ELOISA DA SILVA COSTA
(Orientadora)
Resumo: A delação premiada é um instituto empregado na esfera jurídica e atua como uma espécie de “troca de favores” entre o juiz e o réu. Neste instituto, o acusado provê informações referentes ao(s) crime(s) cometido(s), prestando auxílio a fim de colaborar com a solução do mesmo, podendo obter as compensações previstas em lei. Tal instituto tornou-se amplamente conhecido com a chamada Operação Lava-jato, quando houve diversos acordos de delação premiada com repercussão em âmbito nacional. O presente artigo tem como objetivo, através das informações legais e sob o ponto de vista da ética e da moral, apresentar argumentos com relação à constitucionalidade deste instituto jurídico, considerando seus aspectos positivos e negativos, demonstrando a sua finalidade e os benefícios que podem ser concedidos.
Palavras-chave: Delação. Constitucionalidade. Aspectos positivos e negativos.
Abstract: The award-winning delation is an institute used in the legal sphere and acts as a kind of "exchange of favors" between the judge and the defendant. In this institute, the accused provides information regarding the crime(s) committed, providing assistance in order to collaborate with the solution of the same, being able to obtain the compensations provided for by law. This institute became widely known with the so-called Operation Lava-jato, when several plea bargaining agreements took place with nationwide repercussions. This article aims, through legal information and from the point of view of ethics and morals, to present arguments regarding the constitutionality of this legal institute, considering its positive and negative aspects, demonstrating its orientation and the benefits that can be granted.
Keywords: Delation. Constitutionality. Positive and negative aspects.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Fundamentação teórica. 3. Legislação e concessão de benefícios. 3.1. Momentos para a concessão do acordo. 4. Valor probatório da colaboração premiada. 5. A ética e a moral. 6. Considerações finais. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo disserta sobre o instituto jurídico denominado de delação premiada, conhecido popularmente como uma troca de favores entre o juiz e o réu. Sucede-se quando o acusado fornece informações importantes sobre o crime ocorrido e delata outros partícipes, informações estas que levam a resultados pertinentes na resolução do crime. Quando o acordo acontece, o juiz pode conceder ao réu, a depender da legislação utilizada, a diminuição da pena em até 2/3 (dois terços), substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, cumprimento da pena em regime semiaberto e o perdão judicial.
Segundo Guilherme de Souza Nucci a delação premiada ocorre:
Quando se realiza o interrogatório de um co-réu e este, além de admitir a prática do fato criminoso do qual está sendo acusado, vai além e envolve outra pessoa, atribuindo-lhe algum tipo de conduta criminosa, referente à mesma imputação. (NUCCI, 1997, p. 208).
Apesar de estar prevista no ordenamento jurídico brasileiro desde a década de 1990 com a lei nº 8.072/1990 (Lei de Crimes Hediondos), a delação premiada tornou-se um dos assuntos mais falados no Brasil no ano de 2013 e seguintes. Isso se deve às investigações por corrupção desencadeadas por manifestações e por iniciativa do sistema judiciário brasileiro na chamada Operação Lava-jato, quando foram firmados diversos acordos de delação premiada a fim de obter sucesso na investigação.
Foi instituída com o objetivo de facilitar a resolução de crimes, com enfoque nos cometidos por organizações criminosas, devido à dificuldade em punir os crimes praticados em quadrilha ou bando, uma vez que era muito difícil descobrir todos os envolvidos na prática do delito.
Existe no âmbito jurídico uma discussão acerca da inconstitucionalidade, ou não, da delação premiada. Vários doutrinadores consideram o mecanismo inconstitucional do ponto de vista moral e ético. Outros doutrinadores a consideram constitucional pelos seus pontos positivos, visto que por meio deste instituto se desmontam diversas organizações criminosas.
Vale ressaltar que delação premiada é apenas uma das espécies de colaboração premiada, sendo esta o gênero. O vocábulo delação presume, precisamente, que haja a incriminação de demais partícipes da organização. Deste modo, na colaboração pode-se colaborar com o Estado delatando um comparsa, como por exemplo na delação premiada, ou colaborar com outras informações importantes, sem a delação de demais coautores do crime.
O instituto da Delação Premiada foi criado com o propósito de contribuir com a obtenção de provas durante uma investigação. Assim, esse mecanismo favorece o processo no tocante à aquisição de provas. Nesse sentido, através da delação premiada, o Estado consegue desmantelar um grupo de criminosos com maior facilidade.
De maneira resumida, podemos determinar que a delação premiada é uma técnica judicial onde um acusado colabora com as investigações delatando demais partícipes do crime e prestando informações úteis para o esclarecer o fato delituoso, em contrapartida, o Estado oferece um benefício que pode ser: a redução da pena de até dois terços do total, converter a pena em regime semiaberto, ou então, o perdão judicial.
No Brasil a delação premiada está prevista por lei desde o ano de 1990, quando foi criada foi a Lei de Crimes Hediondos (8.072/1990). No entanto, essa lei tratava apenas da redução de um a dois terços da pena do réu.
De acordo com o artigo 8º da lei 8.072/90:
Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.
Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços. (BRASIL, 1990).
Após a Lei dos Crimes Hediondos, tivemos a Lei do Crime Organizado, Lei 9.034 de 1995, entretanto, foi revogada pela Lei nº 12.850 de 02 de agosto de 2013, a qual dispõe cautelosamente sobre a delação premiada, os requisitos necessários, seus possíveis benefícios e os direitos do colaborador.
3. LEGISLAÇÃO E CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS
Na legislação brasileira, várias leis fazem menção à delação premiada, algumas delas são: Crime de extorsão mediante sequestro (art. 159, § 4°, do Código Penal), Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e contra a Ordem Tributária (Lei 8.137/90, incluído pela Lei 9.080/95) e a Lei 12.850/13 que define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal.
A Lei 12.850/13 que discorre sobre a investigação criminal, o processo de obtenção da prova, as infrações penais e sobre o procedimento criminal a ser utilizado, aperfeiçoou o instituto da delação premiada trazendo seus requisitos.
Assim diz o seu artigo 4º:
(...) Art. 4o O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;
V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.
(BRASIL, 2013).
Além da legislação brasileira, encontramos a colaboração (ou delação) premiada na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, também conhecido como Convenção de Palermo, promulgada pelo decreto nº 5.015/2004, sendo este o principal instrumento de âmbito mundial de combate ao crime organizado transnacional.
3.1 MOMENTOS PARA A CONCESSÃO DO ACORDO
Os acordos de colaboração premiada podem ocorrer nas diversas etapas da persecução penal, ou seja, o acordo pode ser firmado em qualquer momento, desde a investigação preliminar até a execução penal, após o trânsito em julgado da condenação.
O art. 4, § 5º, lei 12.850/13 diz: Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos.
4. VALOR PROBATÓRIO DA COLABORAÇÃO PREMIADA
O art. 4º, § 16, traz no seu texto a informação de que não poderá ser decretada ou proferida medidas cautelares ou pessoais, recebimento de denúncia ou queixa-crime ou sentença condenatória baseando-se somente nas declarações do colaborador.
Apesar disso é possível que o julgador, respaldado pelo princípio da livre valoração da prova, considere relevantes os elementos apropriados para proferir a sentença, visto que a colaboração premiada constitui meio de obtenção prova. Entretanto, por si só não é suficiente para proferir sentença.
5. A ÉTICA E A MORAL
Alguns doutrinadores são contra a aplicação do acordo de delação premiada, com base no argumento de que este instituto fere a moral e a ética, entendendo que quem pratica o ato de delatar é visto como traidor.
De acordo com Carvalho (2009, p.101), a tomada de uma postura infame (trair) pode ser vantajosa para quem o pratica, e o Estado premia a falta de caráter do codelinquente, convertendo-se em autêntico incentivador de antivalores ínsitos à ordem social.
Já, em contrapartida, outros doutrinadores entendem que a delação premiada é benéfica para o ordenamento jurídico, visto que auxilia no desmantelamento de organizações criminosas.
Nesse sentido, para Nucci (2007) ainda que o instituto da delação premiada seja criticado pela moral e a ética por regularizar o “dedurismo”, comprova ser uma forma válida no combate à criminalidade. Desta forma, traz benefícios ao Estado e também para a sociedade.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O debate em torno da (in) constitucionalidade da delação premiada, em relação à moral e a ética, sempre existirá, considerando que existem duas vertentes.
Nesse contexto, o posicionamento favorável entende que o benefício que este instituto traz para o combate a criminalização deve ser considerado, visto que por continuação, beneficia toda a sociedade, trazendo efetividade no combate à corrupção, desestimulando a prática de crimes e também conferindo agilidade no processo penal.
Em contrapartida, a vertente contrária ao instituto alega que o mesmo fere o direito constitucional ao silêncio, e considera a delação como uma forma de traição e que não deve ser fonte de premiação para um criminoso.
No entanto, conclui-se que o valor coletivo deve prevalecer, sendo essencial para a vida em sociedade. Nessa perspectiva, sob o fundamento do interesse coletivo e o bem social, analisa-se que a delação premiada é um instituto benéfico e necessário, considerando que é um instrumento jurídico eficaz que auxilia o Estado no combate a corrupção. É importante ressaltar que a delação premiada deve ser utilizada dentro dos limites estabelecidos pela legislação e garantindo os direitos e garantias fundamentais do acusado. Além disso, é fundamental que haja um cuidadoso acompanhamento e controle dos acordos de delação, a fim de evitar possíveis abusos e garantir que a colaboração seja voluntária e verdadeira.
REFERÊNCIAS
ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA. Disponível em: <https://direito.idp.edu.br/blog/direito-penal/acordo-colaboracao-premiada/> Acesso em: 30 de setembro de 2022.
BITENCOURT, C. R. Comentários à Lei de Organização Criminosa - Lei 12.850, de 02 de Agosto de 2013. São Paulo: Saraiva, 2014. E-book.
BRASIL, Lei 8.137 de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil _03/leis/L8137.htm>. Acesso em: 17 de outubro de 2022.
CARVALHO, Natália Oliveira. A delação premiada no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009.
Colaboração premiada. Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/pdf> Acesso em: 25 de outubro de 2022.
Da colaboração premiada. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm>. Acesso em: 08 de abril de 2023.
NUCCI, Guilherme de Souza. O valor da confissão como meio de prova. São Paulo: Revista dos Tribunais: 1997 p. 208.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial. 3ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 716.
Graduanda em Direito pela Universidade Brasil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACHADO, Júlia Emanuelle Rodrigues. A (in) constitucionalidade da delação premiada Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 jun 2023, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61629/a-in-constitucionalidade-da-delao-premiada. Acesso em: 26 dez 2024.
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