 13, que diz:
Temos que permanecer unidos e organizados para evitarmos que ocorra novamente um massacre, semelhante ou pior ao ocorrido na Casa de Detenção em 2 de Outubro de 1992, onde 111 presos foram covardemente assassinados, massacre esse que jamais será esquecido na sociedade brasileira. Por que nós do Comando vamos sacudir o Sistema, e fazer essas autoridades mudar a pratica carcerária, desumana, cheia de injustiça, opressão, torturas, massacres nas prisões. (VASCONCELOS, 2008)
A criação do PCC e de tantas outras facções é prova de que a incompetência na administração do cárcere no Brasil tem um longo histórico, fazendo-se necessário repensar as práticas de resolução de conflitos, de modo que, desde as camadas mais pobres da sociedade, se liberte gradualmente dos processos de criminalização e da ideologia punitivista.
Informou Lindomar Sobrinho, presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários de Roraima: “Os agentes agiram de pronto e pararam a carnificina. Se eles não tivessem agido, teria sido muito maior”. (CARTA CAPITAL, 2017, on line)
Quando se fala da carnificina nos presídios Brasileiros logo se imagina que isso é uma coisa dos dias atuais, devido ao aumento significativo dos crimes, criação de novos ilícitos penais, crise econômica brasileira, etc. Porém o sistema Carcerário Brasileiro nunca foi modelo a ser seguido, no ano de 1952, O Massacre da Ilha Anchieta foi uma das maiores rebeliões nos presídios[5], de acordo com jornais da época[6] o número de mortos passaram de 100, se faz necessário repensar se passou 65 anos e nada mudou, esse grande problema passa por várias gerações é uma situação complexa e ambígua, nos primeiros dias do ano de 2017 o sistema carcerário explodiu, ocorrendo em menos de 15 dias rebeliões em diversos presídios dos estados brasileiros deixando mais de 130 mortos.[7]
Como se pode observa as práticas de resolução de conflitos aplicada durante décadas não estão surtindo o seu devido efeito, deve se pensar, desde as camadas mais pobres da sociedade, para que está se liberte gradualmente dos processos de criminalização e da ideologia punitivista.
3. JUSTIÇA RESTAURATIVA UMA POSSIVÉL SOLUÇÃO PARA A CRISE DO SISTEMA CARCERÁRIO
Sendo uma novidade no Brasil a sua veloz difusão conceitual para a Justiça Restaurativa que em contraposição ao atual sistema penal retributivo[8] no qual segue a ideologia punitivista, ao contrário então da justiça tradicional que não se preocupa com a violação da norma que atinge os presos a vítima e toda a comunidade, a Justiça Restaurativa valoriza a autonomia dos sujeitos e do diálogo entre eles com o principal objetivo de humanizar o sistema, que ao invés de versar sobre transgressões ou a culpa, materializa as possibilidades concretas da participação individual e social do indivíduo na sociedade.
A importância da Justiça Restaurativa para o sistema retributivo é um dos benefícios mais evidente e imediato para o sistema de justiça formal é o efeito conciliador, pois ao evitar que certos litígios cheguem aos bancos judiciais o resultado se torna visível, porque o Judiciário é liberado das grandes filas de casos para julgar e não havendo grandes demandas certamente o judiciário irá analisar as lides de forma mais eficaz.
A Justiça Restaurativa então uma das alternativas para contribuir e minimizar o problema carcerário Brasileiro, pois o modelo inova ao solucionar conflitos, antes que haja a punição proposta pela justiça criminal, com ela pretende solucionar o conflito reiterando o comprometimento das partes na busca de uma solução negociada reduzindo os efeitos estigmatizantes de uma eventual vitória ou derrota processuale restabelecer o convívio social tanto da vítima quanto do agressor, resgatando a sensação de segurança da comunidade e gerando um enorme potencial de pacificação social.(Prática da Justiça Restaurativa, 2005, p.83)
Essa nova Justiça se apresenta como uma alternativa ao atual modelo retributivo ao exemplo que não objetiva a punição e sim a restauração do ofensor, tem um cuidado maior deve ser dispensado quando o ofensor se tratar de criança ou adolescente, para isso tem a obrigatoriedade de se levar em consideração o tratamento disponibilizado pelo ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente a esses menores infratores, para que o modelo restaurativo possa contribuir de forma veemente na soluções desses conflitos.
Faz-se compreender que o trabalho da justiça restaurativa não é voltada para o delito, mas sim a consequência do conflito gerado por este, o modelo restaurativo visa complementar o tratamento da retribuição dada ao ofensor pelo Estado visto que esta não dirimi o conflito apenas pune o agente e é esse o trauma tanto da vítima quanto do ofensor, que muitas vezes a Justiça Restaurativa é chamada para se manifestar, pois a sociedade vive numa convivência à distância, em contato então podemos notar que essa justiça tende a promover uma intensificação do papel comunitário na promoção da segurança. (CARVALHO Luiza, 2015)
3.1 AS ORIGENS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA
Segundo Albert Eglash(2011,p.19)a Justiça Restaurativa surgiu em meados da década de 70, como resultados de antigas tradições pautadas em diálogos, de acordo com a história da humanidade as civilizações antigas até a nossa sociedade contemporânea incluindo os grupos familiares, e os povos indígenas criaram soluções para seus conflitos, os construtores de consensos originários se deram em grande escala em países como Nova Zelândia, Canadá, Estados Unidos, Brasil dentre outros, o surgimento da justiça nestes países foi influenciando principalmente pelas propostas abolicionistas do atual sistema penal e de grupos críticos da área penal interessados em busca de alternativas a prisão após o aumento da criminalidade e grande quantidade de presos.
A Justiça Restaurativa ficou mundialmente conhecida pelo livro Trocando as Lentes: Um Novo Foco sobre Crime e Justiça, do americano HowardZehr (2014.p6), na década de 90 e se tornou um dos principais movimentos de reforma do sistema criminal e se tornou um dos principais motivos da reforma no sistema criminal sendo reconhecido e recomendado pela Organização das Nações Unidas e pela União Européia e como forma de incentivar tais regras e regulamentar as práticas no mundo, à ONU emitiu três resoluções de 1999 a 2002 e essas resoluções são referente a justiça restaurativa nos países que são signatários da ONU.
Tais práticas têm raízes em dimensões gregárias tão antigas quanto à organização das comunidades humanas, na medida em que uma comunidade para se manter e conviver precisa ter uma ética e justiça em seu modo de ser um sistema de manutenção de relações que evite ou repare danos e ofensas causados entre os participantes ou litigantes, podemos dizer que as comunidades humanas funcionam na base da teoria do dom da resolução de conflitos. (MARIOTI, 2000)
3.2 JUSTIÇA RESTAURATIVA SEUS PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS
Cada instituto tem sua base, sob a qual se justifica e se funda a sua razão de ser, a Justiça Restaurativa por versarem sobre normas de comportamento social tem o seu fundamento maior os princípios e direitos da dignidade da pessoa humana inicialmente, os princípios fundamentais da pessoa humana, e os princípios norteadores do direito penal correlatos com a essa nova justiça, sob os quais faremos breves comentários para melhor inteligência do tema.
Nas últimas décadas tem crescido a busca por alternativas para a administração de conflitos na sociedade. O Direito Penal e o Direito Processual Penal, por meio dos órgãos da administração de justiça criminal monopolizam a sistemática de resolução dos litígios. As práticas da Justiça Restaurativa têm um novo paradigma na resolução de conflitos por meio do diálogo e a resolução dos danos em que vítima e autores estão envolvidos em busca da recuperação da relação entre as pessoas o novo modelo restaurativo baseia-se em valores, resultados definidos e procedimentos.
As dificuldades enfrentadas na atualidade pelo sistema prisional brasileiro voltam-se para a morosidade na tramitação dos processos além da superlotação nos presídios que não conseguem responder ao apelo social que clama pela redução da violência, de respostas céleres do judiciário para a resolução dos conflitos sociais. Neste sentido a Justiça Restaurativa surge como um caminho viável e uma alternativa muito mais ampla do crime baseiam-se em um modelo não punitivo, mas sim na análise do fato danoso observando suas consequências e procurando as possíveis soluções para a sociedade brasileira.
3.3 PRINCIPAIS PRÁTICAS RESTAURATIVAS
Em conformidade com os valores e princípios mencionados acima, diversas podem ser as práticas restaurativas, que, por sua vez, não impedem que novos modelos sejam criados, ou que os ja? existentes sejam adaptados e modificados em conformidade com as demandas específicas de cada local. Walgrave (2008, p. 31-41), no entanto, selecionou, as práticas mais conhecidas atualmente, apresentando-as da seguinte maneira:
A Justiça Restaurativa tem um especial interesse pelas necessidades das vítimas que não são adequadamente atendidas pelo sistema judiciário penal, entre elas: informação, narração dos fatos, recuperação do senso de controle e reparação ou reivindicação.
Como o foco principal deixa se ter a averiguação dos fatos para posterior responsabilizar o acusado, um serviço de apoio a? vítima, conforme o autor (Walgrave, 2008, p. 32) ,deve ser a primeira e mais importante condição para fazer a justiça, toda projeção, previsão ou planificação do tripé da Justiça Restaurativa, tem como sua base em que nada pode concorrer com o diálogo franco aberto com a vítima e acusado, não é certo que a negociação do conflito seja como um jogo de soma que se soma zero, no qual uma parte ganha e automaticamente a outra perde, pelo ao contrário, a criação de valor sempre está presente, até naqueles casos em que parece que tudo se reduz a uma equação matemática de forma negativa.
É nestas necessidades que o sujeito tem a possibilidade de ser escutado e uma das ferramentas mais importante para resolver conflitos é saber escutar com atenção e pedir explicações, é conhecer a outra história de permitir o arrependimento e a desculpa do ofensor e ter uma reparação pelo dano sofrido.
Para o ofensor, a possibilidade de poder encontrar-se com sua vítima e sua necessidade de responsabilizar-se positivamente e restaurar sua imagem como pessoa para assumir compromissos e condutas valiosas para o futuro que ambos os sujeitos juntamente com a comunidade possam trabalhar na recomposição do relacionamento quanto seja necessário, tendo oportunidade de administrar os conflitos numa experiência com um forte conteúdo pedagógico nesse sentido e cuja a realização mão pode estar ausente a comunidade.
Os encontros vítima e acusado devem ser realizados em espaços onde todos os participantes o façam autenticamente e livres de perigo da revitimização, em síntese, não pode existir um programa de Justiça Restaurativa sem sua articulação com um programa vitimológico.
Conforme a Resolução 225, versa sobre as práticas restaurativas e tem como o foco a satisfação das necessidades dos envolvidos, tanto comunidade a vítima e o ofensor, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e as suas implicações para o futuro.
4. A JUSTIÇA RESTAURATIVA SUA APLICABILIDADE E SEUS PROJETOS NO BRASIL
Importante mencionar que diversos programas de administração alternativa de conflitos se encontram em operação, na condição de projetos-piloto ou de funcionamento continuo. Referidos programas e projetos são importantes para demonstrarem a efetiva existência de diferentes iniciativas de sistemas alternativos de resolução de conflitos. (2014, p.219)
Em levantamento realizado no ano de 2005[9] pelo Ministério da Justiça, por intermédio de parceria entre a Secretaria de Reforma do Judiciário e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), foram mapeados 67 programas alternativos de administração de conflitos, em funcionamento em 22 Estados brasileiros.
A implementação oficial da Justiça Restaurativa no Brasil aconteceu a partir de 2005, através do projeto “Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro”, iniciativa da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça em colaboração com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD. Foram criados três projetos-piloto em Porto Alegre (RS), Brasília (DF) e em São Caetano do Sul (SP), mas em foi em Porto Alegre que a Justiça Restaurativa tomou forma e foi chamada de Projeto Justiça para o Século 21, um articulado de ações interinstitucionais liderados pela Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS) com o objetivo de difundir a Justiça Restaurativa na pacificação de conflitos e violências envolvendo crianças, adolescentes e seu entorno familiar e comunitário.(2011, p.18)
Como explicitado no tópico anterior um dos três projetos-piloto foi em Porto Alegre/RS e com o nome de Justiça do Século 21, foi coordenado então pela 3º Vara Regional da Infância e da Juventude de Porto Alegre, que se iniciou as práticas restaurativas, na qual o tema adotado foi o círculo restaurativo com a participação principal da vítima e o seu grupo familiar e a ofensor aplicando as medidas socioeducativas.
Em São Caetano do Sul/SP(2011,p.57) foi adotado um projeto de nome “ Justiça, Educação, Comunidade: Parcerias para a Cidadania”, esse projeto teve inicio em 2008 e ainda está em desenvolvimento a prática utilizada são os círculos e cirandas com crianças menores de 12 anos, usando a técnica de comunicação não violenta, os círculos são realizados em mais de 11 escolas atualmente, bem como no Fórum e no Conselho Tutelar da cidade.
Já em Araguaína/ TO no ano de 2013 foi implantada a Justiça Restaurativa o juiz titular da 2ª Vara Criminal e Execuções Penais da Comarca de Araguaína, Antônio Dantas, colocou a unidade judiciária como referência na aplicação da Justiça Restaurativa no país. A próxima etapa do projeto é fazer com que também as vítimas possam participar dos círculos restaurativos. O projeto em Araguaína foi um dos finalista no Prêmio Innovare 2016.
4.1CÍRCULOS RESTAURATIVOS E SUAS SOLUÇÕES
Através da implantação dos projetos de justiça restaurativa no Brasil, pode-se constatar uma evolução na reabilitação de jovens que haviam cometido algum tipo de delito, o que em outrora, acarretaria em uma punição, talvez, exacerbadamente exagerada.
Podemos citar alguns casos reais em que a justiça restaurativa cumpriu o papel a que se propôs:
Caso 1:
Em Caxias do Sul (RS), um assalto à mão armada envolvendo três adolescentes encontrou uma saída em uma nova metodologia de solução de conflitos. O caso, que poderia terminar com mais três adolescentes em unidades socioeducativas lotadas, foi resolvido com base na Justiça Restaurativa, ou os chamados círculos restaurativos. No caso do assalto, os três adolescentes, os familiares e o dono do restaurante roubado foram convidados a participar do círculo, onde, juntos, decidiram a melhor forma de solucionar o conflito. Os jovens cumpriram regime de liberdade assistida e devolveram o valor roubado. Para Roger Modelski, um dos adolescentes, a Justiça Restaurativa mudou sua forma de pensar e sem ela “eu poderia estar morto hoje”, afirma. Roger, hoje com 23 anos, conta que a presença do dono do restaurante nos círculos e a esperança dele de que os jovens poderiam mudar foi fundamental. (PROJETO COLABORA, 2017,online)
Caso 2:
A comarca de Araguaína é referência nacional na aplicação da Justiça Restaurativa, o Juiz titular da 2ª Vara Criminal e Execuções Penais da Comarca de Araguaína, Antônio Dantas, colocou a unidade judiciária como referência na aplicação da Justiça Restaurativa no país. O magistrado já determinou a realização de 11 círculos restaurativos. No dia 13 de setembro foi publicada a sentença com enfoque restaurativo nos autos de nº 0003131-30.2016.827.2706, envolvendo os sentenciados Johnny Cristiano dos Santos e Maria Karollyny Campos Ferreira, tendo sido reconhecida a Justiça Restaurativa para o primeiro e, como consequência, a diminuição da sua pena e a aplicação do regime mais brando, o aberto. (TJTO, 2016, online)
Apesar de a justiça restaurativa visar conciliação entre o infrator e a sociedade, é de suma importância que o “acusado” demonstre arrependimento e interesse nessa conciliação.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, não restam dúvidas quanto à naturalização da barbárie que arruína o sistema carcerário brasileiro, o aumento da criminalidade revela a fragilidade do nosso atual sistema penal, o papel do Estado na solução de conflitos e na promoção de políticas públicas torna-se cada vez mais distante da sociedade, a pena da privação de liberdade de forma indiscriminada não mais ressocializa o indivíduo tornando-o inapto ao convívio social.
E é neste contexto que se insere a proposta da justiça restaurativa, que propõe a ser uma nova ferramenta na composição de resolução de conflitos, sem alimentar a violência, em busca pela harmonização das necessidades de todas as partes envolvidas, sem exclusão, promovendo uma efetiva reflexão entre ambos.
Pode-se dizer que a justiça possui princípios diferentes dos sustentados pelo modelo tradicional, esse novo método trata os acusados com dignidade respeitando as leis, bem como seus direitos tratá-los com dignidade e respeita os seus direitos. Assim, a Justiça Restaurativa, sinaliza um novo e longo caminho a ser enfrentado, mas que a necessidade de resolver o problema carcerário no Brasil está clamando por uma luz no fim do túnel como uma ferramenta para a reestruturação do sistema criminal.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF.
ZEHR, H.Changing Lenses: A New Focus for Crime and Justice(Waterloo, ON: Herald Press, 1990) in http://www.restorativejustice.org/. Acesso 25 mar. 2017
PELIZZOLI. M. L. A importância da Justiça Restaurativa - em direção à realização da justiça: Editora da UFPE, 2014 – Disponível em:
https://www.ufpe.br/edr/images/documentos/A_import%C3%A2ncia_da_JR.pdf
Acesso:06 jun. 2017
VASCONCELOS, C. E. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. São Paulo: Método, 2008, p. 35-40) Disponível em:
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ACHUTTI, Daniel Silva: Justiça Restaurativa e abolicionismo penal . São Paulo, Ed. Saraiva, 2014.
ZIZEK, Slavoj. Arriesgarloimposible:Conversaciones com Glyn Daly. Trad. Sonia Arribas. Madri: Trotta, 2006, p.116site: http://emporiododireito.com.br/tag/processo-penal/page/19/#_ftn30Acesso em 12 jun. 2017.
Uma abordagem constitucional sobre a Justiça Restaurativa no âmbito criminal preconizada na Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça http://www.seer.ufrgs.br/index.php/revfacdir/article/viewFile/62935/38656
Acesso: 12 jun.2017.
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http://justicarestaurativaemdebate.blogspot.com.br/2016/03/%209/1/1/1
Acesso:12 out. 2017
'Presídios do País são masmorras medievais’, diz ministro da Justiça. Disponível em:
<http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,presidios-brasileiros-sao-masmorras-medievais--diz-ministro-da-justica,10000001226>, acesso em 18 nov. 2017
Justiça Restaurativa: o que é e como funciona.Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/62272-justica-restaurativa-o-que-e-e-como-funciona
Acesso: 19 nov. 2017
Carnificina em presídios deixou mais de 130 mortos neste ano. Disponível em:
https://www.cartacapital.com.br/sociedade/carnificina-em-presidios-deixou-mais-de-130-mortos-neste-ano Acesso: 19 nov. 2017
A Ilha Anchieta Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Rebeli%C3%A3o_da_Ilha_Anchieta
Acesso:19 nov. 2017.
http://www.tjto.jus.br/index.php/listagem-noticias/4345-comarca-de-araguaina-e-referencia-nacional-na-aplicacao-da-justica-restaurativa.Acesso em 17 de nov. 2017.
[1] Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos, Especialista em Prestação Jurisdicional, pós-graduado em Direito e Processo Administrativo, Graduado em Direito e em Comunicação Social. Professor Universitário em Direito Penal e Processo Penal, escritor de obras jurídicas, palestrante.
[2] Em entrevista o então Ministro da Justiça no governo Dilma, José Eduardo Cardoso, citou os presídios textualmente como masmorras medievais. Disponível em: <http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,presidios-brasileiros-sao-masmorras-medievais--diz-ministro-da-justica,10000001226>, acesso em 18/11/2017
[3] Podemos citar: Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), art. 5, 2; Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), art. 5; Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, art. 7.
[4]Ex-Detentos, realidade e preconceito. (GAZETA DO POVO, 2010, on line)
[5]A Rebelião da Ilha Anchieta foi um confronto ocorrido em 20 de junho de 1952, entre as forças policiais brasileiras e prisioneiros que tentaram escapar do presídio que existia , na época, na Ilha Anchieta, litoral norte do estado de São Paulo o episódio foi uma das maiores rebeliões de prisioneiros da história. Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Rebeli%C3%A3o_da_Ilha_Anchieta acesso em 19/11/2017.
[6]Manchete do jornal O Estado de S. Paulo, Edições dos dias 21 e 22 de Junho de 1952, (MIGALHAS, 2017, online).
[7]No dia 1º de Janeiro de 2017,em Manaus uma rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), foi encerrada com o assassinato de 56 presos. Posteriormente no dia 4º de Janeiro em Patos (PB) dois homens foram assassinados durante uma rebelião. Dias depois da barbárie em Manaus, a Penitenciária Agrícola Monte Cristo, na capital de Roraima, foi palco de dezenas de mortes, em um novo episódio da guerra de facções, 33 homens morreram. Uma outra rebelião na Penitenciária de Alcaçuz, na Região Metropolitana de Natal, deixou 26 mortos, foi o terceiro maior massacre do ano. Disponível em https://www.cartacapital.com.br/sociedade/carnificina-em-presidios-deixou-mais-de-130-mortos-neste-ano acesso 19/11/2017.
[8]Sistema penal retributivo segue a teoria que a pena é a retribuição do mal injusto praticado pelo criminoso.
[9]A publicação dos resultados está? disponível no sítio eletrônico do Ministério da Justiça, seçãopublicações http://www.mj.gov.br , acesso em 20/11/2017
Graduanda em Direito Pela Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MANTOVANELLI, Danielle Silva. A Justiça Restaurativa: uma alternativa para o Sistema Carcerário Brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 dez 2017, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51093/a-justica-restaurativa-uma-alternativa-para-o-sistema-carcerario-brasileiro. Acesso em: 07 nov 2024.
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